Viomundo, 10 de maio de 2012
Dr. Rosinha: “Alguns segmentos da imprensa terão de ser investigados, sim”
Por Conceição Lemes
Deu no Painel, da Folha de S. Paulo, dessa quarta-feira, 9 de maio.
O deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), um dos “soldados” citados, estranhou a nota.
“Eu não sei de nenhuma reunião secreta na liderança do PT do Senado. E se houve, não participei”, diz. “E não tendo participado, fui escalado, segundo a Folha. Só que até agora eu não fui avisado, a não ser pelo Painel.”
“Se alguém disse a frase ‘se a mídia quer guerra, ela vai ter guerra’, não saiu de ninguém do PT de reunião em que eu tenha participado. Até porque o nosso objetivo não é a imprensa, mas a organização criminosa do Cachoeira”, reitera. “Agora, se algum jornalista ou empresa de comunicação tiver algum problema identificado, será investigado como qualquer suspeito de crime.”
Nós entrevistamos o Dr. Rosinha no final da noite dessa quarta-feira 9. Ele é suplente da CPI do Cachoeira. O suplente, ao contrário dos muitos imaginam, pode fazer tudo — ter acesso aos documentos sigilosos, questionar os depoentes, se manifestar — , exceto votar, se o titular estiver presente. E quando o titular se ausenta, o suplente vota também.
Na terça-feira, o Dr. Rosinha participou da sessão secreta da CPI que ouviu o depoimento do delegado da Polícia Federal (PF) Raul Alexandre Marques Souza, que comandou a Operação Vegas.
Viomundo – Os documentos já vazados da Operação Monte Carlo indicam que o esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira teria um braço na mídia. O que achou das revelações nesse setor até agora?
Dr. Rosinha – Oficialmente, dentro da CPI, ainda há muito pouca coisa nessa área . Nós tivemos o primeiro depoimento – o do delegado da Vegas — na terça-feira. E os documentos que chegaram à Câmara, ainda não deu tempo para analisarmos.
De modo que tudo o que saiu sobre a imprensa e a organização criminosa do Cachoeira foi publicado por outros veículos da imprensa. Mas o pouco que ouvi na terça-feira do delegado da Polícia Federal, alguns segmentos da imprensa terão de ser investigados, sim.
Viomundo — O que o senhor ouviu?
Dr. Rosinha – Eu não posso revelar, porque a reunião foi secreta. Mas o delegado disse que há mais de um jornalista citado nas escutas telefônicas do Cachoeira. Lembre-se de que ele falou apenas sobre a Operação Vegas.
Viomundo – É só a Veja ou há mais veículos citados nos grampos da Operação Vegas?
Dr. Rosinha – Tem mais veículos envolvidos.
Viomundo – Quer dizer que o delegado abordou, mesmo, a participação da mídia no esquema do Cachoeira?
Dr. Rosinha — A sessão de terça foi sobre a investigação e as escutas telefônicas da Operação Vegas. Nas gravações com o Cachoeira, segundo o delegado, foram feitas referências a três jornalistas de veículos diferentes.
Viomundo – Quantos veículos?
Dr. Rosinha – Foram citados três jornalistas de três veículos diferentes. Nós, agora, vamos continuar a apuração. Se forem mantidas as informações que ouvimos, cabe investigação.
Viomundo – Tanto o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, quanto a mídia estão batendo na mesma tecla: a convocação dele para depor na CPI seria uma manobra para desviar a atenção do chamado mensalão. O que acha dessa teoria?
Dr. Rosinha – O chamado mensalão está no STF e não mais na Procuradoria Geral da República. O STF vai fazer o julgamento no momento em que julgar que está tudo preparado para fazê-lo.
Eu não entrei nessa CPI para vingar absolutamente nada. Nem ninguém. Eu assim como todos os demais petistas integrantes da CPI – e nós conversamos sobre isso — entramos nela, porque existe uma organização criminosa que tem de ser investigada.
Se o procurador for convocado, não tem nada a ver com o chamado mensalão. Tem a ver com o fato de ele ter ficado mais de dois anos sem dar encaminhamento ao relatório da Operação Vegas, da Polícia Federal. Ele não mandou arquivar nem tocou adiante. Por que ele fez isso? Essa explicação ele deve não para a CPI, ele deve para toda a sociedade. Afinal, enquanto ele ficou sem dar continuidade ao relatório da Vegas, o crime organizado foi mantido. Na verdade, essa atitude dele contribuiu para que demorasse ainda mais a investigação.
Viomundo – Caso a CPI do Cachoeira convoque algum jornalista para depor, a mídia dirá que é um atentado à liberdade de imprensa e à liberdade de expressão. O que acha disso?
Dr. Rosinha — Quer dizer que jornalista não pode ser investigado? Cada vez que um jornalista é investigado é censura, é atentado à liberdade de imprensa? Aí, eu estaria dizendo que jornalistas, de uma maneira geral, poderiam cometer crimes. Isso é um desvio de atenção. É querer se resguardar de qualquer tipo de investigação.
O Murdoch que o diga na Inglaterra. É algo muito semelhante. A empresa do Murdoch grampeou telefones. O que se tem até agora é que o jornalista da Veja, o Policarpo Jr., usou material de telefones grampeados ilegalmente, como fez o pessoal do Murdoch, na Inglaterra.
O jornalista da Veja sabia ou não que o material era proveniente de grampo ilegal? Bem, a suspeita de que ele sabia é muito forte. Isso tem que ser investigado, porque se confirmada essa prática, ficará caracterizado crime muito semelhante ao que tinha na Inglaterra.
Agora isso não é censura. Vão dizer que na Inglaterra estava tendo censura? Não estava, estava tendo investigação. Então, no Brasil, eu acho que a CPI tem de ter a liberdade de investigar todos os cidadãos e cidadãs sobre os quais forem levantadas suspeitas.
Viomundo – Então todo suspeito será investigado?
Dr. Rosinha – Todas as conversas que estamos tendo são no sentido de focar no crime organizado. Toda vez que houve CPI, dois ou três deputados eram a festa da mídia. E o corruptor, você se lembra de quantos foram punidos? NENHUM!
Agora, há um corruptor, que é do crime organizado, com empresas legais. Afinal, ele tem de lavar o dinheiro. Acho que é um grande momento na República para se investigar tudo isso.
Não se trata de tirar o foco de políticos. Mas ver que tem um segmento importante que manda no Estado brasileiro. Ele tem poder no Parlamento – já está aí o caso do senador. Tem poder na polícia – já tem o policial federal preso. Tem poder no Executivo. E tem poder na mídia. É como a máfia italiana que está em tudo.
Quinta-Feira, 10 de Maio de 2012
Os encontros entre Policarpo, da Veja, e os homens de Cachoeira
Vinicius Mansur
Brasília - Um levantamento do inquérito 3430, resultado da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal (PF), indica que o editor da revista Veja em Brasília, Policarpo Júnior, e integrantes da quadrilha do contraventor Carlinhos Cachoeira se encontraram presencialmente, pelo menos, 10 vezes. Só com Cachoeira foram 4 encontros.
O número pode ser maior, uma vez que a reportagem de Carta Maior teve acesso apenas ao apenso 1 do inquérito, com 7 volumes. Entretanto, existem mais dois apensos que, juntos, tem 8 volumes.
O primeiro destes encontros foi marcado para o dia 10 março de 2011. Em ligação telefônica no dia 9 daquele mês, às 22:59, Cachoeira diz ao senador Demóstenes Torres (então do DEM, hoje sem partido):
“É o seguinte: eu vou lá no Policarpo amanhã, que ele me ligou de novo, aí na hora que eu chegar eu te procuro.”
No dia 27 de abril, Cachoeira anunciou outro encontro com o jornalista. Em uma ligação interceptada às 07:22, o inquérito da PF relata: “Carlinhos diz que vai almoçar com a prefeita de Valparaíso e com Policarpo da revista Veja”. Às 09:02, o contraventor avisa a Demóstenes de novo almoço com Policarpo, desta vez acompanhados da prefeita de Valparaíso (GO). “Eu vou almoçar com o Policarpo aí. Se terminar o almoço e você estiver lá no apartamento eu passo lá”, disse Cachoeira ao senador, que respondeu: “Ok... o Policarpo me ligou, tava procurando um trem aí. Queria que eu olhasse pra ele algumas coisas. Pediu até pra eu ligar para ele mais tarde, não quis falar pelo telefone”.
Nesta mesma conversa, Demóstenes pediu conselhos a Cachoeira sobre sua mudança de partido. Cachoeira afirmou que “esse DEM já naufragou” e disse “tem que ir pro PMDB, até pra virar do STF né?”
O terceiro encontro: o alvo é Zé Dirceu, não a Delta
A partir do dia 7 de maio de 2011, aparecem conversas da quadrilha de Cachoeira sobre a reportagem “O segredo do sucesso”, assinada por Hugo Marques e publicada pela revista Veja na edição 2216, daquele mesmo fim de semana. A matéria relaciona o crescimento da empresa Delta com os serviços de consultoria de José Dirceu.
Em ligação do dia 8 de maio, às 19:58, Cachoeira diz ao diretor da construtora Delta no Centro-Oeste, Cláudio Abreu, que Demóstenes vai trabalhar nos bastidores do Senado para abafar a reportagem.
No dia 9, às 23:07, Cláudio pergunta ao bicheiro se ele irá “no almoço com aquele Policarpo” no dia seguinte. Cachoeira responde: “Ah o Policarpo eu encontro com ele em vinte minutos lá no prédio, é rapidinho”.
No dia 10, às 14:43, Cachoeira relata a Cláudio a conversa que teve com Policarpo sobre a reportagem. A conversa, entretanto, não é detalhada pelo inquérito da PF ao qual a reportagem de Carta Maior teve acesso.
No dia 11, às 09:59, Idalberto Matias de Araujo, o Dadá, tido pela PF como braço de direito de Cachoeira, conta ao bicheiro que conversou com repórter da Veja, Hugo Marques, que lhe revelou que o alvo de sua reportagem era “Zé Dirceu e não a Delta”.
O quarto encontro foi com Cláudio Abreu. No dia 29 de junho de 2011, às 19:43, Cláudio disse a Cachoeira que esteve com Policarpo e passou informações sobre licitação da BR 280. As informações foram parar na reportagem “O mensalão do PR”, publicada na edição 2224 da revista Veja e que deu origem as demissões no Ministério dos Transportes.
No dia 7 de julho, às 09:12, Cláudio conta a Cachoeira que “o JR quer falar” com ele. Cláudio: “...to tomando um café aqui, eu, Heraldo e o Dadá, esperando ele.”
Cachoeira: “Que que é JR?”
Cláudio: “PJ, né amigo.”
Cachoeira: “PJ?”
Cláudio: “Pole.”
Cachoeira: “O que?”.
Cláudio: “Engraçado lá, Carlinhos. Policarpo, porra.”
No dia 26 de julho de 2011, Policarpo perguntou a Cachoeira, em telefonema às 19:07, como fazer para levantar umas ligações entre o deputado Jovair Arantes (PTB-GO) e “gente da Conab”. Seis dias antes, a Veja publicou a reportagem “Quiproquó no PMDB”, denunciando o então diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Oscar Jucá Neto, por desvio de dinheiro público. Juca neto pediu demissão um dia depois.
No dia 28, às 17:19, uma ligação interceptada pela PF entre Jairo Martins, o araponga de Cachoeira, e uma pessoa identificada apenas como “Editora Abril” é sucintamente resumida pela palavra “encontro”.
No dia 29, às 20:56, Jairo adianta a um homem chamado Paulo Abreu que a edição de Veja do final de semana “baterá na Conab”, como aconteceu através da reportagem “Dinheiro por fora”. A reportagem traz informações sobre a relação da empresa favorecida pela Conab e o financiamento de campanha de Jovair e de outros políticos de Goiás.
Nos documentos apurados por Carta Maior ainda consta uma ligação telefônica entre Demóstenes e Cachoeira, no dia 18 de agosto de 2011, às 09:34, na qual o senador relata que um repórter da Veja chamado Gustavo está atrás de um “Evangivaldo” e pergunta: “Tem alguma coisa contra esse homem?”. Cachoeira responde: “vou ver aqui e já te falo”. O presidente da Conab na ocasião se chamava Evangevaldo Moreira dos Santos. Ele permaneceu no cargo até 17 de fevereiro deste ano. Em sua carta de demissão, encaminhada à presidente no dia 10, o ex-funcionário disse que “tem sido usado como instrumento de adversários políticos que vislumbram as eleições municipais” em Goiânia.
Invadindo o hotel Nahoum
No dia 2 de agosto de 2011, às 10:46, Jairo Martins, marca encontro por telefone “no Gibão do Parque da Cidade” com “Caneta”, identificado inicialmente pela PF como alguém da Editora Abril. Às 12:04, Jairo informa a Cachoeira que irá almoçar com “Caneta” às “15 pra uma” para tratar “daquela matéria lá (...) que tá pronta”.
Às 14:30, o araponga informa ao bicheiro que “Caneta” quer usar imagens do hotel “pra daqui a duas semanas, que naquele período que ele me pediu, o cara recebeu 25 pessoas lá, sendo que 5 pessoas assim importantíssimas”. Ele também se mostra preocupado e diz que o combinado era não usar as imagens. Cachoeira diz: “Põe ele pra pedir pra mim”.
Às 21:03, Cachoeira revela a identidade de “Caneta”. O contraventor conta a Demóstenes que “o Policarpo vai estourar aí, o Jairo arrumou uma fita pra ele lá do hotel lá, onde o Dirceu, Dirceu, é, recebia o pessoal na época do tombo do Palocci”. Segundo Cachoeira, Policarpo pediu para “por a fita na Veja online”.
No dia 4, às 17:18, Cachoeira fala com Policarpo ao telefone e pede para ele ir encontrar Cláudio Abreu, da Delta, que está esperando. Às 17:31, Cachoeira
diz para Claudio mandar Policarpo soltar nota de Carlos Costa.
Às 17:47, Cláudio pergunta onde a nota deve ser publicada. Cachoeira diz que no “on-line já ta bom”, mas “se for na revista melhor”. Às 18:37, o bicheiro informa ao diretor da Delta que Policarpo “está com um problema sério na revista”, pediu para desmarcar o encontro e receber a nota por email.
No dia 10 de agosto, às 19:11, Cláudio conta ao chefe da quadrilha que estará em Brasília no dia seguinte para falar com “PJ”. Às 19:22, Jairo e Policarpo combinam por telefone um “encontro no churrasquinho”. Às 20:41, Jairo e Cachoeira falam sobre liberação das imagens.
No dia 11, às 08:58, Carlinhos fala a Demóstenes que almoçará com Policarpo. O resumo de uma ligação às 14:09, entre Cachoeira e Cláudio, afirma que “Carlinhos está no Churchill, possivelmente com Policarpo Júnior”. Às 20:05, em conversa com Demóstenes, Cachoeira conta que encontro com Policarpo foi para ele “pedir permissão para o trem lá do Zé”.
No dia 15, às 10:12, Cachoeira orienta Jairo para “matar a conversa com Policarpo”: “nós temos que pedir aquele assunto para ele”, diz. A noite, Jairo e Policarpo marcam encontro. Às 19:04, Policarpo marca encontro com Jairo “em 10 minutos no espetinho”. O resumo de uma ligação entre os dois às 19:26 diz “encontro”.
O resumo de uma ligação às 12:45 do dia 16 descreve: “Carlinhos diz que liberou, que só falta ele liberar. Jairo diz que falta pouca coisa. Acha que hoje ele libera”.
No fim de semana de 27 e 28 de agosto de 2011, a revista Veja deu uma capa com o título “O Poderoso Chefão”, em alusão a influência que o ex-ministro José Dirceu ainda tinha sobre o PT e o governo de Dilma Rousseff. A reportagem trouxe imagens de vários políticos visitando Dirceu dentro do Hotel Naoum, onde ele se hospedava em Brasília, afirmando que Dirceu articulou a queda do então ministro da Casa Civil, Antônio Palloci.
O repórter da Veja, Gustavo Ribeiro, foi acusado de tentar invadir o apartamento de Dirceu. A polícia também investiga como as imagens do circuito interno do hotel foram capturadas. As gravações feitas pela Operação Monte Carlo desvendam parte desta trama.
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Vegas: Gurgel agora usa o que omitiu. Collor está certo
- Publicado em 10/05/2012
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