quinta-feira, 31 de março de 2016

A ousadia descarada do cínico Sérgio Moro

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/A-ousadia-descarada-do-cinico-Sergio-Moro/4/35841




Carta Maior, 31/03/2016



A ousadia descarada do cínico Sérgio Moro



PorJeferson Miola




Em “A cura de Schopenhauer”, o psiquiatra e escritor norte-americano Irvin D. Yalom, ao analisar comportamentos psicopatas, se apóia na expressão iídiche “chutzpah”, que ele traduz como sendo “ousadia descarada, palavra sem uma correspondência exata em outras línguas, mas bem definida na história do menino que matou os pais e depois pediu clemência aos jurados por ser órfão”.

O Juiz Sérgio Moro, nos esclarecimentos remetidos ao juiz do STF Teori Zavascki sobre a interceptação e divulgação ilegal de conversas telefônicas da Presidente Dilma com o ex-presidente Lula, revela os traços de uma personalidade cínica, descarada. Ele parece o personagem saído do livro de Yalom – aquele que conscientemente assassina os pais e depois roga clemência e perdão do Tribunal por ser órfão!

Estamos dentro do vulcão da história, sugados na vertigem dos acontecimentos. Por mais afiadas que sejam as intuições e capacidades de análise, vários acontecimentos e fenômenos sociais relevantes escapam da compreensão imediata. Algumas experiências, por traumáticas demais, às vezes somente podem ser compreendidas na plenitude tempos após sua ocorrência.

Não temos o direito, porém, de menosprezar e subestimar os sintomas e sinais de uma engrenagem perigosa, de contorno claramente fascista, que está em movimento. O juiz Sérgio Moro – e também vários agentes públicos – são peças dessa engrenagem fascista de partidarização do Estado para aniquilar inimigos e adversários ideológicos.

Nas 31 páginas escritas ao STF, ele solicita “respeitosas escusas a este Egrégio Supremo Tribunal Federal” [sic]. Não dedica, contudo, uma única palavra de desculpas às vítimas da violência que perpetrou: Lula e Dilma. Ele, ao contrário, usa o calhamaço para atacar e tripudiar o ex-presidente Lula com ironias e insinuações.

Ele escreveu que “o propósito [da divulgação criminosa das conversas] não foi político-partidário” [sic], que “não teve por objetivo gerar fato político-partidário, polêmicas ou conflitos” [sic].

Mentira! Ele agiu de consciência e partidariamente para impedir a posse do ex-presidente Lula na Casa Civil e incendiar o país junto com a Rede Globo e a mídia golpista, que construíram uma narrativa canalha a partir de conversas coloquiais entre duas autoridades presidenciais.

Moro agiu com dolo, com consciência da lesão irreparável que causaria ao ex-presidente Lula e à Presidente Dilma. Com isso, ele não lesou apenas dois seres humanos, mas violentou a democracia, o Estado Democrático de Direito, a Constituição. Nas palavras do juiz do STF Marco Aurélio de Mello, ele “simplesmente deixou de lado a lei, como fazem os justiceiros.
 

É incabível um pedido de desculpas do Moro. Ele deve, isto sim, ser suspenso do cargo de juiz e responder administrativa e funcionalmente no Conselho Nacional de Justiça e criminalmente no Poder Judiciário.
 

Moro não cometeu simples “erros” que poderiam ser desculpáveis; ele cometeu ilegalidades, abusos e crimes com dolo – e, por isso, deve ser tratado como qualquer cidadão/ã brasileiro/a quando da prática delituosa.

Moro até pode se livrar do julgamento e da condenação na Justiça, se for protegido por um corporativismo que emprega métodos que estão “nas origens do totalitarismo, como diria Hannah Arendt.

Independente disso, Moro já está sendo julgado e condenado pela História.​

Cuidado com o que forem pedir a Zeus


http://www.conjur.com.br/2016-mar-31/senso-incomum-moro-criou-tipo-extincao-punibilidade-pedido-desculpas




Consultor Jurídico, 31 de março de 2016




Moro criou novo tipo de extinção de punibilidade: pedido de desculpas


Por Lenio Luiz Streck




Esta coluna é light. Ficou mais light ainda depois que li a recomendação do procurador-geral da República: Segundo Rodrigo Janot, os integrantes do Ministério Público Federal devem evitar o "messianismo", as "cizânias personalistas" e os "arroubos das idiossincrasias individuais". Ouviram bem, senhores procuradores? Recortei e colei na geladeira de minha Dacha. Vou cobrar.

Sigo. Por isso, não há tese alguma a ser descrita ou defendida no Senso Incomum de hoje. Afinal, quem lê tanta notícia, perguntava Caetano Veloso na canção Alegria, Alegria. O que mais se pode dizer sobre os acontecimentos? Eis a questão. Algumas frases e falas acabaram com a discussão. No caos que se formou, sobra muito pouco. Assim:

O que dizer sobre o direito de Pindorama depois que o professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho fez uma interpretação do impeachment conforme a Constituição norte-americana? Cessa tudo o que a antiga musa canta. Depois da verfassungskonforme Auslegung (interpretação conforme a Constituição, foi lançada a Interpretation des brasilianischen Amtsenthebung (Impeachment) in Übereinstimmung mit der nordamerikanischen Verfassung ou talvez, The Interpretation of the Brazilian impeachment in accordance with the North American Constitution. Portanto, não é necessário provar crime nenhum. Pronto. Magister dixit. Informações que me foram dadas, à socapa e à sorrelfa, pelo jurista G. Camarote (autor do livro em italiano, em 3 volumes, Sapere sempre tutto ciò che accade nel governo e più in impeachment — “sempre sei tudo sobre o governo e até do impeachment”), indicam que Cunha teria mandado a OAB emendar a inicial, por esta não ter fundamentado o pedido na Constituição americana. A ver. As fontes do G.(Rei do) Camarote nem sempre são confiáveis.

Talvez pelo fato de a OAB não ter fundamentado o impeachment na Interpretation of the Brazilian impeachment in accordance with the North American Constitution — tese que parece que vai vingar (e não há nenhuma ironia nisso — apenas uma constatação) — Cunha colocou o pedido na fila. Disse que a OAB chegou tarde. A meu ver, também. Arrisco em dizer que talvez por isso Cunha tenha aproveitado para criticar o exame de ordem. Esse Cunha... Não perde uma oportunidade....

E o que dizer após o mico que o juiz Sérgio Moro pagou ao Supremo Tribunal Federal, pedindo calorosas desculpas em longas 30 páginas? Quando entrei no MP vi uma cena bizarra: um promotor havia pedido, equivocadamente, o arquivamento de um caso escabroso. Fê-lo em 65 páginas. Ao que o velho procurador lhe disse: quem arquiva em 65 páginas, denuncia em folha e meia. Serve para Moro. Muita desculpa. Muito drible. Muito malabarismo verbal. Depois ele se irrita quando os réus não contam toda a verdade. Viu como é, doutor? Por vezes, é difícil explicar o inexplicável. Além disso, Moro criou uma nova espécie de extinção de punibilidade: por pedido de desculpas. Por exemplo, a violação da Lei 9.296, mais o artigo 325 do CP foram considerados como um mero descuido. Ele não imaginou que, mesmo sendo fruto de um “erro” na obtenção das escutas (mormente de Dilma e Lula), isso poderia ter repercussões na vida política. Verbis: “compreendo que o entendimento então adotado possa ser considerado incorreto, ou mesmo sendo correto, possa ter trazido polêmicas e constrangimentos desnecessários. Jamais foi a intenção desse julgador, ao proferir a aludida decisão de 16/3, provocar tais efeitos e, por eles, solicito desde logo respeitosas escusas a este Egrégio Supremo Tribunal Federal”. O STF poderia conceder o prêmio Poliana à Moro. E a reforma do Código Penal pode acrescentar novas hipóteses de extinção da punibilidade: o pedido de desculpas. Mas tem um problema. Devem ser diretas. Sinceras. Como as delações, matéria da qual Moro entende bem demais. Bem, que lê tanta notícia, mesmo?

Camarote — sempre ele (minha fonte preferida) — já me assoprou que parece que o pessoal da Petrobras já está escrevendo longa carta à Moro, pedindo desculpas por alguns crimes. Pedem isonomia. Por exemplo, se Moro for desculpado pelo fato do artigo 325, querem o mesmo desconto de suas penas. Isso sem considerar as penas do artigo 10 da Lei 9.286. Dá um bom desconto.

Que mais aconteceu que valha a pena noticiar? Tem o parecer do PGR sobre o caso Lula. Estamos em fase de muita criatividade. Teses sobre o impeachment, teses sobre a descriminalização via desculpas e, agora, o foro privilegiado misto. Parece que foi tirado de algum direito alienígena também. O parecer é emblemático. Diz que Dilma pode nomear, mas a nomeação tem desvio de finalidade. Ao mesmo tempo, as investigações ficam no primeiro grau... E a Constituição? Deixemo-la prá lá. Lembro de uma seção no Órgão especial do Colégio de Procuradores do MP em que fui membro eleito durante três gestões. Era o julgamento de um recurso de membro do MP. Em determinado momento, fui interrompido em meu voto: “Lá vem o Dr. Lenio de novo com essa história de Constituição”. Pois é. Pois é.

Em termos de Brasilian Law Oscar Premium, parece que a melhor tese até agora — claro, está difícil de escolher — pode ter sido aquela, também tirada do direito norte-americano, de autoria do procurador Pastana. Essa tese é muito estudada em Columbia e se chama Bird sings better when arrested. Positivistas e não positivistas, hermeneutas e argumentativistas se debruçam há anos sobre essa nova teoria. Nas minhas aulas de doutorado há um espaço só para essa discussão. Já há alunos fazendo interface com o direito dos animais. Afinal, passarinho na gaiola… Prender o pobre psitacídeo só para ouvi-lo falar?

No mais, os meios de comunicação estão deitando e rolando com a frase “impeachment não é golpe”. Os grandes juristas contemporâneos da Globo Law School são os maiores experts em como não se deve fazer jornalismo e como se distorce o Direito. Nos programas soliloquias, o jusfilósofo Dr. M. Birne, explica, de forma imparcial, o que é isto — impeachment, a partir de seu livro em alemão Die Größe meiner Wut gegen die Regierung (Minha grande raiva contra o governo, 3a ed, com posfácio de Cunha, Eduardo). Best seller. Cristina Wolf, direto de Brasilia, fala de cadeira. Pudera, depois de ter publicado sua tese doutoral em inglês intitulada The size of my anger against the government (A dimensão da minha raiva contra o governo – 5ª. Ed., revista, com capítulo especial sobre “porque levamos Eduardo Cunha de barbada nos noticiários). Li a ambos e fiquei impressionado.

Nem preciso falar do filósofo contemporâneo W. Bomer, autor do livro What is the best way to present the news in a partial way (qual é o melhor modo de apresentar noticias de modo parcial, 3ª Ed. Revista e atualizada de acordo com o impeachment). Veja-se que a grande maioria dos jornalistas escreveram livros famosos e seguem suas matrizes teóricas ao máximo.

O que mais me resta por escrever?

Ainda para finalizar: seguindo a matriz teórica do best seller do professor Birne (Pereira, em alemão), a IPI (imprensa pindoramense isenta) chegou ao máximo ao colocar no ar um vídeo feito por uma anônima em um shopping, “entrevistando” o ministro Celso de Mello. Fantástico. Ups. Passou no Fantástico, mesmo. Tudo bem, mas fico pensando cá com meus botões: como isso se daria na Alemanha? Um juiz do Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional) sendo gravado/entrevistado em uma grande Kaufhaus? Algo como "Wie geht es dir, mein Freund? Was denken Sie über den Prozess, der das Gericht über den Fall von Kanzlerin Angela..."? (Algo como "o que você acha do processo..."). Provavelmente o juiz diria: "In diesem Vortrag wird es nicht gelingen" (em tradução abrasileirada, algo como "Minha Senhora, essa conversa não vai rolar").
Nem vou falar da NBC entrevistando o Judge Clarense, em um shopping em Washington. Minha dúvida — em face de minha ingenuidade — é: essa gravação foi autorizada? Sei lá. Em tempos de escutas clandestinas... Todos escutam todos. E quem fará a Grundescuta (a escuta fundamental, algo como a Grundnorm?). O ministro autorizou a divulgação no Fantástico? A senhora anônima vendeu o vídeo? Tem assinatura do ministro autorizando? A tal senhora estava usando crachá?[1] Pode-se gravar pessoas sem usar crachá?

Se ainda há algo a dizer, perguntaria — agora de forma absolutamente séria: Cansamos da democracia? Se não, vamos levar o Direito a sério. E cumprir a Constituição, sem ideologizar tudo. Deve ter restado um mínimo de racionalidade. Se a resposta for, sim, cansamos, sugiro a leitura de duas fábulas. A primeira é de Ésopo: as rãs, cansadas da democracia, pediram a Zeus que lhes desse um rei. Rindo dessa ingenuidade, Zeus lhes deu um pedaço de pau. Como esse “rei” não se mexia, reclamaram com passeatas na lagoa. Zeus se irritou e lhes deu um novo rei: uma cegonha... que comeu as rãs.

A segunda é do Barão de Mandeville. Ali também as abelhas estavam cansadas da democracia e dos vícios. A colmeia ia bem, mas havia muitos vícios. Então as abelhas moralistas fizeram passeatas, colheram milhões de assinaturas e pediram que a rainha decretasse a virtude. Feito isso, iniciou o caos. Uma sociedade sem vícios — portanto, sem política e políticos da base e fora da base aliada da Rainha — não tem crimes, não tem doentes, não tem stress, não tem trabalho para advogados, policiais, procuradores, juízes... Nem jogo do bicho tem. Quebrou. Caos. As abelhas se deram conta e voltaram à Rainha e pediram: restaure os vícios, porque — e essa é a moral da história — vícios privados, benefícios públicos. Não existe essa coisa de “só virtudes”, “eugenia social”, etc. Eis aí uma fábula liberal, é verdade. Em tempos de guerra entre esquerda e direita, é possível que todos a critiquem. OK. Está bem. Então, fiquem com a de Ésopo. Ignorem a de Mandeville. Não quis ofender... Como constitucionalista (mas limpinho), só estou tentando ajudar. Lembremo-nos da recomendação do Procurador-Geral da República: paz. Serenidade. E sem idiossincrasias.

E cuidado com o que forem pedir a Zeus.

Post scriptum: na próxima, se Pindorama ainda estiver por aí, escreverei sobre o projeto do Código de Processo Penal.

1 Lembro do personagem de Francisco Milani, na Escolinha do professor Raimundo, Pedro Pedreira (Pedra 90). Ele pedia: tem documento? Testemunhas? Reconhecimento de firma?

Lenio Luiz Streck
 é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito.

Impeachment pode ser golpe, sim

 
Paulo Henrique Amorim: Crise moral? Não! É reacionarismo mesmo!  





http://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2016/03/1755816-olhares.shtml



Folha.com, 31/03/16



Olhares

 
Por Janio de Freitas




Se a Justiça fosse cega, não precisaria de venda nos olhos.
 
Cada magistrado, cada advogado, promotor e procurador vê o que quer, como qualquer de nós outros, nas fatias de realidade ante os seus olhos. Mas têm à sua disposição uma vantagem decisiva: no Direito há bases teóricas para todos os gostos e todos os lados. E a escolha entre elas, por mais que os seus usuários apregoem um caráter científico do Direito, sempre traz a marca indelével do critério pessoal. Nele incluída a dose individual de ética.

Tudo na atual crise tem envolvimento jurídico, seja ou não predominante. A divergência manifesta-se em cada ponto, decorrendo tanto da variedade de conceitos como das influência íntimas ao adotá-los, tantas delas bem conhecidas. Mas às vezes a influência tem sido mais forte do que os conceitos. Ou assim parece. E o resultado não é bom para o que importa à Justiça com ou sem venda.

Vários ministros do Supremo, por exemplo, como Celso de Mello, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso, pronunciaram-se sobre impeachment de modo muito semelhante. As palavras do último representam muito bem as dos demais: "Impeachment não é golpe. É um mecanismo previsto na Constituição para afastamento de um presidente da República. Mas com respeito à Constituição e às normas". E, dirigindo-se a parlamentares: "O que os senhores decidirem vai prevalecer. O Supremo não tem pretensão de fazer juízo de mérito nessa matéria".
 
Logo, impeachment pode ser golpe, sim. O que determinará se é ou não será o processo que a ele conduza. Collor deu muitos motivos para ser pretendido o seu impeachment, mas o adotado foi o mais simplório por ser o que, até àquela altura, menos suscitava questionamentos de adequação "às normas e à Constituição": o uso doméstico de um modesto Fiat Elba presenteado pela fábrica.

No caso atual, todo ministro do Supremo conhece as manobras e os vícios do processo de impeachment. Entre eles, nada menos do que sua instauração na Câmara como represália pessoal aos votos governistas, no Conselho de Ética da Casa, para o processo contra o deputado denunciado ao próprio Supremo por delinquências várias. Tudo fora das "normas e da Constituição".
 
O pedido de impeachment ora discutido não é documento jurídico, é ataque raivoso. O novo pedido, da OAB, foi dado pelos signatários como "técnico". Na forma, admite-se. Mas se valer, e tanto, de uma delação premiada (ainda) não submetida a investigação alguma, de um acusado que se desastrou exatamente por prática de mentiras e fantasias, e agora ansioso por transbordar acusações como Roberto Jefferson para embrulhar sua situação – a OAB não encontrou nada melhor do que a delação premiada de Delcídio do Amaral?

A menos que possa assegurar que os votos do novo ministro Marcelo Navarro no STJ, pela libertação de Marcelo Odebrecht e Otávio de Azevedo, presos há nove meses por que não fizeram delação premiada, não foram votos por convicção, mas por má-fé. Disso, porém, o documento da OAB não dá sequer indício aceitável, baseando-se na mesma delação de Delcídio.

Nas explicações cobradas pelo ministro Teori Zavascki, o juiz Sergio Moro dá o seu motivo para liberar as gravações telefônicas de Lula, Dilma e outros: "Era a melhor maneira de prevenir novas condutas ou tentativas de obstrução ou intimidação da Justiça". Mudou. A explicação que deu no dia era "o direito dos governados de saberem como agem os governantes". Mudou, mas não para melhor. Porque a ideia de Justiça intimidada já é extravagante, quanto mais por um telefonema privado de pessoas sitiadas.
As oftalmologias têm avançado muito.


​​
IHU, ​30/03/2016


Processo de impeachment é artifício para dar ares de legalidade a golpe parlamentar


Por Patricia Fachin ​



Luiz Moreira é graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará — UFC, mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais — UFMG e doutor em Direito pela UFMG. É Diretor Acadêmico da Faculdade de Direito de Contagem. Na avaliação do advogado e professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Contagem, MG, “é clara a tentativa de se dar forma jurídica a um golpe parlamentar”.

 
Como o senhor está acompanhando as investigações da Operação Lava Jato?
 
Lava Jato transformou o combate à corrupção em mote para estabelecer um vale tudo, em que o combate à corrupção é utilizado para legitimar o desapego à Constituição e ao devido processo legal. Entre nós não há mais quem esteja a salvo das investidas da jurisdição de Curitiba.
 
O projeto é claro: há em curso um projeto que estabelece supremacia do sistema de justiça criminal sobre a democracia. Essa supremacia consiste no estabelecimento da pauta política pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pela polícia. O roteiro é por todos conhecido: foi estabelecida aliança entre eles e a mídia, com o propósito de obter apoio de parcelas da população às chamadas fases da operação Lava Jato. Assim, a ordem constitucional é afrontada e as autoridades judiciárias, submetidas aos caprichos da jurisdição de Curitiba.

Recentemente o juiz Sérgio Moro chegou a divulgar diálogo envolvendo a presidente da República e fez comentários sobre Ministros do STF, sobre a honorabilidade deles etc., em clara demonstração que ele se vê como o demiurgo desta República.



De que modo a Lava Jato está "legitimando o desapego à Constituição"? A que especificamente o senhor se refere?


Os procedimentos na Lava Jato não são corretos, não há distinção entre os que investigam, os que acusam e o que julga. A ampla defesa é desrespeitada, os advogados são criminalizados, a presunção de inocência inexiste, há um desprezo aos direitos fundamentais dos acusados, cuja imagem e cujas intimidades são enxovalhadas, além da utilização deliberada da mídia para blindar suas condutas.

Enfim, as normas constitucionais e a legislação de regência foram substituídas por um desejo utilitário de sucesso na empreitada e pela busca de notoriedade, em que prepondera um vale-tudo judicial.



Qual deve ser o papel do STF em relação à Operação Lava Jato?


O Supremo Tribunal Federal tem-se mostrado incapaz de entender seu papel como tribunal dos direitos fundamentais, como tribunal contramajoritário. Também não entendeu o papel da mídia e da opinião pública nas sociedades complexas e como cabe aos seus ministros, justamente, funcionar como anteparo aos caprichos da maioria.

É constrangedor verificar que o STF adota papel relevante na afirmação dos direitos atinentes à personalidade, de cunho comportamental, e tenha, ao mesmo tempo, incentivado a adoção no Brasil do direito penal do inimigo, consubstanciado no discurso da lei e da ordem, atribuindo ao aprisionamento e ao cumprimento da pena, em regime fechado, um papel civilizatório.
 
Analisando as decisões do STF, é fácil verificar a substituição de uma argumentação sólida em termos jurídicos por uma argumentação senso comum, em que a constitucionalidade cede lugar ao moralismo e ao decisionismo. Portanto, o STF está muito aquém do que dele se espera.


O que o senhor entende por “judicialização da política” e como esse fenômeno se deu, por exemplo, no Mensalão e está ocorrendo no desenvolvimento da Operação Lava Jato?


judicialização consiste na intervenção judicial em todos os aspectos da vida. No Brasil, isso se constitui como tentativa de o Judiciário se imiscuir em todas as áreas, substituindo-se ao Legislativo e ao Executivo. Todos os dias temos notícias de liminares afastando aplicação da lei ou de decisões judiciais que passam a valer no lugar de políticas públicas.

No Mensalão houve quem dissesse que o STF tomou decisões constrangido pela mídia, com a “faca no pescoço”. Tanto no Mensalão quanto na Lava Jato é óbvia a utilização da mídia para alcançar-se um determinado fim, cujo propósito é o contorno às garantias constitucionais dos acusados e a substituição do direito pela vontade do juiz, assim como a troca de papéis entre ministério público e magistrado, de modo que o juiz passa a ser também o acusador.



Entre as discussões dos últimos dias, destaca-se a da atuação do governo e do PT como tentativa de obstruir as investigações da Operação Lava Jato. Houve ou não tentativa do governo e do PT de obstruir as investigações?


Obstrução? Muito ao contrário. O Ministério da Justiça foi absolutamente leniente na condução das infrações à ordem constitucional promovidas pela Polícia Federal. Há notícias de escutas ilegais, de vazamentos e de quebra das rotinas policiais que seguem sem apuração.
 
Espera-se que o Ministro da Justiça não permita que a Polícia Federal se transforme em polícia política e que o governo tenha um projeto claro para a Polícia Federal, pois não é possível que a agenda dos delegados federais, cujo mote é sua autonomia e o combate à corrupção, continue a desestabilizar os poderes constituídos.



O Ministério Público tem recebido tanto críticas como apoio pela condução da Operação Lava Jato. Como, na sua avaliação, ele tem agido e como deveria agir à luz da Constituição? Pode pontuar quais são os erros e acertos da Operação até o momento?


Acertos? Cumprir obrigação funcional é dever dos membros do Ministério Público. Vejo com pesar que o Ministério Público Federal tenha perdido seu caráter de vanguarda e que tenha tão facilmente adotado o corporativismo como mote à sua atuação. Um exemplo é a campanha patrocinada por eles de combate à corrupção.
 
​Qualquer um com um mínimo de senso crítico perceberá que o Ministério Público Federal não adota para si as regras que prega para os outros. Exemplo disso é o apego às normas de seu processo disciplinar, que impedem qualquer punição às infrações cometidas por procuradores da República, ou ainda as diversas vantagens que percebem sem previsão legal.


Em que consistia o caráter de vanguarda do MP, o qual está se perdendo, conforme o senhor aponta?

A vanguarda no MP consistiu na tutela dos direitos difusos e coletivos, dos direitos sociais, do direito ambiental. Hoje prepondera a busca por causas que resultem em notoriedade e forte repercussão.
 
Hoje, muitos analistas falam em “golpe”. Que tipos de ações caracterizariam um golpe hoje? Estamos caminhando para esse cenário ou não?

É clara a tentativa de se dar forma jurídica a um golpe parlamentar. No Presidencialismo só se admite interrupção do mandato presidencial se houver crime de responsabilidade. Não havendo crime de responsabilidade, não há condições de falar em impeachment, ou seja, para haver impeachment é preciso que a presidente da República tenha praticado ato tipificado como crime de responsabilidade. Assim, é absolutamente imprescindível que a infração presidencial esteja descrita como crime na lei que define quais são os crimes de responsabilidade.
 
Se não houver conduta tipificada como crime de responsabilidade, não há impeachment, mas golpe. Não se admite que mera insatisfação com o governo ou com a pessoa da presidente seja motivo para interromper seu mandato. Tampouco a aprovação presidencial em pesquisas de opinião podem levar ao impeachment. Portanto, o processo de impeachment hoje em curso na Câmara dos Deputados é claramente um artifício para dar ares de legalidade a um golpe parlamentar.

 
Há ou não razões para o impeachment da presidente Dilma?

Não, não há. Dilma Rousseff não cometeu qualquer crime de responsabilidade
. Eventuais fragilidades de seu governo na área econômica, ou eventuais atropelos na condução dos arranjos políticos ou ainda eventual falta de carisma pessoal não autorizam a interrupção de seu mandato. O que se tem em marcha é um golpe parlamentar que não pode ser confundido com impeachment.

 
Esse momento de crise política também coloca em pauta a necessidade de discutir uma reforma no Judiciário? Está clara qual é a função do Judiciário? Dado que os ministros do STF são escolhidos pela presidência, isso também não interfere na autonomia para julgarem?

Aos governos eleitos compete legitimar a atuação do Estado. Por quê? Porque o Estado não tem legitimidade. Essa legitimidade é obtida nas eleições, com o voto. Desse modo, cabe aos governos eleitos ditar a pauta de atuação do Estado. É exatamente por isso que existem eleições periódicas, para que haja renovação da legitimidade das decisões governamentais. Então, é tarefa do governante indicar determinados postos do Estado, como embaixadores e membros do Judiciário. Essa questão é absolutamente normal nas democracias constitucionais.
É necessária uma reforma ampla que permita ao eleito governar, uma engenharia constitucional que permita protagonismo da política, que está subordinada aos órgãos de controle. Além disso, o Judiciário não pode ser tido como poder moderador, como poder que está acima dos poderes políticos.

 
Como avalia a decisão do ministro Teori Zavasck, que atendeu ao pedido da AGU e determinou que as investigações da Operação Lava Jato sobre o ex-presidente Lula sejam enviadas ao STF? Qual é o significado dessa decisão?


Sérgio Moro adotou contra o ex-presidente Lula medidas que flagrantemente violam o direito brasileiro. Conduziu-se de modo arbitrário e ilegal. Nesse sentido, tendo constatado as violações à ordem jurídica perpetradas por Sérgio Moro, o ministro Teori Zavascki conduziu o processo à normalidade constitucional. Além de discreto e prudente, o ministro Teori Zavascki assegurará ao ex-presidente Lula a oportunidade de defender-se ante um juízo imparcial, que não se utiliza da técnica jurídica para fazer justiciamento.

 
Na última quarta-feira (23/03), o juiz Sérgio Moro decretou o sigilo da lista de políticos beneficiados pela Odebrecht, mas a lista vazou. Qual é o impacto disso, considerando as investigações? Como avaliar esse tipo de vazamento? É possível responsabilizar alguém por ações como essa?

A decretação do sigilo foi ato posterior à divulgação da lista. Quer dizer, após a lista ser amplamente noticiada, a partir do levantamento do sigilo determinado por Sérgio Moro, ele voltou atrás e decretou o sigilo da lista. Esse fenômeno torna claro que, na Lava Jato, os vazamentos são reiteradamente utilizados como método judicial de constrangimento de cidadãos.

É evidente também que esse "voltar atrás" é medida adotada para que haja adequação ao despacho do ministro Teori Zavascki, em que houve rigorosa censura à conduta de Sérgio Moro. No entanto, a decretação do sigilo veio tarde demais, uma vez que a lista obteve grande repercussão. Embora muitos dos que são citados tenham prerrogativa de função (foro privilegiado), Sérgio Moro não viu problemas em retirar da lista seu sigilo legal. Com isso, mais uma vez, contrariou a Constituição e a legislação de regência, além de usurpar competência do STF.

quarta-feira, 30 de março de 2016

A imposição do medo à maioria da população


http://pcb.org.br/portal2/10663



Resistir, 30/03/16



A imposição do medo à maioria da população



Entrevista concedida a Cátia Guimarães





A historiadora Virgínia Fontes é coordenadora do Programa de Pós-graduação da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fiocruz, e professora da Universidade Federal Fluminense.  
Respondendo a três perguntas de análise de conjuntura do Portal EPSJV, ela identifica tanto causas econômicas quanto movimento de autopreservação nas posições que o grande empresariado e partidos da oposição têm assumido na crise política.


No esforço de entender o cenário atual, que leitura você faz do que está acontecendo no país?
 
O que está acontecendo é um processo muito complexo e que não é linear. Vamos pegar os principais elementos. Nós temos uma crise econômica, portanto uma baixa da taxa de lucro. Crises econômicas são normais na sociedade capitalista. Estamos diante de uma crise capitalista que tem relação com a burguesia brasileira mas ela não justifica alguma coisa do que está acontecendo aqui. O segundo ponto importante de se levar em conta é que provavelmente existe uma briga interburguesa, embora na imprensa burguesa mais direta isso não apareça. Alguns leram essa briga interburguesa como sendo a oposição entre burguesia industrial e financeira ou uma burguesia mais brasileira contra a imperialista. Eu não concordo. Provavelmente a briga que está acontecendo agora é o que eu chamaria de briga de cachorro grande. Desde os governos Fernando Henrique e continuando nos governos Lula, houve impulso e apoio para concentração e centralização do capital no Brasil. Com as privatizações do governo Fernando Henrique, com a legislação para exportação de capitais do governo Fernando Henrique e depois com a atuação do BNDES para montar as campeãs nacionais no governo Lula. É preciso lembrar que o BNDES no governo FHC também financiou a privatização com moeda podre. Portanto, nós temos órgãos de Estado agindo no sentido de consolidar burguesias de alta potência desde o início dos anos 1990. Estimular concentração e centralização do capital significa que esse capital precisa se reproduzir para dentro e para fora. Essas empresas se converteram em multibrasileiras. E, como acontece com as multi em qualquer lugar do mundo, isso significa enfrentar tensões políticas para fora e ser capaz de acalmar para dentro. O que está acontecendo no Brasil? Tudo indica que a tensão burguesa hoje é de escala: massa de burguesia de menor escala, num momento de crise, briga com as suas congêneres maiores. E briga pelo que tem de política pública. Não briga contra a corrupção, ela quer um pedaço para ela. Porque o problema do Brasil não é corrupção, o problema é o funcionamento regular do Estado, que é podre, porque a burguesia está dentro do Estado. Tem que controlar a corrupção, mas ninguém nunca vai controlar a corrupção se é a própria burguesia que determina o que a política pública vai fazer. Portanto, essa briga de escala é bastante silenciada, mas expressa uma série de outras tensões para as quais a gente não está dando atenção.

Vamos pegar dois pontos. Quem hoje a Fiesp representa? A Fiesp saltou da posição de suporte e participação no governo Dilma para a defesa do impeachment e da renúncia. É a Fiesp ainda representante de todo o conjunto da burguesia brasileira? Não sei. Não sabemos. Uma parcela dessa burguesia provavelmente não está encontrando na Fiesp o seu ponto de sustentação. E eu ouso dizer que há uma questão regional na disputa interburguesa entre o paulistocentrismo e as grandes burguesias que foram se construindo no agro, na indústria e na mineração, e que não necessariamente estão centradas só em São Paulo. Portanto, tensão interna da burguesia tem. Essa burguesia toda se beneficiou dos governos Lula. Ora, montar uma multi é abrir área de tensão com os aliados. É abrir brigas muito maiores entre grandes empresas. É lidar como imperialista com os imperialistas. Mas não há estofo na burguesia brasileira para sustentar isso em situação de crise. Porque teria de sustentar duas coisas: o Estado como garantidor da política para fora e o apaziguamento para dentro para que isso consiga acontecer. Nos últimos cinco anos, se estreitou bastante o espaço para o aumento dessas novas multi oriundas de países capitalistas mais recentes, como os BRICS. Portanto, a briga de cachorro grande ficou sem sustentação interna. Marcelo Odebrecht foi o único que pegou 19 anos na cadeia. Terceiro ponto de tensão nessa burguesia, e que eu não acho irrelevante: eles estão com medo. Estão se debatendo, com medo de ser presos. Aliás, eu acho que a frase da Fiesp é esclarecedora: “Não vamos pagar o pato”. Ou seja, eles não vão para a cadeia, vai o resto do mundo inteiro, mas eles não. É a frase mais transparente que eu já vi do tipo ‘nenhum burguês na cadeia’. Ontem [a colunista] Monica Bergamo confirmou as minhas suspeitas. Segundo ela, está todo mundo esperando que a aceleração no processo da Lava Jato e um eventual término do governo Dilma, ao retirar do foco a questão que move a operação, possa esfriar o processo da investigação. É exatamente isso. O que se trata agora é de controlar, essa burguesia tem medo. Como fez Fernando Henrique Cardoso controlando com o famoso engavetador-mor da República, o Geraldo Brindeiro, que impediu todos os processos sobre a burguesia.


Como estão distribuídos os diferentes segmentos da sociedade nesse processo?

Todos esses que eu citei são pontos de tensão na burguesia. Não dá para dizer que a classe trabalhadora está toda homogênea aí. Porque a atuação do PT foi de segmentação, tanto para garantir a sustentação do próprio PT quanto quando abriu a porteira para as políticas do grande capital. A classe trabalhadora foi segmetada, perdeu capacidade convocatória, perdeu capacidade de mobilização porque o PT não queria mobilizar. E colocou-se cada vez mais à disposição das tensões internas da burguesia. Ora, o interesse do PT para o capital era sua capacidade mobilizatória. Perdida essa capacidade, para que serve o PT? Mas pode essa burguesia acabar com o povo brasileiro? Não, não pode. Ela vai precisar achar outro percurso que justifique um apaziguamento qualquer para essas massas. Quem vai ser a nova esquerda para o capital ninguém sabe porque o que está aparecendo até agora é só uma direita endurecida, muito truculenta, constituída de brancos de classe média que não representam a massa da população, mas que têm tido uma presença exacerbada tanto na mídia quanto na rua e nas redes. Uma direita completamente desequilibrada. O discurso que unifica tudo isso é o anticomunismo, raivoso, agressivo, violento, absolutamente antidemocrático. Mas não tem comunismo! Quem está fazendo comunismo aqui? O argumento é paulistocêntrico, totalmente de São Paulo, que é a história dos petralhas. Como se o PT condensasse nele próprio todas as características de todas as esquerdas de todos os períodos históricos na existência. E como se ele tivesse feito esse papel, que não fez. O que está acontecendo é uma sequência de golpes que eu chamaria de golpes moles, gelatinosos, mas com muita mídia – a mídia participa disso -, todos por dentro da institucionalidade. Qual é o papel de cada peão nesse jogo? Eu falei de burguesia, falei de classe trabalhadora. Agora, que partidos nós temos? Quais partidos são efetivamente nacionais, têm uma implantação no território nacional inteiro? Só tem dois a meu juízo: PT e PMDB. O PSDB se forma e se consolida como um partido paulista, no máximo em aliança – e eventual porque não consegue emplacar alianças de longa duração – com algum estado, fundamentalmente os estados tradicionais da riqueza no Brasil: Paraná, Rio de janeiro, Minas Gerais, eventualmente um ou outro no Nordeste. Não é um partido cujo desenho seja realmente de implantação nacional. Tentou surfar nessa onda para se converter em partido nacional, mas não conseguiu. Agora ele se dá conta de que qualquer governabilidade passa pelo PMDB. E, portanto, os primos-irmãos PSDB/PT vão tender a fazer a mesma coisa, a não ser que o PSDB agora aceite virar PMDB, voltar aos braços de onde nasceu. Do ponto de vista partidário, a configuração é dramática. O PMDB está afundado até o pescoço; o PSDB, nós sabemos que está, embora isso esteja oculto, mas na hora em que se puxar a correia do PMDB, o PSDB vai, como foi o PT. De novo, eles têm que ter medo. E eles estão querendo derrubar o governo rápido para brecar essa operação Lava Jato. Vão botar alguma figuração bonitinha para o Sergio Moro, ele vai continuar com uma bandeirinha prateada sacudindo na rua, fazendo algum estardalhaço, vai ter direito a muita mídia, muito jantar, muito champanhe com empresário.


Quais são os riscos identificáveis hoje nessa conjuntura?

Estamos assistindo a uma redução brutal da capacidade popular de se expressar. Vivemos a evidência da amputação que esse tempo de FHC mais governos Lula/Dilma significou como perda de capacidade organizativa da classe por baixo. As contradições não sumiram: a massa de trabalhadores é maior, as condições desses trabalhadores são piores, portanto, os problemas vão aparecer e rápido. E não tem ditadura militar que possa resolver esse tipo de problema. Portanto, as tensões todas estão presentes. A gente não tem partidos capazes de dar conta da expressão dessas tensões. O PSDB está rachado em São Paulo. Estamos diante do risco de uma redução significativa de direitos, que já está acontecendo; a consolidação de uma força de direita, ao mesmo tempo institucionalizada e não-institucionalizada, que não é exatamente partidária, porque não cola só com os partidos. É como se você tivesse a revista Veja perambulando pela rua: racismo, sexismo, discriminação social pesada, como elemento norteador das formas sociais. Isso é dramático porque é muito amedrontador num país já povoado de milícias e de uma polícia completamente truculenta. Isso significa que milícias passam a ter uma configuração ainda mais subordinada à grande propriedade e ainda menos subordinada a qualquer elemento de legislação. Esse é um processo de direitização que não é só político, é também social. Um processo de direitização significa imposição do medo à maioria da população, quer seja pela violência, pela perda de emprego, quer seja simplesmente pela desqualificação da sua presença num lugar não desejado. Eu acho que os riscos são altos. Se é verdade que a democracia é algo muito limitado — porque procura esvaziar a vida social dos conflitos, trazendo todos para o terreno da representação —, ao menos esse espaço para conflitos, teoricamente, ela abriria. E, portanto, por esse espaço, você teria como aglutinar forças. Se isso é agora eliminado pelo judiciário, pela mídia e por uma espécie de conjugação de partidos que capturam, eliminam e invertem a expressão real do voto, isso significa que os espaços estão fechados. É uma ditadura? Institucionalmente, não. Na prática, é uma ditadura do capital de forma muito brutal. Isso não significa que as contradições estejam controladas, portanto essas lutas vão aparecer, mas agora vão ter que se defrontar com uma direita que ganhou espaço, ganhou fôlego, ganhou gordura nesses últimos tempos. Só participando desse processo de enfrentamento é que a gente vai poder saber.

terça-feira, 29 de março de 2016

Golpe: O hoje, o amanhã e o depois


http://jornalggn.com.br/noticia/o-hoje-o-amanha-e-o-depois-por-wagner-iglecias#.Vvr3NZLS8Zs.facebook



Jornal GGN, 29/03/16



O hoje, o amanhã e o depois


 
Por Wagner Iglecias
 



HOJE: Ao que parece conspirações frenéticas estão acontecendo com objetivo de aprovar rapidamente o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Contra ela não há crime comprovado. Diferentemente do que acontece com seus algozes. Na Folha de hoje a insuspeita jornalista Mônica Bergamo já adiantou o que está acontecendo: o PMDB desembarca do governo e acelera o processo de impeachment, a ser conduzido por Eduardo Cunha. O qual já teria fechado acordo com Michel Temer para não ser cassado. Aprovado o afastamento de Dilma, Cunha deverá renunciar à Presidência da Câmara, mas continuará deputado, mantendo o direito ao foro privilegiado.

AMANHÃ: O provável governo Temer será baseado numa aliança entre os irmãos siameses PMDB e PSDB. Um mix entre pessoas como Temer, Serra e Renan, entre outros. Especula-se que Gilmar também poderia fazer parte deste governo. É algo muito difícil de acontecer, no entanto especula-se também que Sérgio Moro possa vir a ser indicado para uma vaga no STF pelo novo governo.

DEPOIS: Deverá ser implantada uma duríssima agenda de ajustes econômicos, com o peso recaindo exclusivamente sobre os trabalhadores (os pobres e os de classe média). O discurso de peemedebistas e tucanos é previsível: dirão que Dilma arrasou o país e que agora será preciso cortar na carne para recolocar a economia nos trilhos. O rolo compressor da direita deverá impor diversas medidas, não apenas econômicas, como as citadas abaixo:

a) o fim de qualquer tipo de indexação para o reajuste dos salários e dos benefícios previdenciários, prevalência das convenções coletivas entre patrões e empregados sobre as normas legais e terceirização total do mercado de trabalho, acabando na prática com a legislação trabalhista prevista pela CLT (possibilitando a informalização e a precarização completa da mão de obra, com facilitação inclusive para práticas de trabalho infantil e atividades análogas ao trabalho escravo);

b) desvinculação da Constituição dos gastos mínimos obrigatórios dos governos com saúde e educação;

c) privatização de todas as empresas estatais, nos âmbitos federal, estadual e municipal;

d) regulamentação da autonomia do Banco Central (que poderá passar a fazer política monetária a seu bel prazer e ao bel prazer dos rentistas, independentemente da vontade do Poder Executivo);

e) fim da exclusividade da Petrobrás na exploração do Pré-Sal e reinstituição do regime de concessão, de óbvio interesse das petroleiras estrangeiras; 

f) fim da política de subsídios governamentais à política industrial e ao comércio exterior brasileiro; 

g) fim do uso dos recursos do FGTS para financiar a expansão da política habitacional (Minha Casa Minha Vida);

h) cortes nos recursos dos programas de financiamento à educação superior (FIES e ProUni) e cortes nos recursos dos programas de formação técnica (Pronatec); 

i) intervenção no Sistema Único de Saúde (SUS) (provavelmente visando a diminuição do repasse de recursos à saúde pública); 

j) duro reajuste das tarifas públicas (energia elétrica, gás, telefonia, pedágios etc.); 

k) forte mudança na Política Externa, afastando o Brasil do Mercosul, da Unasul e dos BRICS e redirecionando o país para acordos com os USA e a União Européia; 

l) instituição do Estatuto da Família (que prevê como único tipo de família aquela formada por pai, mãe e filhos)

m) instituição do Estatuto do Nascituro (que ameaça os direitos reprodutivos das mulheres)

n) instituição do Estatuto do Desarmamento;

o) transferência ao Congresso Nacional da questão da demarcação de terras indígenas, hoje sob incumbência do Poder Executivo;

p) regulamentação de parcerias público-privadas para a administração do sistema penitenciário em todo o país;

q) Instituição da redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos;

r) alteração da Constituição para que entidades de cunho religioso possam propor Ações de Constitucionalidade perante o STF;

s) engavetamento de qualquer projeto de Reforma Agrária mais consistente;

t) engavetamento de qualquer projeto de regulação da propriedade dos meios de comunicação;

u) regulamentação da compra de terras por estrangeiros;

v) alterações na Lei de Biossegurança de modo a favorecer os fabricantes em detrimento dos consumidores;

w) regulamentação da dispensa de servidores públicos por insuficiência de desempenho; 

x) estabelecimento do Código da Mineração, que favorece as grandes mineradoras; 

y) engavetamento de qualquer projeto de Reforma Política que vise o aumento do poder do cidadão / eleitor; 

z) engavetamento de qualquer projeto de Reforma Tributária de caráter progressivo, voltado a tributar mais os mais ricos e menos os mais pobres;

za) reforma da Previdência, de caráter prejudicial aos trabalhadores.

E tanta gente por ai achando que tudo se resume ao "combate à corrupção".

Poder Judiciário partidarizado?


http://www.conexaojornalismo.com.br/colunas/politica/brasil/desembargador-reage-a-modelo-moro-e-pergunta-poder-judiciario-partidarizado-73-43264



Conexão Jornalismo, 29 de Março de 2016



Poder Judiciário partidarizado?


Da Redação


 Desembargador do Tribunal de Justiça de Alagoas, Tutmés Airan de Albuquerque Melo é um magistrado diferente de boa parcela dos que conhecemos por aí: não é corporativista. Costuma falar em nome da razão e dos seus estudos sem recorrer ao velho dilema dos colegas que se travam para não se indispor com colegas - mesmo violentando a consciência - quando não, o direito. Neste artigo ele mergulha em documentos e publicações nas quais aponta um conjunto de erros que revelam a partidarização do judiciário brasileiro - uma praga que pode custar a nossa democracia.



Tutmés Airan de Albuquerque Melo*


A guerra política instaurada no Brasil, que pode levar ao impeachment da presidenta Dilma, tem vários ingredientes. Nenhum deles, talvez, nem mesmo a atuação da mídia, tem despertado mais polêmica do que as decisões judiciais que brotam do conflito.

A ideia deste texto é, a partir da análise de algumas dessas decisões, tentar entender o porquê da polêmica e, entendendo o porquê, refletir sobre as suas consequências em relação à própria existência do Poder Judiciário e à sua capacidade de ser, numa crise desse tamanho, um mediador para o conflito.

Mãos à obra.


1ª DECISÃO

A Revista Veja, ano 48, edição nº 44, com circulação no mês de novembro de 2015, em sua capa, estampou uma foto do ex-presidente Lula com trajes de presidiário, atrás das grades.

Sentindo-se ofendido em sua honra e imagem, propôs ação de indenização por dano moral contra a Editora Abril S/A, processo distribuído para a juíza Luciana Bassi de Melo, titular da 5ª Vara Cível do Foro Regional XI de Pinheiros, Comarca de São Paulo.

Julgando o conflito, inclusive de forma antecipada, sua excelência decidiu que o ex-presidente Lula não tinha razão.

É certo, como sustenta Kelsen [1] , que decidir é um ato de escolha entre alternativas possíveis. Isso não quer dizer ou sugerir que o Estado dê um cheque em branco para o juiz decidir como quiser.

É que, não obstante tenha uma margem considerável de poder para construir a sua decisão, todo juiz sabe ou pelo menos intui que há interpretações-limite sobre o sentido e alcance dos textos normativos, a partir das quais tudo o mais não passa de uma tentativa autoritária de fazer prevalecer a vontade pessoal em detrimento dos limites impostos pela legalidade.

No caso em análise, embora tenha procurado ancorar a decisão em precedentes jurisprudenciais, para fazer prevalecer a sua vontade a juíza não hesitou, inclusive, em falsear a realidade, porque somente a falseando poderia decidir como decidiu.

Vejamos.

Chama a atenção uma passagem da sentença na qual, enfaticamente, sua excelência, em mal português, disse que a capa da revista não havia inventado nada, deturpado ou distorcido notícias a respeito do autor. Como não?!

Colocá-lo na capa de uma revista de circulação nacional vestido de presidiário, e atrás das grades, é absolutamente incompatível com o fato de que até hoje o ex-presidente Lula não tem contra si nenhum processo penal em tramitação e muito menos condenação, mesmo não transitada em julgado, capaz de sugerir ou indicar que ele poderia ser eventualmente colocado, em consequência de um processo ou de uma condenação, na condição de prisioneiro.

A toda evidência, pois, a capa da revista não se limitou a narrar ou criticar um fato real. Antes, criou um fato conveniente aos seus interesses na perspectiva clara de desconstruir a imagem de um homem que, até que se prove o contrário, é inocente e como tal deve ser, por imperativo constitucional, tratado.

Ao não reconhecer o óbvio - a ofensa à honra e à imagem do ex-presidente Lula -, sua excelência fez imperar uma espécie de justiça particular, ferindo de morte um dos pilares mais importantes do devido processo legal, segundo o qual as decisões judiciais devem obediência a regras prévias e democraticamente postas, limitadoras do poder de qualquer juiz.
A subversão da cláusula constitucional do devido processo legal não parou por aí. Nota-se que, por mais de uma vez, sua excelência justifica e legitima a capa da revista Veja, como se ela traduzisse as manifestações populares, no seio das quais, inclusive, teria havido a criação do boneco "Pixuleco", "representando o autor como prisioneiro".

São conhecidas as relações entre o Direito e as avaliações morais que os homens fazem sobre suas condutas. Uma delas, a que interessa neste instante, é a de que, através das normas jurídicas que produz e garante, o Estado deve proteger as pessoas contra os linchamentos e execrações produzidas apressadamente pela moralidade média.

Ao não enxergar na atitude da revista qualquer excesso, e ao ancorar a sua argumentação exatamente naquilo que ela tinha o dever de evitar ou combater, sua excelência descurou de um compromisso fundante do devido processo, segundo o qual as pessoas não podem ficar à mercê do juízo moral e de suas consequências devastadoras.

A propósito, bastaria um simples exercício mental para perceber isso. Um bom juiz deve se colocar no lugar do outro. Será que sua excelência gostaria de ter a sua imagem veiculada nas mesmas condições em que a revista retratou o ex-presidente Lula?



2ª E 3ª DECISÕES


Sexta-feira, dia 4 de março, o Brasil amanheceu em polvorosa: agentes da Polícia Federal levaram o ex-presidente Lula. De início se imaginou tratar de uma prisão anunciada. Logo depois, no entanto, constatou-se tratar-se de uma condução coercitiva que, enquanto tal, teria que ocorrer caso fosse verificada a hipótese prevista no artigo 260 do Código de Processo Penal, in verbis:

Art. 260. Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

[.]

Como se vê, não se pode conduzir uma pessoa para depor coercitivamente sem que ela tenha sido previamente convidada para tal e, em consequência desse convite, se recusado a fazê-lo. Aqui, por mais que se queira dar asas à imaginação, não cabe outra interpretação: ir depor sob "vara" pressupõe resistência injustificada a um chamamento da justiça.

Eis que logo se descobriu que o ex-presidente Lula não tinha sido previamente convidado a depor, não se podendo obviamente dizê-lo resistente a um convite que não houve. O que então justificaria uma condução coercitiva?

Instado a se explicar, o juiz Sérgio Moro, responsável pelo mandado de condução coercitiva disse que a determinou em nome da busca da verdade e "para evitar tumultos e confrontos entre manifestantes políticos favoráveis e desfavoráveis ao ex-presidente". Acontece que sua excelência, a pretexto de lançar mão da prerrogativa contida no artigo 260 do CPP, o fez de forma absolutamente divorciada de sua hipótese legal legitimadora.
Sua excelência, portanto, legalmente falando, não teria essa prerrogativa, no caso, exorbitando, consciente e deliberadamente, de seu poder, desprezando, tal como na decisão anterior, os marcos normativos pública e democraticamente estabelecidos, para, autoritariamente, fazer prevalecer a sua vontade. Como disse o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, comentando a decisão de condução coercitiva, o juiz estabeleceu "o critério dele, de plantão".


Por melhores que sejam os propósitos, um juiz não pode decidir contra o sentido unívoco da lei, sobretudo porque a mensagem não deixa margem a qualquer dúvida. Como disse o referido ministro, "não se avança atropelando regras básicas". Afinal, mais dia menos dia, "o chicote muda de mão", e também de alvo.

Sua excelência, portanto, negou submissão às regras do jogo [2] , agindo fora dos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico, afrontando, assim como na decisão anterior, regra basilar do devido processo legal.

Como se isso não bastasse, e em nova afronta ao devido processo legal, expôs de modo desnecessário e vexatório o ex-presidente, quando seria do seu dever protegê-lo contra a execração pública e midiática.

Com efeito, ao que tudo indica sua excelência queria exatamente isto: que o ex-presidente Lula fosse execrado pública e midiaticamente. E por quê? Porque, violando o que estabelecem os artigos 8º e 9º da Lei nº 9.296/1996, que regulamenta o procedimento de interceptação telefônica, permitiu que conversas ao telefone feitas pelo ex-presidente Lula viessem a público, inclusive algumas estritamente privadas que não interessavam à investigação, bem como uma conversa havida entre o Lula e a presidenta Dilma, cuja divulgação somente poderia ser excepcionalmente autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, dada a prerrogativa de foro da presidenta.

É de se imaginar que sua excelência sabia dessas proibições/limitações a ele impostas pelo ordenamento jurídico, mesmo porque parece ser dotado de bom preparo técnico. Não obstante, apesar delas e contra elas, resolveu decidir como decidiu, nesse caso criminosamente. Veja-se o que diz o artigo 10 da lei acima citada:

Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.
É que o diálogo entre a presidenta Dilma e o ex-presidente Lula já foi captado num momento em que a interceptação, por decisão do próprio Moro, já não poderia mais ser feita. Contrariando a sua própria decisão, sua excelência não somente trouxe para o inquérito o referido diálogo como permitiu a sua divulgação. Ao agir assim, parece ter cometido o crime previsto no artigo 10 acima referenciado, expondo-se a um risco que racionalmente só se explica se o juiz tiver objetivos que transcendem o simples ato de dizer e aplicar o Direito na vida das pessoas, objetivos de resto não autorizados em lei.

E quais seriam esses objetivos?

O primeiro parece ter sido o de indispor o ex-presidente Lula com instituições respeitáveis e altas autoridades da República, a exemplo do Supremo Tribunal Federal e da Ordem dos Advogados do Brasil. Veja-se, para ilustrar, o teor dos diálogos interceptados e revelados:

- Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos uma Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, (Conversa entre Lula e a presidenta Dilma)

- Amanhã eles vão fazer alguma putaria com o Lula. Terça-feira o filha da puta da OAB vai botar aqui dizendo que o Conselho da OAB acha que nesse caso. É uma palhaçada. (Fala atribuída ao ministro Jacques Wagner em conversa com o Lula)

Porque as altas autoridades são humanas e as instituições são compostas por homens que se ressentem e se ofendem, sua excelência parece ter conseguido o seu intento, tanto assim que a OAB nacional, que até então se posicionava contra o impeachment da presidenta Dilma, mudou de posição.

A consciência da ilegalidade da decisão que tomou e os riscos daí decorrentes parecem ter valido a pena: o ex-presidente Lula e, por tabela, a presidenta Dilma, a toda evidência, saíram enfraquecidos desse episódio.

O segundo objetivo também parece ter sido plenamente alcançado: a produção de um massacre midiático no qual diálogos foram manipulados para dar a eles a serventia que era conveniente, no caso, tentar convencer parte da população de que o ex-presidente Lula havia aceitado o cargo de ministro chefe da Casa Civil para, ganhando foro privilegiado, livrar-se de uma prisão iminente e inevitável, à Sérgio Moro [4].

Novamente, arriscar-se ao ponto de agir criminosamente parece ter valido a pena: uma parcela da população se convenceu de que o Lula quis ser ministro para evitar a prisão.



4ª DECISÃO

Inteiramente contaminado por essa perspectiva, um outro juiz entra em cena e, instado a decidir liminarmente, em sede de ação popular, o Dr. Itagiba Catta Preta Neto, resolveu suspender a nomeação e posse do ex-presidente Lula na Casa Civil.

À parte a discussão sobre a verossimilhança dos argumentos utilizados, o fato é que graças à atuação fiscalizadora de alguns bons jornalistas foram descobertos dois escândalos.

Na noite anterior à decisão, sua excelência deixou-se flagrar em pleno facebook participando alegre e entusiasticamente de um ato político em Brasília contra a presidenta Dilma e a favor do seu impeachment. Na postagem que colocou, além de sua fotografia na companhia possivelmente da família, sua excelência ridiculariza a presidenta Dilma, associando-a à imagem de uma bruxa, e, lá para as tantas, diz que é preciso derrubar a presidenta para que o dólar baixe e possibilite que pessoas como ele voltem a viajar.


​Descoberto, apagou o perfil de sua conta no facebook, num esforço envergonhado e tardio de diminuir o vexame.

Uma outra descoberta desnudou sua excelência de vez. Analisando o percurso da ação popular no sistema de automação da Justiça Federal do Distrito Federal, percebeu-se que, entre o peticionamento e a decisão, transcorreram 28s. Quer dizer, em 28s o juiz recebeu o processo, analisou o argumento da parte e decidiu!

Como isto não é humanamente possível, e até por sua declarada opção político-ideológica, o fato é que a decisão de proibir o ex-presidente Lula de assumir o Ministério parece ter sido produzida antes de sua excelência conhecer do processo, como se tivesse sido encomendada [5].

Essas circunstâncias denunciam que sua excelência não tinha, face à sua opção política, nenhuma condição para decidir a ação popular. Ao fazê-lo, violou regras elementares que tratam da atividade do juiz, sobretudo aquelas que impõem o dever de imparcialidade e que disciplinam as hipóteses de suspeição.

Uma pergunta permanece no ar: se sua excelência se sabia suspeito, por que não se reconheceu enquanto tal? A resposta, tão inquietante quanto óbvia, sugere tratar-se, uma vez mais, de um juiz que, para fazer prevalecer as suas escolhas e a sua justiça, opta conscientemente por desprezar regras elementares do seu mister, desbordando dos limites impostos ao exercício de seu poder.

Que o Supremo Tribunal Federal, numa intervenção pedagógica, possa dar juízo aos nossos juízes.


NOTAS

[1] Em: Teoria Pura do Direito. Tradução: João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

[2] O respeito às regras do jogo, segundo Norberto Bobbio, é que caracteriza o democrata e a democracia (In O Futuro da Democracia: Uma defesa das regras do jogo. Tradução: Marco Aurélio Nogueira. 6ª edição. São Paulo: Paz e Terra).

[3] Art. 8° A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas.

Parágrafo único. [.]

Art. 9° A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada.

Parágrafo único. [.]

[4] Prisões preventivas que, na grande maioria, servem para a obtenção, pelo sofrimento, de delações premiadas, ou, então, para materializar condenações penais antecipadas.

[5] Essa suspeita aumenta porque, em artigo publicado em alguns sites jornalísticos, mostramos que a decisão foi colocada no sistema 4min19s antes do processo chegar ao juiz.


*Professor da UFAL e Desembargador do Tribunal de Justiça de Alagoas

O Titanic do PMDB


http://www.brasil247.com/pt/blog/alex_solnik/222992/O-Titanic-do-PMDB.htm



Brasil 247, 29 de Março de 2016



O Titanic do PMDB


Por Alex Solnik



O bravo comandante Michel Temer e seus peemedebistas favoritos estão preparando, nos melhores alfaiates, as indumentárias mais vistosas, reservando os melhores perfumes para embarcarem, excitadíssimos, na viagem do impeachment sem desconfiarem que a sua aventura tende a ser tão desastrosa quanto a do Titanic.
 
Desastrosa não só para eles, mas para todos os brasileiros que os saúdam e aplaudem – e também os que os vaiam - enquanto eles gloriosamente sobem ao convés.

Pobre Temer, pobres peemedebistas!

O impeachment que sempre foi e sempre será um golpe civil, na medida em que sua finalidade é depor um presidente (ou vice ou ambos) eleito é um processo tão tortuoso e danoso ao país que jamais aconteceu entre nós, ao contrário do que afirmam editoriais tendenciosos e deputados mal informados.

“Mas tivemos o impeachment do Collor! E ele não foi danoso! Não fez mal algum ao país, só fez bem! E ninguém chamou de golpe”!

Ledo (e Ivo) engano!

O impeachment compõe-se de três etapas. Na primeira, os deputados federais votam se o processo deve ser aberto – é o que acontece nos dias que correm. Se 342 deles optarem pelo sim passa-se à segunda etapa, que é quando os senadores, também por maioria absoluta, devem confirmar a decisão da Câmara dos Deputados para o processo seguir adiante.

Nessa etapa Collor renunciou, impedindo que a terceira etapa acontecesse.
E é na terceira etapa que mora o perigo.

Se os senadores aprovarem a abertura do impeachment (até aí vota-se apenas a abertura e não o mérito), o presidente ou, no caso, a presidente é afastada provisoriamente por 180 dias.
E o vice assume, também provisoriamente, por 180 dias.

Nesse período ocorre, enfim, o julgamento do impeachment, realizado no Senado, mas sob o comando do presidente do STF. É quando o processo político veste o figurino jurídico.

Jamais um impeachment chegou a essa etapa no Brasil.

Essa grande festa para a qual o PMDB ansiosamente se embeleza e distribui convites tem, portanto, duração limitada.
Se o Senado decidir que a presidente não cometeu crime de responsabilidade – que é o mais provável, pois crime não há - ela volta ao poder e o governo provisório do vice afunda no iceberg da sua estupidez e irresponsabilidade.

Mas não é só.

Durante esses seis meses as denúncias que Temer acumula na Lava Jato estarão sob a lupa do STF e poderão transformá-lo em réu.

Em último caso, seu mandato poderá ser cassado (motivos não faltam) pelo STF e ele então terá de ser substituído por seu sucessor imediato, que é o presidente da Câmara, que já é réu.

Assumindo, e seu processo estando em andamento, o sucessor poderá vir a ser condenado (faltam motivos?) e, em consequência, também cair. E seu sucessor imediato é o presidente do Senado, que também é freguês da Lava Jato.

Se este também for impedido, assumirá o presidente do STF, que convocará novas eleições.
Nessa altura do campeonato já poderemos estar nos aproximando de 2018 para quando as próximas eleições estão, de fato, programadas.

Resumo da estupidez número 1: o país vai perder esse tempo todo para chegar ao mesmo ponto a que chegaria naturalmente, sem que tudo isso fosse necessário e com consequências imprevisíveis para a já frágil economia, que se encontra em recessão.

Resumo da estupidez número 2: o impeachment terá ferido, mas não assassinado a única autoridade – a presidente Dilma - que não é investigada pela Lava Jato para abrir espaço a sucessores atolados em seus particulares mares de lama.

É preciso alertar aos brasileiros que, ao contrário do que pregam os arautos do golpe, o impeachment – se consumado - não vai tirar o Brasil da crise econômica e sim aprofundá-la, pois a instabilidade de um governo provisório, ameaçado não só pelo fantasma da volta da presidente como pela mão pesada da Lava Jato e do STF não vai proporcionar clima favorável a investimentos e sim – aí sim – à paralisia da atividade econômica.

Se os peemedebistas pretendem embarcar no Titanic, tenham bom proveito.

Mas levar com eles uma nação inteira não é apenas estupidez. É crime de lesa-pátria.

10 lições da Lava Jato para subverter a Democracia

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/10-licoes-para-subverter-a-Democracia/4/35818




Carta Maior, 29/03/2016


10 lições para subverter a Democracia



Por Najla Passos




​Deflagrada há dois anos, a Operação Lava Jato tem desrespeitado, sistematicamente, a Constitução de 88. Apenas os militares, na Ditadura, com o AI nº 5, tiveram poder para desrespeitar, de forma tão escancarada, o texto da Carta Magna.

Para os defensores do juiz Sérgio Moro, a justificativa obedece ao clássico raciocínio autoritário de que “os fins justificam os meios, um jargão atribuído pelo PIG (Partido da Imprensa Golpista) como sendo uma prática utilizada pela esquerda mundial. No entanto, ela vem sendo praticada pela Justiça Federal do Paraná, com apoio incondicional do condomínio golpista.

Para os defensores da legalidade, os métodos do juiz Sérgio Moro colocam em xeque as conquistas democráticas em um país ainda assombrado pela memória do regime de exceção da Ditadura, e contribuem de forma decisiva para o golpe em curso contra o governo da presidenta Dilma Rousseff.


Confira aqui a lista das principais subversões do Juiz Sérgio Moro:


1 - Delações premiadas no atacado


A delação premiada é um instrumento novo no arcabouço jurídico brasileiro, jamais usado com a intensidade vista na Lava Jato. Juristas das mais diversas áreas e tendências ideológicas são praticamente unânimes em afirmar que o instrumento não pode ser usado no atacado, sob pena de subverter as garantias constitucionais, suprimindo-as.

A delação premiada não tem finalidade de punição simplesmente, mas de buscar a correção de atos ilegais. Mas, a forma como ela vem sendo utilizada demonstra a única intenção de punir. Em outubro do ano passado, durante seminário da OAB, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Sebastião Reis, resumiu o problema:

A delação está sendo banalizada. Tem mais colaborador do que réus na Lava Jato”, afirmou. Para o magistrado, da forma com que vem sendo utilizado, o instrumento gera seletividade nas condenações. “O Estado está abrindo mão do direito de punir em troca da condenação de três, quatro pessoas”, denunciou.

Pesquisa da Consultor Jurídico mostrou que todas as 23 delações firmadas por Moro até aquela data violavam a Constituição e/ou as leis penais. Em vários depoimentos forçados, chamados de acordos de delação, os "delatores" ficam impedidos de recorrer das sentenças condenatórias, que lhes forem impostas.

Essa verdadeira subversão constitucional ocorre pela exigência de renúncia de direitos indisponíveis, como o amplo direito de defesa.
 
É preciso esclarecer que mesmo um delator, posteriormente condenado, poderá entender que o que lhe foi concedido como "benefício" viola o princípio da proporcionalidade: ou se delata e se prova de imediato os atos e agentes ilegais, ou o delator aponta os atos como indícios, mas a prova precisará ser buscada em investigação.
 
Neste caso, quem demonstrou cabalmente as provas deveria receber um benefício maior do que quem apenas apontou os indícios. Caberia, portanto, discutir a sentença a partir do princípio da proporcionalidade. O Tribunal, por exemplo, poderia ampliar os benefícios.

As delações, tal como os depoimentos colhidos no período da ditadura, vedam completamente aos réus a possibilidade de impetração de habeas corpus, além de todo e qualquer recurso contra a senteça. Há, inclusive, denúncias de que as delações estejam sendo utilizadas como instrumento para que réus mantidos encarcerados por prazos até aqui indefinidos, algumas vezes em situações precárias, possam ter acesso à liberdade, 

No entendimento de um membro do MP, que bem ilustra a subversão da garantia constitucional da dignidade humana e presunção da inocência que assola a Lava Jato, “passarinho para cantar precisa estar preso”. Estranhamente, são postos em liberdade "condicional" colaboradores que fazem a delação premiada. É evidente que a prisão preventiva não é preventiva, mas uma prisão para delação.


2 – Prender para delatar

O Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo, com mais de 600 mil encarcerados, dos quais cerca de 25% ainda não foram sequer a julgamento. Entre eles, estão as vítimas da prisão preventiva, que a midiática Lava Jato teima em banalizar para dar aos “midiotas” a falsa sensação de que "algo muito profundo está mudando no país da corrupção”. Os juristas alegam que a prisão preventiva deveria ser a exceção. Não a regra.  "Ninguém será preso antes do trânsito em julgado". E que seu uso indiscriminado cobrará um alto preço da democracia.

No dia 11/3, um grupo de mais de 200 promotores e procuradores publicaram um manifesto criticando o excesso de prisões preventivas, requisitadas pelo Ministério Público e concedidas pelo judiciário. No documento, eles afirmam que “a banalização da prisão preventiva – aplicada, no mais das vezes, sem qualquer natureza cautelar – e de outras medidas de restrição da liberdade vai de encontro a princípios caros ao Estado Democrático de Direito”. As manifestações contra a prática têm sido recorrentes entre juristas e operadores do Direito ainda não contaminados pela “Doutrina Moro”.

No artigo “Prende e solta”, publicado na Folha em 9/3/2015, o ministro do STF Marco Aurélio de Mello já alertava para o problema. “A prisão preventiva talvez amenize consciências ante a morosidade da Justiça, dando-se uma esperança vã aos cidadãos, como se fosse panaceia perante esse mal maior que é a impunidade. A exceção virou regra, implementando-se, com automaticidade e, portanto, à margem da regência legal, esse ato de constrição maior que é a prisão. (…) Justiça não é sinônimo de justiçamento. A sociedade não convive com o atropelo a normas reinantes”, alertou o ministro.

As críticas também se devem ao fato de que a ânsia de Moro por prender e punir só atinge um lado do espectro ideológico. Enquanto a cunhada do ex-tesoureiro do PT, João Vacari Neto, foi presa por engano ao ser confundida com outra pessoa em uma imagem de câmera de uma agência bancária, a mulher e a filha do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, continuam livres, leves e soltas, apesar de existirem provas eloquentes de que possuem contas clandestinas no exterior.


3 - Conduções coercitivas?

No dia 4/3, o país quase entrou em convulsão social depois que Moro determinou a condução coercitiva do ex-presidente Lula para depor na Lava Jato, no episódio que chegou a ser classificado por juristas como “sequestro”.
 
Não foi a primeira vez que o juiz se valeu do expediente, tão pouco a última. A cada nova fase da operação, os mandatos de condução coercitiva saem em dezenas da caneta de Moro, mesmo sem a intimação prévia do investigado, em clara violação da lei. Cento e tantas pessoas já foram submetidas à condução coercitiva, apesar de terem colaborado com as investigações.

O sequestro do ex-presidente Lula tem um peso simbólico especial. Maior líder político do Brasil, admirado e respeitado internacionalmente, ele jamais se negou a colaborar com a Lava Jato. Pelo contrário. Por três vezes, se apresentou voluntariamente à PF para prestar os esclarecimentos demandados por Moro.

Certamente, trata-se do único caso em que a condução coercitiva não foi determinada, pelo menos, com clareza. O juiz Moro não determinou expressamente que o ex-presidente fosse conduzido coercitivamente em direção a algum lugar.

Além disso, aeroporto é um lugar para se embarcar em um avião, não para prestar depoimento. Ainda mais em um espaço não atribuído à Polícia Federal, mas sob jurisdição da Força Aérea Brasileira, o que, aliás, provocou a intervenção do oficial comandante daquele posto, impedindo que o ex-presidente fosse embarcado num avião da PF que o aguardava ali para este fim, conforme denunciou, com exclusividade, a Carta Maior

O desrespeito ao ex-presidente e à legislação foi tão flagrante que até mesmo o ministro Marco Aurélio de Mello, que não mantém nenhum relacionamento ou simpatia por Lula, contestou Moro publicamente. "Condução coercitiva? O que é isso? Eu não compreendi. Só se conduz coercitivamente, ou, como se dizia antigamente, debaixo de vara, o cidadão de resiste e não comparece para depor. E o Lula não foi intimado?", questionou.

Professor da PUC-SP, o constitucionalista Pedro Serrano classificou a ação contra Lula como a maior ilegalidade já cometida em relação a um ex-presidente da República desde João Goulart.  "Não conheço na nossa legislação a figura da condução coercitiva sem que tenha havido antes a convocação”, disse.


4 - Autorização e divulgação de grampo ilegal

No dia 16/3, o Brasil que assistiu ao Jornal Nacional ficou chocado com o teor da conversa telefônica mantida entre Lula e Dilma, na qual, segundo o maior telejornal da mídia golpista, os dois tramavam para manter o ex-presidente fora das grades da Lava Jato. A conversa, como quase tudo na vida, admitia várias outras interpretações possíveis, como deixou claro a presidenta Dilma Rousseff. Mas isso não interessava à narrativa criada por Moro e a mídia que o serve.

O mais preocupante, porém, é que era uma conversa privada envolvendo a principal mandatária da República que, por previsão constitucional e legal, não pode ter suas comunicações privadas violadas e divulgadas sem autorização do STF, até mesmo por razões de segurança nacional. Para agravar o quadro, tratava-se de grampo inconstitucional e ilegal: o próprio Moro havia mandado a PF suspendê-lo às 11h12 e a gravação fora feita às 13h32. Mas o juiz se fez de morto e com clara intenção de subverter a Constituição e a lei, divulgou a conversa para a mídia três horas depois, naquela já considerada a operação de escuta telefônica mais ágil e ilegal da história do país.
 
Os áudios que inundaram a mídia dali para frente deixaram claro que Lula não era o único alvo das escutas. Foram vazadas conversas pessoais e sem peso para as investigações de sua mulher, Marisa, com seu filho, Lulinha. Também foram grampeados celulares de pessoas que sequer são investigadas pela Lava Jato, como o presidente do PT, Rui Falcão, e o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, no maior Big Brother jurídico de que se tem notícia no país.


5 - Violação do direito de defesa


São várias as formas com que a condução da Lava Jato viola o direito de defesa dos réus. A primeira a ser apontada pelos juristas, ainda no início da operação, está prevista em vários dos acordos de delação premiada já selados: por determinação do juiz Moro, os advogados de defesa ficam proibidos de ter acesso às transcrições dos depoimentos do delator, o que viola o princípio do contraditório e o direito à ampla defesa.
 
A mais recente e a que mais perplexidade causou foi a autorização do juiz para que a PF operasse escutas nos telefones do escritório de advogados que atendem o ex-presidente Lula. Todos os 25 advogados da equipe tiveram suas ligações grampeadas durante 30 dias, o que violou não apenas o direito ao sigilo do ex-presidente, como também dos demais 300 clientes do escritório. Em nota, o advogados denunciaram que a prática configura “um grave atentado às garantias constitucionais da inviolabilidade das comunicações telefônicas e da ampla defesa”.


6 - Carimbo de sigilo partidarizado

O mesmo Moro que divulgou a conversa privada da presidenta da república sem sequer pedir autorização ao STF, sob a alegação de que o conteúdo era de interesse público, colocou sob sigilo a chamada “Lista da Odebrechet”, o documento encontrado na última fase da operação que lista a relação de políticos que supostamente recebiam propina da empreiteira. A lista contém 200 nomes de políticos de 18 partidos. Lá estão os tucanos Aécio Neves e José Serra, assim como o peemedebista Eduardo Cunha. Não constam, porém, nem Lula e nem Dilma. Mas isso, claro, o juiz justiceiro cuidou de deixar sob sigilo. E o Jornal Nacional não mencionou.


7 - Vazamentos seletivos

Não se pode acusar Moro de responsabilidade pelos vazamentos seletivos de documentos da Lava Jato que, há dois anos, abastecem o noticiário com informações desfavoráveis a um campo político em detrimento do outro. Não há provas suficientes para isso. A não ser que se lance mão da Teoria do Domínio do Fato, que tanto sucesso tem feito nas acusações contra petistas.

Certo, nesta história, só mesmo o fato de que o juiz justiceiro nada fez para impedi-los, pelo menos enquanto eles desfavoreciam apenas ao governo federal e seu núcleo. A única vez em que ele falou em investigar o vazamento de informações referentes à Lava Jato foi quando suspeitou que Lula soube que a PF iria a sua casa com antecedência.

Parece que, quando os vazamentos se viraram contra o juiz justiceiro, Moro até se lembrou de que são ilegais.


8 – Atuação política escancarada

Moro tomou posição escancarada como força de oposição ao governo da presidenta Dilma quando, no dia 13/3, após as manifestações golpistas que tomaram conta do país, enviou um email à jornalista Cristiana Lobo, comentarista da Globo News, pedindo que as forças políticas do país “ouçam a voz das ruas”. "O juiz Sérgio Moro perdeu de vista os limites e responsabilidade da magistratura e se deixou influir pela publicidade", avaliou o professor emérito da USP e jurista Dalmo Dallari.

Antes disso, o juiz já havia dado provas de sua atuação partidarizada. No dia 9/3, proferiu uma palestra sobre a Lava Jato para a Lide Consultoria, cujo coordenador nacional, João Dória, é pré-candidato pelo PSDB à Prefeitura de São Paulo. Ao apresentá-lo ao público, Dória convidou os presentes a aderirem aos protestos pelo impeachment de 13/3. No dia 18/3, quando as mesmas ruas foram tomadas por brasileiros que defendem a democracia, o juiz justiceiro não trocou correspondência com jornalistas da mídia golpista e não elogiou a manifestação democrática.

Governador do Maranhão, o advogado e jurista Flávio Dino, que se demitiu do cargo de juiz federal para abraçar a carreira política, criticou a atuação política de Moro durante encontro dos Juristas pela Legalidade e pela Democracia com a presidenta Dilma, em 22/3. “O poder judiciário não pode mandar carta convocando para passeata. Não cabe ao poder judiciário fazer esse tipo de coisa. (…) Não usem a toga para fazer política, porque isso acaba por destruir o poder judiciário”, cobrou.


9 – Discurso de ódio

Muitos os intelectuais brasileiros têm acusado Moro de adotar uma estratégia discursiva autoritária para justificar a forma com que vem conduzindo Operação Lava Jato, um dos principais pilares do golpe em curso no país. Amplificado pela mídia e pela oposição golpista, o discurso de ódio seletivo contra a corrupção de apenas um espectro ideológico tem suscitado a violência.

São inúmeros os casos de pessoas agredidas por usarem roupas vermelhas, a cor identificada com a esquerda. Inclusive, cinco mães com bebês de colo. Há relatos de patrões que demitiram ou ameaçaram de demissão trabalhadores petistas e até de uma médica que se negou a atender o filho de uma ex-vereadora do partido em Porto Alegre (RS).

Segundo Flávio Dino, o discurso do combate à corrupção do qual Moro se serve é adotado pela elite golpista brasileira desde os anos 1950 para esconder os verdadeiros problemas do país e respaldar as rupturas da ordem democrática. “O que se segue a isto é o que estamos assistindo: o crescimento dramático de posições de corte fascista em nosso país, representadas pela violência, por grupos inorgânicos sem líderes, em busca de um 'duce', um 'füher', um protetor. Ontem, as Forças Armadas. Hoje, a toga supostamente imparcial e democrática”, explicou.


10 - Redução das garantias individuais

Muitos juristas avaliam que a subversão incorporada por Moro à investigação criminal, à instrução processual e aos julgamentos da Lava Jato têm reduzido drasticamente as garantias individuais no país, o que preocupa os defensores da democracia.

Ao comentar as práticas da Lava Jato em debate no Senado, o juiz Rubens Casara, especialista em direito processual penal, alertou que tanto no fascismo clássico italiano quanto no nazismo alemão e no stalinismo soviético a presunção de inocência também foi relativizada.

Elmir Duclerc Ramalho Junior, promotor na Bahia e professor de direito processual penal, reforçou: “há uma tendência autoritária perigosa que lembra, sim, períodos autoritários da história da humanidade”.​