domingo, 6 de maio de 2012

Vitória de Hollande. Vive La France!

A nova geografia da Europa: Hollande ficou maior


UOL, 06/05/2012 15h27
 

Sarkozy reconhece derrota e François Hollande como novo presidente da França

 

Do UOL, em São Paulo


O atual presidente da França, Nicolas Sarkozy, adiantou seu discurso inicialmente previsto para as 21h30 (16h30 no horário de Brasília)  deste domingo e reconheceu a derrota no segundo turno das eleições presidenciais para o rival, o socialista François Hollande.
A França tem um novo presidente e nós temos que respeitar”, disse ele, aplaudido pelos eleitores. "Estou prestes a me tornar um francês entre os franceses", declarou.
No discurso, Sarkozy disse que assumia a responsabilidade pela derrota e também agradeceu a oportunidade de ser presidente durante cinco anos, e deixa o cargo como o segundo presidente a não conseguiu se reeleger no país nos últimos 30 anos. Além disso, ele torna-se o 11º líder a perder o poder depois da crise econômica na Europa.
Sarkozy disse ter ligado para Hollande e desejado sorte no seu primeiro mandato como presidente. "Uma nova era começa na França. (...) E vocês podem contar comigo para defender seus ideais", disse ele no discurso.

Após o fechamento dos colégios eleitorais, às 20h (15h no horário de Brasília), diferentes institutos confirmavam a vitória de Hollande. Segundo o instituto CSA, o socialista obteve 51,8% dos votos, para o Ipsos 51,9% dos votos e para o TNS Sofres, 52%. Na capital francesa, partidários do socialista já comemoram a vitória, ainda não oficializada.
Com a confirmação da vitória, Hollande será o segundo presidente socialista eleito no país e traz a esquerda de volta ao poder após um hiato de 17 anos. Antes dele, o primeiro socialista eleito presidente foi o francês François Mitterrand.
Dados preliminares do Ministério do Interior francês mostram que 71,96% dos eleitores registrados votaram até as 17h na França (meio-dia no horário de Brasília). A participação dos votantes no segundo turno está um pouco acima do comparecimento do primeiro turno, que fora de cerca de 70,59% até as 17h de 22 de abril.

 

Intelectuais que apoiaram Sarkozy estão reclusos e silenciosos

 

Eduardo Febbro - De Paris


Paris - As convicções morais, políticas e intelectuais parecem transitar em um território transfronteiriço. O século XXI viu na França uma das mais eloquentes e desastrosas testemunhas de transformação política e intelectual, onde vários protagonistas reconhecidos das lutas da esquerda passaram sem rodeios para o campo liberal de Nicolas Sarkozy. Intelectuais de esquerda que foram para as fileiras ideológicas do presidente francês, Nicolas Sarkozy, dirigentes socialistas históricos que formaram parte do seu governo assim que foi eleito em 2007, ex-ministros sarkozistas que hoje chamam a votar pelo socialista François Hollande, ou o líder do centro-direita, François Bayrou, que também se pronunciou a favor do socialista: um setor da classe política e intelectual de França joga dos dois lados. ´

Há alguns meses, o ex-presidente conservador Jacques Chirac, em cujo governo Sarkozy foi ministro do Interior, disse que votaria em François Hollande. A filha de Chirac disse a mesma coisa. Nas últimas semanas, dois ex-ministros do governo de Sarkozy, Fadela Amara, e Martin Hirsch, mais outros três do gabinete de Chirac, Corinne Lepage, Brigitte Girardin e Azouz Begag, anunciaram seu voto a favor do candidato socialista. O fenômeno, por estranho que pareça, não é novo. Seus precedentes são inclusive “abracadabrantes”, segundo a expressão que Jacques Chirac empregou um dia.

O mais notório é o de Eric Besson. Este dirigente socialista era o responsável pela economia dentro do PS e tinha a seu cargo o programa econômico na equipe de campanha da candidata socialista à eleição presidencial de 2007, Ségolène Royal. Em plena campanha, Besson abandonou o Partido Socialista e passou às filas da direita, até ocupar dois ministérios importantes no gabinete de Sarkozy, entre eles o mais polêmico dos ministérios criados por ele, o da Imigração, Integração e Identidade Nacional. Outro que se distinguiu foi o líder socialista Bernard Kouchner, um dos fundadores da organização Médicos sem Fronteiras. Kouchner é uma das grandes personalidades do socialismo francês dos anos 89-90, mas acabou sendo ministro de Relações Exteriores de Nicolas Sarkozy.

A solubilidade também se estende aos intelectuais. Entre 2005 e 2007, muitos “ex-esquerdistas” aderiram plenamente ao discurso de Nicolas Sarkozy, em especial ao conceito central que a direita promovia naquela época: a eliminação de toda a herança cultural, social e ideológica oriunda das revoltas de maio de 1968. Em um famoso discurso de abril de 2007, pronunciado junto a alguns intelectuais que haviam protagonizado a revolta de 68, Nicolas Sarkozy desenvolveu um entusiasmado argumento contra os “herdeiros de maio de 68”, a quem acusou de haver destruído os valores da hierarquia. “Já não é mais proibido proibir”, disse então o candidato. Para Sarkozy, o Maio de 68 havia imposto “o relativismo intelectual e moral”, a ideia de que “não havia nenhuma diferença entre o verdadeiro e o falso, entre o belo e o feio”. Diante desse argumento algumas cabeças pensantes sucumbiram.

Em 2007, alguns intelectuais de esquerda descobriram um Nicolas Sarkozy que os fascinou e, junto a eles, a França descobriu, por sua vez, essa geração que, daí pra frente, seriam chamados os “neocons” (nome extraído da referência aos “neoconservadores norte-americanos”). Passaram da extrema esquerda para a direita sem o mínimo rodeio. Cinco anos depois daquela transmutação, a decepção entre os ex-intelectuais socialistas, maoístas, trotskistas ou anarquistas é enorme. Pascal Bruckner, Pierre-André Taguieff, Alain Finkielkraut, Olivier Rolin ou André Glucksman eram as cabeças mais visíveis desse movimento de “neocons” fascinados. ”Depois do grande sonho de Chirac, Nicolas Sarkozy acrescentava um fôlego jovem”, explicou Pascal Bruckner ao jornal Liberation.

Este ensaísta brilhante que atravessou a linha do sarkozismo conta que, em 2007, ”Sarkozy se opunha a Rússia, afirmava que os direitos humanos nunca seriam subordinados aos interesses do comércio. Dizíamo-nos: se pelo menos fosse verdade. Vários meses depois, Sarkozy recebia o coronel Khadafi”. A decepção foi tecendo-se pouco a pouco. O jantar que Nicolas Sarkozy participou no luxuoso restaurante Le Fouquet’s na noite em que ganhou a eleição presidencial, suas férias no iate de um milionário, a visita de Khadafi, sua indulgência com a Rússia, a dureza do discurso sobre a segurança e a estigmatização dos estrangeiros foram construindo um círculo de desilusões.
Mas naqueles anos, ”Nicolas Sarkozy fazia as linhas se moverem”, segundo lembra Marc Weitzmann, para quem Sarkozy “respondia a uma urgência de novidade”.

A novidade durou pouco. As realidades da política e as opções do mesmo Sarkozy, seu estilo e suas incoerências passaram do limite. A fascinação se tornou desconfiança, a desconfiança decepção e a decepção afastamento. A eleição de 2012 não os têm como convidados, nem sequer como agitadores do debate. Poucos são os intelectuais que participaram na campanha. Nem sequer desenvolveram uma espécie de autocrítica ou se revelaram com a força moral e ética que corresponde a um intelectual quando o poder cai no abismo do populismo e da vingança pública. A campanha de Sarkozy contra os muçulmanos, a confusão intencional entre imigração e insegurança, entre muçulmano e islâmico, não suscitou neles nenhum sobressalto.

Em um artigo publicado no jornal Le Monde, o filósofo Alain Badiou escreveu: “é uma vergonha esses intelectuais do neo-racialismo e do nacionalismo disfarçado que rechearam pacientemente o vazio deixado no povo pelo eclipse provisório da hipótese comunista com um manto de inépcias sobre o perigo islâmico e a ruína dos nossos valores!”. Aqueles protagonistas intelectuais da safra sarkozista estão agora reclusos como se, em um país onde pensar e escrever equivale à eternidade, sua palavra tivesse ficado muda perante a velocidade da história e a cenografia instantânea do sistema político.

Tradução: Libório Junior

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