quinta-feira, 28 de julho de 2011

As versões espanholas de Murdoch

Sono tutte buoni genti !


El rey Juan Carlos saluda a Javier Godó, conde de Godó y vicepresidente de la Fundación Conde de Barcelona, antes de la audiencia al Patronato de la Fundación que cumple XXV años de su constitución, esta tarde en el Palacio de la Zarzuela. EFE
El rey Juan Carlos saluda a Javier Godó, conde de Godó

As versões espanholas de Murdoch


Pascual Serrano - Rebelión

Os ambientes jornalísticos e políticos de todo o mundo, e da Espanha em especial, andam muito alterados com o escândalo Murdoch, sua espionagem telefônica, suas conivências com políticos e suas trapaças financeiras. Todos os meios de comunicação espanhóis apresentam o ocorrido no Reino Unido como algo estranho a nosso país. A ninguém ocorreu lembrar que praticamente todas as tropelias do magnata australiano tem seu formato correspondente na Espanha. Repassemos.

Em 1995, a Justiça processou Javier Godó, presidente e proprietário majoritário do Grupo Godó, editor, entre outras publicações, do diário La Vanguardia, por criar uma rede de escutas ilegais com o objetivo de seguir e vigiar numerosas personalidades da vida política e econômica espanhola. Foram espionados o prefeito de Barcelona, o promotor geral do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, diversos ministros e até o juiz da Audiencia Nacional, Baltasar Garzón. Na Espanha não se pagou as forças de segurança por seu silêncio, mas sim contratou-se integrantes delas para realizar as escutas telefônicas. Um agente do CESID (Centro Nacional de Inteligência) acabou condenado por criar a rede de escutas. Além disso, na sede do grupo Godó, um ex-coronel tinha um escritório no qual apareceram quinze documentos dos serviços de inteligência classificados como secretos e confidenciais. No final, nunca se soube quem foi o mandante da espionagem.

No Conselho de Administração do grupo Vocento (ABC) encontrava-se Emilio Ybarra, que também foi presidente do BBVA. Ele pediu demissão ao ser processado por apropriação indébita de fundos secretos em Jersey, em 1990. Inicialmente, foi condenado pela Audiencia Nacional, mas acabou absolvido pelo Tribunal Supremo.

Em 1992, o grupo Prisa comprou a rádio Antena 3, cadeia líder de audiência naqueles anos e principal competidora da cadeia Ser. Para isso, contaram com a autorização do governo e, oito anos depois, a Audiencia Nacional e o Tribunal Supremo declararam a compra e a autorização governamental anuláveis e improcedentes por descumprir as leis anti-monopólio contra a concentração dos meios de comunicação. Como o grupo prisa se encarregou de fechar a rádio Antena 3, a operação nunca pode ser revertida.

Sobre o grupo Zeta o jornalista Santiago Miró, da revista Interviú, conta que, com a mediação de sete milhões de pesetas, Mario Conde conseguiu parar as rotativas de um número da revista de 1991 que continha uma informação sobre o Banesto (Banco Espanhol de Crédito) que não era do seu agrado, quando já estavam impressos 70 mil exemplares.

Em 1998, Baltasar Garzón processou o presidente e o vice-presidente da Telecinco, acusados de diversos atos fraudulentos. Dois anos depois acusou seu principal acionista, Silvio Berlusconi, por delitos de fraude fiscal e violação da legislação espanhola anti-concentração de meios de comunicação. A impunidade parlamentar de Berlusconi impediu que fosse julgado, assim como seu braço direito, Marcelo Dell’Utri, que foi presidente da Publiespaña, empresa encarregada da publicidade da Telecinco. Dell’Utri foi condenado na Itália a vários anos de prisão por colaboração externa com a máfia.

O diário El Mundo pertence a Unidad Editorial. Os dirigentes da publicação, sabedores de que o grupo italiano Rizzoli estava interessado em ficar com a maioria das ações da companhia, compraram as participações de seus companheiros de redação para revendê-las aos italianos e embolsar, no caso de Pedro J. Ramírez, ao redor de 2 bilhões de pesetas entre 1999 e 2003.

Sobre a conivência entre políticos e grupos de comunicação. São bem conhecidas as sinergias entre o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) com os grupos Prisa e Mediapro (Público, LaSexta), ainda que com recorrentes brigas de família que nunca tem grandes consequências.

Os sindicatos da TVE denunciaram em numerosas ocasiões as contratações milionárias da produtora Mediapro. E o jornalista Miguel Barroso, ex-secretário de Estado de Comunicação com Rodríguez Zapatero e marido da ministra da Defesa, é conselheiro de uma multinacional britânica acionista de LaSexta. Quanto ao grupo Prisa, seu principal acionista de então e presidente, Jesús Polanco, recebeu milionárias receitas do governo de Felipe González, por meio dos Fundos de Ajuda ao Desenvolvimento, criados para que países, em sua maioria latino-americanos, comprassem bens e serviços de empresas espanholas. Graças ao governo socialista, o grupo Prisa foi a única empresa espanhola que explorava um canal pago de televisão.

São apenas alguns pequenos exemplos para lembrar que nossos proprietários de meios de comunicação não tem nada que aprender com Rupert Murdoch. A diferença é que aqui (na Espanha) não dão explicações no Congresso nem terminam condenados pela Justiça.

(*) Pascual Serrano é jornalista. Todos os dados desses textos estão em seu livro “Traficantes de información. La historia oculta de los grupos de comunicación españoles” (Akal, 2010)

Tradução: Katarina Peixoto

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