domingo, 10 de julho de 2011

Brasil será notificado por mais dois crimes da ditadura



São Paulo, domingo, 10 de julho de 2011


Brasil se omite sobre desaparecidos na ditadura argentina

LUCAS FERRAZ
DE BUENOS AIRES

O Brasil evita tornar-se parte em ações na Justiça argentina que investigam o desaparecimento de brasileiros no país durante sua última ditadura militar (1976-83).
Desde 2005, a Argentina já processou mais de 820 pessoas por crimes ocorridos no período, resultando em mais de 200 condenações.
Países como Chile, Espanha e França já se tornaram parte em ações que investigam o desaparecimento de cidadãos durante o terrorismo de Estado argentino.
O Brasil poderia participar de pelo menos três ações em andamento que estão relacionadas ao desaparecimento de brasileiros. Além de cobrar por Justiça, poderia contribuir com informações e documentos para ajudar a esclarecer os casos.
"O governo brasileiro tem todas as condições de se apresentar como parte. Pelo jeito, não quis", disse à Folha Pablo Parenti, coordenador de direitos de direitos humanos do Ministério Público Federal da Argentina e um dos responsáveis pelas ações sobre desaparecidos.
Desde 2007 o Brasil reconheceu que pelo menos seis brasileiros desapareceram na ditadura argentina.
Os dados estão no "Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos", organizado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos. O governo adota o balanço como oficial.
Os desaparecidos são: Francisco Tenório Cerqueira Júnior (1976), Maria Regina Marcondes Pinto de Espinosa (1976), Sidney Fix Marques dos Santos (1976), Walter Kenneth Nelson Fleury (1976), Roberto Rascardo Rodrigues (1977) e Luiz Renato do Lago Faria (1980). Seus parentes nunca tentaram agir judicialmente, segundo o comitê do Rio do grupo Tortura Nunca Mais.
Entre o fim dos anos 70 e o início dos 80, as ditaduras do Cone Sul se uniram na Operação Condor para perseguir militantes de esquerda.

ANISTIA
Mesmo ciente de que pode se apresentar como parte nas ações na Argentina, o governo brasileiro nunca agiu.
A Secretaria Especial de Direitos Humanos diz nunca ter tratado do tema e que a responsabilidade é do Ministério das Relações Exteriores.
O Itamaraty informou que o assunto nunca foi tratado internamente. A embaixada do Brasil em Buenos Aires disse não ter informações.
Sob condição de anonimato, duas autoridades do governo Dilma Rousseff disseram que o país não fará no exterior o que está impedido de fazer internamente.
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal declarou que a Lei de Anistia, de 1979, é válida também para ex-agentes da ditadura acusados de torturas e desaparecimentos.
Além de se recusar a participar das ações no país vizinho, o Brasil dificulta o acesso a informações pedidas por promotores argentinos. Integrantes do Ministério Público relataram dificuldades para obter papéis no Brasil.
Em junho, o promotor argentino Miguel Osorio, responsável pela investigação da Operação Condor, enviou ao Brasil pedido de informações sobre a aliança das ditaduras do Cone Sul. Não recebeu resposta até o momento.



Texto que o professor Fábio Comparato leu na Câmara dos Deputados, na Comissão de Direitos Humanos, sobre a  necessidade de instalar-se imediatamente a Comissão da Verdade, na quinta-feira (30/06).

Executoriedade da Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, no Caso Gomes Lund e outros v. Brasil (“Guerrilha do Araguaia”)

Pronunciamento na Audiência Pública convocada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados

O que está em discussão, nesta audiência pública, não é o conflito entre a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Gomes Lund e outros v. Brasil (“Guerrilha do Araguaia”) e o acórdão do Supremo Tribunal Federal, que julgou a argüição de descumprimento de preceito fundamental n° 153. É irrelevante, nesta altura dos acontecimentos, saber qual das duas decisões judiciais é a melhor, à luz do direito interno e do direito internacional. O que se deve discutir, aqui e agora, é a responsabilidade do Estado Brasileiro no cumprimento da referida sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, estejamos ou não de acordo com ela.

Comecemos por lembrar que o princípio fundamental do Estado de Direito impõe a todas as potências soberanas o respeito absoluto à jurisdição dos tribunais internacionais, quando essa jurisdição foi por elas oficialmente reconhecida. A soberania de um Estado, no plano do direito das gentes, não implica, de modo algum, a relatividade do princípio cardeal pacta sunt servanda. O Brasil aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e reconheceu como obrigatória, nos termos do disposto em seu art. 62, a jurisdição da citada Corte. O art. 68 da Convenção dispõe que os Estados signatários “comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”.

O Brasil foi citado como Réu no caso supra-referido, compareceu perante a Corte e não opôs nenhuma preliminar de incompetência desta, para conhecer da referida demanda e julgar o mérito da causa. Em conseqüência, não cabe a menor dúvida de que o Estado Brasileiro aceitou a jurisdição internacional nesse caso. Seria rematado dislate, escusa lembrá-lo, que o Brasil tivesse aceito tal jurisdição tão-só para a hipótese de uma decisão que lhe fosse favorável no mérito.

Ora, como a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobreveio em 24 de novembro de 2010, posteriormente, portanto, ao acórdão do Supremo Tribunal Federal na argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 153, o demandante neste último processo, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que tenho a honra de representar nesta audiência pública, pediu ao Tribunal, em instância de embargos declaratórios, que se pronunciasse expressamente sobre a executoriedade daquela sentença.

Chamada a manifestar-se a esse respeito naquele processo, a Advocacia-Geral da União afirmou, citando os votos vencedores no acórdão, que “o Brasil não estaria [note-se o tempo condicional do verbo] obrigado a adotar convenções internacionais por ele não ratificadas, ou convenção que tenha vindo a ratificar em data posterior à anistia concedida pela Lei n° 6.683/1979”. O argumento, com a devida vênia, é inteiramente despropositado. Em primeiro lugar, porque o Brasil aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos por ato de 25 de setembro de 1992, tendo ela sido promulgada pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro do mesmo ano.

Em segundo lugar, porque a tese de que os tratados de direitos humanos não se aplicam a fatos anteriores à sua ratificação é unanimemente rejeitada, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, constituindo a todas as luzes uma norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens), conforme o disposto no art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Com efeito, em se tratando de crimes de Estado ou crimes contra a humanidade, como é o caso que ora se discute, seria rematado despautério admitir que o próprio Estado, cujos agentes praticaram tais atos criminosos, tivesse o arbítrio de fixar a data a partir da qual o tratado que os qualifica e regula sua punição seria aplicável.

Na verdade, o pronunciamento do Exmo. Sr. Advogado-Geral da União perante o Supremo Tribunal Federal produziu um efeito político dos mais graves, que não pode deixar de ser aqui ressaltado. Segundo o disposto no art. 3°, § 1° da Lei Orgânica da Advocacia- Geral da União, o Advogado-Geral da União é “submetido à direta, pessoal e imediata supervisão do Presidente da República”. Há, por conseguinte, uma presunção legal de que todo pronunciamento do Advogado-Geral da União, em processos judiciais, conta com a aprovação do Chefe de Estado.

De onde se conclui, lamentavelmente, que a Presidência da República, enquanto único órgão competente para representar o Estado Brasileiro na esfera internacional (Constituição Federal, art. 84, incisos VII e VIII), acaba de rejeitar, por interposta pessoa, a decisão proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso supra-referido; no qual – repita-se – o Brasil consentiu em figurar como Réu e fez-se presente em todas as instâncias do processo.

A recusa em cumprir sentença de tribunal internacional, cuja jurisdição foi oficialmente aceita de modo geral e tacitamente confirmada no processo pertinente, configura flagrante desrespeito ao princípio do Estado de Direito e coloca o nosso País em estado de aberta ruptura com a ordem jurídica internacional.


Brasília, 30 de junho de 2011.

Fábio Konder Comparato

Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

Doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra



Quinta-Feira, 30 de Junho de 2011

Brasil será notificado em julho por mais dois crimes da ditadura

André Barrocal

BRASÍLIA – O Brasil deve ser notificado em julho, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, como réu em mais dois casos de crimes praticados na ditadura militar que não foram investigados no país e que parentes das vítimas levaram até o tribunal para tentar esclarecer e punir os culpados. Os processos referem-se às mortes de Luiz José da Cunha, o Crioulo, militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), e do jornalista Vladimir Herzog, o Vlado. A notificação marca, na prática, o início do julgamento, pois abre espaço para o acusado exercer o direito de se defender.
“Acredito numa decisão em no máximo um ano após a notificação”, disse a diretora do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) no Brasil, Beatriz Estela de Azevedo Affonso. Cejil é uma organização latino-americana defensora dos direitos humanos que representa uma série de parentes de vítimas da ditadura perante a Corte Interamericana, ao lado de duas instituições brasileiras: a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos de São Paulo e o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro.

A trinca foi responsável por acusar o Brasil na Corte pelo assassinato de militantes comunistas da Guerrilha do Araguaia. O país foi condenado no fim de 2010, depois de quase dois anos de julgamento. Beatriz acredita que os processos de Vlado e Crioulo serão bem mais rápidos, porque agora a Corte já está mais familizarizada com o contexto histórico brasileiro em que as mortes aconteceram. Alguns pontos da sentença pelos assassinatos na Guerrilha do Araguaia vem sendo cumpridos, mas aquele que os familiares mais desejam, a revogação da Lei de Anistia e a punição a torturadores e criminosos da ditadura, não. O cumprimento da sentença foi debatido em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (30/06).

Segundo Beatriz, a sentença favorável aos familiares no caso do Araguaia serve de estímulo para que outros processos sejam levados à Corte Interamericana. O objetivo, disse, é criar um volume grande de condencações ao Brasil para tentar constranger o Supremo Tribunal Federal (STF) a revogar a Lei de Anistia. “Novos casos vão chegar à Corte Interamericana, vão se acumular lá, esse problema para o Brasil vai durar muito tempo ainda”, afirmou Beatriz.

São Paulo, sexta-feira, 01 de julho de 2011

Ex-presidente não vê motivo para sigilo eterno

DE BRASÍLIA

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, responsável pelo decreto que determinou o sigilo eterno sobre determinados documentos públicos, disse ontem ser contra o dispositivo.
"Não vejo mais razão para o sigilo", disse FHC.
A presidente Dilma Rousseff foi inicialmente favorável ao fim do sigilo eterno, mas depois recuou. Agora voltou atrás e trabalha pela aprovação do projeto, em tramitação no Senado.
FHC afirmou que tentaria fazer o senador e ex-presidente José Sarney mudar de ideia e defender a liberação dos papéis. Sarney, ao lado do também ex-presidente e senador Fernando Collor, é a favor do sigilo.
O tucano disse que assinou o decreto sem ler o conteúdo. "Fiz sem tomar conhecimento. Foi no último dia do mandato." O texto foi assinado em 27 de dezembro de 2002, cinco dias antes do fim do mandato.

Nenhum comentário:

Postar um comentário