quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A desoneração e os trabalhadores


Sócrates (E) a Platão: o Estado é para defender os débeis


Jornal do Brasil, 03/08/2011

A desoneração e os trabalhadores

 
Por Mauro Santayana

 
A passeata convocada para hoje em São Paulo,  por algumas das principais entidades sindicais do país, e o propósito, anunciado ontem pelo governo, de desonerar a folha de pagamento de alguns setores industriais, não nos remetem a Marx e a seus discípulos, mas nos fazem retornar a Platão. No mais político de seus Diálogos, o de Górgias, ele reconstitui – ou cria -discussão entre Sócrates, Górgias, Querefonte, Polo e Calicles. Sócrates vence, e convence, ao afirmar que a melhor forma de viver é a de praticar a justiça, além de todas as outras virtudes, e arrasa seu oponente, ao afirmar que de nada vale  a argumentação de  Calicles  de que o Estado  existe, e deve existir, em favor dos poderosos – e contra os débeis.  O jovem e rico contendor do filósofo  chega a citar Pindaro, em seu verso conhecido, segundo o qual a força faz o direito.  A isso se opõe Sócrates, reclamando o papel do Estado como garantidor da justiça, mediante as leis. Enfim, o Estado só é legítimo quando protege os débeis.

É interessante a posição de certos empresários, ao reclamar contra os direitos trabalhistas. Quando a economia vai mal, eles se queixam, e argumentam que a flexibilização das leis do trabalho favorece o aumento do nível de emprego; quando a economia vai bem, o que ocorre agora, alegam que não conseguem competir com a importação de bens industriais, a não ser com o sacrifício dos trabalhadores. Ora, para alguns patrões, nada melhor do que uma sociedade econômica sem salários, e é o que buscam, na automação, a cada dia maior, dos processos industriais. Ainda agora, uma empresa de Taiwan anuncia a produção de um milhão de robôs para a indústria da China. Bem argumentam os que consideram a sociedade industrial contemporânea a mais injusta de quantas houve na História.

Como não pode haver produção sem consumo, nem consumo sem salários, o aumento da desigualdade leva a crises econômicas  profundas, como mostram os exemplos, de 1929 aos nossos dias.

As medidas anunciadas ontem pelo governo em seu conjunto  são necessárias. A preferência pela compra de produtos e serviços nacionais pelo Estado é boa providência, e melhor seria se, como produtos nacionais, só fossem considerados os procedentes de firmas realmente brasileiras, e não dentro da latitude imposta pelas emendas constitucionais do governo neoliberal de Fernando Henrique. Hoje, qualquer empresa, de capital externo, constituída no Brasil, ou adquirida de brasileiros, é considerada nacional. É um bom começo, embora parcela importante do que economizarmos com a redução das importações venha a ser consumida na remessa de lucros ao exterior pelas multinacionais. Esse primeiro passo,  ao que parece, será seguido de outros. Conforme disse Mantega, é preciso proteger os produtores brasileiros contra os aventureiros que vêm de fora.

Apesar de tudo isso, os reais produtores, que são os que trabalham no pátio das fábricas, buscam, como é de seu direito, e  de justiça, negociar com ganho real os acordos anuais de salários. Lutam também pela redução da jornada de trabalho, pelo fim do fator previdenciário, e pela regulamentação da terceirização, esse instrumento impiedoso de compra e venda da força e inteligência do trabalho – com lucros espantosos. Daí a passeata anunciada para hoje em São Paulo.

O mundo vive momento novo, dentro da velha injustiça que, pelo que vemos, já era objeto das especulações de Platão. Como a injustiça é o resultado da insensatez, os congressistas norte-americanos não foram assistidos da razão, ao debitar aos pobres a espantosa dívida do país. Não foram os pobres que gastaram as centenas de bilhões de dólares nas aventuras militares do Oriente Médio, que se somam às cifras inimagináveis consumidas em outras expedições de saqueio pelo mundo a fora.

E por falar em aventuras militares, convém ler com atenção o artigo do almirante Mário César Flores, ontem publicado em  “ O Estado de São Paulo” - (Vide e-mail '
Somos todos simplesmente brasileiros') (Ivan)) - sobre a pouca percepção que os brasileiros têm da importância e necessidade de forças apropriadas para a defesa da soberania nacional. As Forças Armadas devem ser suficientemente poderosas  a fim de dissuadir eventuais agressores à nossa soberania geográfica e política.  Não temos cuidado de erguer e solidificar os pilares de nossa liberdade e segurança no mundo. A  educação elementar é desdenhada. Proliferam, graças ao liberalismo oficial, universidades privadas sem qualidade,  autorizadas a explorar o sonho dos pobres. Não conseguimos assegurar saúde pública universal de qualidade, e não cuidamos bem dos homens aos quais incumbe a defesa do país.

E uma boa notícia. Ao assegurar a liberdade de trabalho para os músicos, contra a filiação compulsória à Ordem dos Músicos do Brasil, o STF dá mais um passo contra a praga do corporativismo,  em favor da plena liberdade de trabalho e de expressão cultural dos cidadãos, conforme os princípios basilares da democracia republicana.

Manifestantes passam pela Avenida Paulista, em São Paulo, durante passeata organizada pelas centrais sindicais e movimentos sociais

 

UOL, 03/08/2011

Centrais sindicais marcham em São Paulo pelos direitos trabalhistas

Do UOL Economia, em São Paulo
 
Centrais sindicais e movimentos sociais reuniram manifestantes nesta quarta-feira (3) na cidade de São Paulo para reivindicar a aprovação de leis relativas ao trabalho pelo Congresso Nacional. O evento atraiu 15 mil pessoas, segundo estimativa da Polícia Miltar. A organização do evento estima ter reunido mais de 40 mil manifestantes, segundo a assessoria da Força Sindical. A passeata começou na Praça Charles Miller, em frente ao Estádio do Pacaembu, e seguiu em direção à Assembleia Legislativa, passando pela avenida Paulista. Por volta das 11h50, a passeata já estava na Avenida Paulista, entrando na avenida Brigadeiro Luís Antônio.



O grupo reivindica reduzir a jornada de trabalho para 40 horas semanais sem redução do salário, regulamentar a terceirização para garantir os direitos dos trabalhadores, e acabar com o fator previdenciário –cálculo que reduz os benefícios de quem se aposenta mais cedo, por tempo de contribuição.
O movimento pede também que o Congresso ratifique as convenções 158 e 189 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)a primeira, contra a demissão de funcionários sem motivo, e a segunda regulamenta as condições dos trabalhadores domésticos no mundo, igualando seus direitos aos dos demais trabalhadores. As centrais sindicais pedem ainda a regulamentação da Convenção 151 da OIT, que estabelece o direito de organização e negociação coletiva dos servidores públicos.  É necessário que o Congresso Nacional ratifique as convenções da OIT para que elas tenham validade.

“Devemos nos mobilizar e lutar para que nossas reivindicações sejam atendidas”, disse Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical. Além das reivindicações referentes ao mercado de trabalho, o movimento ainda pede mudanças na política econômica: reduzir os juros, conquistar o desenvolvimento com valorização do trabalho, distribuir renda e fortalecer o mercado interno. A lista de exigências inclui também a realização das reformas agrária e urbana, a garantia de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) e de 50% do Fundo Social do Pré-sal para a educação, e defende a “soberania nacional e autodeterminação dos povos”.

Entre os organizadores do ato estão a Força Sindical, a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), a União Geral dos Trabalhadores (UGT) e a Nova Central. Participam também movimentos sociais, como o Movimento dos Sem Terra (MST) e a União Nacional dos Estudantes (UNE).

Nenhum comentário:

Postar um comentário