Conservadorismo atrasa e mata
Por Sulamita Esteliam
Loucas da Pedra Lilás, grupo de teatro recifense anti-violência contra a mulher, na Marcha das Margaridas 2011, que levou 70 mil mulheres à Esplanada dos Ministérios, dia 17 - do campo, da floresta e da cidade. A Articulação de Mulheres Brasileiras, dentre outras organizações, disse presente - Foto: Universidade Livre Feminista
Que a sociedade brasileira é conservadora não é novidade para ninguém. Mas, desde a última campanha presidencial, assiste-se a uma verdadeira cruzada obscurantista contra questões de direitos civis, de cidadania, a exemplo da descriminalização do aborto e da luta contra a homofobia.
Escrevo a propósito de um cartaz de rua, homofóbico, afixado em Ribeirão Preto, interior de São Paulo - e que a Justiça mandou retirar, felizmente. Em contraponto, matéria publicada em Carta Maior sobre as preocupações e ações da Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e em Defesa da Legalização do Aborto para barrar o retrocesso que se insinua no Parlamento. A intolerância, sabemos, tem raiz em setores religiosos, de diferentes matizes, subjugados pelo oportunismo politiqueiro – no geral. E, claro, se reflete no Congresso Nacional – que nada mais é do que um retrato em preto e branco da nossa sociedade. Por mais que seja a Geni do sistema republicano verde-amarelo -muito mais para amarelão, eu diria.
A recente aprovação da união homoafetiva, por exemplo, é rejeitada pela maioria dos brasileiros, segundo pesquisas. Enquanto a redução da maioridade penal é aprovada por mais de 80% das pessoas ouvidas por recente pesquisa CNT/Sensus. O que dá a dimensão do que somos e como raciocinamos. Se você perguntar para qualquer pessoa na rua sobre se ela é contra ou a favor do aborto, a maioria absoluta vai dizer que é contra. E muito provavelmente vai argumentar que há que se respeitar a vida. Eu pergunto: e a vida das mulheres que são levadas a abortar, e que morrem em consequência do aborto clandestino – terceira causa de morte materna no Brasil -, não vale nada?
Ora, ninguém, em sã consciência, pode ser favorável a tirar vidas, em quaisquer circunstâncias. Do mesmo modo, dificilmente uma mulher vai usar o aborto como método contraceptivo. Muito menos aquelas que já sofreram na pele, e na alma, a dor de uma gravidez interrompida, ainda que naturalmente. Fato é que não há lei capaz de barrar o aborto. Ainda que boa parte não incorpore o discurso feminista do “direito ao corpo”, uma uma em cada cinco mulheres, com idade de 18 a 39 anos, já abortaram no país. É o que detecta pesquisa da UNB -Universidade de Brasília. Aqui, neste blogue.
São 5,3 milhões de mulheres, a maioria casada, tem filhos e religião – católica em grande parte. Mais da metade delas delas precisa de internação hospitalar, em geral pelo SUS – Sistema Único de Saúde. A maior parte é pobre e, muito possivelmente, negra. Trata-se, portanto, de saúde pública e de humanidade. Cidadania é a palavra.
Então, não importa se a maioria é contra ou a favor ao aborto, à união homoafetiva. Alguém já perguntou, creio que a propósito do casamento gay – o jornalista e blogueiro Leonardo Sakamoto: “E daí!?” Você tem o direito de não aceitar, de não querer para si ou para o seus. Mas tem obrigação cidadã – e se for o caso, cristã – de respeitar; tanto as diferenças, quanto as necessidades. Não é lícito usar sua crença ou convicção para discriminar, atacar, cercear, ofender e, muito menos, matar – por atos, palavras, omissão e/ou hipocrisia. Ao Estado cabe proteger.
Não é simples, mas é assim – ou deveria.
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