segunda-feira, 18 de julho de 2011

Rio de Janeiro reage contra as OSS



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Sentença Deferida pelo Juiz Renato Sertã da 8ª. Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro.

Processo nº:
0049352-36.2011.8.19.0001
Tipo do Movimento:
Sentença
Descrição:
Processo nº 0049352-36.2011.8.19.0001 IMPETRANTES: Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (Sinmed RJ) e Sindicato dos Enfermeiros do Rio de Janeiro (Sinndenf RJ) IMPETRADO: Secretário Municipal de Saúde do Rio de Janeiro SENTENÇA Trata-se de mandado de segurança que busca em suma evitar a implantação de serviços terceirizados nos setores de emergência de alguns dos principais hospitais públicos e unidades de saúde do Município do Rio de Janeiro. Figuram como impetrantes o Sindicato dos Médicos e o Sindicato dos Enfermeiros, os quais questionam ato praticado pelo Sr. Secretário Municipal de Saúde, consistente na abertura de processo de seleção destinado a formalização de parcerias com as chamadas ´Organizações Sociais´, tudo previsto no Edital n° 01/2011, publicado em 08/02/2011 (fls. 84 e seguintes). Aduzem que a estratégia de melhora e modernização de tais serviços, tal como vem sendo feita pela Municipalidade, ofende o interesse público em geral e o interesse dos profissionais de saúde em particular, vez que ao transferirem para as Organizações Sociais a gestão dos serviços supra mencionados, afastam a possibilidade de se abrirem vagas em cargos públicos de médicos e enfermeiros, as quais seriam providas de forma democrática através de concurso de provas e títulos. Acrescentam que a qualidade do serviço também estaria comprometida pela atuação de profissionais inexperientes eventualmente alocados pelas Organizações Sociais, em prejuízo dos administrados. Concedi parcialmente a liminar, consoante decisório de fls. 363/364, através do qual proibi a proclamação dos resultados do processo de seleção, vedando também a celebração do contrato de gestão, cuja formalização é prevista entre o Município e a Organização Social que sair vencedora do certame. Contra a decisão liminar foi apresentado Agravo de Instrumento cuja cópia se vê às fls. 567/579, não havendo ainda notícia sobre o seu julgamento pelo egrégio Tribunal de Justiça. Vieram informações da autoridade impetrada às fls. 445 e seguintes, tendo a douta Procuradoria Geral do Município se manifestado em defesa do ente público às fls. 370 e seguintes. Novos petitórios foram apresentados, com farta documentação, pelo Município às fls 591 e seguintes, e pelos Sindicatos impetrantes às fls. 759/843 e 845/873. O Ministério Público opinou pela concessão da segurança, em seu parecer de fls. 587/589. É o relatório. Examinados, passo a decidir. Em primeiro lugar enfrento a questão da legitimidade dos sindicatos supra mencionados para impetrarem o presente writ, e faço-o para reconhecê-la. Com efeito, o art. 21 da Lei n° 12.016/2009 abarca hipóteses nas quais entidades que congregam o interesse de uma classe de profissionais, como os sindicatos, podem, sim, zelar pelos interesses legítimos relativos a seus associados, ou de parte deles. Reconheço como legítimo o interesse da classe de médicos e enfermeiros de buscar o aperfeiçoamento dos atendimentos à população, bem como ampliar ou ao menos manter o nível de oferta de cargos para tais profissionais, via concurso público. No mesmo sentido aliás, já havia se pronunciado o egrégio Tribunal de Justiça em paradigmático acórdão da 16ª Câmara Cível proferido na Apelação Cível 2007.0001.60271, tendo como Relator o eminente Desembargador Mauro Dickstein, em hipótese na qual se discutia a legalidade da contratação de profissionais médicos sem concurso público, o que afetaria a classe médica como um todo, ou ao menos uma parcela dos seus integrantes. A respeito, dispôs o aresto: ´.... devem ser tutelados os direitos dos profissionais alvo das contratações que serão realizadas, cuja regularidadde constitui, em tese, direito passível de ser perseguido pela respectiva entidade de classe.´ Rejeito assim a preliminar de ilegitimidade ad causam ativa suscitada pelo Município e pela autoridade impetrada. Quanto ao mérito, há que se enfocar primeiramente o desiderato do ato administrativo atacado, que consiste em última análise na terceirização de serviços na área da saúde pública. Tais serviços até agora foram prestados pelo próprio Município através de seu quadro de funcionários, e em breve futuro pretende-se que seja disponibilizado pela atuação das chamadas ´Organizações Sociais´. Não é de hoje que a delegação desses serviços em si vem sendo objeto de diversos questionamentos, em sede judicial e extrajudicial. Em 2008, época da prolação do acórdão referido linhas acima, o Judiciário já se pronunciava alertando para os obstáculos e limitações à contratação de pessoal estranho ao serviço público, mormente na área da saúde. Confira-se uma vez mais aquele acórdão, ao descrever a atividade da classe médica: ´... tal atividade é finalisticamente desempenhada pelos médicos, o que leva de plano à conclusão de que é necessária a realização de concurso para o seu ingresso nos respectivos cargos, salvo nas hipóteses pontualmente previstas na Lei Maior, pois, esses profissionais constituem a ´longa manus´ especializada do Estado para a realização prática da atividade de saúde´. Com efeito, há serviços que, por serem essenciais ao bem estar da população, deveriam em princípio ser disponibilizados pelo próprio Poder Público. São integrantes da atividade-fim do Estado, que tem o dever de exercê-la diretamente, isto é, sem intermediários. O mesmo já não ocorre com as chamadas ´atividades-meio´, tarefas auxiliares à consecução da atividade-fim. A distinção entre elas, todavia, e como sói acontecer na ciência jurídica, não guarda precisão matemática, de modo que deve o intérprete distinguir caso a caso, e alvitrar a melhor solução. Alguns critérios distintivos são traçados pela doutrina, sendo neste sentido preciosa a lição de Flavio Amaral Garcia, para quem: ´A conceituação do que seja atividade-meio e atividade-fim e os traços que diferenciam um do outro não são aspectos que podem ser solucionados apenas pela ciência do direito. Considerada a terceirização como um fenômeno econômico nas atividades privadas e cuja origem se dá, como dito, na Ciência da Administração, não raro se torna inviável pretender engessar e separar em campos absolutamente opostos as atividades-meio das atividades fins. A atividade empresarial é dinâmica e muitas vezes o processo produtivo se interliga de tal maneira que fica impossível uma separação nítida entre meio e fim. As mutações das técnicas de produção, que decorrem do processo cada vez mais acelerado de evolução tecnológica, mostram a insuficiência do critério como norte seguro para as terceirizações (..) (..) no que diz respeito à Administração Direta pode-se mencionar como exemplo os serviços de atendimento da polícia mais conhecidos como '190'. Seria possível a terceirização deste serviço, sob o controle e fiscalização de agentes públicos para uma empresa de call center? Isto seria terceirizar atividade-fim da polícia? Note-se que, mais uma vez, se está diante de uma zona cinzenta em saber se serviço de call center poderiam ser utilizados na hipótese. É claro que, neste caso, há uma questão fundamental preliminar a ser resolvida, que consiste em saber se haveria risco à segurança pública na terceirização e se foram transferidas prerrogativas típicas de Estado para o seu exercício.´ (..) Se o critério atividade-meio e atividade-fim não é, como aqui se demonstra, o limite adequado para diferenciar uma terceirização lícita de uma ilícita, cabe propor os parâmetros adequados para as contratações de prestação de serviços que envolvam a Administração Pública. O primeiro limite norteador das terceirizações nas atividades administrativa envolve o poder de império estatal , ou seja, aquelas atividades que exigem atos de império e de autoridade, com, por exemplo, segurança, fiscalização, regulação e poder de polícia. Essas são atividades estatais que, em sua essência, dependem que as autoridades administrativas estejam investidas com prerrogativas públicas necessárias à satisfação dos interesses públicos tutelados e que, portanto, não podem ser delegadas a agentes privados que não ostentem tal condição. Mais uma vez, recorra-se à lição de Marcos Juruena Villela Souto: ´A regra é que, para atividades permanentes, seja criado, por lei, um cargo público e provido por um servidor selecionado por concurso público. Só que, em tempos de modernização e diminuição da máquina do Estado, os cargos públicos só devem ser providos ou criados se envolverem atividades típicas do Poder Público, notadamente as que exigirem manifestação do poder de império (polícia, fiscalização, controle, justiça)´ (in Revista de Direito da PGERJ, 2010, vol. 65, p. 102/109). Configura-se assim, razoável a formulação segundo a qual, embora essencial, a prestação de serviços de saúde, por não constituir ´ato de império´, poderia em alguns casos ser delegada a terceiros, desde que legalmente habilitados a tanto. Posta essa premissa, surgem duas indagações subseqüentes, a saber: a quem delegar e o que pode ser delegado. Para a primeira dessas perguntas, reconheço que em princípio, as Organizações Sociais poderiam receber tal incumbência, eis que devidamente amparadas pela Lei n° 9.637/1998, que regula sua criação e delimita seu âmbito de atuação. Tal diploma legal teve sua constitucionalidade questionada através da ADI nº 1923-DF; a matéria até hoje não obteve pronunciamento definitivo pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. Este, em sede de medida cautelar, decidiu pelo indeferimento da medida, vez que o longo tempo de tramitação (cerca de 9 anos) até a data daquela decisão teria descaracterizado o periculum in mora, necessário para concessão da cautelar. Preservou-se assim, ao menos por ora, a constitucionalidade dos artigos questionados: EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 9.637, DE 15 DE MAIO DE 1.998. QUALIFICAÇÃO DE ENTIDADES COMO ORGANIZAÇÕES SOCIAIS. INCISO XXIV DO ARTIGO 24 DA LEI N. 8.666, DE 21 DE JUNHO DE 1.993, COM A REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI N. 9.648, DE 27 DE MAIO DE 1.998. DISPENSA DE LICITAÇÃO. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 5º; 22; 23; 37; 40; 49; 70; 71; 74, § 1º E 2º; 129; 169, § 1º; 175, CAPUT; 194; 196; 197; 199, § 1º; 205; 206; 208, § 1º E 2º; 211, § 1º; 213; 215, CAPUT; 216; 218, §§ 1º, 2º, 3º E 5º; 225, § 1º, E 209. INDEFERIMENTO DA MEDIDA CAUTELAR EM RAZÃO DE DESCARACTERIZAÇÃO DO PERICULUM IN MORA. 1. Organizações Sociais --- pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, direcionadas ao exercício de atividades referentes a ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde. 2. Afastamento, no caso, em sede de medida cautelar, do exame das razões atinentes ao fumus boni iuris. O periculum in mora não resulta no caso caracterizado, seja mercê do transcurso do tempo --- os atos normativos impugnados foram publicados em 1.998 --- seja porque no exame do mérito poder-se-á modular efeitos do que vier a ser decidido, inclusive com a definição de sentença aditiva. 3. Circunstâncias que não justificariam a concessão do pedido liminar. 4. Medida cautelar indeferida. (ADI 1923 MC, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU (ART.38,IV,b, DO RISTF), Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2007, DJe-106 DIVULG-20-09-2007 PUBLIC-21-09-2007 DJ 21-09-2007 PP-00020 EMENT VOL-02290-01 PP-00078 RTJ VOL-00204-02 PP-00575) - Grifei. No âmbito Estadual, a Lei nº 5026/09 do Município do Rio de Janeiro também teve a sua constitucionalidade posta em cheque perante o Egrégio Órgão Especial do TJ, através da Representação de Inconstitucionalidade n° 034705-10.2009.8.19.0000, cujo julgamento ainda se encontra suspenso, aguardando o pronunciamento definitivo da Suprema Corte na ADI retro-citada. Destarte, por ora, parece razoável o entendimento segundo o qual as OSs poderiam assumir alguma parcela das tarefas originalmente acometidas ao Poder Executivo. A segunda indagação (´o que pode ser delegado?´) remete à missão de distinguir, dentre os serviços de saúde, os que lhe são nucleares daqueles que tem caráter meramente complementar. Quanto a estes últimos pode-se apontar os misteres de limpeza, vigilância ou contabilidade das unidades hospitalares, ou até mesmo exames laboratoriais e consultas médicas paralelas destinadas a auxiliar no tratamento de cada paciente. Dentre os primeiros - de natureza essencial - figuram a própria gestão do hospital e o desenvolvimento de suas atividades típicas, quais sejam, atender os pacientes que lá chegam, interná-los, planejar e executar cirurgias, ministrar remédios e gerenciar admissão e demissão de profissionais. Nesta seara, a doutrina já alertava contra o perigo de fazer conviver duas classes de trabalhadores dentro da estrutura do desenvolvimento da atividade-fim, quais sejam, os ocupantes de cargos de provimento efetivo e os contratados pelas empresas ditas terceirizadas. Confira-se mais uma vez a lição de Flavio Amaral Garcia: ´A coexistência de servidores efetivos e terceirizados é indesejável e pode, de fato, violar o princípio do concurso público, no mais das vezes, criando, principalmente, disparidades remuneratórias entre agentes que executam a mesma função. Apenas situações excepcionais, temporárias e devidamente justificadas poderiam, em tese, autorizar essa situação de um mesmo serviço ser executado por concursados e terceirizados.´ (in Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado, vol. 65, pág. 108). Sobremodo na delegação dos serviços de natureza essencial, recomenda-se especial cautela, sob pena de o Poder Público recuar de missão que lhe é constitucionalmente destinada. No caso presente, entrementes, a autoridade impetrada logrou demonstrar que ao menos em sede legislativa esta delegação encontra-se respaldada, eis que a Lei Municipal n° 5026/2009 a prevê expressamente, mormente em seu artigo 1º, verbis: ´Art. 1º O Poder Executivo poderá qualificar como Organizações Sociais as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura, à saúde e ao esporte, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei. (..) §2º As Organizações Sociais cujas atividades sejam dirigidas à saúde poderão atuar exclusivamente em unidades de saúde criadas a partir da entrada em vigor desta Lei, no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla e nos equipamentos destinados ao Programa de Saúde da Família . Aqui o tipo de serviço pretendido delegar, de acordo com o Edital (fls. 84/96), cinge-se aos setores de emergência médica, tais como os que são desenvolvidos nas Unidades de Pronto Atendimento (as chamadas ´UPA's´). Entrementes, a Lei Municipal n° 5026/2009, no §2º de seu art. 1º permitiu a utilização do sistema de delegação somente em novas unidades.E aí reside um dos pontos da controvérsia, na medida em que os Sindicatos impetrantes asseveram que as tais delegações não poderiam ocorrem em unidades antigas - e já tradicionais - do nosso Município, tais como os hospitais Miguel Couto, Lourenço Jorge, Souza Aguiar e Salgado Filho, locais onde já se acumulou larga experiência, e onde já existe estrutura que acabaria por ser desmontada em detrimento do nível de serviço e dos interesses da população. O Município, a seu turno, procura sustentar que em verdade a unidade a ser instalada, por sua estrutura peculiar e diferenciada, há de ser sempre uma unidade nova, embora venha a funcionar em local físico antigo (vale dizer, os mencionados tradicionais hospitais cariocas). Para tanto, indica as características das unidades novas previstas na Portaria do Ministério da Saúde n° 347/2010 e acrescenta que nada semelhante existe atualmente no interior daqueles hospitais, tratando-se pois de inovação. O argumento, embora sedutor, procura desviar a atenção para o fato de que, em verdade, o Município tenta atribuir à expressão ´unidade de saúde´, constante da Lei municipal 5029/2009, significado diverso do seu sentido ordinário. O legislador municipal não explicou ou definiu tal expressão, e nem precisava em princípio fazê-lo diante da singeleza vocabular. Ao mesmo tempo preconizou a lei local que o sistema de delegação de serviços para as OSs seria introduzido somente no Hospital Ronaldo Gazolla e nos equipamentos do Programa de Saúde da Família. Deduz-se de plano que o novel sistema seria implantado somente em tais locais e não se destinaria a outros estabelecimentos de saúde no Município. O manejo do conceito fluido de ´unidade nova´, segundo o qual, poderia ela ser implantada em local antigo, decorre da tal Portaria ministerial federal, que foi editada somente em 2010, posteriormente à lei municipal em comento, criando a categoria de unidade de ´pronto atendimento´, até então inexistente. Observo outrossim que mesmo o conceito de unidade nova não está claro no edital, dando a impressão a quem lê que unidade nova seria aquela instalada em local onde até então nunca haveria funcionado qualquer hospital ou posto de saúde. Entrementes, ainda que pudessem ser superados tais percalços, surge outro aspecto ainda mais importante - a meu sentir o ponto nodal da controvérsia - e que reside na questão da preservação do princípio da transparência, desta feita na própria delegação dos serviços em tela. Melhor explanando, deve ser avaliada a possibilidade de a Organização Social que sair vencedora no certame funcionar a contento prestando serviços de saúde, ao mesmo tempo em que preste contas, diuturna e ininterruptamente, do desenvolvimento das suas atividades. A respeito do tema, na já mencionada ADI 1923/DF, proferiu recentemente seu voto o eminente Ministro Luiz Fux, do qual já se pode extrair preciosos ensinamentos. No item ´V´ da parte dispositiva do voto do eminente Ministro, consta o alerta de que as organizações sociais só podem funcionar se resguardarem com rigor tal princípio da transparência, inclusive quanto à contratação de pessoal. Confira-se: ´a seleção de pessoal pelas Organizações Sociais seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade;´ Justifica-se este posicionamento na medida em que, ao mesmo tempo em que o Poder Público transfere a gestão a terceiros (no caso às Organizações Sociais), deve resguardar mecanismos de controle de tal delegação. Essa é a maneira mais eficaz de assegurar o bom nível do serviço prestado à população. Notadamente quanto à contratação de pessoal, deverá haver obrigatoriedade de transparência no processo seletivo de captação de profissionais pelas Organizações Sociais; e isto deverá estar expressamente previsto no contrato de gestão referido no edital de processo seletivo. No caso presente, o tema está tratado na cláusula 2, item 4 da minuta de Contrato de Gestão (parte integrante do edital), acostada aos autos às fls. 548, verbis, assim vazada: ´Utilizar, para a contratação de pessoal, critérios exclusivamente técnicos inclusive quanto ao gerenciamento e controle de recursos humanos, observando as normais legais vigentes, em especial as trabalhistas e previdenciárias´. A leitura de tal cláusula mostra com facilidade que os critérios de seleção de pessoal são por demais vagos, limitando-se a exigir boa formação técnica, o que, ao final, nada esclarece. Observei a respeito, que a zelosa Procuradoria do Município ofertou petição às fls. 591, seguida de extensa documentação, através da qual sustenta que existem mecanismos eficazes de controle das Organizações Sociais capazes de afastar as preocupações quanto ao desempenho do novo serviço. Ocorre que tais documentos correspondem a simples modelos da prática de gestão, padrões a serem seguidos. Neles não se contém instrumentos destinados ao Poder Público que possam vir a interferir efetivamente nos critérios de escolha ou descarte dos servidores terceirizados. Assim, a prosperar o processo de seleção nesses moldes, ter-se-á a contratação de uma Organização Social que por sua vez, em matéria de pessoal, fará o que bem entender, correndo-se o risco de se contratar por exemplo, médicos ou enfermeiros inexperientes, em prejuízo da população, o que atenta também contra o princípio da eficiência. O Poder Público pode delegar serviços, todavia o seu papel de fiscalização, este é evidentemente intransferível e irrenunciável. Enxergo assim perigo concreto de se afastar o poder fiscalizatório do Município caso se prossiga com o procedimento licitatório em questão. O princípio da razoabilidade deve ser aplicado aqui em sua inteireza, enfeixado pelos seus três subprincípios consagrados na doutrina, quais sejam a adequação, a necessidade ou exigibilidade, e a proporcionalidade em sentido estrito. O poder fiscalizatório do Município há de ser preservado e somente regras editalícias claras sobre a contratação de pessoal pela OS podem assegurar a eficácia de tal fiscalização. Aplica-se assim o subprincípio da adequação, que na lição de Daniel Sarmento, recomenda que se pesquise ´se a norma presta-se, ao menos em tese, para a consecução dos resultados colimados pelo legislador.´ (in A Ponderação de Interesses na Constituição Federal, 1ª edição, Lumem Juris, pág. 87). O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito também encontra plena aplicação, como relembra o mencionado jurista: ´O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito - que Robert Alexy denomina também como mandado de ponderação -, envolve, por seu turno uma análise da relação custo-benefício da norma avaliada. Ou seja, o ônus imposto pela norma deve ser inferior ao benefício por ela engendrado, sob pena de inconstitucionalidade´. (op. cit. pág. 89). Na hipótese vertente, a ausência de mecanismos definidos na contratação de pessoal pela Organização Social torna antijurídica a própria atuação da entidade na esteira do entendimento do Ministro Luiz Fux. Não se trata aqui de adentrar o mérito da conveniência e oportunidade do ato administrativo praticado pelo Poder Público, o que cabe precipuamente ao Município, não podendo o Judiciário nele se imiscuir. O Município pode, como cediço, alvitrar a utilização das Organizações Sociais, devidamente selecionadas. O que não pode é fazê-lo sem as salvaguardas mínimas, como aqui se constata. Paralelamente, os Sindicatos impetrantes dão notícia de recentes contratações de médicos sem concurso para atuarem nos tradicionais hospitais supra referidos (fls. 848). Noticia-se também a descoberta de falhas graves na gestão da terceirização de serviços na área médica em outros episódios, o que teria sido apontado no relatório do Tribunal de Contas acostado às fls. 793/801. Observei que tais temas não concernem propriamente ao debate que se trava nestes autos, apenas reforçam a idéia, que não é nova, da necessidade de um bom sistema de controle quando há delegações de serviços de tamanha importância para os cidadãos. Isto posto, CONCEDO A SEGURANÇA para, confirmando e complementando a liminar, tornar nulo o edital de fls. 84/96 e seus anexos e proibir a celebração de contrato de gestão entre o Município do Rio de Janeiro e qualquer Organização Social com vistas à reformulação dos atendimentos médicos nos setores de emergência dos hospitais Souza Aguiar, Miguel Couto, Salgado Filho e Lourenço Jorge, e das unidades de saúde (´PAM's´) de Del Castilho e Irajá, referidos na peça de impetração. Sem honorários, na forma do art. 25 da lei 12.153/09. Condeno o Ente Público ao qual está vinculada a autoridade coatora nas despesas processuais. P.R.I Dê-se vista ao MP, com ou sem a interposição de recurso voluntário, e após subam os autos ao E. Tribunal de Justiça para o reexame em duplo grau obrigatório.

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