segunda-feira, 10 de outubro de 2016

O estado de exceção e o papel do Min. da Justiça Alexandre de Moraes

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Jornal GGN, 10/10/16



Xadrez dos 7 pecados de Alexandre Moraes


Por Luis Nassif



Ao contrário do que inicialmente se supunha, Moraes não é um risco à democracia, não por falta de instintos autoritários, mas pela pequena dimensão política e administrativa. Ele é bem menor do que a sombra que projeta.

De acordo com os manuais de gestão de recursos humanos, Alexandre de Moraes incorre em vários pecados abominados pela boa gestão.

Pecado 1 – o funcionário do “eu é que fiz”

Bom chefe é o que sabe reconhecer e premiar os feitos dos subordinados.

Dia desses, assisti a uma palestra-almoço dele no Instituto dos Advogados de São Paulo.

No almoço, Moraes apresentou seu projeto para segurança pública.

Primeiro, falou do policiamento nas fronteiras – papel que efetivamente lhe cabe, como chefe da Polícia Federal.

Apresentou como grande novidade de seu plano a parceria com governos vizinhos para atacar o tráfico nos próprios países produtores. Essa “novidade” já é implementada há tempos pela PF. A ponto de que, mal chegou ao Ministério, pediu para participar de uma ida ao Paraguai para aparecer em vídeos ridículos cortando arbustos de maconha.

Aliás, chegou no almoço acompanhado de duas equipes de cinegrafistas.

Esse exibicionismo já o havia indisposto com a Polícia Civil paulista. Os delegados apelidaram-no de Kojak, pela calvície precoce e atração desmedida pelas câmeras. Ou, então, como o tio soturno da família Adams. Exigia ser informado sobre todas as operações de impacto da Polícia Civil para se apropriar do mérito.

Pecado 2 – o superdimensionamento dos pequenos feitos

No almoço-palestra apresentou outra prioridade do Ministério da Justiça: o combate à violência doméstica. Educados, os comensais contiveram o riso. A troco de quê um Ministro, acantonado em Brasília, iria coordenar uma ação federal de cunho eminentemente local?

O mote foi apenas para apresentar uma estratégia tecnológica desenvolvida pela PM paulista – que ele assumiu como sua. Consiste em pegar o Google Maps e anotar os pontos que registram mais casos de violência doméstica. Depois, ampliar o policiamento nos locais, além de delegacias especializadas. Aliás, é o primeiro caso mundial de policiamento preventivo para repressão à violência doméstica que, como o próprio nome indica, ocorre dentro de casa.

Hoje em dia, estados menores recorrem a sistemas de geo-referenciamento muito mais sofisticados, cruzando bancos de dados próprios com os do Google, identificando regiões de maior criminalidade, analisando aspectos socioeconômicos, prédios públicos, rede escolar. Mas o bravo Moraes se jactava para um público de advogados do fato de marcar no Google Maps as regiões de maior violência doméstica.

Outro episódio do gênero foi a transformação de um grupo de simpatizantes do Estado Islâmico em perigoso grupo terrorista disposto a explodir o país, mas contidos a tempo pela atuação do bravo Kojak.

Pecado 3 – a incapacidade administrativa

Quando Secretário de Segurança de São Paulo, Moraes – que se jactava de usar o Google Maps - não conseguiu colocar de pé o Detecta, um supersistema capaz de identificar até gestos suspeitos de criminosos, anunciado com pompa na campanha eleitoral de Alckmin.

Moraes foi incapaz de implantar o sistema, adquirido da Microsoft, nem outro sistema caseiro, desenvolvido pela Polícia Militar. Nas entrevistas da época, não demonstrava sequer conhecimento mais aprofundado sobre os sistemas, nem sabia explicar as razões do atraso da implementação (http://migre.me/vbQ12).

Ganhou sobrevida com Alckmin devido ao fato do governador não dispor de sistemas de avaliação de seu secretariado. Seu único termômetro é o que sai na mídia, terreno preferencial para a atuação de Moraes.

Menor sorte teve como secretário de Gilberto Kassab, até 2010. No início, Kassab impressionou-se com os modos “deixe-que-eu-chuto” de Moraes. Este se tornou supersecretário das pastas de Transportes e de Serviços, presidente do Serviço Funerário, da SPTrans e da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).

Insurgiu-se contra a criação da Autoridade Metropolitana de Transportes, órgão vital para o planejamento do trânsito; entregou apenas um dos cinco corredores de transporte prometidos, falhou na criação da ciclofaixa do 23 de maio. Mais: anunciou a proibição de estacionamento de carros em ruas do centro, sem comunicação prévia ao prefeito, criando outra crise política.

Pecado 4 – os grandes lances sem planejamento

Como Secretário de Justiça do primeiro governo Alckmin, ensaiou alguns lances de defesa dos direitos humanos.

Seu ato mais expressivo foi despedir 1,6 mil funcionários da Febem, recém contratados através de concurso. Cometeu uma arbitrariedade que foi revogada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), trazendo enormes prejuízos aos cofres do Estado.

Depois, na gestão Kassab, os próprios funcionários da prefeitura perceberam o jogo, a dessintonia completa entre o discurso para consumo do prefeito e os resultados efetivos.

Por exemplo, decidiu reduzir em 20% o valor dos contratos de lixo. Segui-se uma greve de garis, com o lixo de acumulando por toda a cidade e ajudando a ampliar a tragédia das enchentes – agravadas por outro seguidor do estilo Moraes, o governador José Serra, que suspendeu as verbas para desassoreamento do Tietê. As enchentes acabaram resultando em 59 mortos e mais de 900 pontos de alagamento em três meses de chuva.

Pecado 5 – a aliança com insubordinados

Trata-se de uma fraqueza indesculpável em chefias. Quando não conseguem se impor sobre os subordinados, aderem a eles.

Assim que assumiu o Ministério, correu para visitar a Força Tarefa da Operação Lava Jato e anunciou uma série de reuniões com superintendências da Polícia Federal, hipotecando apoio total à operação, como se tivesse alguma ascendência sobre a PF.

Adotou esse mesmo comportamento em relação à Polícia Militar paulista. Para não parecer que tinha perdido o controle, preferiu comprometer sua biografia, apresentando-se como chefe inconteste dos massacres.

Antes de chegar à Secretaria, Moraes foi titular de ações judiciais da PM contra o procurador da República Matheus Baraldi Magnani, que denunciou as violências da corporação (http://migre.me/vbSmW) após 18 assassinatos pela Rota. E crucificou um PM por denunciar as violências da corporação. Está sendo processado pelo PM por isso.

Assim como em relação à Polícia Civil paulista, irritou os delegados da PF com o exibicionismo, situação que se agravou quando, em Ribeirão Preto, se exibiu aos correligionários do PSDB, anunciando grandes operações para a semana seguinte, pré-eleições.

A retaliação veio na forma de um vazamento da Operação Acrônimo, da própria PF, mostrando que seu escritório recebeu pagamento de empresas envolvidas com o caso (http://migre.me/vbSap). Até agora não explicou adequadamente que tipo de serviço prestou. Nem convenceu sobre sua suposta ascendência sobre a PF.

Pecado 6 – a traição com o antigo empregador

Demitido por Kassab, tempos depois foi acusado de vazar notícias para a imprensa, sobre supostas irregularidades na coleta de assinaturas para a fundação do PSD.

Em seguida, aliou-se a Michel Temer, que se tornou seu padrinho na indicação para Secretário da Segurança de Alckmin. Em maio de 2015, o blog “Flit Paralisante” – porta-voz se parte da Polícia Civil – informava sobre a possibilidade do Secretário de Segurança de Alexandre Moraes ser prefeiturável em 2016 (http://migre.me/vbvxr). Nomeado Secretário, passou a privilegiar delegados ligados ao ex-Secretário Antônio Ferreira Pinto, também do PMDB.

Pecado 7 – os episódios controvertidos

Em seu tempo de Secretário da Segurança de Franco Montoro, Michel Temer saiu com suspeita de ligação com bicheiros, que teriam ajudado no financiamento de sua campanha para deputado.

Mal saiu da Secretaria dos Transportes de Kassab, Moraes tornou-se advogado da Transcooper, a cooperativa de vans controlada pelo PCC. Sua defesa foi a de que a Transcooper não estava envolvida em nenhuma irregularidade – só seus associados.

Conclusão

Pelo acúmulo de abusos, pelo comportamento desajeitado como Ministro da Justiça, fica claro a pequena dimensão política de Moraes. Uma das principais características dos verdadeiramente poderosos é justamente o de não alardear seu poder.

O poder da repressão, de fato, está em mãos mais profissionais, do general Sérgio Etchegoyen comandando os serviços de inteligência das Forças Armadas.

Moraes é apenas um personagem atrás de holofotes e de um roteiro melhor.

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