Folha.com, 14/10/16
Por Vladimir SafatleJunta financeira comanda o Brasil
Semana
passada, o dito "governo" resolveu apresentar à população seu plano
de emergência econômica diante da propalada crise. Conhecido como PEC 241, o
plano visa congelar os investimentos estatais nos próximos 20 anos, permitindo
que eles sejam, no máximo, reajustados pela inflação do período.
Isso
significa, entre outras coisas, que o nível do investimento em educação e saúde
continuará no nível em que está, sendo que o nível atual já é resultado de
forte retração que afeta de forma brutal hospitais públicos, universidades e
escolas federais. Todos têm acompanhado a situação calamitosa dos nossos
hospitais, os limites do SUS, os professores em greve por melhores condições de
trabalho. Ela se perpetuará.
Para apresentar
o novo horizonte de espoliação e brutalidade social, o dito "governo"
colocou em marcha seu aparato de propaganda. Ao anunciar as medidas, foi
convocado um representante de quem verdadeiramente comanda o país, a saber, um
banqueiro, o senhor Meirelles.
Entrará
para a história o fato de que uma das mais impressionantes medidas econômicas
das últimas décadas, uma que simplesmente retira do Congresso a possibilidade
de realmente discutir o orçamento, que restringe o poder de representantes
eleitos em aumentar investimentos do Estado, que os transforma em peças
decorativas de uma pantomima de democracia, foi anunciada não pelo pretenso
presidente da República, mas por um banqueiro.
Este dado
não é anódino. Ele simplesmente demonstra que Michel Temer não existe. Não é
por acaso que ele não aparece na televisão e some em dia de eleição, indo votar
no raiar do sol. Quem realmente comanda o Brasil atualmente é uma junta
financeira que impõe seus ditames a toque de caixa usando, como álibi, a ideia
de uma "crise" a destruir o Brasil devido ao descontrole dos gastos
públicos.
O script
é literalmente o mesmo aplicado em todos os países europeus com resultados
catastróficos. No entanto, há de se reconhecer que ele tem o seu quinhão de
verdade.
De fato,
há um descalabro nos gastos públicos, mas certamente ele não vem dos
investimentos parcos em educação, saúde, assistência social, cultura etc. Por
exemplo, segundo dados da OCDE, o Brasil gasta 3.000 dólares por aluno do
ensino básico, enquanto os outros países da OCDE – a maioria europeus e da
América do Norte, entre outros – gastam, em média, 8.200 dólares.
A
situação piorará nos próximos 20 anos, já que os gastos continuarão no mesmo
padrão enquanto a população aumentará e envelhecerá, exigindo mais gastos em saúde.
Na
verdade, os gastos absurdos do governo não são com você, nem com os mais
pobres, mas com o próprio sistema financeiro, que se apropria do dinheiro
público por meio de juros e amortização da dívida pública, e lucra de forma
exorbitante devido à taxa de juros brasileira. Uma dívida nunca auditada,
resultante em larga medida da estatização de dívidas de entes privados.
Por
incrível que pareça (mas que deveria ser realmente sublinhado), o plano
econômico do governo não prevê limitação do dinheiro gasto com a dívida
pública. Ou seja, fechar escolas e sucatear hospitais é sinal de
"responsabilidade", "austeridade", prova que recuperamos a
"confiança"; limitar os lucros dos bancos com títulos do Estado é
impensável, irresponsável, aventureiro. Isso demonstra claramente que o
objetivo da PEC não é o equilíbrio fiscal, mas a garantia do rendimento da
classe rentista que comanda o país.
Como se
trata de ser o mais primário possível, o dito "governo" e sua junta
financeira comparam a economia nacional a uma casa onde temos que cortar gastos
quando somos "irresponsáveis". Mas já que a metáfora primária está a
circular, que tal começar por se perguntar que gastos estão realmente
destruindo o "equilíbrio" da casa? Por que a casa não pede mais
dinheiro para aquele pessoal ocioso que mora nos quartos maiores e nunca
contribui com nada?
Ou seja,
já que estamos em crise, que tal exigir que donos de jatos, helicópteros e
iates paguem IPVA, que igrejas paguem IPTU, que grandes fortunas paguem
imposto, que bancos com lucros exorbitantes tenham limitações de ganho, que
aqueles que mais movimentam contas bancárias paguem CPMF?
É claro
que nada disso será feito, pois o Brasil não tem mais governo, não tem mais
presidente e tem um democracia de fachada. O que o Brasil tem atualmente é um
regime de exceção econômica comandado por uma junta financeira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário