São Paulo, quinta-feira, 19 de maio de 2011 |
LinkedIn aponta nova bolha da internet
ÁLVARO FAGUNDES
DE NOVA YORK
A abertura de capital do LinkedIn na Bolsa é mais um sinal de uma nova bolha da internet, dizem especialistas.
A empresa começa a ter hoje seus papéis negociados na Bolsa de Valores de Nova York, com valor de mercado de US$ 4,25 bilhões - ela elevou nesta semana em cerca de 30% o preço das suas ações na oferta inicial.
Isso por uma companhia que lucrou US$ 15 milhões no ano passado. Ou seja, o seu valor de mercado pode ser mais de 280 vezes superior ao ganho obtido em 2010.
Mas não é só a rede social que preocupa. A compra do Skype pela Microsoft por US$ 8,5 bilhões seria mais um indício: a empresa de telefonia via internet ainda não se mostrou altamente lucrativa, apesar da fama, e perdeu US$ 7 milhões em 2010.
São casos que relembram a bolha anterior, que estourou em 2000. A alta foi tanta que o índice Bolsa Nasdaq (de companhias de alta tecnologia) está hoje mais de 40% abaixo do valor atingido em seu auge.
Outra fonte de preocupação é o mercado secundário, em que são negociados os papéis de empresa que ainda não são vendidos em Bolsa.
Para analistas, há muito dinheiro nesse mercado, jogando os preços das empresas para as alturas, e não há fiscalização apropriada.
BANHO DE SANGUE
O Facebook, por exemplo, está avaliado hoje em quase US$ 80 bilhões.
"Imagine se algo acontece e cai para US$ 20 bilhões, o que ainda é bastante. Será um banho de sangue", diz Vivek Wadhwa, professor da Universidade Duke e fundador de duas empresas de tecnologia.
Para ele, o excesso de dinheiro está corrompendo o Vale do Silício, região da Califórnia que abriga várias companhias de tecnologia.
"As pessoas estão ganhando dinheiro antes mesmo de a empresa abrir capital, temos secretárias com US$ 1 milhão. Se você tem US$ 30 milhões na sua conta, vai se preocupar em trabalhar oito horas por dia ou em comprar uma Ferrari e um iate?"
Steve Blank, investidor que ganhou muito dinheiro nos anos 1990 com investimento em empresas iniciantes e hoje dá aulas na Universidade Stanford, critica a falta de fiscalização nos mercados secundários.
Para ele, o problemas não está nas empresas já conhecidas, como Facebook, Twitter e Zynga. As redes sociais, diz, são o equivalente atual às companhias petrolíferas do século 20: vão ter lucros e receitas "insanos".
"O problema é que não há mil empresas dessas. As primeiras 20 que entrarem na Bolsa se darão espetacularmente bem. As próximas nem vão se dar bem. A bolha chega ao fim quando a sua avó diz que comprou ações de uma empresa que você nunca ouviu falar."
De acordo com Blank, o processo da bolha está apenas no começo, quando há muita gente ganhando dinheiro, mas é impossível prever quando ela vai estourar.
Outro foco de problema, diz o investidor, está nas empresas iniciantes desconhecidas, que recebem aportes milionários antes mesmo de produzir algum resultado financeiro. Um exemplo claro, afirma, é a Color, de aplicativos para smartphones, que recebeu um aporte de US$ 41 milhões há dois meses.
"Pessoas sensatas estão preocupadas", diz Wadhwa.
ANÁLISE
Oferta do LinkedIn lembra boom do crédito
ROB COX
LISA LEE
DA REUTERS
É fácil traçar um paralelo entre o atual frenesi quanto a ações de empresas de internet e a bolha do setor que estourou uma década atrás.
Mas talvez uma comparação com o boom de crédito seja mais apropriada.
Como fizeram em meio à mania original de ações da internet, os investidores estão assumindo riscos consideráveis sem que haja recompensas claras.
Também estão abrindo mão de parcela maior de seus direitos, como fizeram os detentores de títulos de dívida, no boom de crédito da década passada.
O exemplo que temos em mãos é cortesia do LinkedIn. A companhia decidiu superestimar em cerca de 30% o valor de sua oferta inicial de ações, o que atribui a ela um valor potencial de mercado de US$ 4,25 bilhões.
Caso suas ações sejam vendidas ao preço mais alto estipulado, o LinkedIn teria múltiplo de 15 vezes o seu faturamento nos 12 meses passados e de cerca de 80 vezes sua receita anterior aos juros, impostos, depreciação e amortização.
COTA DE PERIGO
A oferta inicial do LinkedIn acarreta um frisson adicional de perigo que traz à memória a bolha de crédito destruída em 2008.
Naquele momento, os detentores de títulos, em sua busca desesperada por rendimentos cada vez mais altos, abriram mão de boa parte de sua carta de direitos, das regras que determinam o que as empresas responsáveis pela captação devem e não devem fazer para satisfazer os termos estabelecidos pelos credores.
O LinkedIn está solicitando que os investidores abdiquem de alguns dos mesmos direitos.
As ações que a empresa vai colocar no mercado oferecerão direito de voto equivalente a uma fração do exercido pelas ações classe B que os fundadores, os executivos e os funcionários da empresa detêm.
As três categorias de acionistas mencionadas acima deterão cerca de 99,1% do direito de voto depois da abertura de capital. Durante booms, investidores costumam fazer apostas em suas crenças quanto ao crescimento e ao futuro lucro das empresas em que aplicam seu dinheiro.
Mas a história sugere que, nos momentos de bolha, eles cedem demais hoje para adquirir a promessa de um amanhã.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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