CartaCapital, 17 de maio de 2011
O Nobel da Paz em xeque
Aurélio Munhoz Um aspecto relevante para o Humanismo, mas inconveniente para os aristocratas da grande imprensa, permeou a execução sumária de Osama Bin Laden pelo governo dos Estados Unidos, no início do mês. Trata-se do fato de a cinematográfica operação contra o outrora inimigo número 1 da Casa Branca ter sido engendrada pelo ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 2009, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.
Nem é o caso de debatermos o providencial silêncio imposto ao tema. Afinal, foram claríssimas as razões que levaram a mídia a rotular de justa e heroica o que não passou de uma grotesca demonstração de vingança e oportunismo político – uma Pena de Talião com fortes contornos demagógicos comandada justamente por quem, pela condição de homem mais poderoso do planeta, deveria ser o principal tutor do Estado de Direito.
O foco deste artigo é outro. Desejamos debater a própria essência do Nobel da Paz – o mais prestigiado dos cinco prêmios, criados há 110 anos, que levam o nome do químico e inventor sueco Alfred Nobel. O circo de horrores protagonizado por Obama revela que este prêmio tem sido utilizado, de modo recorrente, como instrumento de uma bem orquestrada farsa, como tantas que a mídia golpista impõe aos incautos.
Não que o conjunto dos vencedores do Nobel da Paz não esteja à altura da honraria. Este texto, afinal, não é um libelo terceiro mundista à xenofobia norte-americana.
Ninguém pode dizer, por exemplo, que o primeiro laureado, o suíço Jean Henri Dunant (o homem que fundou a Cruz Vermelha Internacional e promoveu as Convenções de Genebra), não tenha merecido conquistá-lo, em 1901. Idem o ativista dos direitos humanos norte-americano Martin Luther King Jr, ganhador do prêmio em 1964.
Nossa crítica reside no viés descaradamente político comumente conferido ao Nobel. Nos últimos tempos, assim como em muitas ocasiões no passado, a cerimônia de entrega do título tem sido, não raro, uma premiação burlesca, na qual o coroamento de expoentes do Humanismo é substituído pela subserviência aos chefes de Estado das grandes potências econômicas do planeta ou a figuras de passado discutível.
Vamos aos fatos, calcados nos números. Nas minhas contas, treze presidentes receberam o Nobel da Paz desde sua criação – cinco deles dos EUA, sabidamente o País mais militarizado do planeta, dos quais dois apenas na última década.
Difícil acreditar que estes nobres senhores mereçam mais o prêmio que gente como a médica gaúcha Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança (já preterida uma vez na indicação), o médium mineiro Francisco Candido Xavier ou a religiosa baiana Irmã Dulce.
Mas não falamos apenas de brasileiros, claro. Cidadãos com biografias irrepreensíveis de outras nações importantes do planeta foram solenemente ignorados pelo areópago genérico do Nobel. Entre eles, a enfermeira polonesa Irena Sendler, responsável pela salvação de mais de 2,5 mil seres humanos que haviam sido confinados no Gueto de Varsóvia e cujo destino seria, inexoravelmente, a morte nos campos de concentração nazistas, durante a 2ª Guerra Mundial. Zilda, Chico, Irmã Dulce e Irena morreram consagrados pelo povo, não pelo Nobel.
Não deverá ser diferente em 2011, ainda que, entre os 241 candidatos ao prêmio, esteja o site WikiLeaks – a pedra no sapato dos curadores dos documentos secretos das grandes potências. Se o Nobel da Paz novamente se prestará ao papel de lacaio dos estadistas, é algo que só saberemos em dezembro, quando o nome do vencedor for conhecido. Esperamos, porém, que os responsáveis pela escolha – os doutos senhores que integram o Comitê Nobel da Noruega – façam diferente neste ano: sejam justos com quem, de fato, merece passar à história como detentor do mais respeitado prêmio do mundo.
Nem é o caso de debatermos o providencial silêncio imposto ao tema. Afinal, foram claríssimas as razões que levaram a mídia a rotular de justa e heroica o que não passou de uma grotesca demonstração de vingança e oportunismo político – uma Pena de Talião com fortes contornos demagógicos comandada justamente por quem, pela condição de homem mais poderoso do planeta, deveria ser o principal tutor do Estado de Direito.
O foco deste artigo é outro. Desejamos debater a própria essência do Nobel da Paz – o mais prestigiado dos cinco prêmios, criados há 110 anos, que levam o nome do químico e inventor sueco Alfred Nobel. O circo de horrores protagonizado por Obama revela que este prêmio tem sido utilizado, de modo recorrente, como instrumento de uma bem orquestrada farsa, como tantas que a mídia golpista impõe aos incautos.
Não que o conjunto dos vencedores do Nobel da Paz não esteja à altura da honraria. Este texto, afinal, não é um libelo terceiro mundista à xenofobia norte-americana.
Ninguém pode dizer, por exemplo, que o primeiro laureado, o suíço Jean Henri Dunant (o homem que fundou a Cruz Vermelha Internacional e promoveu as Convenções de Genebra), não tenha merecido conquistá-lo, em 1901. Idem o ativista dos direitos humanos norte-americano Martin Luther King Jr, ganhador do prêmio em 1964.
Nossa crítica reside no viés descaradamente político comumente conferido ao Nobel. Nos últimos tempos, assim como em muitas ocasiões no passado, a cerimônia de entrega do título tem sido, não raro, uma premiação burlesca, na qual o coroamento de expoentes do Humanismo é substituído pela subserviência aos chefes de Estado das grandes potências econômicas do planeta ou a figuras de passado discutível.
Vamos aos fatos, calcados nos números. Nas minhas contas, treze presidentes receberam o Nobel da Paz desde sua criação – cinco deles dos EUA, sabidamente o País mais militarizado do planeta, dos quais dois apenas na última década.
Difícil acreditar que estes nobres senhores mereçam mais o prêmio que gente como a médica gaúcha Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança (já preterida uma vez na indicação), o médium mineiro Francisco Candido Xavier ou a religiosa baiana Irmã Dulce.
Mas não falamos apenas de brasileiros, claro. Cidadãos com biografias irrepreensíveis de outras nações importantes do planeta foram solenemente ignorados pelo areópago genérico do Nobel. Entre eles, a enfermeira polonesa Irena Sendler, responsável pela salvação de mais de 2,5 mil seres humanos que haviam sido confinados no Gueto de Varsóvia e cujo destino seria, inexoravelmente, a morte nos campos de concentração nazistas, durante a 2ª Guerra Mundial. Zilda, Chico, Irmã Dulce e Irena morreram consagrados pelo povo, não pelo Nobel.
Não deverá ser diferente em 2011, ainda que, entre os 241 candidatos ao prêmio, esteja o site WikiLeaks – a pedra no sapato dos curadores dos documentos secretos das grandes potências. Se o Nobel da Paz novamente se prestará ao papel de lacaio dos estadistas, é algo que só saberemos em dezembro, quando o nome do vencedor for conhecido. Esperamos, porém, que os responsáveis pela escolha – os doutos senhores que integram o Comitê Nobel da Noruega – façam diferente neste ano: sejam justos com quem, de fato, merece passar à história como detentor do mais respeitado prêmio do mundo.
Aurélio Munhoz é jornalista, sociólogo, consultor em Comunicação e presidente da oscip Pense Bicho. Pós-graduado em Sociologia Política e em Gestão da Comunicação, foi repórter, editor e colunista na imprensa do Paraná. Endereço no Twitter: http://twitter.com/
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