quinta-feira, 16 de abril de 2015

Breviário do perfeito midiota








Observatório da Imprensa, 16 de abril de 2015




Breviário do perfeito midiota



Por Luciano Martins Costa



A base que os defensores do impeachment da presidente Dilma Rousseff chamam de “apoio popular” é formada por cidadãos de perfil extremamente conservador, propensos a acreditar em mitos urbanos e com baixo grau de cultura política. Sob orientação do filósofo Pablo Ortellado, da USP, e da socióloga Esther Solano, da Unifesp, dezenas de pesquisadores organizados pelo núcleo de debates Matilha Cultural, de São Paulo, entrevistaram 571 participantes da manifestação de domingo (12/4), em toda a extensão da Avenida Paulista. O resultado é estarrecedor. E esclarecedor. ( 
http://www.lage.ib.usp.br/manif/
 )

Por exemplo, 71,30% acreditam que Fábio Luís Lula da Silva, um dos filhos do ex-presidente Lula, é sócio da gigante de alimentos Friboi; 64,10% acham que o Partido dos Trabalhadores pretende implantar uma ditadura comunista no Brasil; 70,90% entendem que a política de cotas nas universidades gera mais racismo; 53,20% juram que a facção criminosa PCC é um braço armado do Partido dos Trabalhadores; 60,40% acham que o programa bolsa-família “só financia preguiçoso”; 42,60% acreditam que o PT trouxe 50 mil haitianos para votar em Dilma Rousseff nas últimas eleições; 55,90% dizem que o Foro de São Paulo quer criar uma ditadura bolivariana no Brasil e 85,30% acham que os desvios da Petrobras são o maior caso de corrupção da história do Brasil.

A lista das perguntas permite traçar um perfil muito claro da matriz dos protestos, como preferências partidárias, confiança na imprensa, em partidos  e entidades civis e, principalmente, adesão a teses improváveis que, no entanto, são muito populares nas redes sociais digitais. O resultado mostra, por exemplo, que a maioria (57,80%) confia pouco ou simplesmente não confia (20,80%) na imprensa. No entanto, o mais alto grau de credibilidade é dado à apresentadora do SBT Raquel Sheherazade, considerada entre os comentaristas políticos: 49,40% disseram “confiar muito” nela, seguindo-se o colunista Reinaldo Azevedo (39,60% dizem confiar muito nele).

A maioria (56,20%) declarou usar como principal fonte de informação política os sites da mídia tradicional (jornais, TVs, etc.), vindo em seguida o Facebook (47,30%). No campo da imprensa propriamente dita, o veículo em que os manifestantes declaram ter mais confiança é a revista Veja (51,80% confiam muito); entre os jornais, destaca-se O Estado de S. Paulo (40,20%).


Rejeição à política

Foram entrevistados apenas manifestantes com idades acima de 16 anos, ou seja, cidadãos aptos a votar. O perfil médio corresponde ao que foi identificado pelo Datafolha (ver aqui): na maioria (52,70%) homens, brancos (77,40%), com educação superior completa (68,50%), idade acima de 45 anos e classes de renda A e B. Apesar de uma tendência a afirmar que não confiam em políticos, a maioria declarou considerar, como lideranças mais confiáveis, pela ordem, o senador Aécio Neves, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o PSDB, o governador Geraldo Alckmin, vindo em seguida a ex-ministra Marina Silva e o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ); José Serra (PSDB-SP) perde para Ronaldo Caiado.

Nada menos do que 73,20% dizem não confiar nos partidos políticos em geral, contra apenas 1,10% que confiam muito e 25,20% que confiam pouco.

Os maiores índices de rejeição vão, evidentemente, para o PT (96% não confiam), seguindo-se o PMDB (81,80% não confiam). A presidente Dilma Rousseff (com 96,70%), seguida do ex-presidente Lula da Silva (95,30%) são os políticos em que os manifestantes menos confiam, seguidos pelo prefeito petista de São Paulo, Fernando Haddad (87,60%). O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conta também com alto grau de rejeição (73,40% não confiam nele).

Os números da pesquisa (ver aqui) permitem fazer uma análise bastante clara do recorte da população que saiu às ruas na última manifestação de protesto contra o governo federal. Os participantes são, majoritariamente, eleitores do PSDB, de uma extração específica da população paulista formada por indivíduos de renda mais alta, brancos, com baixa educação política a despeito da alta escolaridade, muito influenciados por jornalistas comprometidos com a agenda da oposição e propensos a acreditar em rematadas bobagens que proliferam nas redes sociais.

A “base popular” que o senador Aécio Neves apresenta como fonte de legitimidade para seu projeto de impeachment da presidente da República é a fração mais reacionária de seu próprio eleitorado, primor de analfabetismo político. A maioria se encaixa exatamente na definição do perfeito midiota.

Passarão?
 
 
 
 




Folha.com, 16/04/2015



É isto


Por Janio de Freitas




Três aspectos distintos, embora factualmente conexos, destacam-se na situação complexa que a prisão do tesoureiro do PT veio tornar mais tóxica.

Sem ordem de importância, um dos aspectos pode começar como contestação ao líder do PT na Câmara, Sibá Machado, segundo o qual João Vaccari Neto foi vítima de uma "prisão política". Política, e de péssima política, é a ideia exposta por Sibá. O PT está sufocado por acusações de diferentes fontes e igual gravidade, na confusa Operação Lava Jato. Chegou a tal situação sem dar às acusações uma resposta enfática, pelo teor e pela firmeza.

Talvez o PT não pudesse dar resposta objetiva às acusações porque os condutores da inquirição não divulgam o contexto completo dos depoimentos, mas só as suas violações dirigidas do alegado segredo de justiça. A resposta moral e institucional, porém, o PT não a deu por temor ou, ao que parece menos provável, por falta de iniciativa. O resultado é o mesmo: o PT não se faz merecedor de dúvida, quanto mais de confiança, pelo menos até que os possíveis acertos e erros da Lava Jato enfrentem os crivos do conhecimento público e, nele, os especialistas em Direito.

Um outro aspecto é o da animação oposicionista, em especial no PSDB, com a presumida contribuição para o impeachment dada pela prisão de Vaccari. O impeachment, em resumo, é a possibilidade aberta pela Constituição para destituir o governante por crime de responsabilidade. Para iniciar o processo de destituição é necessária, portanto, a precedência do ato ou de indícios com seriedade para serem investigados e avaliados.

Não é o que o PSDB quer. Ao iniciar reuniões com policiais e advogados, além de jornalistas, para descobrir alegações que possam pretextar uma campanha pró-impeachment, esses oposicionistas atestaram que o seu objetivo não é a defesa da legalidade, ou da moralidade administrativa, ou das instituições democráticas. Sua prática é leviana e seu objetivo é ferir de morte o adversário odiado. Dois indícios de má-fé e ação contra o Estado de Direito.

Entre os desdobramentos que a Lava Jato pode produzir está o de comprometer o governo e a própria Dilma Rousseff, por improvável que isso seja. Sem tal eventualidade, porém, os passíveis de crime contra a ordem democrática, nos termos da Constituição, são os que se organizam para fomentar a ruptura da legalidade institucional que tanto custou a este país.

Por fim, não só a prisão de Vaccari, mas tudo na Lava Jato que envolva partido envolve, também, eleições. As últimas, e as anteriores, e ainda as de antes, todas iguais: eleições brasileiras são uma grande hipocrisia.

Raríssimas são as doações financeiras de empresas, como as da Natura, e de empresários, como as de Neca Setúbal, que provêm de convicções ou simpatia, não de interesse. Em proporção semelhante, raríssimos são os políticos profissionais que não tomam "doações" e as embolsam em parte, senão no todo.

Candidato endinheirado a suplente de senador é aposta fácil sobre seu compromisso de pagar toda a campanha, e, apesar disso, com o titular da chapa tomando doações para embolsá-las. Casos assim são muito conhecidos, por isso a oposição não olha para dentro de si mesma. Comprador de fazenda, aliás, com valores falsos na escritura, logo depois de eleição presidencial nos anos 90, não seria notícia nova para os oposicionistas atuais.

Os bens da grande maioria de políticos profissionais são notoriamente incompatíveis com seus ganhos, ainda que lhes somando aposentadorias e outros ganhos conhecidos. Se fosse mesmo para defender a moralidade, bastaria confrontar ganhos e patrimônio. Se não é, restam a falsa moralidade e a hipocrisia.

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