Sair do euro ou não?
Michel Husson - Esquerda.net
O desenrolar da crise pode resumir-se de maneira simples: durante as duas últimas décadas precedentes à crise, o capitalismo reproduziu-se acumulando uma montanha de dívidas. Para evitar o afundamento do sistema, os Estados responsabilizaram-se pelo essencial destas dívidas, que passaram de privadas a públicas. O seu projeto é agora passar a fatura aos cidadãos sob a forma de cortes orçamentais, de aumento dos impostos mais injustos e de congelamento dos salários. Em resumo, a maioria da população (trabalhadores e aposentados) deve garantir a realização dos lucros fictícios acumulados durante muitos anos.
“O bicho estava na fruta”
Querer construir um espaço econômico com uma moeda única, mas sem orçamento, não era um projeto coerente. Uma união monetária truncada torna-se uma máquina de fabricar heterogeneidade e divergência. Os países que têm uma inflação superior à média perdem competitividade, são levados a assentar o seu crescimento no sobre-endividamento.
Retrospectivamente, a escolha do euro não tinha além disso justificação evidente em relação a um sistema de moeda comum, com um euro convertível para as relações com o resto do mundo, e moedas reajustáveis no seu interior. Na realidade, o euro foi concebido como um instrumento de disciplina orçamentária e sobretudo salarial. Sendo impossível o recurso à desvalorização, o salário tornou-se a única variável de ajustamento.
No entanto, o sistema funcionou menos mal graças ao sobre-endividamento e, pelo menos num primeiro tempo, à baixa do euro em relação ao dólar. Estes expedientes não podiam deixar de esgotar-se, e as coisas começaram a degradar-se com a política alemã de deflação salarial que a levou a aumentar a sua posição no mercado, sobretudo no interior da zona euro. Mesmo que a zona euro estivesse globalmente em equilíbrio, o desvio ampliou-se entre os excedentes alemães e os déficits da maioria dos outros países. As taxas de crescimento dos países da zona euro não se aproximaram: pelo contrário, têm tido tendência a divergir e isto desde a introdução do euro.
Esta configuração não era sustentável. A crise acelerou brutalmente os processos de fragmentação e a especulação financeira trouxe ao de cima as tensões inerentes à Europa neoliberal. A crise aprofundou a polarização da zona euro em dois grupos de países. De um lado, a Alemanha, a Holanda e a Áustria beneficiaram de importantes excedentes comerciais e os seus déficits públicos continuaram moderados. Do outro lado, encontravam-se já os famosos “PIGS” (Portugal, Itália, Grécia, Espanha) numa situação inversa: fortes déficits comerciais e déficits públicos já acima da média. Com a crise, os déficits públicos ampliaram-se em todos os países, mas muito menos no primeiro grupo de países que conservam excedentes comerciais. Em todos os outros, a situação degrada-se com a explosão dos déficits públicos e um desequilíbrio crescente da balança comercial.
Na Europa, a crise das dívidas soberanas acelerou a virada para a austeridade que, de qualquer forma, estava programada. A especulação contra a Grécia, depois contra a Irlanda e Portugal, só foi possível porque não houve nenhuma medida de controle dos bancos, nem a assunção mutualizada das dívidas à escala europeia. Foram, além disso, os bancos centrais que forneceram as munições, emprestando aos bancos a 1% o dinheiro que seria em seguida utilizado para alimentar a subida das taxas impostas aos Estados e para embolsar a diferença.
O endividamento público assumiu o endividamento privado, a crise financeira agravou-se neste terreno. Deste ponto de vista, os planos de salvação do euro são na realidade planos de salvação dos bancos europeus que detêm uma boa parte da dívida dos países ameaçados. Os ataques especulativos são usados como argumento a favor de uma passagem rápida a planos de austeridade drásticos. É um absurdo que só pode levar a uma nova recessão, mesmo na Alemanha onde as exportações para os países emergentes não poderão compensar as perdas nos mercados europeus.
No fundo, os governos europeus têm apenas um objectivo: regressar o mais depressa possível ao business as usual [1]. Mas este objetivo é inatingível, precisamente, porque tudo o que tinha permitido gerir as contradições de uma integração monetária mal feita tornou-se inutilizável para a crise. Estes elementos de análise são hoje muito amplamente partilhados. No entanto, eles levam a prognósticos e orientações opostas: ruptura da zona euro ou refundação da construção europeia.
Por uma refundação da Europa
O princípio essencial é a satisfação ótima das necessidades sociais. O ponto de partida é a distribuição da riqueza. Do ponto de vista capitalista, a saída da crise passa por uma reestruturação da rentabilidade e, portanto, por uma pressão suplementar sobre os salários e o emprego. Mas foi a parte do rendimento nacional retirada aos salários que alimentou as bolhas financeiras. E foram as contra-reformas neoliberais que agravaram os déficits, mesmo antes do deflagrar da crise.
A equação é simples: não se sairá positivamente da crise sem uma modificação significativa da repartição dos rendimentos. Esta questão vem mesmo antes da do crescimento. Certamente, um crescimento mais sustentável seria favorável ao emprego e aos salários (sendo ainda necessário discutir o seu conteúdo de um ponto de vista ecológico) mas, de qualquer maneira, não podemos contar com esta variável se, ao mesmo tempo, a repartição dos rendimentos se torna cada vez mais desigual.
É preciso combater duplamente as desigualdades: por um lado, pelo aumento da massa salarial, por outro, pela reforma fiscal. A subida da parte dos salários poderá seguir a regra dos três terços: um terço para os salários directos, um terço para o salário socializado (a proteção social) e um terço para a criação de empregos através da redução do tempo de trabalho. Esta progressão far-se-á em detrimento dos dividendos, que não têm qualquer justificação econômica nem utilidade social. O déficit orçamentáriol deverá ser reduzido progressivamente, não por um corte nas despesas, mas por uma nova fiscalização sobre todas as formas de rendimento que, pouco a pouco, foram dispensados de pagar imposto. No imediato, o custo da crise deverá ser assumido pelos seus responsáveis. Dito de outro modo: a dívida deverá ser em grande parte anulada e os bancos nacionalizados.
O desemprego e a precariedade eram já os males sociais mais graves deste sistema: a crise agrava-os, tanto mais que os planos de austeridade vão cortar nas condições de existência dos mais desfavorecidos. Sublinhando novamente: um hipotético crescimento não deve ser considerado o caminho indicado. Produzir mais para poder criar empregos?
É pegar na questão ao contrário. É preciso operar aqui uma mudança total de perspectiva e tomar como ponto de partida a criação de empregos úteis. Quer seja pela redução do tempo de trabalho no privado ou pela criação de postos de trabalho nas administrações, nos serviços públicos e nas autarquias, é preciso partir das necessidades e compreender que são os empregos que criam riqueza (não forçosamente mercantil). E isto permite estabelecer uma conjugação com as preocupações ambientais: a prioridade ao tempo livre e à criação de empregos úteis são dois elementos essenciais de qualquer programa de luta contra as alterações climáticas.
A questão da repartição do rendimento é o ponto-chave, em torno deste princípio simples: “nós não pagaremos para a crise deles”. Isto não tem nada a ver com uma “retomada pelos salários”, mas com uma defesa dos salários, do emprego e dos direitos sociais, sobre a qual não deverá haver dúvidas. Pode-se então destacar a noção complementar de controle: controle sobre o que eles fazem dos seus lucros (aumentar dividendos ou criar empregos); controle sobre a utilização dos impostos (subvencionar os bancos ou financiar os serviços públicos). O desafio é mudar a agulha da defesa para o controle e só esta deslocação pode permitir que o questionamento da propriedade privada dos meios de produção (o verdadeiro anti-capitalismo) adquira uma audiência de massas.
Como bem resume Özelem Onaram [2]: “Emerge um consenso entre as forças anti-capitalistas europeias em torno de uma estratégia assentada em quatro pilares: 1) resistência às políticas de austeridade; 2) reforma fiscal radical e controle dos capitais; 3) nacionalização/socialização dos bancos sob controle democrático; 4) auditoria da dívida sob controle democrático seguido de um eventual não pagamento”.
Saída do euro?
Qual seria a vantagem de uma saída do euro? O argumento principal é que tornaria possível uma desvalorização da nova moeda que restabeleceria a competitividade do país em causa. Ela daria de novo ao Banco central a possibilidade de emitir moeda, a fim de financiar o déficit de outra forma. Os mais otimistas vêem aí um meio de reindustrializar a economia, de atingir um crescimento mais elevado e de criar empregos. A fusão das moedas nacionais no euro retirou uma variável de ajustamento essencial, a taxa de câmbio. Os países com a competitividade-preço em queda não têm outro meio, no quadro europeu atual, senão a contenção salarial e a corrida desenfreada ao endividamento. Isto é verdade, mas não evita que o cenário de saída do euro seja incoerente.
A saída do euro não resolveria a questão da dívida e pelo contrário agravá-la-ia, na medida em que a dívida aos não-residentes seria imediatamente aumentada devido à taxa de desvalorização. A reestruturação da dívida deveria, em qualquer caso, ser realizada antes da saída do euro. Regressar a uma moeda nacional, para o caso de países que registam importantes déficit externos, submete-os directamente à especulação com a moeda. Pertencer ao euro tinha pelo menos a vantagem de preservar os países destes ataques especulativos: assim, o déficit comercial da Espanha chegou a cerca de 9% do PIB, sem qualquer efeito sobre a “sua” moeda. Uma desvalorização torna os produtos de um país mais competitivos, pelo menos em relação aos países que não desvalorizam. Assim, seria preciso que a saída do euro acontecesse apenas para um pequeno número de países. É pois uma solução nacional, não cooperativa, em que um país procura ganhar partes de mercado aos seus parceiros comerciais.
Mas uma desvalorização faz aumentar o preço das importações, o que se repercute na inflação interna e pode anular parte dos ganhos de competitividade nos preços de exportação. O economista Jacques Sapir, que estabeleceu um plano de saída do euro para a França [3], reconhece que a inflação “imporá desvalorizações regulares (todos os anos ou de 18 em 18 meses)” para manter constante a taxa de câmbio real. Isto significa aceitar um círculo inflação-desvalorização sem fim. A competitividade de um país assenta em elementos materiais: os ganhos de produtividade, a inovação, a especialização industrial, etc. Pensar que a manipulação das taxas de câmbio pode ser suficiente para assegurar a competitividade é, em grande medida, uma ilusão.
É por isso que quase não há nenhuma experiência de desvalorização que não se tenha traduzido num aumento de austeridade, que recai em definitivo sobre os assalariados. Para que a desvalorização sirva para criar uma outra repartição do rendimento e um outro modelo de crescimento será necessária uma profunda transformação da relação de forças sociais. Fazer da saída do euro um pré-requisito significa inverter as prioridades entre transformação social e taxa de câmbio. Há aí um desvio extremamente perigoso. No seu documento, Jacques Sapir sublinha que a “nova moeda deveria ser inserida nas mudanças de política macro-económica e institucional (…) se se quiser que ela produza todos os efeitos desejados”. Entre as mudanças, ele cita uma recuperação dos salários, a defesa dos sistemas sociais, um rigoroso controle dos capitais, a requisição do Banco de França, o controle do Estado sobre os bancos e as companhias de seguros. Mas todas estas medidas deveriam ter sido impostas antes mesmo de qualquer projeto de saída do euro.
Além disso, um governo de transformação social cometeria um erro estratégico terrível começando por sair do euro, pois que se exporia a todas as medidas de retaliação. Politicamente, o risco de dar uma legitimidade de esquerda aos programas populistas é muito grande. Na França, a Frente Nacional faz da saída do euro um dos eixos da sua política. Ela retoma uma lógica nacional-socialista que combina o discurso xenófobo com uma perspectiva que faz da integração europeia a fonte exclusiva de todos os males econômicos e sociais.
Este é o fundo da questão. A mundialização e a integração europeia neoliberais reforçam a relação de forças a favor do capital. Mas não é possível fazer disso a causa única, como se uma melhor partilha das riquezas se pudesse estabelecer espontaneamente, no interior de cada país, com a única condição de tomar medidas proteccionistas. Fazer crer que a saída do euro poderia, por si só, melhorar a relação de forças a favor dos trabalhadores é no fundo um erro de análise fundamental. Basta considerar o exemplo britânico: a libra esterlina não faz parte do euro, mas isso não protege a população de um dos mais brutais planos de austeridade da Europa.
Os partidários da saída do euro avançam um outro argumento: a saída do euro seria uma medida imediata, relativamente fácil de tomar, enquanto que uma perspectiva de refundação europeia estaria fora de alcance. Este argumento passa ao lado da possibilidade de uma estratégia de ruptura, que não se pressupõe que aconteça simultaneamente em todos os países europeus.
Para uma estratégia de ruptura e ampliação
A escolha parece pois ser entre uma perigosa aventura e uma harmonização utópica. A questão política central é sair deste dilema. Para tentar responder-lhe, é preciso trabalhar a distinção entre os fins e os meios. O objetivo de uma política de transformação social é, mais uma vez, assegurar ao conjunto dos cidadãos uma vida decente em todas as suas dimensões (emprego, saúde, reforma, habitação, etc.) O obstáculo imediato é a distribuição dos rendimentos, que precisa de ser alterada na fonte (entre lucros e salários) e corrigida a nível fiscal. É preciso tomar um conjunto de medidas para baixar os rendimentos financeiros e realizar uma reforma fiscal radical. Estas questões passam por pôr em causa os interesses sociais dominantes, os seus privilégios, e este confronto desenrola-se acima de tudo num quadro nacional. Mas os pontos fortes dos dominantes e as medidas de retaliação possíveis ultrapassam este quadro nacional: invoca-se imediatamente a perda de competitividade, as fugas de capitais e a ruptura com as regras europeias.
A única estratégia possível deve então apoiar-se na legitimidade das soluções progressistas, que resulta do seu caráter eminentemente cooperativo. Todas as recomendações neoliberais retornam em última instância à procura do aumento da competitividade: é preciso baixar os salários, reduzir os “encargos” para, no fim de contas, ganhar partes de mercado. Como o crescimento será fraco no período aberto pela crise na Europa, o único meio para um país criar empregos, será ganhar parte deles aos países vizinhos, tanto mais que a maioria do comércio externo dos países europeus se faz no interior da Europa. Isto é verdadeiro até para a Alemanha (primeiro ou segundo exportador mundial com a China), que não pode contar só com os países emergentes para o seu crescimento e os seus empregos. As saídas neoliberais da crise são pois por natureza não-cooperativas: só se pode ganhar contra os outros e é este o fundamento da crise da construção europeia.
Em contraste, as soluções progressistas são cooperativas: elas funcionam tanto melhor quanto se estenderem a um maior número de países. Se todos os países europeus reduzissem a duração do trabalho e taxassem os rendimentos do capital, esta coordenação permitiria eliminar os ataques a que seria exposta esta mesma política conduzida num único país. A via a explorar é pois a de uma estratégia de ampliação que um governo da esquerda radical possa seguir:
1. toma-se unilateralmente as “boas” medidas (por exemplo a taxação das transações financeiras);
2. acompanhamo-las de medidas de proteção (por exemplo um controle dos capitais);
3. corre-se o risco político de infringir as regras europeias:
4. propõe-se modificá-las estendendo à escala europeia as medidas tomadas;
5. não se exclui um braço de ferro e usa-se a ameaça de saída do euro.
Este esquema reconhece que não se pode condicionar a implementação de uma “boa” política à constituição de uma “boa” Europa. As medidas de retaliação de qualquer espécie devem ser antecipadas por meio de medidas que, efetivamente, fazem apelo ao arsenal protecionista. Mas não se trata de proteccionismo no sentido habitual do termo, porque este protecionismo protege uma experiência de transformação social e não os interesses dos capitalistas de um dado país face à concorrência dos outros. É pois um protecionismo de ampliação, cuja lógica é desaparecer a partir do momento em que as “boas” medidas forem generalizadas.
A ruptura com as regras europeias não se faz numa base ideológica, mas a partir de uma medida justa e legítima, que corresponde aos interesses do maior número e que é proposta como caminho a seguir pelos países vizinhos. Esta esperança de mudança permite então contar com o apoio da mobilização social nos outros países e construir assim uma relação de forças que pode pesar nas instituições europeias. A recente experiência do plano de salvação do euro mostrou, além disso, que não é necessário mudar os tratados para passar por cima de um certo número das suas disposições.
Neste esquema, a saída do euro deixa de ser uma questão prévia. É pelo contrário uma arma a utilizar em último recurso. A ruptura deverá pois fazer-se sobre dois pontos que permitiriam alcançar verdadeiras margens de manobra: nacionalização dos bancos e denúncia da dívida.
Ruptura e refundação
O primeiro ponto de apoio é a capacidade de ir contra os interesses capitalistas: o país inovador pode reestruturar a sua dívida, nacionalizar os capitais estrangeiros, etc. ou ameaçar fazê-lo. Mesmo no caso de um pequeno país, a capacidade de resposta é considerável, tendo em conta a interligação das economias e dos mercados financeiros. Muitos poderão ter perdas, por exemplo os bancos europeus no caso da Grécia. Em vez de se ajoelhar diante da finança, Papandreou poderia ter iniciado um braço de ferro dizendo: “A Grécia não pode pagar, portanto temos de discutir”. Foi o que fez a Argentina quando suspendeu o pagamento da dívida em 2001, obtendo com isso uma renegociação.
Mas o principal ponto de apoio residirá no carácter cooperativo das medidas tomadas. Esta é uma enorme diferença com o proteccionismo clássico que, no fundo, procura sempre ultrapassar as dificuldades ganhando partes de mercado aos seus concorrentes. Todas as medidas progressistas, pelo contrário, são tão mais eficazes quanto se generalizem a um maior número de países. É preciso falar aqui de uma estratégia de ampliação que assenta no seguinte discurso: afirmamos a nossa vontade de taxar o capital e tomamos as medidas de proteção adequadas. Mas esperamos que esta medida, como propomos, seja estendida ao conjunto da Europa. É em nome de uma outra Europa que assumiremos a ruptura com a Europa realmente existente. Devemos reflectir na articulação entre ruptura com a Europa neoliberal e projecto de refundação europeia, em vez de os pormos em oposição.
O projeto e a relação de forças
Um programa que visasse apenas regular o sistema à margem seria não só sub-dimensionado mas também pouco mobilizador. Por outro lado, uma perspectiva radical arrisca-se a desmoralizar perante a amplitude da tarefa. Trata-se em qualquer caso de determinar o grau óptimo de radicalidade. A dificuldade não é tanto elaborar dispositivos de ordem técnica: é evidentemente indispensável e é um trabalho largamente avançado, mas não existe nenhuma medida hábil que permita contornar o enfrentamento inevitável entre interesses sociais contraditórios.
Sobre os bancos, as hipóteses vão da nacionalização integral à regulação, passando pela constituição de um pólo financeiro público ou a aplicação de uma regulamentação muito restritiva. A dívida pública pode ser anulada, suspensa, renegociada, etc. A nacionalização integral dos bancos e a denúncia da dívida pública são medidas legítimas e economicamente viáveis mas podem parecer fora de alcance, devido à relação de forças atual. Aí situa-se o verdadeiro debate: qual é, na escala de radicalismo, a posição que melhor permite mobilizar? Não é aos economistas que cabe decidir este debate e é por isso que mais do que propor um conjunto de medidas este artigo procura pôr questões de método e sublinhar a necessidade, para a verdadeira saída da crise, de três ingredientes indispensáveis:
1. uma modificação radical na distribuição dos rendimentos;
2. uma redução massiva do tempo de trabalho;
3. uma ruptura com a ordem mundial capitalista, a começar pela Europa realmente existente.
O debate não pode ficar fechado numa oposição entre anti-liberais e anti-capitalistas. Esta distinção tem evidentemente sentido, conforme o projeto seja libertarmos o capitalismo da finança ou livrarmo-nos do capitalismo. Mas esta tensão não deverá impedir-nos de fazermos um longo caminho em conjunto, enquanto fazemos este debate. O “programa comum” poderá assentar aqui na vontade de impor outras regras de funcionamento ao capitalismo. Esta é a linha divisória entre a esquerda radical e o social-liberalismo. Em qualquer caso, a tarefa prioritária atual para a esquerda radical é construir um horizonte europeu comum, que sirva de base a um verdadeiro internacionalismo.
(*) Artigo publicado em A l’encontre (“Do Contra”) a18 de Julho de 2011. Tradução de Carlos Santos para Esquerda.net
NOTAS
[1] “Negócio de costume”, nota de tradução.
[2] Özlem Onaran, « An internationalist transitional program towards an anti-capitalist Europe », International Viewpoint n°435, Abril 2011.
[3] Jacques Sapir, S’il faut sortir de l’Euro, (Se é preciso sair do euro), documento de trabalho, 6 Abril 2011.
(*) Michel Husson é economista francês e pesquisador no IRES (Instituto de Investigações Econômicas e Sociais)
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