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6 de setembro de 2011
O apoio de Merkel à ‘banktatorship’ da zona do Euro
A chegada do EuroTARP
Por MIKE WHITNEY, no Counterpunch, em 05.09.2011
O Parlamento [Bundestag] alemão terá uma única chance de parar o plano de Angela Merkel de dar centenas de bilhões de dólares aos bancos submersos da União Europeia que fizeram más apostas nos papéis da dívida soberana. Se fracassar no bloqueio a Merkel em 23 de setembro, então — sob o ‘poder expandido’ da European Financial Security Facility (EFSF) — os bancos insolventes serão salvos e os custos serão repassados aos contribuintes da zona do Euro. Apesar do discurso populista (‘não seremos chantageados pelos mercados’), Merkel é uma devota fervorosa da união fiscal governada por banqueiros e acionistas, uma Banktatorship. Presentemente, ela está fazendo o possível para acelerar o processo, antes que os vigilantes hostis chacoalhem os mercados e provoquem um crash do sistema bancário da União Europeia.
Deu na [revista alemã] Der Spiegel:
“Numa situação de pânico do mercado, a EFSF precisa agir rapidamente”, disse Holger Schmieding, economista-chefe do Banco Berenberg, ao Financial Times Deutschland. “Isso poderia acontecer durante a noite ou num fim de semana”. Guntram Wolff, do instituto Bruegel, baseado em Bruxelas, concordou. A aprovação parlamentar “não deve demorar muito”. (“Parliamentary Influence over Euro Bailouts Naive”, Der Spiegel)
Soa familiar? O secretário do Tesouro dos Estados Unidos Henry Paulson usou a mesma estratégia depois do colapso da Lehman Brothers em 2008 para chantagear o Congresso e aprovar 800 bilhões de dólares de ajuda aos bancos via TARP [Troubled Asset Relief Program, nome dado nos Estados Unidos ao resgate dos bancos privados com dinheiro público]. Outra vez, o medo de um derretimento financeiro está sendo invocado para extorquir dinheiro dos trabalhadores. Aqui um trecho de outro artigo da Der Spiegel:
“Os bancos de fato não estão bem. A maioria deles ainda tem muitos papéis da dívida soberana espanhola, italiana, portuguesa e irlandesa em seus balanços e não está claro se essa dívida será paga totalmente. Isso, por sua vez, está alimentando a desconfiança entre as instituições financeiras e muitas deixaram de emprestar umas às outras. Elas estão sendo mantidas vivas apenas porque o Banco Central Europeu (BCE) está colocando à disposição delas uma quantidade sem limite de dinheiro e aceitando como garantia papéis que muitos investidores já não consideram seguros. A melhor capitalização dos bancos poderia aliviar a desconfiança, porque significa que os bancos poderiam absorver melhor as perdas em seus negócios com a dívida soberana. Aquelas instituições que não são suficientemente fortes para levantar dinheiro por contra própria nos mercados de capitais teriam de ser ajudadas com dinheiro público. Não existe melhor instituição para fazer este trabalho que a EFSF”. (“The Euro Rescue Fund Needs More Powers”, Der Speigel)
O trecho acima está errado de tantas formas que é difícil saber por onde começar. A EFSF foi criada para evitar que nações quebrassem, não bancos. A ideia de que os especuladores sejam comparados com governos representativos é risível. Os bancos enfrentam dificuldades porque tomaram decisões ruins e agora precisam enfrentar as perdas em seus investimentos. Os acionistas perderão e as dívidas deverão ser reestruturadas. Não é o fim do mundo.
O que Merkel e companhia querem fazer é virar o sistema de ponta-cabeça e transformar a EFSF num veículo de objetivo especial (Special Purpose Vehicle), por fora do orçamento, autorizado a distribuir dinheiro público para bancos falidos. E tudo está sendo feito para evitar que os banqueiros amigos percam dinheiro. Assim, por trás de toda a conversa mole sobre ‘unidade fiscal’ e ‘consolidação das finanças do estado’ se encontra a verdade nua e crua de que a zona do Euro tem arquitetura financeira idêntica à da [falida empresa norte-americana] Enron. Não existe nada democrático sobre um sistema que recompensa as elites devassas enquanto desvia as perdas para as costas dos trabalhadores. Isso é a pura, simples e velha cleptocracia.
A chanceler alemã, em sua luta, conta com o apoio dos colegas do Banco Central Europeu e do FMI. Na verdade, a recém-indicada chefe do FMI, Christine Lagarde, é a líder da carga pelo Euro-TARP, o que explica porque o processo de nomeação dela foi acelerado, depois que Dominique Strauss Kahn pediu demissão à espera da investigação sobre a acusação de estupro em Nova York. De qualquer forma, a madame Lagarde já demonstrou que está mais do que disposta a carregar o peso exigido para atingir seus objetivos e acomodar seus eleitores ricos. Aqui está como o [jornal britânico] Guardian resumiu o currículo de Lagarde: “Christine Lagarde é pela proteção dos grandes bancos… ela é a mais pró-resgate de todo o grupo”. (“IMF under growing pressure to appoint non-European head”, The Guardian)
De fato. Assim, Lagarde jogou o peso dela no apoio ao resgate dos bancos, chamado de recapitalização bancária. Ela também é feroz advogada de “institucionalizar um governo econômico europeu”, o que significa que quer estabelecer um regime controlado por banqueiros e acionistas; a Banktopia. Ao mesmo tempo, Lagarde insiste que este novo governo deveria ter o poder de intervir no processo orçamentário soberano da zona do Euro para “manter nossos esforços para expandir o grau de vigilância, inclusive sobre os déficits de governos, assim como as dívidas dos setores público e privado, se necessário impondo ‘penalidade políticas’”.
Certo. Assim, este novo governo trans-União Europeia será capaz de sentar o chicote nos estados que aprovarem orçamentos que sirvam aos interesses de seus povos, em vez daqueles do grande capital. Enquanto isso, o Superestado europeu da Lagarde vai continuar a impor as mesmas políticas que impôs desde o início da crise financeira; privatizações em grande escala de bens e serviços estatais e programas de apertar o cinto para manter a economia num estado permanente de Depressão. É isso o que se reserva à zona do Euro? Considere, os bancos já estão sendo salvos pelo programa de compra de papéis do Banco Central Europeu, que mantém o preço das ações artificialmente alto e evita o calote da dívida soberana.
O fato de que Lagarde está defendendo agressivamente a injeção direta de capital sugere que a situação dos bancos é muito pior que qualquer pessoa tinha imaginado, motivo pelo qual — de acordo com o Wall Street Journal — “ela sugeriu que o atual fundo de resgate da dívida soberana da União Europeia (ESFS) poderia ser usado com este objetivo”. Um exemplo clássico de cevar e fisgar.
Os parlamentares alemães terão a oportunidade de acabar com essa doideira de uma vez por todas. Ao bloquear Merkel, o Bundestag pode garantir que os trabalhadores da zona do Euro não serão roubados de centenas de bilhões de dólares ou submetidos ao governo autocrático de banqueiros parasitários. Deixem que os bancos paguem suas próprias contas. Não ao EuroTARP!
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