Kosovo: negócios e mortes rondam o cenário político Internacional |
Pablo Osoria Ramírez |
Seg, 07 de Fevereiro de 2011 |
A sombra do tráfico de órgãos humanos plana sobre o Kosovo depois de investigações recentes sacarem à luz pavorosas histórias, cujas tramas pareciam extraídas de filmes de terror e suspense. Diante da debilidade institucional e da pobreza imperante, o crime organizado toma forma nesse território, onde as leis carecem de implementação devido à incapacidade das autoridades. Tal afirmação foi expressada por Sofía Sebastián, investigadora para os Balcãs na Fundação para as Relações Internacionais e o Diálogo Social. O surgimento de novas provas ocorre num momento em que ainda ficam sem esclarecer denúncias de Carla del Ponte, ex-fiscal-chefe do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia (TPIY), sobre o tráfico de órgãos depois do conflito entre sérvios e albano-kosovares, em 1999 e 2000. As acusações de Del Ponte, refletidas em seu livro The Hunt: Me and the War Criminals (A caça: Eu e os criminosos de guerra) ficaram em suspenso já que nunca aportou evidências concretas, sublinham os pesquisadores. Muitas das imputações também proviam de Belgrado, capital da Sérvia, onde se responsabilizava a membros do Exército de Libertação do Kosovo (UCK) pelo seqüestro de civis neste país para depois matá-los e vender partes de seus corpos. O parlamento do Kosovo declarou em fevereiro de 2008 de maneira unilateral a independência do enclave, uma antiga província sérvia, considerada berço da cultura e religião dessa nação balcânica. Negócio horripilante Uma década depois das denúncias e depois da publicação d'A caça:..., o ex-fiscal suíço e atual parlamentar do Conselho Europeu (CE), Dick Marty, oferece provas reveladoras contra a UCK e suas principais figuras, quem na atualidade encabeçam o governo kosovar. O documento elaborado pelo servidor público europeu em uma ardua indagação qualifica de pavorosos os fatos ocorridos em terras balcânicas. Os prisioneiros eram alimentados razoavelmente bem e depois, por meio de ditames médicos, eram transportados ao centro da Albânia e ultimavam-nos com um tiro na cabeça para extrair seus órgãos e vendê-los no estrangeiro, descreve Marty. A investigação implica a Hashim Thaci, eleito em dezembro primeiro-ministro do Kosovo, depois de celebrarem-se as primeiras eleições nesse território após a separação da Sérvia, com a anuência dos Estados Unidos e da maioria dos governos da União Européia. Thaci, no julgamento de Marty, era um dos dirigentes do denominado grupo de Drenica, que participou no comércio de órgãos. Figura nos relatórios dos serviços secretos da OTAN e de vários países ocidentais como ator-chave e o mais perigoso dos "padrinhos da quadrilha", segundo o escrito pelo qual o Parlamento Europeu reclamou uma investigação sobre Thaci. Ainda que o parlamentar europeu não especifique quantos assassinatos se produziram para comerciar rins, a justiça sérvia afirma que foi cerca de meio milhar. Marty entrevistou dezenas de testemunhas diretamente implicadas, entre elas soldados, familiares de desaparecidos ou de mortos, representantes de instituições judiciais internacionais e promotores kosovares. Em muitos deles apreciei medo nos olhos, explicou o ex-magistrado suíço ao assegurar que todos os depoimentos são anônimos para garantir a segurança de suas fontes. O texto também denuncia a impunidade de que gozam os autores dessas práticas, por causa da lei do silêncio imperante no Kosovo e da pouca vontade política internacional para julgar aos culpados. A missão da União Européia (UE) no Kosovo (Eulex) abriu recentemente uma investigação sobre o suposto envolvimento de Thaci na rede que perpetrou assassinatos e tráfico de órgãos de seres humanos. Vamos examinar o relatório cuidadosamente, sublinhou o diretor adjunto da Eulex, Andy Sparkes, em referência ao documento apresentado por Marty. Assegurou que seus promotores têm a capacidade, o conhecimento, a localização e a jurisdição suficientes para gerenciar a indagação judicial. A assembléia parlamentar do CE adotou o relatório do servidor público e instou a Eulex a pesquisar as acusações. Clínica Medicus ou bazar de horrores Como parte de outra investigação também por tráfico de órgãos no Kosovo, a Polícia Internacional (Interpol) prendeu em meados de janeiro em Istambul ao médico Jusuf Sonmez (conhecido como Doutor Vampiro e Buitre Doctor), sob uma ordem emitida por um tribunal de Pristina. A detenção está relacionada com o chamado caso Clínica Medicus, que implica a uma rede de pessoas dedicada a extirpar os rins de pessoas pobres com a promessa de receber em troca cerca de 20 mil euros que nunca chegaram a suas mãos. De acordo com denúncias, Sonmez fez parte do grupo de cirurgiões criminosos da clínica privada, sediada em Pristina, que atuou em 2008 sob ordem do médico kosovar Lutfi Dervishi. A polícia européia desvendou no ano passado a existência do bando criminoso que se encarregava de enganar aos doadores e de extirpar seus órgãos de maneira ilegal, os quais vendiam por mais de 100 mil euros. Ainda que nenhum dos suspeitos tenha sido preso até o momento, o caso é considerado pelas autoridades judiciais como o mais sério na história recente do território balcânico. Segundo as investigações, alguns dos integrantes da rede de transplantes ilegais tinham ocupado previamente altos cargos no Ministério de Saúde do Kosovo. Vários promotores da UE apresentaram anteriormente acusações contra sete membros do grupo criminoso, todos eles kosovares, enquanto outros dois implicados, um israelense e um turco, eram perseguidos pela Interpol. A porta-voz da Eulex, Irina Gudeljic, afirmou que desconhece se o cidadão turco preso em Istambul seria extraditado para Pristina. Gudeljic deixou ver a possibilidade de que Sonmez estivesse relacionado com as indagações do Conselho Europeu. O relatório de Marty sustenta que todos os casos de tráfico de órgãos humanos de pessoas ao redor do Kosovo foram organizados nos últimos anos pelos mesmos autores, o que põe em evidência os nexos com o caso Clínica Medicus. Pablo Osoria Ramírez é jornalista da Redação Europa da Prensa Latina |
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Que monstruosidade ! Que coisa pavorosa! Mais uma... Quantas mais aconteceram? Quantas estão acontecendo neste momento? Quantas mais ocorrerão?
Quem precisa ser rápida e definitivamente executado, e ter todos os seus órgãos de sustentação devidamente extirpados, é o sistema Capitalista, antes que execute a todos nós.
Jornal do Brasil, 17/12/2010
Salvar os banqueiros e assassinar os pobres
Por Mauro Santayana
OS GOVERNOS da União Europeia se preparam para, uma vez mais, salvar os bancos da crise financeira, sob o pretexto de que isso é necessário, a fim de salvar a economia. Prevê-se uma injeção de capital da ordem de seiscentos bilhões de euros. Com esse dinheiro, aplicado em programas de desenvolvimento econômico e de assistência urgente contra a fome e as endemias e epidemias nos países pobres (como é o caso mais dramático, o do Haiti), seria possível impedir a morte prematura de milhões e milhões de pessoas, sobretudo de crianças. Os banqueiros enriquecem-se com o dinheiro dos depositantes e devedores; distribuem grandes lucros a si mesmos, como representantes dos acionistas, cometem crimes calculados, certos de que os governos os salvarão. É o que ocorre, quase sempre: em lugar de serem punidos, são salvos pelos Estados, que deveriam defender os interesses dos cidadãos que trabalham e produzem bens. Nos últimos tempos globalizantes e neoliberais,o que vem ocorrendo é a mais brutal transferência de renda dos produtores (trabalhadores e empresários industriais) ao sistema financeiro, e a crescente irresponsabilidade dos principais bancos do mundo.
Também ontem se soube que, em Kosovo, na guerra que conduziu à independência, houve a matança organizada e coordenada de sérvios e kosovos-albaneses, para que de seus cadáveres se retirassem os rins, destinados ao mercado negro europeu de órgãos. De acordo com a investigação, realizada por Dick Marty, ex-juiz suíço e atual membro do Conselho da Europa, pelo menos 500 pessoas, presas durante o conflito, foram retiradas das celas improvisadas, conduzidas a locais escolhidos e equipados de instrumental adequado. Ali, uma a uma, recebiam um tiro na cabeça e, ato contínuo.eram estripadas. Os rins imediatamente se destinavam a hospitais e cirurgiões privados que os aguardavam, para atender à demanda dos pacientes na Europa rica.
Os pobres sempre foram vistos como servidores da vida dos ricos, como escravos formais ou sob contratos leoninos de trabalho. O avanço da ciência médica, em lugar de servir para dar-lhes mais tempo de vida saudável, condena-os, em determinadas circunstâncias, a se tornarem vítimas de brutal canibalismo. A eventual doação de órgãos deve ser decidida pelas pessoas enquanto vivas, mediante documentos claros e precisos de sua livre vontade. Como sempre se denuncia - e em alguns casos há indícios fortes, como nessa denúncia de uma pessoa idônea e respeitável, o suíço Marty - os pobres têm servido de conjuntos desmontáveis, como os automóveis roubados, a fim de oferecer peças de reposição aos que podem pagar bem a fim de adiar a própria morte.
E temos outras informações chocantes, como a do surgimento de uma organização de moradores do tradicional bairro da alta classe média de São Paulo, Higienópolis, em defesa de seus cães. Como informou a Folha de S. Paulo, exigem que a prefeitura cuide das praças do bairro elegante, onde seus cães passeiam todos os dias, levados por empregados ou pelos próprios donos, de forma a dar dignidade aos animais. Entre outros benefícios, reivindicam tanques de água fria, para o banho refrescante de seus animais, além da higiene cuidadosa do chão onde transitam.
Como pagam seus impostos municipais, talvez em dia, é provável que a prefeitura os atenda, concedendo existência digna aos cães de raça nobre, como os labradores, são-bernardos, huskies siberianos e pastores belgas, sem esquecer os diminutos lhassas e pequineses.
Quanto às crianças, perambulames pelas ruas, que tratem de ser astutas, para não serem mortas pelos que querem sanear as metrópoles, como ocorreu na Candelária e em outros lugares. Elas e os moradores de rua – mais odiados ainda do que os cães sem dono - não têm tanques onde banhar-se e exalam o odor dos desprezados.
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Há que se lutar implacável e intransigentemente para acabar com a miséria no mundo.
99,99% dos atos de barbárie cometidos são consequências dela.
Jornal do Brasil, 22/11/2009
BARBÁRIE
Por Mauro Santayana
A beleza e a morte
Mais de 60 pessoas, nos primeiros cálculos da polícia peruana, foram assassinadas na região Huánuco, na selva, ao nordeste de Lima, e de seus corpos foi extraída gordura – para o comércio. Quatro dos assassinos foram detidos, mas faltam outros.
Segundo as primeiras informações, um estrangeiro, provavelmente italiano, de acordo com testemunhas, fornecia-lhes uma serra circular finíssima, para que pudessem degolar as vítimas de pé. Em seguida, os corpos eram escarnados e a gordura extraída.
O comprador lhes pagava 15 mil dólares por litro.
Sentimos horror diante das informações de que pessoas sejam mortas para que a sua gordura sirva de matéria-prima, na Europa, para a fabricação de cosméticos. Eram sequestradas, manietadas e mortas; descarnadas, e, depois de extraída a gordura, seus restos eram sepultados no meio da selva. Não é possível que camponeses mestiços morram para que algumas mulheres – que nada sabem disso – possam embelezarse no outro lado do mundo.
Estamos em tempo mais enlouquecido do que supúnhamos.
Em um hospital do Rio, várias crianças recém-nascidas quase morreram, intoxicadas com morfina pela enfermeira. Há alguns anos, enfermeiro do Rio matava pacientes de que cuidava, sob encomenda de corretores de serviços funerários. Adolescentes matam adolescentes, “para ver como é matar alguém”, conforme confessou, nestes mesmos dias, uma menina norte-americana de 15 anos, depois de assassinar outra, de 9. Filhos matam pais, pais matam filhos, como o que, em São Paulo, para vingar-se da mulher que o abandonara, jogou do terraço de um edifício o filho, antes de se matar.
Há 31 anos – em 18 de novembro de 1978 – o “pastor” norteamericano Jim Jones levou 913 pessoas ao suicídio: 276 delas crianças, em uma comunidade que criara na Guiana Inglesa. Os nazistas faziam abajures com peles de judeus, de ciganos e de outros prisioneiros, curtidas com cuidado – conforme os horripilantes testemunhos daquele tempo brutal. Mas não é preciso recuar tanto no tempo.
Além dos crimes cometidos no Vietnã, no Iraque ainda sobrevivem milhares de crianças, das que, atingidas pelas bombas de fragmentação produzidas com material radioativo, contraíram leucemia e outros tipos de câncer. E os massacres se repetem. No Afeganistão e no Paquistão, os ataques das tropas invasoras e os atentados, quase diários, matam – e matam, quase sempre, pessoas inocentes.
É provável que os mesmos crimes estejam ocorrendo em outros lugares do mundo pobre. Se o primeiro preço do produto é de 15 mil dólares o litro, deve ser de mil vezes mais o do creme final.
Trata-se do horrível conluio entre Eros, que incita à busca da beleza, e seu eterno adversário, Tanatos, o senhor da Morte. Nesse caso peruano, e em outros casos semelhantes – como o da falsa adoção e do sequestro de crianças para o “desmonte” em clínicas europeias, há o mesmo fator horripilante: a miséria. É a miséria que produz as vítimas “doadoras”, de fígados e de gordura, e seus algozes imediatos, os assassinos e pequenos traficantes.
Mais de 60 pessoas, nos primeiros cálculos da polícia peruana, foram assassinadas na região Huánuco, na selva, ao nordeste de Lima, e de seus corpos foi extraída gordura – para o comércio. Quatro dos assassinos foram detidos, mas faltam outros.
Segundo as primeiras informações, um estrangeiro, provavelmente italiano, de acordo com testemunhas, fornecia-lhes uma serra circular finíssima, para que pudessem degolar as vítimas de pé. Em seguida, os corpos eram escarnados e a gordura extraída.
O comprador lhes pagava 15 mil dólares por litro.
Sentimos horror diante das informações de que pessoas sejam mortas para que a sua gordura sirva de matéria-prima, na Europa, para a fabricação de cosméticos. Eram sequestradas, manietadas e mortas; descarnadas, e, depois de extraída a gordura, seus restos eram sepultados no meio da selva. Não é possível que camponeses mestiços morram para que algumas mulheres – que nada sabem disso – possam embelezarse no outro lado do mundo.
Estamos em tempo mais enlouquecido do que supúnhamos.
Em um hospital do Rio, várias crianças recém-nascidas quase morreram, intoxicadas com morfina pela enfermeira. Há alguns anos, enfermeiro do Rio matava pacientes de que cuidava, sob encomenda de corretores de serviços funerários. Adolescentes matam adolescentes, “para ver como é matar alguém”, conforme confessou, nestes mesmos dias, uma menina norte-americana de 15 anos, depois de assassinar outra, de 9. Filhos matam pais, pais matam filhos, como o que, em São Paulo, para vingar-se da mulher que o abandonara, jogou do terraço de um edifício o filho, antes de se matar.
Há 31 anos – em 18 de novembro de 1978 – o “pastor” norteamericano Jim Jones levou 913 pessoas ao suicídio: 276 delas crianças, em uma comunidade que criara na Guiana Inglesa. Os nazistas faziam abajures com peles de judeus, de ciganos e de outros prisioneiros, curtidas com cuidado – conforme os horripilantes testemunhos daquele tempo brutal. Mas não é preciso recuar tanto no tempo.
Além dos crimes cometidos no Vietnã, no Iraque ainda sobrevivem milhares de crianças, das que, atingidas pelas bombas de fragmentação produzidas com material radioativo, contraíram leucemia e outros tipos de câncer. E os massacres se repetem. No Afeganistão e no Paquistão, os ataques das tropas invasoras e os atentados, quase diários, matam – e matam, quase sempre, pessoas inocentes.
É provável que os mesmos crimes estejam ocorrendo em outros lugares do mundo pobre. Se o primeiro preço do produto é de 15 mil dólares o litro, deve ser de mil vezes mais o do creme final.
Trata-se do horrível conluio entre Eros, que incita à busca da beleza, e seu eterno adversário, Tanatos, o senhor da Morte. Nesse caso peruano, e em outros casos semelhantes – como o da falsa adoção e do sequestro de crianças para o “desmonte” em clínicas europeias, há o mesmo fator horripilante: a miséria. É a miséria que produz as vítimas “doadoras”, de fígados e de gordura, e seus algozes imediatos, os assassinos e pequenos traficantes.
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