Carta Maior, 18/03/2016
Os juízes promotores da demência no Brasil
Por Flavio Aguiar
Em conjunto, eles se acham a nova encarnação
da Santa Ceia: um bando de apóstolos, em torno de um Messias. Não há
Judas no meio deles, no entanto. O Judas está fora, deve ser caçado,
condenado, expurgado, esfolado vivo, trancafiado, e impedido de
concorrer ao que quer que seja daqui para a frente.
Ao
redor deles, o Supremo Juiz, mais alguns, os áulicos promotores, a
soldadesca da PF à solta age como se fora a Legião de Anjos da Morte
enviados para limpar o antigo Egito de seus, não, de seu primogênito.
De todo modo, o melhor que poderá acontecer a toda esta caterva de medíocres e arrogantes será caírem no esquecimento da História. Que o pó lhes seja leve.
Flávio Aguiar reside atualmente na Alemanha, onde atua como correspondente para publicações brasileiras. Pesquisador e professor de Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, tem mais de trinta livros de crítica literária, ficção e poesia publicados. Ganhou por três vezes o prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro
Agem de modo semelhante como agia o bando de
oficiais da Aeronáutica reunidos em torno de Carlos Lacerda nos anos 50,
contra Vargas, fanatizados ídolos e próceres de uma classe média
ascendida que se sentia ameaçada pelos aumentos do salário mínimo
concedidos pelo governo de Vargas. O manifesto das forças terrestres se
chamava “O manifesto dos coronéis”. Entrou para a vergonha da história
brasileira.
Hoje
os coronéis e outros oficiais estão recolhidos a sua função
constitucional, o que é bom para todos. Então o conluio messiânico, que
corresponde aos anseios das hordas fascistas reunidas em todo o Brasil
mas sobretudo na Avenida Paulista, encontra representação na seara
jurídica.
Não
surpreende. O sistema judiciário brasileiro sempre foi o setor mais
conservador da nossa sociedade. Mais que os militares. Ele é presa
constante, por exemplo, da Opus Dei. Ele goza de um sentimento
corporativo entre seus pares maior do que o militar, o eclesiástico e o
universitário juntos. Por isto a atitude de Moro, da trinca Cássio Marx,
José Carlos Engels e Fernando Hegel, de outros juízes e motores
açodados em busca de manchetes apressadas, não surpreende.
Há
uma novidade. Olhando-se a foto dos juízes militares que julgavam a
então futura presidenta Dilma nos temos da Resistência Armada à Ditadura
de 64, vê-se que eles, pudicamente, tapam os olhos, como aqueles
macaquinhos de prateleira, já que tapavam os ouvidos aos direitos da
acusada e tapavam a boca desta. Agora não. Estes promotores da demência e
os juízes da agonia do regime democrático escancaram a face, os olhos
cúpidos ou fascistas, e arreganham os dentes em sorrisos que mais
parecem escárnios, na TV Globo, nas manifestações de estilo
nazi-messiânico que promovem o ego ressentido dos que se sentem
prejudicados pela melhora da situação dos pobres que as administrações
populares promoveram, não só na esfera federal, mas em todas, as
estaduais e as municipais também.
Como
dito antes, eles pensam que são os enviados do Senhor: a Corte do
Justiceiro que desce do Planalto de Curitiba em busca de galgar o
Planalto do Palácio ou o Palácio do Planalto (alguém ainda duvida que
Moro quer ser o Berlusconi brasileiro?).
Mas
quem são eles na verdade? O prometido Messias é um juiz medíocre,
vingativo ao ponto de ao se ver privado de seu alvo, o ex-presidente,
fazer operações escusas e ilegais que apenas coroam sua carreira de
violações dos direitos básico da cidadania, um proto-fascista em busca
de seu público-alvo. Já pensaram num juiz que diz que “se deve ouvir a
voz das ruas”? Alguém se lembra do imortal filme dirigido por Stanley
Kramer, O julgamento de Nuremberg (1961, Oscar de melhor ator
coadjuvante para Maximilian Schell no papel do advogado de defesa dos
nazistas)? Um juiz tão medíocre que, sem saber o que faz, cita a
'Operação Mãos Limpas', um desastre para a Itália, e o 'caso Watergate', uma
bênção, ainda que tardia, para os EUA, em seu favor. Só dá pra dizer:
perdoamos, porque ele não sabe o que fala.
Sobre
a trinca pseudo-marxista e hegeliana já se falou. Quanto aos restantes,
bem, serão lembrados não como as legiões do Senhor, mas as hordas nazis
que perseguiam judeus e inimigos do regime, remanescentes da ditadura
de 64, cujo final melancólico estava mais para um regime policial (que é
o que querem implantar agora) do que até mesmo para um regime militar
stricto sensu.
O
juiz Moro assinou sua completa falência ao declarar que o grampo que
divulgara era ilegal, que a divulgação, portanto, era ilegal, mas que
“isso não era relevante”. Caramba, eu não votaria neste homem nem para
juiz de futebol de várzea, até porque pela fama que está criando ele
seria trucidado no primeiro pênalti que marcasse. Ele conta com a Rede Globo, a Folha, o Estadão, o Globo, etc.
Mas
não adianta. Ele vai entrar para a história como o Grande Torquemada do
século XXI no Brasil. Os outros, como os pequenos. A PF comprometida
com tais desmandos, como os neo-SS ou neo-SA ou ainda neo-pandorgas da
ditadura que se queria impingir ao Brasil.
De todo modo, o melhor que poderá acontecer a toda esta caterva de medíocres e arrogantes será caírem no esquecimento da História. Que o pó lhes seja leve.
Flávio Aguiar reside atualmente na Alemanha, onde atua como correspondente para publicações brasileiras. Pesquisador e professor de Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, tem mais de trinta livros de crítica literária, ficção e poesia publicados. Ganhou por três vezes o prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro
Blog do Santayana, 12/01/16
O diabo e a garrafa
Por Mauro Santayana
Em pleno processo de impeachment, e de julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), das ações envolvendo a chapa vitoriosa nas últimas eleições, a situação da República tem sido marcada pela espetacularização de um permanente “pega para capar” jurídico-policial, a ascensão da “antipolítica”, o aprofundamento da radicalização e a fascistização do país.
A
do messianismo, da vaidade, da onipotência e do imponderável, e a do
oportunismo e do fascismo – e aqui não nos referimos ao velho fascio
italiano – em seu estado mais puro, ensandecido e visceral.
Em pleno processo de impeachment, e de julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), das ações envolvendo a chapa vitoriosa nas últimas eleições, a situação da República tem sido marcada pela espetacularização de um permanente “pega para capar” jurídico-policial, a ascensão da “antipolítica”, o aprofundamento da radicalização e a fascistização do país.
Políticos e
empresários têm sido presos – muitos por ilações frágeis ou exagerado
rigor cautelar –, enquanto outros homens públicos e bandidos e delatores
premiados apanhados com milhões de dólares na Suíça circulam livremente
ou estão em prisão domiciliar.
Milhares de
brasileiros acreditam piamente que o Brasil é um país quebrado e
destruído, quando temos as sextas maiores reservas internacionais do
mundo e somos o terceiro maior credor individual externo dos Estados
Unidos.
Que um perigoso
“bolivarianismo” pretende implementar uma ditadura de esquerda na
América Latina, quando, seguindo os ritos democráticos normais, e sob
amplo acompanhamento de observadores internacionais, a oposição liberal
acaba de ganhar, pelo voto, as eleições na Venezuela e na Argentina.
Que o Brasil é um
país comunista quando pagamos juros altíssimos, e somos,
historicamente, dominados, na economia e na política, por um dos mais
poderosos sistemas financeiros do mundo, pelo agronegócio e o
latifúndio, por bancos e empresas multinacionais.
Discutindo na
mesa de pôquer da sala de jogos do Titanic, envolvidos por suas
disputas, e por uma rápida sucessão de fatos e acontecimentos, que têm
cada vez mais dificuldade em digerir e acompanhar, os homens públicos
brasileiros ainda não entenderam que a criminalização da política,
criada por eles mesmos, como parte de uma encarniçada e deletéria
disputa pelo poder, há muito extrapolou o meio político tradicional,
espalhando-se, como o diabo que escapa da garrafa, como uma peste pela
sociedade brasileira, na forma de uma profunda ojeriza, preconceito e
desqualificação do sistema político, e daqueles que disputam e detêm o
voto popular.
Se não se
convocar a razão e o bom senso, para reagir ao que está acontecendo, e
se estabelecer um patamar mínimo de normalidade político-institucional,
tudo o que restará será o confronto, o arbítrio e o caos.
Está muito enganado quem acha que o mero impedimento de Dilma Rousseff resolverá a questão.
No final da
década de 20, os judeus conservadores comemoravam, da varanda de suas
mansões, na Alemanha, o espancamento, nas ruas, de esquerdistas e
socialistas, pelos guardas de grupos paramilitares nazistas como as SS e
as SA, e se regozijavam, em seu íntimo, por eles os estarem livrando da
ameaça bolchevista.
Depois também
viram passivamente – achando que estariam resguardados por suas fortunas
– passar sob suas janelas, as filas de operários e pequenos
comerciantes judeus a caminho dos campos de concentração – até chegar a
sua vez de ocupar, como sardinhas em uma lata, o seu lugar nas câmaras
de gás.
Poucas vezes, na
história, o efeito bumerangue costuma poupar aqueles que, como
aprendizes de feiticeiro, se atrevem a cutucar o que está dentro da
caixa de Pandora.
Depois de Dilma e
do PT, seria a vez de Temer, e depois de Temer virão os outros – todos
os partidos e lideranças que tenham alguma possibilidade de alcançar o
poder, por via normal.
Parafraseando Milton Nascimento, na política brasileira “nada será como antes amanhã”.
O Brasil que se
seguirá à batalha sem quartel e sem piedade, levada a cabo pela oposição
nos últimos anos e meses tendo como fim a destruição e total
aniquilamento do PT – cujas principais vítimas não serão esse partido,
mas o Estado de Direito, o presidencialismo de coalizão, a
governabilidade e a própria Democracia – não terá a cara do Brasil do
PSDB de Serra, de Aécio, ou de FHC, mas, sim, a de Moro e a de
Bolsonaro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário