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3/06/2012
Mauro Santayana
Combalida política e economicamente, por uma crise
que se aprofunda a cada dia, também do ponto de vista social - e pela erosão de
sua credibilidade internacional - a Espanha e sua diplomacia parecem não ter
aprendido nada com as dolorosas lições dos últimos anos.
De passagem por Brasília, aonde vem oferecer,
segundo a imprensa ibérica, onze anos depois de sua última visita ao nosso
país, uma “aliança política e econômica sem precedentes”, o Rei Juan Carlos tem
como destino final na América do Sul, o observatório chileno de Cerro Paranal,
a fim de agregar-se, como “observador”, no dia 6 de junho, à cúpula
presidencial da Aliança do Pacífico.
Essa, para quem não conhece, é uma organização patrocinada pelo México e pela
Espanha, que nasce com o claro objetivo de se contrapor à ampliação da presença
brasileira na América do Sul, e que reúne, além do México, o Chile, o Peru
e a Colômbia.
Com a Aliança do Pacífico, a Espanha, que não pode
participar de reuniões do Mercosul, da UNASUL e da CELAC, nem mesmo como
observadora, contaria – depois do rotundo fracasso de suas cúpulas
“ibero-americanas”- com novo instrumento
para imiscuir-se nos assuntos do nosso continente.
O outro aliado com que contam os espanhóis nesse
processo de tentar promover a divisão sul-americana, é o Paraguai, país tradicionalmente pendular em suas relações externas,
que joga para beneficiar-se da ajuda ora do Brasil, ora da Argentina, ora da
Espanha, dependendo do momento e das circunstâncias.
Não foi por outro motivo que o Paraguai aceitou
promover a fracassada cúpula “ibero-americana” de Assunção, em novembro do ano
passado, que terminou com a ausência dos países mais importantes da região, mas
contou com a presença justamente do México e do Chile, co-patrocinadores da
“Aliança do Pacífico”.
É também importante registrar, nesse contexto, a
posição do parlamento paraguaio que
impede, há anos, a expansão do Mercosul, ao não ratificar a entrada da
República da Venezuela no Tratado, já aprovada pelos outros membros do bloco.
A diplomacia brasileira, com a chegada do Rei Juan
Carlos a Brasília nesta segunda-feira – data em que ocorrerá, em Madri, reunião
“técnica” para discutir a questão da expulsão de brasileiros dos aeroportos
espanhóis nos últimos anos - tem excelente
oportunidade para deixar claro que não concorda com a interferência externa no
espaço sul-americano.
Com relação ao Paraguai, qualquer concessão do
grupo, no futuro, poderia ser negociada – em todas as instâncias, incluída a
parlamentar - de forma a obter rápida aprovação à entrada da República da Venezuela
no Tratado do Mercosul. Enquanto isso, nada impede que o Uruguai, a Argentina e
o Brasil possam negociar acordos bilaterais de livre comércio com Caracas.
É difícil, tendo em vista a formação histórica de
nossos países, que a tentativa de divisionismo entre o Brasil e os países
ocidentais do continente tenha êxito. O México sempre foi uma realidade à
parte, menos durante o governo
nacionalista de Cárdenas, quando seus atos o incluíam na mesma ordem de
pensamento de Getúlio Vargas. Como se recorda, Cárdenas nacionalizou o petróleo em 1938, sem que os Estados Unidos, já
em preparação para a guerra, tomasse qualquer medida de retaliação. Nos últimos trinta anos, no entanto, os
governos do México têm sido fiéis vassalos dos Estados Unidos e é, sem dúvida, a serviço de Washington,
que sua diplomacia atua ao lado do Chile e de Madri.
Há razões ainda mais antigas que tornam difícil
essa aliança da Costa do Pacífico. O povo peruano não se esquece, até hoje, da ocupação de Lima pelas forças chilenas, em
janeiro de 1881, na Guerra do Pacífico, que lhe custou a amputação de parte
de seu território (a Província de Tacna) por 50 anos, só recuperada depois de
imensos sacrifícios e desgastantes negociações diplomáticas.
A Bolívia sofreu ainda mais com
os chilenos: todo o litoral do Pacífico que lhe pertencia (a rica e extensa
província de Antofagasta) foi anexado, e La Paz perdeu seu acesso ao oceano. Esse conflito – provocado pelos interesses ingleses e norte-americanos –
não foi completamente superado, e é uma lição de como os estranhos, com suas
intrigas, causam as tragédias ao fomentar as guerras entre vizinhos.
Essa mesma interferência estrangeira – no caso, das
empresas petrolíferas americanas e inglesas – provocou a carnificina da Guerra do Chaco, entre a Bolívia e o
Paraguai, nos anos 30 do século passado.
O México rompeu relações com a Espanha e dela
esteve distanciado até o fim do franquismo. Hoje, apesar da submissão de sua
política externa aos Estados Unidos, grande parte da opinião pública mexicana
rejeita aproximação maior com Madri.
Não há qualquer razão para que a Espanha de Juan
Carlos, que vem sacrificando seu grande povo, em favor dos exploradores de
sempre (hoje reunidos na globalização do neoliberalismo), venha a se meter no
encontro de Cerro Paranal.
Isso só se explica pela desesperada busca de apoio
internacional, no momento em que sua economia e suas instituições (sobretudo a
monarquia) entram em acelerado declínio de credibilidade interna.
Com suas grandes empresas e bancos endividados (só
a Telefónica, que atua no Brasil com a marca Vivo, deve mais de 100 bilhões de
dólares), reduz-se o prestígio internacional do governo e da monarquia
espanhola. O Rei – é o que se diz na imprensa espanhola – vem nos propor
“relações políticas e econômicas sem precedentes”. Em lugar de relações novas e excepcionais, os brasileiros querem, no
mínimo, ser tratados com respeito em território espanhol, quando viajarem à
Europa.
A cortesia diplomática recomenda que recebamos bem
o Rei – em nome do respeito ao povo espanhol – mas os nossos interesses no mundo recomendam que não nos comprometamos com
um governo que está arrochando seu povo com medidas econômicas draconianas,
enquanto os ricos continuam saqueando os trabalhadores e retirando seus
capitais do país.
A queda da popularidade de Piñera no Chile, a
aproximação crescente do Brasil com a Colômbia, e a iminência de um governo de
esquerda no México, retiram da monarquia espanhola espaço para suas manobras
diplomáticas em nossa região.
Será melhor que o Brasil, como agiu quando da
reunião anterior, no Paraguai, se ausente do próximo encontro de Chefes de
Estado dos paises “ibero-americanos”, previsto para realizar-se na cidade de
Cadiz, na Espanha, em novembro deste ano. Para
discutir o futuro dos nossos países contamos com a UNASUL e o Conselho de
Defesa Sul-americano, e, no contexto do espaço ampliado da América Latina, com
a CELAC. Nós, e nossos vizinhos, não
temos nada a fazer do outro lado do Atlântico, assim como a elite neocolonial
de nossas antigas metrópoles não têm nada a fazer, institucionalmente, do lado
de cá do oceano.
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Na foto abaixo, uma representante da verdadeira nobreza, aquela nobreza que realmente conta, tendo sua mão beijada.
O rei Juan Carlos, da Espanha, beija a mão da presidente Dilma Rousseff durante audiência no Palácio do Planalto, em Brasília. Pedro Ladeira/AFP
UOL, 04/06/2012 06h00
Rei da Espanha se reúne com Dilma em meio a constrangimento por questões migratórias
Do UOL, em São Paulo*
O rei Juan Carlos, chefe do Estado espanhol, tem um encontro marcado com a presidente Dilma Rousseff nesta segunda-feira (4), para um encontro que vai tratar de questões econômicas, em meio à crise na Europa. No entanto, outro tema também deverá chamar a atenção na pauta das conversas: a crise relacionada ao trânsito de turistas entre os dois países.
A visita ocorre em um momento de constrangimento recíproco entre os dois países, causado principalmente pela polêmica sobre o tratamento dado aos brasileiros que viajam à Espanha.
De acordo com assessores que preparam a visita, o rei deverá usar sua
imagem de chefe de Estado para amenizar a situação na conversa com a
presidente. Disposto a desfazer o mal-estar causado pelas questões
migratórias, o rei Juan Carlos deverá discursar em português e em
espanhol nesta segunda.
No momento em que o rei visita o Brasil ocorre, em Madri, uma
reunião bilateral sobre questões migratórias, com a participação da
ministra Maria Luiza Lopes da Silva, diretora da Divisão de Políticas
Consulares e de Brasileiros no Exterior do Ministério de Relações
Exteriores (MRE). O desconforto entre os dois países é causado
principalmente pelo tratamento considerado “inadequado” conferido pelas
autoridades espanholas aos brasileiros que chegam ao país ibérico.Também nesta segunda, a ministra debaterá com representantes do Ministério das Relações Exteriores da Espanha propostas para facilitar a entrada de turistas nos dois países e melhorar a cooperação quando houver casos de inadmitidos.
A reunião foi agendada depois que o governo brasileiro decidiu endurecer as condições exigidas aos turistas espanhóis, em resposta aos impedimentos denunciados por brasileiros em sua chegada à Espanha. As novas normas, que entraram em vigor no dia 2 de abril, estabelecem que os espanhóis que viajarem ao Brasil devem ter passagem de ida e volta e comprovante de reserva em um hotel. Quem for ficar na casa de amigos ou parentes tem que mostrar uma carta-convite assinada pelo anfitrião e registrada em cartório, além de um comprovante de residência de seu hóspede. Também precisa comprovar ter, no mínimo o equivalente a R$ 170 diários para bancar a permanência e passaporte válido por pelo menos seis meses.
O Brasil alega que as dificuldades que seus cidadãos encontram para entrar na Espanha são maiores que em outros países do espaço Schengen, a zona da União Europeia com livre circulação de pessoas.
A Espanha quer discutir as aplicações das normas migratórias no trânsito de cidadãos. A intenção da Espanha é que a boa relação política que existe entre os dois países sirva para encontrar uma solução para evitar que se repitam "inadmissões injustificadas" e mal-entendidos.
Soluções cogitadas
Em abril de 2008, houve um acordo para que policiais brasileiros pudessem cooperar no aeroporto de Barajas, em Madri, para reforçar as garantias na aplicação das regras de admissão no espaço da União Europeia. Também naquela ocasião se previu a possibilidade de que policiais espanhóis pudessem trabalhar no Brasil com o mesmo propósito.
Desde 2007, cerca de 11 mil brasileiros foram barrados ao tentar entrar na Espanha, um número que, apesar de ser considerado alto pelas autoridades brasileiras, vem caindo ao longo dos anos, devido a esforços diplomáticos do governo brasileiro para que a Espanha defina bem os critérios exigidos para a entrada no país.
Em 2007, 3.013 brasileiros não foram admitidos. Em 2008, de acordo com dados do Itamaraty, esse número foi 2.196. Já em 2009, o numero de brasileiros inadmitidos no país europeu caiu para 1.714 e em 2012 foram 1.695 os barrados. No ano passado, 1.402 brasileiros tiveram que retornar ao Brasil ao serem impedidos de entrar na Espanha e até 30 de abril deste ano foram 299, de acordo com dados levantados pelo governo brasileiro.
O número que não diminui, no entanto, de acordo com o MRE, é o de queixas dos brasileiros em relação ao tratamento recebido das autoridades espanholas. A inadequação relatada nas queixas reflete problemas no trato, nas acomodações e no tempo em que os brasileiros precisam esperar para que se proceda a volta ao país. Na Espanha, houve casos de cidadãos brasileiros ficarem até três dias detidos no aeroporto.
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