Draghi, do BCE: trabalha para a Europa ou para o Goldman Sachs?
Jornal do Brasil, 28/04/2011
Os bancos, a desigualdade e o ocaso da velha Europa
Por Mauro Santayana
Pode ser um bom sinal: chamado às
falas pelo Parlamento Europeu e pela Comissão Européia, o fiel
funcionário do Banco Goldman Sachs, que preside ao Banco Central
Europeu, Mário Draghi, gaguejou. Não pôde explicar aonde foram parar o
trilhão de euros que os países centrais da Europa emitiram e entregaram
ao BCE, a fim de recuperar a economia do bloco. De acordo com Michel
Barnier, Comissário da União Européia encarregado do mercado interno do
grupo, que inclui os serviços financeiros, e de Durão Barroso, o
presidente da Comissão Européia, os bancos beneficiados com os recursos,
repassados pelo BCE a juros inferiores a 1%, não os usaram no estímulo à
economia. Ao contrário, continuaram emprestando aos estados em
dificuldades, a juros que vão de 6 a 10%. Quanto mais dificuldades
enfrentam, mais altos são os juros, em uma espiral de arrocho,
desemprego e miséria de seus povos.
Mesmo com os imensos recursos de caixa,
os bancos privados – encabeçados pelo famigerado Goldman Sachs –
reduziram seus financiamentos às empresas em 30% e os empréstimos aos
correntistas privados em 43%. As condições para a concessão de créditos à
economia real se tornaram ainda mais duras. E os empréstimos aos
Estados se fazem sob exigências draconianas.
O Banco Central Europeu não pode
emprestar diretamente aos Estados. Como todos os bancos centrais,
eles são servidores dos banqueiros, e, de modo geral, operam com
autonomia. Temos que sujeitar o nosso Banco Central ao controle direto
do poder executivo.
Os bancos, na confidência de um
banqueiro europeu anônimo, usam os empréstimos do BCE para refinanciar
seus balanços, e soltam o dinheiro a filete de água para o financiamento
da produção, do comércio e dos serviços. Esse procedimento faz com que a
Europa siga o desastre americano e inglês, que se iniciou em 1980, com
Madame Thatcher e Reagan. Nestes últimos trinta anos, nos Estados
Unidos, o famoso um por cento dos americanos mais ricos viram sua renda
multiplicar 300 vezes. Os americanos mais pobres tiveram um aumento de
40% em seus rendimentos, mas em conseqüência da participação intensiva
das mulheres no trabalho. Essa participação, exigida pela crescente
dificuldade dos lares, fez com que houvesse uma melhoria na renda
familiar. Sem isso, só com o trabalho dos homens, não teria havido
nenhuma melhoria.
A economia moderna – na avaliação de
John Plender, um dos mais lúcidos analistas do Financial Times – parece
ter duas pistas: uma de altíssima velocidade para os ricos, e outra,
vagarosa, para os pobres. Segundo o próprio Financial Times, em matéria
de janeiro deste ano, os conselhos de administração das grandes
empresas, notadamente as do setor financeiro, têm fixado a remuneração
de seus presidentes-diretores gerais em 400 vezes o salário de seus
empregados de base. Há três décadas, essa diferença, já extremamente
injusta, era de 40 vezes.
O sistema financeiro se tornou
incontrolável, nos quadros legais de hoje, na medida em que se tornou
grosseiramente obeso, na observação do mesmo jornal britânico.
Os estados nacionais abdicaram do
senhorio da moeda, em favor do BCE (leia-se, do Goldman Sachs) mediante o
Mecanismo Europeu de Estabilização. Os gestores desse “Mecanismo”,
entre outros absurdos, não podem ser processados pela justiça. São
invioláveis e impunes, cometam as irregularidades que possam cometer.
Por essas razões, começa a crescer, nos meios políticos europeus, a
idéia de que é preciso estatizar logo os bancos, antes que a impaciência
popular leve a soluções radicais, mediante a articulação
revolucionária, ou a ascensão da extrema-direita, que tampouco ama os
banqueiros.
O controle mais efetivo da moeda pelos
Estados, e sua intervenção direta no processo econômico são o caminho
natural para impedir o fim do sistema democrático, ao reduzir a brutal
desigualdade entre ricos e pobres e entre países marginalizados pela
pobreza e as economias mais desenvolvidas.
Mário Draghi reconheceu que os bancos
não atuam como seria de esperar. E prometeu dar explicações mais
detalhadas das providências que pretende tomar. Vamos ver o que dirá o
fiel servidor do Goldman Sachs.
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