São Paulo, quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Os americanos criaram o agente 171
ELIO GASPARI
A CENA parece ter saído de um filme barato. Dois agentes americanos encrencam-se ao desembarcar num país tropical, têm seus passaportes apreendidos e são informados de que devem esperar pela decisão de um juiz. Na cena seguinte eles desaparecem. Como saíram do país? Coisa de heróis de filmes de segunda. Podem ter usado papéis inadequados. Também podem ter dado um daqueles telefonemas misteriosos, recebendo um envelope na portaria do hotel.
Não foi cena de filme. Aconteceu no Brasil. No dia 1º de outubro passado ocorreu um incidente durante o voo 128 da Continental Airlines que partiu de Houston para o Rio de Janeiro. Uma passageira (Fabíola Fantinato) desentendeu-se com as atendentes do serviço de bordo e a tripulação acionou os dois agentes da Transport Security Administration, a TSA, que viajam nas aeronaves americanas para prevenir desordens e até mesmo sequestros. Os policiais, Alan Doyle e Aaron Thomas, imobilizaram a passageira, algemando-a. Ela teria mordido um deles.
Ao desembarcar, os agentes entregaram a senhora à polícia do aeroporto, mas como ela dizia ter sido agredida e apresentara queixa, tiveram seus passaportes apreendidos. Segundo seu advogado, tinha sinais de violência nos seus braços, nas costas e no canto do olho esquerdo. Por ordem de um juiz federal, os agentes deveriam comparecer a uma audiência, marcada para a semana seguinte. A passageira é mulher do juiz estadual Marcos Fantinato.
No dia marcado, viu-se que os dois agentes evaporaram. Segundo uma versão que circula nos Estados Unidos, divulgada pela CNN, eles receavam ser constrangidos por conta do parentesco da senhora. Temiam um malfeito e, para evitá-lo, praticaram outro. Legalmente, não poderiam deixar o país sem os passaportes. Se saíram com documentos inadequados, é uma coisa. Se obtiveram papéis com as autoridades consulares americanas, é coisa pior. Em qualquer caso, se agentes estrangeiros fizerem coisa parecida nos Estados Unidos, seu governo ouvirá poucas e boas.
Talvez o embaixador Thomas Shannon não saiba, mas funcionários do governo americano já protegeram cidadãos encrencados com a Justiça brasileira.
Em 1966 quatro contrabandistas foram presos na Amazônia. Tinham contatos com um poderoso senador e armou-se um carteiraço. O general Vernon Walters, adido militar americano, foi instruído para levar o caso ao seu amigo marechal Castello Branco, presidente do Brasil. Pela narrativa do filho de Castello, dias depois as celas da Polícia Federal amanheceram abertas e os presos sumiram.
Até agora, o governo brasileiro fez de conta que não houve nada com os agentes da TSA. Há uma semana o ministro da Defesa, Nelson Jobim, esteve com Janet Napolitano, czarina da vigilância interna americana e assinou um acordo de segurança aérea. Segundo a assessoria da senhora, não trataram do sumiço. Pena, porque, no mínimo, os agentes iludiram os controles de aeroporto da Polícia Federal e debocharam de uma ordem judicial. No máximo, a embaixada americana, sabendo do ocorrido, contribuiu para a malfeitoria.
O escritor inglês Ian Fleming criou o agente 007, imortalizado por James Bond, com licença para matar. O governo americano criou os agentes 171, com licença para passar a perna nos outros.
ELIO GASPARI
A CENA parece ter saído de um filme barato. Dois agentes americanos encrencam-se ao desembarcar num país tropical, têm seus passaportes apreendidos e são informados de que devem esperar pela decisão de um juiz. Na cena seguinte eles desaparecem. Como saíram do país? Coisa de heróis de filmes de segunda. Podem ter usado papéis inadequados. Também podem ter dado um daqueles telefonemas misteriosos, recebendo um envelope na portaria do hotel.
Não foi cena de filme. Aconteceu no Brasil. No dia 1º de outubro passado ocorreu um incidente durante o voo 128 da Continental Airlines que partiu de Houston para o Rio de Janeiro. Uma passageira (Fabíola Fantinato) desentendeu-se com as atendentes do serviço de bordo e a tripulação acionou os dois agentes da Transport Security Administration, a TSA, que viajam nas aeronaves americanas para prevenir desordens e até mesmo sequestros. Os policiais, Alan Doyle e Aaron Thomas, imobilizaram a passageira, algemando-a. Ela teria mordido um deles.
Ao desembarcar, os agentes entregaram a senhora à polícia do aeroporto, mas como ela dizia ter sido agredida e apresentara queixa, tiveram seus passaportes apreendidos. Segundo seu advogado, tinha sinais de violência nos seus braços, nas costas e no canto do olho esquerdo. Por ordem de um juiz federal, os agentes deveriam comparecer a uma audiência, marcada para a semana seguinte. A passageira é mulher do juiz estadual Marcos Fantinato.
No dia marcado, viu-se que os dois agentes evaporaram. Segundo uma versão que circula nos Estados Unidos, divulgada pela CNN, eles receavam ser constrangidos por conta do parentesco da senhora. Temiam um malfeito e, para evitá-lo, praticaram outro. Legalmente, não poderiam deixar o país sem os passaportes. Se saíram com documentos inadequados, é uma coisa. Se obtiveram papéis com as autoridades consulares americanas, é coisa pior. Em qualquer caso, se agentes estrangeiros fizerem coisa parecida nos Estados Unidos, seu governo ouvirá poucas e boas.
Talvez o embaixador Thomas Shannon não saiba, mas funcionários do governo americano já protegeram cidadãos encrencados com a Justiça brasileira.
Em 1966 quatro contrabandistas foram presos na Amazônia. Tinham contatos com um poderoso senador e armou-se um carteiraço. O general Vernon Walters, adido militar americano, foi instruído para levar o caso ao seu amigo marechal Castello Branco, presidente do Brasil. Pela narrativa do filho de Castello, dias depois as celas da Polícia Federal amanheceram abertas e os presos sumiram.
Até agora, o governo brasileiro fez de conta que não houve nada com os agentes da TSA. Há uma semana o ministro da Defesa, Nelson Jobim, esteve com Janet Napolitano, czarina da vigilância interna americana e assinou um acordo de segurança aérea. Segundo a assessoria da senhora, não trataram do sumiço. Pena, porque, no mínimo, os agentes iludiram os controles de aeroporto da Polícia Federal e debocharam de uma ordem judicial. No máximo, a embaixada americana, sabendo do ocorrido, contribuiu para a malfeitoria.
O escritor inglês Ian Fleming criou o agente 007, imortalizado por James Bond, com licença para matar. O governo americano criou os agentes 171, com licença para passar a perna nos outros.
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