Pluridade afetiva brasileira (Pluriafetividade)
Por
Fernando Moura Peixoto
“O Amor, que não
ousa dizer seu nome
Bateu-lhe à porta, ao acaso, um dia.
E ele, inebriado pela cotovia
(que paira à janela, mas depois some...),
Sentiu crescer, súbito, na alma, u'a fome
De algo que, até então,
desconhecia.
Desejo... estranheza... culpa... agonia...!
Desce aos umbrais, na angústia que o consome!
... Porém, depois das lágrimas enxutas,
Chamou a cotovia, deu-lhe frutas,
E sorveram, um no outro, a própria essência.
E ambos, nessa atração de semelhantes,
Num cingir de músculos, os amantes
Ergueram-se aos portais da transcendência.”
Oscar Wilde (1854
– 1900)
De “O amor que não ousa dizer seu nome”, clássico poema de 1876 do irlandês dublinense Oscar Wilde (1854 – 1900), escritor, poeta e
dramaturgo, direto ao século 21, com “O amor que ousa dizer seu nome”, livro escrito em 2005 pelo literato, romancista, ensaísta e acadêmico
francês Dominique
Fernandez, nascido em 1929, em Neuilly-sur-Seine).
No cromatismo iriado e libertário representativo do
movimento LGBT*S (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros e
Simpatizantes), João pode gostar de João, e Maria, de Maria, ou ainda,
de João e de Maria ao mesmo tempo, e vice-versa, numa PLURALIDADE AFETIVA do relacionamento humano contemporâneo – a decantada
diversidade sexual –, em um neologismo, os
‘PLURIAFETIVOS’.
Retrato neste trabalho (Vídeo acima) pessoas ‘do bem’, simples, comuns, diárias, integradas no seu labor ou lazer.
Não espere ver aqui atores globais, desportistas, profissionais liberais,
militares e políticos famosos. Mesmo porque “eles não se assumem”,
o que, para os integrantes da comunidade gay, “enfraquece o movimento”,
assevera um militante da causa.
Clodovil Hernandes (1937
– 2009), estilista, apresentador e político, dizia que “qualquer pessoa que vive reprimida vive muito mal”. A atriz transformista Rogéria (1943-), nascida Astolfo Barroso Pinto, afirmava, há
tempos, que “os
homossexuais são como os árabes; se fossem unidos,
dominariam o mundo”.
Dominique Fernandez, intelectual francês
de ascendência mexicana, é mais contundente. Em 2009, aos 80 anos, ouvido pelo
jornal ‘Le Monde’, disse: “Ser homossexual não é somente preferir as pessoas do mesmo sexo. É (e
deve continuar a ser) manter-se à margem da massa de seus semelhantes, pensar e
agir diferentemente, trazer ao consenso social um fermento de revolta e de discórdia”.
Fernandez, emérito viajante, versado em arte barroca
e cultura italiana, primeiro membro da
Academia Francesa declaradamente gay, recebeu os prêmios literários Médicis (1974), Goncourt (1982) e Méditerranée
(1989). Proferiu palestras na Itália, Boêmia, Portugal, Síria, Bolívia e
Brasil.
Considerado “o Proust dos trópicos”, o mineiro Pedro Nava (1903 – 1984), médico reumatologista e anatomista, modernista,
escritor, desenhista, caricaturista, pintor, poeta e cronista – Prêmio Jabuti em 1974 e 1983 –, grande historiador da medicina e um dos maiores
memorialistas da literatura brasileira, deu a vida pela opção sexual que
mantinha reservada. “Senhor, Senhor! Dilacerai a minha carne, mas tende pena dos homossexuais”, deixou escrito em anotação na forma
de uma oração, sem data, revelada pela Fundação Casa de Rui Barbosa em 2017.
Carlo
Mossy (1946-), ator, diretor, roteirista e produtor
cinematográfico brasileiro, nascido em Israel - notoriamente conhecido pela fama de machão - em entrevista no ‘Programa
do Jô’, em 2 de outubro de 2008, declarou: “Todo
ser humano é bissexual. Alguns assumem; gostam. Alguns não assumem, mas
continuam gostando. E alguns morrem de velhice. Nós todos somos bissexuais”.
O jornalista José Simão (1947-),
paulista e dono de um cáustico humor, atuante em vários segmentos da mídia,
lembra que “casamento gay é opcional, casa quem quer”, e
manda um aviso aos homofóbicos: “todo pitbull é uma Lassie enrustida”. O humorista J. Praiano (1946-), carioca da gema, pressagia: “guarde
sua homofobia; quem sabe, um dia, eles serão maioria”.
Drauzio Varella (1943-), médico oncologista, cientista e escritor paulista, em seu artigo
‘Homossexualidade e DNA’, publicado em
14 de novembro de 2015 na Folha de São Paulo, afirmou que “nunca
houve nem existirá sociedade em que a homossexualidade esteja ausente. O
estudo mais completo até hoje, realizado por Bailey e colaboradores da
Austrália, mostrou que 8% das mulheres e dos homens são homossexuais”.
“(...)
Especificamente, ainda no ventre materno, epimarcas que afetam a resposta às
ações da testosterona produzida pelos testículos ou ovários fetais são capazes
de masculinizar o cérebro de meninas ou afetar o dos meninos, conduzindo mais
tarde à atração homossexual.”
“(...)
A antiga visão do sexo como um binário condicionado pelos cromossomos XX ou XY
está definitivamente ultrapassada. Ela é incapaz de explicar a diversidade de
orientações sexuais, nos demais mamíferos e até nas aves.”
“(...)
A homossexualidade é um fenômeno de natureza tão biológico quanto a
heterossexualidade. Esperar que uma pessoa homossexual não sinta atração por
outra do mesmo sexo é pretensão tão descabida quanto convencer heterossexuais a
não desejar o sexo oposto.”
“Os que assumem o papel de guardiões da
família e da palavra de Deus para negar às mulheres e aos homens os direitos
mais elementares não são apenas sádicos, preconceituosos e ditatoriais. São
ignorantes.”
“O amor
é essencial
O sexo, acidente
Pode ser igual
Pode ser diferente”
..., verso inicial do vídeo, do poeta português Fernando Pessoa (1888 – 1935), foi
citado pelo antropólogo, historiador e pesquisador Luiz Mott (1946-),
fundador do Grupo Gay da Bahia e
decano do movimento no Brasil, quando entrevistado, em 24 de abril de 2010, também
em um ‘Programa do Jô’, na TV-Globo.
As fotos, editadas em meio a grafites e cartazes,
ocorreram entre 2012 e 2015 nas ruas e no comércio do Rio de Janeiro,
notadamente no bairro de Botafogo.
Na trilha sonora, ‘Strangers In The Night’, interpretada com suavidade e delicadeza
pelo pianista Richard
Clayderman. Lançada em 1966, na voz de Frank Sinatra (1915 – 1998) e
composta por Charles
Singleton, Eddie Syder e Bert Kaemperft, a letra diz na primeira
estrofe:
“Desconhecidos na noite trocando olhares
Admirando-se na noite
Quais
eram as chances que poderíamos ter
de nos apaixonarmos
Antes
que a noite terminasse...”
A música, adotada pelo público gay, virou uma
espécie de hino e Sinatra achava enjoado ter de cantá-la nos shows. No Brasil,
o “shooby-du-bi-du”,
vocalização melódica sem palavras de ‘Strangers In The Night’, era entoado nas
festas dançantes da juventude como “chupi-chupi-chupi”.
A tradução de “O amor que não ousa dizer seu nome”,
de Oscar Wilde, aqui reproduzida, é de Oliver Cavalcanti. O verso “Fui crime... Serei
poesia”, é de autoria do poeta cearense Alfredo Pereira Lima Júnior (1925-),
grafitado nas ruas do Rio de Janeiro por seu neto, o ator Bernardo Lima Mendes (1987-), como
parte de um projeto artístico, e nada tem a ver com o movimento LGBT*S. Mas bem
que poderia.
“O medo do ridículo nos reduz o sublime.” Rousseau (1712 – 1778)
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