Acordo de Obama com republicanos revolta esquerda
ANDREA MURTA DE WASHINGTON
Depois dos independentes, agora foi a vez de a elite da esquerda americana se voltar contra Barack Obama com uma força até então pouco vista em seu governo, com ameaças de fim de apoio e de desafios internos à reeleição do presidente em 2012.
A gota d'água foi o acordão fechado entre a Casa Branca e os republicanos para renovar por mais dois anos os polêmicos cortes de impostos da era George W. Bush (2001-2009) para as faixas mais ricas da população. O pacote já foi aprovado no Congresso, e Obama o sancionou anteontem.
Deixar expirar os cortes de impostos aos mais ricos era uma promessa de campanha do presidente, e ele continua a dizer que é contra a sua renovação.
Mas afirmou que foi encurralado pela oposição e teve de concordar para obter necessária extensão do seguro-desemprego e outras medidas de estímulo econômico.
"O que Obama fez foi quase imperdoável" disse à Folha o analista da Universidade Harvard Alexander Keyssar, de tendência democrata.
"Foi má política, má ideologia e má economia. Se você acredita em qualquer tipo de valor progressista, defender por que faz sentido elevar impostos para os mais ricos agora deveria ser muito fácil", afirmou.
Para Keyssar, a concessão de Obama aos republicanos avaliza o "pseudodiagnóstico" da oposição de que "se cria empregos cortando impostos para os ricos" -"e há amplas provas de que isso não é verdade".
Alguns formadores de opinião esquerdistas pediram rompimento imediato com o presidente, como Clarence B. Jones, da Universidade Stanford e ex-confidente do ativista de direitos civis Martin Luther King Jr.
Outros, como Michael Lerner, editor da revista "Tikkun" e analista, e Robert Kuttner, cofundador da revista "The American Prospect", exortaram preparações para uma primária democrata em 2012.
Para estes, o desafio seria uma tentativa de forçar o presidente a retornar para posições mais de esquerda.
"TRAIÇÕES"
O acordão não foi a primeira "traição" do presidente a essa parcela do eleitorado.
A prisão de Guantánamo (Cuba) para suspeitos de terrorismo continua aberta, a guerra no Afeganistão se arrasta, e a reforma do sistema saúde não ofereceu um plano de cobertura público.
"Nada disso é o que os progressistas queriam", afirma Clyde Wilcox, professor de governo da Universidade Georgetown.
"Muita gente acredita que [o ex-presidente George W.] Bush pressionou pelo que quis, com ou sem consenso, e que agora Obama está com medo de pressionar de volta [e agir como o predecessor]", disse Wilcox.
Para Keyssar, "está claro que Obama não é progressista e que as pessoas em seu entorno também não são".
É cedo para dizer se um desafio interno a Obama será viável ou bem-sucedido em 2012 -até porque não há nome forte democrata que possa concorrer com ele em uma primária hoje.
Mas o risco está na mesa, e o estrago pode ser grande. Nenhum dos últimos quatro presidentes que tiveram de enfrentar primárias em seus partidos antes de concorrer à reeleição chegou a um segundo mandato.
Para Wilcox, tudo vai depender da economia. "Se o cenário não melhorar, é bem provável que haja, sim, desafio interno em dois anos."
"Obama será o candidato", diz Keyssar. "Mas acho que ele perdeu o entusiasmo da base progressista, o que provavelmente significa que será derrotado em 2012. E quando ele perder, nos lembraremos desse momento."
----------
Quem consegue ler todas as mensagens que envio, sabe que desde o início do Governo Obama já afirmava que os EUA não mudariam, que continuariam a manter sua política imperialista de sempre.
Para o Brasil, a ampliação de sua presença militar na Colômbia é a maior das ameaças contra a nossa soberania. Este é um dos motivos pelo quais defendo a manutenção de boas relações com os atuais governos da Venezuela, Bolívia e Equador. Estes não estão submissos aos interesses norte-americanos e não poderemos lutar sozinhos a luta contra o imperialismo norte-americano que, com certeza, o futuro trará.
Os EUA querem as riquezas de nossa Amazônia, querem as riquezas de nosso pré-sal, e faram de tudo para se apoderarem delas.
Jornal do Brasil, 03/01/2010
Gilson Caroni Filho *
RIO - No início de 2009, quando Barack Obama assumiu a Casa Branca, vários analistas afirmavam que estávamos começando um novo período histórico, que marcava o fim do unilateralismo do governo anterior, dando ensejo à efetivação de um sistema global multipolar. Os argumentos eram muito convincentes. O mais poderoso império de todos os tempos deixava para trás a doutrina Bush, abandonando a roupagem absolutista usada para negar os mais antigos direitos fundamentais do homem: os direitos civis e políticos consagrados pelo direito internacional.
Na América Latina, Bolívia, Venezuela, Equador, Chile, Brasil e Uruguai, entre outros, deixaram de ser portos seguros para os desígnios do capital estadunidense, graças ao avanço das forças progressistas na região. Redefinia-se um velho roteiro onde a direção do impulso político no continente parava de ser orientada no sentido de consolidação dos regimes que colaboravam com as grandes corporações, dando lugar a governos que privilegiam os interesses de seus povos, redefinindo prioridades na elaboração de suas políticas externas.
No primeiro discurso após as eleições, Obama resumia o significado simbólico de sua chegada à Presidência: “Se pessoas ainda têm dúvidas de que a América é o lugar onde as coisas são possíveis, que ainda acreditam que os sonhos dos nossos fundadores ainda estão vivos, se ainda questionam o poder da nossa democracia, esta noite é a sua resposta”.
Os recentes posicionamentos do governo norte-americano em Honduras, apoiando eleições que legitimaram o golpe, sob o pretexto de que “a maneira como a eleição será conduzida vai inevitavelmente afetar condições para superar divisões políticas do país”, demonstram que juízos históricos sobre inflexões desejadas têm-se baseado em análises conjunturais que subestimam a força dinâmica interna da direita estadunidense e sua capacidade para recuperar e restabelecer a agenda hegemônica imperial. A “guerra preventiva” deu lugar à “guerra justa”, confirmando o diagnóstico de Fidel sobre a “domesticação” de Obama.
Há uma questão central que não pode ser relegada a segundo plano. Na ausência de qualquer forma de desafio organizado das classes trabalhadoras no interior dos Estados Unidos, a margem de manobra dos segmentos dominantes do imperialismo para recuperar-se de crises econômicas sem pagar nenhum dos custos políticos e sociais que todos os seus competidores têm que enfrentar é uma vantagem comparativa colossal.
Além disso, como nos lembra James Petras, o império, devido ao seu alcance no exterior, continua numa posição que lhe permite aproveitar os principais benefícios de outros países, “através de seus contatos político-militares, mantendo assim, sua vantagem sobre a Europa e Ásia em escala crescente”. É preciso uma leitura muito apressada para falar em crise de hegemonia.
O recuo quanto ao prazo de fechamento da prisão militar na Baía de Guantánamo, a instalação de bases militares na Colômbia, a escalada bélica, com aumento de 10 a 15 mil soldados para “terminar o trabalho” no Afeganistão, os discursos ambíguos sobre o Iraque, além da falta de propostas concretas para a Conferência do Clima, em Copenhague, não ferem apenas esperanças e ilusões. Soam como um sinal que não pode ser desconsiderado por quem deseja uma nova ordem internacional.
Não serão discursos protocolares, repletos de petições bem intencionadas, que deterão o que os Estados Unidos julgam ser sua “missão civilizadora". Em uma América Latina que grita e se revolta, a vitória golpista em Honduras se apresenta como uma oportunidade histórica para a esquerda não sectária. Atualizando conceitos e categorias, é hora de elaborar um programa que se apresente como inconfundível estratégia contra-hegemônica.
Obama jamais desconsiderou a correlação de forças internas que limitam as possibilidades de uma reversão da política externa norte-americana. No mesmo discurso inaugural, o presidente foi bem enfático ao afirmar que “estamos preparados para liderar novamente”. Interpretar essa afirmação como lapso ou arroubo de um líder inexperiente é perigoso demais para quem não quer que se confirme o velho axioma segundo o qual a América Latina roda e roda sem sair do lugar. É preciso muita atenção ao que dizem “os eleitos do mundo". Uma coisa é certa: o humor, por excessivo mau gosto, deve ser descartado de saída.
* Sociólogo
Nenhum comentário:
Postar um comentário