Revista Caros amigos - dezembro 2010
Ornaldo Rancor, cineastra
Carlos Bagno
Eu pensava que depois que Orvalho de Cavalo, pilósopo, tinha se mudado para os Estados Unidos, a extrema direita brasileira tinha ficado órfã. Mas eis que não! Basta ligar o rádio pela manhã e ter o desprazer de ouvir Ornaldo Rancor vomitar uma verborreia fascista, digna da Ku-Klux-Klan ou coisa pior, atrapalhar nosso santo café manhã, que tantos brasileiros podem tomar agora graças ao desenvolvimento que o país alcançou nos últimos oito anos com a maravilhosa ascensão das classes C e D e com a maior redução de pobreza da história desse Brasil sofrido.
Bem dizia uma amiga: "A ditadura fez a cama de muita gente". É verdade! Nos anos de chumbo, fomos iludidos por algumas figuras que posavam de progressistas e revolucionárias. Agora, sob a luz da resplendente democracia que o último governo tornou ainda mais radiante, os conservadores enrustidos saem do armário e se revelam em corpo, alma e espírito.
Nosso cineastra é um desses. Devidamente cooptado pelo império midiático, aparece na televisão e no rádio, rancoroso e furibundo, lançando ofensas pessoais contra Lula e tudo o que não venha da elite mais racista, xenófoba e sexista que, tendo a grande imprensa como porta-voz, se aliou em torno do candidato derrotado nas eleições e da candidata de casca verde e polpa azul-tucano, que fala como se estivesse pairando acima do bem e do mal, nalgum ecossistema mítico, num discurso absolutamente autista.
Temos também "comentaristas" políticos que pontificam na grande mídia, como a tucana disfarçada de perua Pelúcia Hipócrita, o gosmento Vermal Peneira e seu colega Humilham Vaaca, que babavam e espumavam de ódio toda vez que, durante o período eleitoral, precisavam se referir à nossa nova presidenta eleita. Eu mal podia acreditar no que via e ouvia. Eles não tinham o menor escrúpulo em emitir palavras de ordens ao tucanato do tipo "o que é preciso fazer é X", "expliquem aos eleitores que Y", "digam que o verdadeiro nome disso é Z" e coisas assim, instruções diretas e claras, sem papas na língua, sobre como aumentar o volume da boataria sórdida que fez tanta lambança entre o primeiro e o segundo turnos.
Que saudades de quando a voz da direita nacional era a de Nelson Rodrigues, que nosso cineastra Ornaldo parece querer imitar. Só que Nelson Rodrigues era um gênio, um dos maiores estilistas da língua portuguesa, um reacionário assumido, enquanto nosso Ornaldo é um... cineastra.
Quando chego num aeroporto e vejo filas de pessoas humildes, principalmente idosos, que somente agora conseguem tomar um avião para visitar os parentes distantes ou voltar à terra natal, me encho de alegria. Ou quando, como professor universitário, recebo cada vez mais alunos vindos de famílias pobres, de pais analfabetos, alunos que, em outros tempos (ainda recentes), jamais poderiam pisar numa universide a não ser como faxineiras, zeladores ou motoristas. Mas deve ser justamente por isso que gente como Rancor, Hipócrita, Vermal e Vaaca não conseguem se conter e saem em defesa dos feudos reservados à elite elitíssima que se vê, com toda razão, ameaçada pela invasão de seus condomínios habitacionais, sociais, culturais etc. por tanta gente pobre, feia, pouco instruída, nortista-nordestina e malvestida. Será mera coincidência que os três sejam brancos e do Sudeste?
Marcos Bagno é linguista e escritor. www.marcosbagno.com.br
Nota pessoal : Quem é quem
Ornaldo Rancor – Arnaldo Jabor
Pelúcia Hipócrita - Lúcia Hipólito
Vermal Peneira - Merval Pereira
Humilham Vaaca – William Waack
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