domingo, 7 de novembro de 2010

Santayana: O ensino e a federação

Jornal do Brasil, 05/11/2010

Por Mauro Santayana

O tema da educação retorna à discussão, com o juízo desabonador da ONU sobre o nosso desempenho, não obstante os esforços dos anos recentes. A responsabilidade maior pelo descalabro, como bem apontou o relatório, é o interesse de parcelas das elites nacionais em negar o conhecimento aos trabalhadores: “um estudo de atitudes sobre educação entre elites brasileiras durante os anos 90 mostrou que as elites são frequentemente relutantes em ampliar as oportunidades de educação, pois trabalhadores educados seriam mais difíceis de gerenciar”. Convém trocar o verbo “gerenciar” pelo correto: explorar.

Em princípio, essas três questões deveriam ser cuidadas pelos estados, e só de forma subsidiária pela União. O avanço do poder central sobre a Federação, iniciado discretamente no Estado Novo, não contido, como seria de esperar, pela Constituição de 1946, escancarado na vigência da ditadura militar e exacerbado durante o despotismo manhoso de Fernando Henrique, retirou dos estados, mediante legislação casuística, o que ainda lhes restava de recursos fiscais próprios. As relações políticas entre o Planalto e os governos estaduais, não obstante a postura de Lula, estão marcadas por essa violação do espírito federativo, tal como ele foi negociado e aprovado no pacto republicano de 1891.

A educação é o alicerce das sociedades políticas. Em 1848, em discurso no parlamento da França, Victor Hugo estabeleceu essa prioridade de forma definitiva, ao lembrar a grande revolução ocorrida em seu país, 25 anos antes, com a obrigatoriedade do ensino gratuito. O desenvolvimento intelectual, ele destaca, fora notável, pelo simples fato de que as pessoas pobres começaram a ler. “A multiplicação de leitores é a multiplicação dos pães, disse o genial escritor e político. “No dia em que Cristo usou esse símbolo, ele anteviu uma impressora. Um livro nutre milhares, milhões de almas, toda a Humanidade”.

O grande problema da educação no Brasil está em sua base. Não estamos sendo capazes de ensinar bem as crianças a ler e a escrever. Há um ditado latino que afirma: “Quis scribit, bis legit” (Quem escreve, lê duas vezes). Ora, quem não sabe escrever, e, portanto, lê mal, como poderá continuar a educar-se e chegar à universidade? Sem uma educação de base forte – e não a temos, como a própria ONU reconhece – não formaremos os cientistas, técnicos e pensadores de que necessitamos, no processo de construção da nacionalidade. O governo Lula avançou bastante, mas a tarefa continua a ser dos estados. É preciso investir, com coragem, na formação de professores e em sua remuneração, enquanto há tempo.

A presidente Dilma Rousseff anunciou o propósito de negociar com os governadores e com os novos senadores as grandes questões nacionais. Muitos deles se elegeram empenhados na recuperação das prerrogativas republicanas dos estados. Ela, com sua experiência, o aval da grande maioria dos cidadãos brasileiros, e o exemplo de Lula, já demonstrou acreditar que política é, antes de tudo, a busca do entendimento. Essa mesma disposição, ela afirmou que terá em seu convívio com o Congresso como um todo. Trata-se de um pacto cotidiano, sempre renovado, e, nos pactos, todos perdem alguma coisa, para que o conjunto ganhe o essencial. Essa tarefa é facilitada por dois fatores: o aumento da bancada situacionista nas duas casas e a não reeleição dos adversários mais radicais do governo Lula, como foram, entre outros, os senadores Arthur Virgílio e Heráclito Fortes.

Já se articula a formação de um grupo de senadores, eleitos pelos partidos de oposição e da base aliada, para formar um bloco de centro, a fim de buscar a conciliação entre governo e oposição, em benefício da continuidade do desenvolvimento e da estabilidade institucional.

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