Tijolaço, 05/02/17
Lula é povão... e povão tem de sofrer calado
Por Wilson Gomes
Do doutor
em Filosofia Wilson Gomes, professor da Faculdade de Comunicação da
Universidade Federal da Bahia, via Facebook:
Primeiro
apareceram os que acusaram Lula de pecado futuro: vai usar a morte da esposa
para se fazer de vítima. Acusar alguém de pecados ainda não cometidos é uma
tentativa de fechar ao acusado uma alternativa, de desqualificá-la de antemão:
“vai doer, mas chorar você não pode; tente, então, ficar quietinho”. “Fazer-se
de vítima” é uma dessas expressões curiosas da alma brasileira, vez que quem
acusa o interlocutor de se fazer de vítima geralmente está fazendo o papel de
verdugo. O carrasco está barbarizando, mas, por favor, tenha compostura, “não
se faça de vítima”.
Depois
apareceram as condenações pelo “uso político do velório”. Como pode um
sindicalista e político enterrar a própria esposa com um coração de político e
sindicalista? Tinha que ter havido discrição, silêncio. Como pode um sujeito
enterrar a sua companheira de vida, cuja morte foi, no mínimo, acelerada pelo
desgosto e por acusações que, segundo ele, são injustas, berrando, esperneando,
acusando? Não, o certo era ficar quietinho ou, se fosse mesmo para fazer drama,
que se cobrisse de cinzas, batesse no peito, em lágrimas, e gritasse “mea culpa, mea maxima culpa!“.
Fosse
apenas questão de ser sommelier do luto alheio, até me pareceria razoável.
Afinal, o Facebook é principalmente uma comunidade de tias velhas desaprovando
as saias curtas e os comportamentos assanhados dos outros. Mas, é mais que
isso. Pode haver um aluvião público de insultos, augúrios de morte e dor, e
difamação a sua esposa, durante duas semanas, mas Lula não pode mostrar-se
ultrajado ou ofendido, não pode desabafar do jeito que pode e sabe, não pode
espernear. Em vez do “j’accuse“, o certo seria a aceitação bovina do garrote, da dor, da
perda. Em vez do sindicalista e político, em um ambiente privado do sindicato,
velando entre amigos a mãe dos seus filhos, havia de ser um moço composto e
calado. Todo mundo tem direito de velar os seus mortos como pode e sabe, exceto
Lula.
Uma parte
da sociedade brasileira nunca se cansa de mostrar a Lula o seu lugar. E de
reclamar, histérica, quando ele, impertinente, não faz o que ela quer. Tem sido
assim. Lula já foi insultado de analfabeto, nordestino, cachaceiro, ignorante e
aleijado, muito antes de ser chamado de corrupto e criminoso. A cada doutorado honoris causa de Lula choviam
ofensas e impropérios porque ele não tinha todos os dedos, porque era uma
apedeuta, porque era um peão. Qualquer motivo para odiá-lo sempre foi bom o
bastante para uma parte da sociedade.
Agora, estamos autorizados a odiá-lo por mais uma razão: o modo como
acompanhou a agonia e como velou sua companheira. Que os cultivados me perdoem
a analogia, mas isso me lembra a acusação feita em 'O Estrangeiro', de Albert
Camus, ao sujeito que não conseguiu chorar e sofrer, como aos demais parecia
conveniente e apropriado, no funeral da própria mãe: “J’accuse cet homme
d’avoir enterré sa mère avec un cœur de criminel”. “Eu acuso este homem de
ter enterrado a sua mãe com um coração de criminoso”.
No
surrealismo da narrativa política brasileira, a história se repete: Lula deve
ser desprezado porque enterrou a esposa com um coração de político e
sindicalista e isso não está direito.
Voilà.
Lula nunca vai aprender o seu lugar.
Não. E
como disse o Chico, “Qualquer canção de dor / Não basta a um sofredor / Nem
cerze um coração rasgado / Porém ainda é melhor / Sofrer em dó menor / Do que você sofrer calado.”
Jornal do
Brasil, 05/02/17
Dona Marisa ao ódio
respondeu doando seus órgãos
Por Leonardo Boff
Diz-se que todas as instituições funcionam. Mas não se qualifica o seu funcionamento. Funcionam mal. Em outras palavras não funcionam. Se tomamos como referência a mais alta corte da nação, o STF, aí fica claro que as instituições estão corrompidas, incluindo a PF e o MP. Especialmente o STF é atravessado por interesses políticos e um dos seus ministros, de forma escancarada, rompe diretamente a ética de todo magistrado, falando criticando, atacando fora dos autos e tomando claramente posição por um partido; nada acontece, no nosso vale tudo jurídico, quando deveria sentir o rigor da lei e sofrer um impeachment. Esta situação é um sinal inequívoco que estamos numa derrocada política, ética e institucional. O Brasil vai de mal a pior pois todos os dias os itens sociais e políticos se deterioram. E havia senadores e deputados de poucas luzes que propalavam que com a derrubada do PT o Brasil entraria uma nova primavera de progresso.
O que nos parece mais grave é o fato de que se instaurou um real estado de sítio judicial. A operação Lava-Jato mostrou juízes justiceiros que usam o direito como instrumento de perseguição, no caso do PT e diretamente do ex-presidente Lula. A Polícia Federal, bem no estilo da SS nazista, entrou casa adentro da família Lula, revistaram cada canto, reviraram o colchão, remexeram a penteadeira de Dona Marisa, revolveram a geladeira, carregaram o que puderam e levaram sob vara, pois é esta a expressão correta, quer dizer, coercitivamente o ex-presidente Lula para interrogatório numa delegacia do aeroporto.
Tal ato de violência física e simbólica traumatizou a ex-primeira dama. Maior foi o trauma quando foi indiciada como criminosa na operação Lava Jato junto com o marido. Isso a encheu de medo e alterou todo seu estado de saúde.
Como se não bastassem aquilo que escreveu corajosamente jornalista Hildegard Angel em seu blog na internet "os oito anos de bombardeio intenso, tiroteio de deboches, ofensas de todo jeito, ridicularia, referências mordazes, críticas cruéis, calúnias até. E sem o conforto das contrapartidas”. E faço minhas as palavra de Hildegard Angel, pois representam o que posso testemunhar em mais de 30 anos de amizade entranhável com Dona Marisa e Lula: “Foi companheira, foi amiga e leal ao marido o tempo todo. Foi amável e cordial com todos que dela se aproximaram. Não há um único relato de episódio de arrogância ou desfeita feita por ela a alguém, como primeira-dama do país. A dona de casa que cuida do jardim, planta horta, se preocupa com a dieta do maridão e protege a família formou com Lula, um verdadeiro casal”.
Criticam-na porque como primeira dama não assumiu funções públicas. Mas poucos sabem que foi ela que restitituiu a forma original do palácio do Planalto, resgatando os móveis e tapetes que haviam sido doados a ministros e a outros departamentos. Ela possuía elevado sentido estético. Foi fundamental na reforma da Catedral que acompanhou passo a passo.
Finalmente, foi ela que introduziu no Torto as festas da cultura popular, a celebração de seus santos de devoção que são da maioria do povo brasileiro, Santo Antônio e São João. Lá organizou o carnaval bem no estilo do povo, com as bandeirinhas e o pau de sebo. Escândalo da burguesia descolada de nossas raízes e envergonhada de nossas tradições.
Ela sofreu um AVC que foi fatal. Visitei-a na UTI, falei-lhe ao ouvido (dizem que mesmo em coma o ouvido ainda funciona) palavras de confiança e de entrega ao Deus Pai e Mãe que ela acreditava com fé profunda. Deus a estava esperando para que caísse em seu seio materno e paterno para ser feliz eternamente. Abracei o ex-presidente que não escondia as lágrimas. Quando se constatou a morte cerebral, o coração ainda pulsava. Ele disse uma palavra verdadeira: ”O coração dela pulsa porque o nosso amor vai para além da morte.”
Ao lado de tanta dor se constataram na internet palavras de ódio e de maledicência. Felizes porque morria e merecia morrer daquele jeito. Aí me dei conta de que não temos apenas pedófilos mas também necrófilos, aqueles que amam e celebram a morte dos outros. Pertinente é a frase atribuída ao Papa Francisco: “Quando você comemora a morte de alguém, o primeiro que morreu foi você mesmo”.
Diante da morte, o momento derradeiro para cada ser humano, pois vai encontrar-se com Suprema Realidade que é Deus, devemos nos calar reverentes. Ou proferimos palavras de conforto e de solidariedade ou emudecemos respeitosamente. Como podemos ser cruéis e sem piedade diante da morte dolorosa de uma pessoa conhecida como extremamente bondosa, arraigada aos mais pobres, lutadora dos direitos dos trabalhadores e das mulheres e com grande amor ao Brasil? Ao ódio ela respondeu doando generosamente os próprios órgãos para que outros pudessem viver.
Lamentavelmente, o golpe perpetrado contra o povo, impôs uma radical agenda que segundo o jornalista Elio Gaspari “é uma grande máscara, atrás da qual se escondem os velhos e bons oligarcas” (O Globo 5/02/17 p.8). Esses odeiam os pobres como odeiam o PT e Lula e odiaram Dona Marisa Letícia.
Mas a verdade e a justiça possuem uma força intrínseca. Elas arrancarão as máscaras dos pérfidos. A luz brilhará. Enquanto isso, contemplaremos uma estrela no céu da política brasileira: Dona Marisa Letícia Lula da Silva.
Forum, 04/02/17
Prefeito tucano demite diretor que pediu morte de Marisa nas redes sociais
Da Redação
Em outra postagem, o diretor jurídico da prefeitura escreveu que deveriam desligar os aparelhos da ex-primeira dama: “Safada, façam o favor para a população e desliguem logo os aparelhos para sair mais barato a conta que nós iremos pagar”.
O diretor
começou a trabalhar na Secretaria neste ano, junto à administração do novo
prefeito, com cargo de confiança. “Foi um momento de infelicidade do Celso
nessa questão. Tivemos exemplo do gesto do Fernando Henrique com o Lula, assim como o Lula teve um
gesto com o Fernando Henrique quando ele perdeu a dona Ruth. Esse gesto (postagens) foi
executado dentro do período de trabalho. Se ele estivesse fora do horário de
trabalho eu diria que não teria nada a declarar, mas como foi dentro do
expediente, falo para vocês que ele será punido severamente, ele está
despedido”, afirmou o prefeito.
“Quero dar parabéns ao prefeito Dilador Borges (PSDB) por sua atitude de não aceitar pessoas intolerantes com seus concorrentes em seu governo”, afirmou Consolaro. “Acima da política está o relacionamento respeitoso à pessoa do outro, divergimos, mas também convergimos, não somos inimigos, apenas concorrentes, adversários em certos contextos”, concluiu.
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