Jornal GGN, 26/02/17
Elogios internacionais para o Procurador Geral e a Força Tarefa “pró-mercado”
Por Bruno Lima Rocha*
Introdução
Comecei
este recorte logo após a morte do ministro do Supremo em desastre
aéreo, cujas circunstâncias implicariam uma ampla investigação federal.
Não se trata aqui de uma ilação da morte de Teori com a morosidade de Rodrigo Janot
e os pressupostos liberais da Força Tarefa da Lava Jato. Longe disso.
As bases do argumento já são suficientes para não arriscarmos uma
irresponsável suposição sem fatos contundentes. Deixo as especulações
sem fim para os “justiceiros da geração Nutella” e suas elucubrações de
“teoria do fato”. Nas palavras abaixo, duas evidências de que tanto
os paladinos de Curitiba como o próprio Procurador Geral da República
fazem o possível para agradarem plateias no estrangeiro, fazendo coro com a Lawfare (o emprego de convênios e justificativas ‘legais’ como arma de guerra imperial) e
a governança liberal mundializada. Se isso ocorre de forma normativa e
voluntária ou por simples reflexo ideológico e mimetismo de
comportamento institucional subalterno, é algo ainda a decifrar. Os
efeitos são igualmente nefastos. Vejamos.
Alexandre de Moraes no STF e um governo ilegítimo sangrando por dentro
A morte do jurista e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki,
em 19 de janeiro de 2017, abriu ainda mais as entranhas do Estado
brasileiro em seu estamento superior. O governo ilegítimo, comandando
pelo vice-presidente golpista, viu-se diante de um impasse. Indicar um
algoz, ou então apontar um substituto de visíveis simpatias ao seu
mandato tampão. A aposta caiu na escolha pela pizza, com a indicação –
aprovada pelo Senado – de Alexandre de Moraes para a suprema corte. O fato de por si já seria absurdo – indicar o seu ministro da Justiça no exercício do cargo – e tem como agravante o perfil e a trajetória mais que discutíveis do ex-secretário de transportes de Gilberto Kassab na Prefeitura de São Paulo e de Justiça e Segurança Pública de Geraldo Alckmin no estado de São Paulo.
O tema de fundo para a indicação de Moraes ao STF é o de sempre e é escancarado: a Lava Jato e a delação da Odebrecht,
contando com uma lista gigantesca de supostos envolvidos no esquema de
propina institucionalizado e contratos batizados. O governo MT (Michel Temer,
codinome que consta na delação dos executivos da maior empresa de
engenharia pesada do Brasil) está contra a parede, perde na semana do
carnaval ao titular da pasta das Relações Exteriores (o senador tucano José Serra, campeão de vexames no Itamaraty) e vê o afastamento de Eliseu Padilha
(PMDB-RS), até então todo poderoso ministro da Casa Civil. Ambos
ministros alegaram problemas de saúde – o que pode ser verdade – mas, ao
mesmo tempo, afastam-se do governo em situação muito delicada. A Lava
Jato e as disputas internas entre os oligarcas golpistas sangram o
próprio governo.
Até
aí, nada que seja novidade e menos ainda em termos de operações de
investigação federal. Teríamos exemplos ainda mais dramáticos, como as
operações Farol da Colina, Macuco, Chacal, Satiagraha, Castelo de Areia,
Monte Castelo, dentre outras de menor monta. A diferença da atual
operação – dotada de força tarefa quase completamente autônoma – para
com as citadas é simples. Em última análise, mesmo que executando
sentenças esperadas pela maioria da população, a Força Tarefa é muito
bem vista por poderes externos (conforme já explicamos em outros textos
desta publicação), e abusa dos holofotes, operando como força política
dotada de capacidade decisória e incidência na opinião pública e
sociedade civil em rede. Nada mais perigoso do que operadores da lei interpretando-a apenas conforme suas doutrinas e idealizações de vida em sociedade. Na sequência, apontamos mais duas evidências desta relação “harmônica” e uma conclusão de crítica propositiva.
A operação que tem dimensões internacionais e o Procurador Geral pró mercado
"A Lava Jato é tão grande que a cada pena que se puxa surge uma galinha."
Esta frase seria do ministro Teori Zavascki, segundo o programa Fatos e
Versões da Globonews (exibido no sábado 21 de janeiro de 2017), cujo viralatismo elogia o fato da Operação coordenar com 30 países e já obter condenações em 17 Estados soberanos. Para
quem acompanha a política dos países Hermanos latino-americanos, a Lava
Jato – com a Odebrecht como alvo – sangra o ambiente político da
Colômbia, Equador, Peru, Venezuela e Panamá (veremos estas ramificações e
impactos em artigos posteriores).
No mesmo programa, também elogiam o fato da tecnocracia da PF e da Receita ser "preparadíssima", falando vários idiomas, com
pessoal tendo vivido fora do país e com conexões diretas no exterior.
Até aí tudo bem, se o ideal de "viver fora" não fosse os Estados Unidos,
a Inglaterra ou suas outras ex-colônias anglo saxãs. Quando muito, a
“experiência fora” é um mimetismo Europa do Euro (antes do Brexit, de
certo) governada pela Comissão Executiva da União Europeia, apêndice do
Bundesbank (Banco Central da Alemanha Federal e também da Unificada) e
porta voz do ordoliberalismo.
Como
é da estrutura da subordinação dos formadores (ou deformadores) de
opinião no Brasil, o elogio interno reflete o aplauso do centro do
capitalismo. Temos o fato, declarado, do Procurador Geral da
República, Rodrigo Janot, no Fórum Econômico Mundial de Davos (Suíça),
afirmando para a nata do capitalismo mundializado de que a Lava Jato e a
atuação da PGR é pró-mercado. No portal do World Economic Forum,
Janot é citado reforçando a convocatória do próprio fundador do think
tank dos ricos no planeta. O texto é muito direto:
“Another
highlight will be the participation of Rodrigo Janot, Prosecutor
General of Brazil, who has been leading an epic fight against corruption
in the country. Market capitalism needs urgent reform in three key
areas: ending corruption, tackling inequality and failing to adopt
sufficient long-term thinking, according to Klaus Schwab, the Forum's
Founder and Executive Chairman.” (ver link em http://migre.me/w8hSn).
O
evento do Procurador Geral do Brasil estava na agenda “regional”. Mas o
Brasil teve outro momento de evidência duvidosa no contestado evento.
Janot foi ao mais que questionado fórum ao lado de um ex-CEO do Itaú e
ex-funcionário do Banco Mundial, hoje presidente do Banco Central do
Brasil, Ilan Goldfajn, este sim, queridinho do mercado e espiritualmente um Chicago Boy.
Junto a Goldfajn, o hoje todo poderoso titular da pasta da Fazenda e
homem com livre trânsito entre os especuladores do planeta, o ex-diretor do Bank of Boston, Henrique Meirelles. O papelão de tipo “exposição de motivos e intenções de austeridade” foi registrado e compartilho neste link (http://migre.me/w8hXI)
Força Tarefa da Lava Jato premiada no Panamá - ironia macabra
Sábado,
3 de dezembro de 2016, Cidade do Panamá. Na capital do pequeno país do
istmo centro-americano, a Força Tarefa da Lava Jato foi premiada pela
super ONG Transparência Internacional como defensora global contra a
corrupção no planeta (http://migre.me/vHGOB).
A Transparência foi uma opção das transnacionais (TNCs), no período
pós-consenso de Washington, para modificar a forma de inserção e
investimento nas periferias do mundo. Nos tempos de Terceiro Mundo e
Guerra Fria, a corrupção de autoridades e busca de acessos facilitados
eram vistos como “custos transacionais”; após a virada da década de ’80,
a solução mundializada pelos EUA foi tentar universalizar a democracia
liberal, diminuir as barreiras nacionais e institucionalizar um sistema
de Justiça que fosse passível de controle ou regulação pelas grandes
empresas atuando em países com algum sistema institucional mais sólido.
Daí
vem à noção de luta contra a corrupção como uma punição seletiva, e o
fator fundamental dos acordos de cooperação judicial. Como os EUA tem a vantagem estratégica de intervir na maior parte das comunicações eletrônicas no planeta (através do Sistema PRISM, antes no Echelon – ver nsa.gov e dia.mil - no emprego das agências de monitoramento Geoespacial – ver nga.mil – e na de Reconhecimento – ver nro.gov), logo, apontam seus alvos de forma seletiva, favorecendo ou prejudicando agentes coletivos nacionais ou mesmo atores individuais.
É óbvio que a incidência de corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de
divisas e vantagens intra-governos é gigantesca, e dentro dos parâmetros
dos sistemas legais de Justiça, a maior parte dos envolvidos nos
seguidos escândalos não escaparia de investigações contundentes. Mas, como
afirmam nos EUA, existem empresas e conglomerados que são “grandes
demais para falir e grandes demais para serem presos” (too big to fail
and too big to jail), e o mesmo ocorre em escala planetária.
Logo, a
modalidade de denúncias de corrupção e os acordos de cooperação
internacionais com países mais fracos (todos ou quase todos em algum
grau em escala planetária), torna-se uma maneira efetiva de exercício de
hegemonia da superpotência, considerando suas enormes vantagens no
ato investigativo graças a sua capacidade de espionagem eletrônica em
escala planetária. Do lado brasileiro, os holofotes se globalizam
através da internet e de acordos de cooperação. No portal da
Procuradoria Geral da República, na página da Secretaria de Cooperação
Internacional (SCI) consta um relatório em inglês, em formato Pdf e uma
ampla prestação de contas. No entendimento deste analista, tudo soa como
prestação de contas aos pares internacionais, afirmando a independência
dos poderes do Estado brasileiro e a autonomia decisória de
procuradores e magistrados nacionais. Para quem julgar exagero em minhas
palavras, convido a uma leitura atenta no documento oficial, no
seguinte link (http://migre.me/w8icL).
Para evitar o salvacionismo dos cruzados da Lava Jato
Se
os vínculos e subordinações da Força Tarefa da Lava Jato para os EUA
não forem revelados, os cruzados liberais (operadores de direito Nutella
conforme o jurista e professor Lênio Streck– ver http://migre.me/w8ik4)
vão ser vistos como único patrimônio moral do Brasil. Vejam bem, as
oligarquias políticas são parasitas e realmente não valem nada; o
empresariado brasileiro é sim sanguessuga e rentista, e dos financistas
nem se fala. Logo, a moral da virtude política está marcada hoje pelos reacionários da mídia pró EUA e os operadores jurídico policiais.
Não tem como escolher mal menor agora, logo, entendo que é urgente
tomar distância do moralismo conservador e defender toda e qualquer
forma de aumento da democracia participativa e resistência contra o
retrocesso e a perda dos direitos sociais. A cancha está totalmente
aberta, para todos os lados da política e com chances para todas as
ideologias.
Há
evidência de possibilidades concretas de traição a pátria,
insubordinação e indicação de testemunhas chave para fecharem acordos
com o Departamento de Justiça da Super Potência. Logo, os adidos legais
dos EUA desde o início da Operação Pontes – iniciada em fevereiro de
2009 - são os personagens chave desta conspiração. Se os adidos são
operadores-chave, seus interlocutores brasileiros também. Tanto quem
opera na troca de informações, como na Autoridade Central inexistente,
que nada supervisiona e deixa correr por conta própria, em perigosa
autonomia administrativa e jurisprudencial. O neologismo “república de
Curitiba”, em franca alusão à “república do Galeão” de triste memória
para a política brasileira é decorrente desse conjunto de absurdos e
idealização dos Estados Unidos.
É
preciso indicar um curso político para esta crítica. Caso esta
possibilidade de cooperação não autorizada não fique demonstrada para a
sociedade brasileira, os tecnocratas das carreiras jurídicas
(magistrados, procuradores, delegados e auditores) – e suas lealdades
ideológicas externas – podem vir a formar o novo polo de poder com
capacidade de intervenção nos processos políticos internos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário