quarta-feira, 18 de julho de 2012

Fotografias da ditadura são liberadas para consulta

Folha.com, 06/07/2012

Fotografias da ditadura são liberadas para consulta

RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA

A Lei de Acesso à Informação levou o Arquivo Nacional, em Brasília, a liberar à consulta cerca de 5.000 fotografias do acervo do extinto SNI (Serviço Nacional de Informações) tiradas por agentes da ditadura militar (1964-1985).
Há fotos de centenas de pessoas presas acusadas de subversão e ligação com a luta armada, obrigadas a posar com roupas íntimas; artistas panfletando a favor da Lei da Anistia, em 1979; e eventos religiosos com o bispo d. Hélder Câmara. A maioria nunca havia sido divulgada.
Também há seis fotografias de um arsenal de armas do grupo guerrilheiro VAR-Palmares, ao qual pertenceu a presidente Dilma Rousseff.
Há ainda fotos de corpo inteiro do jornalista Vladimir Herzog (1937-75) anexadas a papéis do Instituto Médico Legal paulista de 25 de outubro de 1975, o dia de sua morte. Nessas imagens, há marcas da necropsia e de uma mancha escura em seu pescoço.

 
Fotos do corpo do jornalista Vladimir Herzog tirada após a autópsia, 
em 25 de outubro de 1975.
O jornalista morreu após sofrer torturas no DOI-Codi de SP
 
Foto no Arquivo Nacional que faz parte de lote de imagens tiradas por araponga durante a ditadura militar;
 Na foto, os atores Antonio Pedro (de camisa clara) e Osmar Prado (camisa xadrez) fotografados pelo SNI durante a ditadura militar
 
Renata Sorrah e artista não identificado durante atividade em prol da Lei da Anistia
 
 
 
Folha.com, 18/07/2012
 
 
Arquivo libera foto que revela lesões a bala em Carlos Lamarca
 
RUBENS VALENTE
MATHEUS LEITÃO
DE BRASÍLIA

Uma rara foto do corpo do guerrilheiro Carlos Lamarca (1937-1971) revela os vários ferimentos a bala que ele sofreu no cerco militar que o matou, no interior da Bahia.
Essa e outras imagens de um dos principais nomes da resistência armada à ditadura militar, hoje sob a guarda do Arquivo Nacional, foram tiradas no Instituto Médico Legal de Salvador (BA) possivelmente por agentes do SNI (Serviço Nacional de Informações) e obtidas pela Folha.
 
 Foto do corpo do guerrilheiro Carlos Lamarca que revela os ferimentos a bala
 
"Para mim, a foto é inédita, eu nunca a tinha visto", disse o advogado da família Lamarca, o ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh. O filho de Lamarca, César, preferiu não fazer comentários sobre o conteúdo das imagens.
A família luta na Justiça para validar a indenização mensal recebida da União, suspensa após liminar obtida por três clubes militares.
O Arquivo Nacional também guarda fotos do corpo de José Campos Barreto, o Zequinha, militante do MR-8 morto com Lamarca no mesmo dia pela Operação Pajussara, do Exército, na Bahia.
Segundo a família de Zequinha, as fotos são inéditas. O irmão Olival Barreto disse ter ficado emocionado: "Eu lembro de meu irmão todos os dias. Essas fotos, desconhecidas, mostram claramente que houve uma execução". O Instituto Zequinha Barreto, em São Paulo, confirma o ineditismo das fotos.
A ativista de direitos humanos Suzana Lisboa, que representou as famílias de mortos e desaparecidos na comissão criada pelo governo nos anos 1990 para reparar danos causados pelo Estado na ditadura, disse que as imagens "confirmam o estado depauperado de ambos".
"Não tenho nenhuma dúvida sobre a execução deles." A comissão concluiu que Lamarca e Zequinha foram executados à sombra de uma árvore.
Engenheiro Raul Amaro Nin Ferreira, dias antes de sua morte em 1971
 
 
Fotografias inéditas em poder do extinto SNI (Serviço Nacional de Informações), hoje no Arquivo Nacional, em Brasília, confirmam que o engenheiro Raul Amaro Nin Ferreira (1944-1971) estava em boas condições de saúde quando foi preso pelo DOPS do Rio de Janeiro, em 1971. Onze dias depois da foto, em 12 de agosto daquele ano, Ferreira morreu no Hospital Central do Exército, para onde foi transferido após ter sido torturado no DOPS.
Ferreira havia sido parado em uma blitz policial e, dias depois, entregue ao Exército. Em sua casa, a polícia apreendeu textos considerados "subversivos".
As fotografias obtidas pela Folha eram desconhecidas de seus familiares. Em 1994, em decorrência de uma batalha legal empreendida pela família, uma decisão da 9ª Vara Federal do Rio responsabilizou o Estado por sua prisão, tortura e morte.
Ferreira aparece nas fotos sem qualquer marca de violência. Sua irmã, a professora Maria Coleta Oliveira, se disse surpresa com a existência das imagens, já que a família havia feito inúmeras buscas em arquivos oficiais.
A explicação pode estar em um detalhe: na legenda, feita em máquina de escrever, o nome de Raul Nin foi grafado erroneamente como "Min".
"Na versão oficial, não disseram que ele sofreu tortura, mas que teve uma doença no fígado, porque tinha manchas no corpo. Na verdade [quando foi preso], estava em perfeitas condições de saúde."
No livro "Os Anos de Chumbo" (ed. Relume Dumará, 1994), o general Adyr Fiúza de Castro, do I Exército, reconheceu que Ferreira morreu em decorrência das torturas: "Quando foi entregue ao Exército, estava com umas marcas, havia sido chicoteado com fio no DOPS".
A ex-integrante da Comissão de Mortos e Desaparecidos do governo federal Suzana Lisboa disse que a foto "é documento oficial que comprova que ele foi assassinado após ter sido preso".

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