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Partidarização da Justiça ameaça a democracia brasileira
Por Eduardo Guimarães
Este ano, uma das principais anomalias da democracia brasileira emergirá com força. A proximidade do julgamento do “mensalão” do PT revela que, dos três pilares da República (Executivo, Legislativo e Judiciário), um não passou pela depuração da hegemonia conservadora oriunda da ditadura.
A democracia tratou de equilibrar a correlação de forças políticas e ideológicas nos Poderes Executivo e Legislativo. A renovação de quadros que os processos eleitorais impõem a esses Poderes a cada quatro ou oito anos (neste caso, nas eleições para o Senado Federal) permite que acompanhem os anseios da sociedade por pluralidade.
Esse efeito benfazejo da democracia, porém, não atinge a terceira perna do tripé que sustenta a República, o Judiciário.
Ainda que a cúpula desse Poder seja designada pelos poderes Executivo e Legislativo através da indicação dos membros do Supremo Tribunal Federal pelo Executivo, com referendo do Legislativo, o resto do corpo da Justiça brasileira ainda sofre os efeitos de décadas a fio de controle conservador das instituições.
O funcionamento da Justiça brasileira, no varejo, mostra seu viés conservador. Da juíza que mandou massacrar milhares de famílias do bairro de Pinheirinho em São José dos Campos para beneficiar um ricaço corrupto às decisões judiciais nos Estados que atendem aos interesses das famílias midiáticas e de seus prepostos, é claro o viés político-ideológico que distorce a Justiça.
Mesmo no Supremo Tribunal Federal, espanta constatar como o julgamento do “mensalão” do PT, de interesse da direita midiática, ultrapassou, temporalmente, o julgamento de escândalos mais antigos (como o mensalão do PSDB mineiro), que se arrastam simplesmente porque a mídia não se interessa por eles.
Bastou a mídia fazer pressão para o julgamento do mensalão ser marcado, ultrapassando ilegalmente casos mais antigos que se arrastam. Aí se tem a demonstração de que mesmo em um Supremo renovado pela indicação de juízes sem vínculos políticos como os indicados pelos governos anteriores ao de Lula, o poder de chantagem da mídia ainda intimida a Justiça.
A desconfiança que a sociedade nutre em relação à Justiça transparece da manchete de primeira página da Folha de São Paulo do primeiro dia útil desta semana, que dá conta de que a CUT pode ir às ruas protestar contra uma politização do julgamento do mensalão que vai se tornando cada vez mais previsível.
Na verdade, o que um dos grupos de mídia que mais intimidam o Judiciário noticia é apenas a ponta do iceberg de um imenso movimento de resistência democrática contra o tribunal político em que as famílias midiáticas e os partidos políticos que controlam devem tentar converter o julgamento do mensalão, pois, além da CUT, todos sabem que esse movimento em prol de um julgamento técnico deve açambarcar UNE, MST e outras centrais sindicais.
Com efeito, o julgamento do mensalão será, também, o julgamento da Justiça, pois algumas condenações, se ocorrerem, serão inaceitáveis porque se darão sem prova alguma. Como no caso de José Dirceu, por exemplo, que só pode sofrer alguma condenação se o julgamento for político porque não há absolutamente nada, nesse processo, que o incrimine.
Nas instâncias estaduais da Justiça, então, a situação é espantosa. Desafetos dos barões da mídia sofrem condenações absurdas nas primeiras instâncias enquanto que essa mídia e seus peões são blindados contra qualquer reclamação pelos abusos que cometem.
Na Justiça paulista ou na carioca, por exemplo, qualquer um que enfrente a mídia ou seus tenentes sabe que perderá, passando a ter alguma chance apenas nas instâncias superiores, quando os processos deixam a Justiça estadual.
Esse processo de partidarização e ideologização da Justiça, bem como sua permeabilidade a pressões midiáticas, está se tornando cada dia mais escandaloso. Jornalistas que se opõem aos partidos de direita e aos grupos de mídia vêm sofrendo cerceamento do direito de defesa.
Recentemente, jornalistas que incomodam a Globo foram condenados em ritos praticamente sumários, com seus processos “andando” em uma velocidade que a Justiça dificilmente exibe e sob decisões escandalosas que dispensam até, pasme-se, produção de provas pelas partes, dando razão, in limine, aos prepostos da família Marinho.
Movimentos sociais e sociedade civil, portanto, organizam-se para denunciar ao mundo a corrupção da Justiça pelos interesses da direita midiática. As ruas serão o primeiro passo, mas a intenção é chegar aos fóruns internacionais, pois o partidarismo da Justiça constitui a última grande ameaça à democracia brasileira.
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