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A notícia deve ser conhecida, portanto, dispensa maiores explicações. A ATEA (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos) decidiu fazer uma campanha contra o preconceito em relação aos ateus. Para isso, comprou o espaço dos ônibus urbanos de Salvador e Porto Alegre para colocar cartazes de propaganda. Porém, as empresas de transporte público das duas cidades recusaram ceder o espaço para a divulgação da campanha.
A iniciativa foi muito boa. Porém, dos quatro cartazes, apenas um deles cumpre o papel em transmitir uma mensagem correta, respeitosa, que não dá margem a interpretações equivocadas, e que ajuda a abrir a mente de quem não tolera pessoas que não acreditam em dogmas religiosos. Este cartaz é o "somos todos ateus com os deuses dos outros". Os outros três apresentam diversos problemas.
O "religião não define caráter" carrega uma mensagem correta. Pessoas religiosas não são nem melhores nem piores do que pessoas não religiosas. O objetivo da escolha de Chaplin e Hitler para ilustrar a campanha não é mostrar que acreditar em Deus torna as pessoas ruins, mas que acreditar em Deus não torna as pessoas necessariamente boas e não acreditar não as torna necessariamente ruins. Embora correta, a mensagem é mal divulgada, por três motivos: em primeiro lugar, observadores poderim interpretar erroneamente que o objetivo do anunciante foi demonstrar que religião criaria Hitlers e ateísmo criaria Chaplins. Em segundo lugar, muita gente acha equivocadamente que Hitler era ateu. Um Torquemada, um Franco, um Khomeini ou um Bin Laden criariam menos problemas de entendimento. Em terceiro lugar, a Lei de Godovin.
O "se Deus existe, tudo é permitido" não faz sentido. Não apenas quem não acredita, mas a grande maioria das pessoas que acreditam em Deus consideraram o atentado ao World Trade Center uma monstruosidade. A foto do atentado faria mais sentido com os dizeres "se a fé fosse sempre boa, atrocidades não seriam cometidas em nome dela".
O "a fé não dá respostas, só impede perguntas" ficou muito espalhafatoso com a foto da grade de uma prisão. Em vez de estimular a tolerância, estimula o conflito.
Conforme dito anteriormente, o "somos todos ateus com os deuses dos outros" ficou ótimo. É um convite à reflexão. A maioria das pessoas que acredita em Deus nos dias de hoje acredita em um Deus específico: no Deus descrito pelas três grandes religiões monoteístas. Quase ninguém acredita nos deuses dos egípcios antigos, dos gregos antigos, dos africanos, dos indianos, dos ameríndios. Durante muito tempo, crianças que pertenceram a estes respectivos povos aprenderam desde cedo a acreditar em seus respectivos deuses. Hoje quase todos nós não acreditamos em nenhum destes deuses. Por que o Deus no qual fomos educados a acreditar desde crianças tem necessariamente que existir? O que acharíamos se os mencionados povos nos considerassem pessoas sem moral ou sem caráter somente porque não acreditamos nos deuses deles?http://www1.folha.uol.com.br/
UOL, 10/12/2010
Campanha em ônibus diz que Deus pode não existir
HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA
ARTICULISTA DA FOLHA
A Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos) veicula a partir de hoje campanha publicitária para dizer que Deus pode não existir.
Empresas barram campanha publicitária
As peças de propaganda, com frases como "Religião não define caráter" e "A fé não dá respostas. Ela só impede perguntas", circularão em ônibus de Salvador e Porto Alegre por um mês.
"O prazo pode se estender, se tivermos doações", diz Daniel Sottomaior, da Atea.
A campanha teve início no Reino Unido em 2009 e se espalhou por outros países, com resultados distintos.
Nos EUA e na Espanha, a iniciativa deu certo, provocando a esperada polêmica. Na Itália, a veiculação foi proibida. Na Austrália, a companhia responsável por anúncios em ônibus se recusou a exibi-los.
Algo parecido aconteceu em São Paulo. Depois que conheceu o conteúdo dos anúncios, já após a assinatura do contrato, a empresa que os veicularia se negou a fazê-lo, alegando que a legislação proíbe temas religiosos. A Atea avalia a possibilidade de uma ação judicial.
Metade dos cerca de R$ 10 mil utilizados na campanha brasileira vem de pequenas doações e de recursos da própria instituição. A outra metade vem de um único doador paulista que prefere permanecer anônimo.

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