segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Cesare Battisti: Direiro de asilo


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segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Direito de Asilo: Tempo de Refletir


Por Carlos Alberto Lungarzo
Anistia Internacional (USA) – 2152711 

O triunfo eleitoral da candidata Dilma Rousseff, membro do que fora o mais desenvolvido movimento da esquerda latino-americana nos anos 80, e ex-prisioneira política, deve servir para refletir sobre um fato dramático. Após 25 anos de democracia e de 8 anos de governo popular, o Brasil voltou a ter um preso político, que já permaneceu privado de sua liberdade por mais tempo do que cumpriram vários presos políticos da ditadura.
O escritor italiano Cesare Battisti está em território brasileiro (um país autônomo e soberano, cuja constituição defende a autodeterminação dos povos, a prevalência dos direitos humanos e o direito asilo) desde há quase 43 meses. Durante todo esse tempo foi refém das mais reacionárias gangues de inquisidores, da mesma mídia que envidou os mais mirabolantes esforços para desestabilizar os representantes do povo, e dos subservientes de um estado imperial, parcialmente neofascista, eivado pela corrupção, e governado por sociedades secretas, pelo obscurantismo milenar, e pelo crime organizado.

Mas os fatos se desenvolvem no Brasil, um país cioso de sua soberania, de possuir um governo plebiscitado numerosas vezes, e de ter elevado o bem-estar social de boa parte dos excluídos, e que, sobretudo, nada tem a ver com os insanos rancores e a sede de sangue do banditismo da Operação Gladio.


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Folha de São Paulo, 18/06/2010
 
Terrorismo verbal LUÍS ROBERTO BARROSO

Não é surpresa que, na guerra implausível movida há mais de 30 anos contra o ex-militante de esquerda Cesare Battisti, a verdade seja uma vítima constante. A inverdade mais repetida, como uma lavagem cerebral, é a de que ele seria um terrorista. Battisti jamais foi acusado por terrorismo. O uso da palavra maldita tem fins propagandísticos e apenas revela a falta de serenidade e o ânimo persecutório.
A história documentada, que raramente se consegue contar ao público, é a seguinte. Entre 1976 e 1979, Battisti foi membro de uma organização política chamada Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), que se opunha ao poder da máfia nas instituições italianas e à aliança entre o partido comunista e a democracia cristã.
Nesse contexto, o PAC envolveu-se em ações subversivas, com quatro mortes. Em 1979, a organização foi desbaratada e seus membros foram julgados. Battisti não foi sequer acusado de participação em qualquer dos homicídios.
Foi condenado, apenas, pelo delito político de subversão.
Dois anos depois, em 1981, Battisti fugiu da prisão, com a ajuda de um dos líderes do PAC: Pietro Mutti. Refugiou-se no México e depois na França, onde recebeu abrigo do governo Mitterrand.
Após a fuga, quando Battisti já se encontrava em segurança, Mutti foi preso. Acusado de participação nos homicídios, transferiu a culpa das quatro mortes para Battisti, mediante delação premiada.
A acusação foi "confirmada" por quatro dos condenados por homicídio no julgamento em que Battisti nem fora acusado. Não houve testemunhas, prova pericial, nenhuma arma encontrada. Só a delação dos principais acusados.
Diante disso, Battisti foi julgado novamente, à revelia, e condenado à prisão perpétua. Os "advogados" que o defenderam no segundo julgamento se utilizaram de procurações falsas, segundo perícia realizada na França. Hoje, os delatores premiados estão soltos, e só Battisti continua sendo perseguido.
Cesare Battisti é inocente das acusações de homicídio que lhe foram feitas. Embora não tenha se tornado uma ditadura, em muitos momentos a Itália não foi capaz de assegurar o devido processo legal aos adversários do regime.
Foi um período de exceção, com prisões preventivas de mais de três anos e violência nos presídios
. Por isso, o governo brasileiro o acolheu. E dois procuradores-gerais da República manifestaram-se pela validade do refúgio e pela extinção do processo.
O Supremo Tribunal Federal (STF), por cinco votos a quatro, anulou o refúgio concedido pelo ministro da Justiça, com a chancela do presidente da República, e autorizou sua extradição. Também por cinco votos a quatro, o STF entendeu que a decisão final é do presidente da República.
Alguns dos principais juristas do país escreveram ao presidente pedindo-lhe que não entregue Battisti para que sofra um justiçamento histórico tardio e injusto.
O mesmo pedido foi feito por um dos principais filósofos franceses, Bernard-Henri Lévy
. Há diversas possibilidades de não entrega compatíveis com o tratado de extradição entre Brasil e Itália, uma das quais apontada no voto do ministro Eros Grau. Cabe ao presidente Lula, soberanamente, a decisão final.
Mas não deve passar despercebido que a insistência em chamar Battisti de terrorista é artifício de quem não tem a verdade e a história do seu lado. Precisa da retórica.
LUÍS ROBERTO BARROSO, professor titular de direito constitucional da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), é advogado de Cesare Battisti no Supremo Tribunal Federal.
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Folha de São Paulo, 11/01/2010
 
Estratégia para manter Battisti no país prevê entrevistas de Lula ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A equipe dedicada a estudar a tese jurídica que deverá fundamentar a manutenção do italiano Cesare Battisti no Brasil, como deseja o presidente Lula, começa o ano com o entendimento de que o argumento mais aplicável ao caso está no temor de perseguição política. É o mesmo usado para o pedido de refúgio rechaçado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e que fatalmente reabriria uma crise diplomática com a Itália.
O pacote de medidas prevê ações para amenizar tais efeitos: um forte trabalho da diplomacia, que nem começou; e entrevistas nas quais Lula atribuiria a manutenção de Battisti no Brasil a "razões humanitárias".
Em visita à Itália em novembro, Lula discutiu o assunto com o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, que chegou a admitir a não extradição, desde que tivesse por base o tal temor de perseguição política.
Em 16 de dezembro, mesmo antes da publicação do acórdão do julgamento no qual o STF decidiu pela extradição de Battisti e firmou o entendimento de que a decisão final é prerrogativa do presidente, a Corte voltou ao tema. Motivada por pedido de revisão dos termos da decisão apresentado pela Itália, a Corte decidiu suprimir do resumo da decisão a palavra "discricionário" na frase: "por maioria, o tribunal assentou o caráter discricionário do ato do presidente da República de execução da extradição".
Na prática, nada muda. Mas deixa claro que o entendimento do STF é o de que o presidente pode negar a extradição, desde que dentro dos termos do acordo com a Itália, e não pelo motivo que lhe vier à cabeça -"caráter discricionário"
Ex-militante das Brigadas Vermelhas, a italiana Marina Petrella também teve sua extradição negada pela França por motivos humanitários em 2008. Condenada à prisão perpétua por atos terroristas na Itália, ela estava presa desde agosto de 2007. Seu estado de saúde deteriorou-se muito, o que serviu de argumento ao governo francês para soltá-la.
Não é o caso de Battisti. O que mais se aproximaria de uma questão humanitária seria alegar que, por 11 anos e meio ele viveu em situação estável na França, sob a chamada doutrina Mitterrand de proteção a refugiados políticos.
Com o governo de Jacques Chirac, ele fugiu do país e escondeu-se no Brasil, onde viveu anônimo, com passaporte falso - crime pelo qual responde
- até março de 2004, quando foi preso pela PF, a pedido do Estado italiano, para fins de extradição. É acusado de quatro assassinatos, pelos quais foi condenado à prisão perpétua.
Na argumentação formal, Lula não terá como fugir do tratado firmado entre Brasil e Itália em 1989, pelo qual é permitido negar a extradição, desde que por motivos determinados. No caso de Battisti, o mais provável está descrito no artigo 3º, alínea E: motivação política do pedido de extradição.
O desfecho da história também requer um pedido de habeas corpus, que deverá ser apresentado pelo advogado de Battisti, Luís Roberto Barroso, tão logo Lula dê o seu veredicto.
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Jornal do Brasil, 18/12/2009
 

Extradição inconstitucional

Dalmo Dallari, Jurista


No Estado democrático de direito, como é o Brasil, a Constituição é o conjunto normativo superior, que rege todos os atos jurídicos que forem praticados por qualquer autoridade ou qualquer órgão público brasileiro.
Isso tem aplicação tanto para atos que sejam praticados e produzam efeitos no âmbito nacional, quanto os atos de qualquer natureza praticados num foro internacional ou para produzirem efeitos além das fronteiras nacionais. A Constituição brasileira é superior aos acordos e tratados que forem celebrados por qualquer membro do governo brasileiro, pois nenhuma autoridade pode celebrar validamente um acordo ou assinar um tratado que seja contrário a alguma disposição da Constituição brasileira. É oportuno lembrar e ressaltar a superioridade da Constituição brasileira, neste momento em que membros do governo italiano e alguns brasileiros a eles submissos pretendem que ao decidir sobre o pedido de extradição do italiano Cesare Battisti o tratado de extradição assinado pelos governos do Brasil e da Itália prevaleça sobre a Constituição brasileira.
Essa tentativa de fazer prevalecer a vontade do governo italiano sobre a vontade do povo brasileiro, consagrada na Constituição, já foi externada e repelida várias vezes e agora tomou novo alento porque o ministro Eros Grau, dando maior precisão ao voto proferido no julgamento do pedido de extradição de Battisti, esclareceu o que quis dizer quando falou em decisão discricionária do presidente.
Externando o que, para as pessoas bem informadas e de boa-fé, era óbvio, disse agora o eminente ministro que jamais teve a intenção de afirmar que o presidente da República poderá decidir arbitrariamente,mas deverá fundar-se na Constituição.
Assim, pois, o ministro Eros Grau não modificou o seu voto, mas apenas explicitou o óbvio: na decisão sobre o pedido de extradição, que é de sua competência privativa, como diz a Constituição e foi reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente da República deverá ter em conta o que determina a Constituição brasileira.
O exame de todos os elementos jurídicos envolvidos nas circunstâncias de fato e nos processos judiciais relativos ao caso Battisti e ao pedido de sua extradição leva necessariamente à conclusão de que o pedido de extradição não poderá ser atendido pelo governo brasileiro, devendo, portanto, ser recusado pelo presidente da República, pela existência de claros obstáculos constitucionais ao atendimento do pedido. Com efeito, está expresso nos autos do processo em que Cesare Battisti foi condenado na Itália que ele foi acusado de ter praticado atos que configuram, ao mesmo tempo, "homicídio e subversão".
Não se diz, no processo, que esses crimes foram praticados autonomamente, mas, ao contrário disso, afirma-se que os mesmos atos configuraram os dois crimes. Ora, se os atos foram praticados na Itália e as autoridades italianas os qualificaram como crime político, a eventual opinião divergente dos tribunais brasileiros não tem força jurídica para modificar a qualificação dada pela Justiça italiana.
Deixando de lado, neste momento, o fato de que jamais se comprovou que Battisti tenha, efetivamente, cometido qualquer homicídio e que a acusação baseou-se exclusivamente numa delação premiada, o dado essencial é que as próprias autoridades italianas afirmam o caráter político das ações de que Battisti foi acusado, pois subversão é crime político, na Itália e no Brasil. Ora, a Constituição brasileira diz expressamente, no artigo 5º, inciso LII, que "não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião". Só isso já torna Cesare Battisti. Outro obstáculo constitucional intransponível é o fato de que a Constituição brasileira, pelo mesmo artigo 5º, no inciso XLVII, dispõe que "não haverá pena de caráter perpétuo".
Ora, o tribunal italiano que julgou Battisti condenou-o à pena de prisão perpétua. Essa decisão transitou em julgado, e o governo italiano não tem competência jurídica para alterá-la, para impor uma pena mais branda, como vem sendo sugerido por membros daquele governo.
A Constituição da Itália consagra a separação dos Poderes e assim como o presidente da República do Brasil está obrigado a obedecer a Constituição brasileira o mesmo se aplica ao governo da Itália, em relação à Constituição italiana. Em conclusão, no desempenho de sua atribuição constitucional privativa o presidente Lula deverá decidir sobre o pedido de extradição de Cesare Battisti. E respeitando as disposições da Constituição brasileira, como é seu dever, deverá negar o atendimento do pedido, pela existência de impedimento constitucional.
O pedido de extradição de Battisti não pode ser atendido pelo governo brasileiro

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