sábado, 3 de março de 2012

O candidato da UDN


CartaCapital, Ed. 687


Editorial
O candidato da UDN


Mino Carta


Há dez anos a mídia apresentava José Serra, candidato à Presidência da República pelo PSDB, como cidadão “preparado”. À época, meus dedutivos botões esclareceram que, segundo editorialistas, colunistas, articulistas, todos os demais candidatos eram “despreparados”, a começar, obviamente, por Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-operário metido a sebo. Dez anos depois, o cenário do quartel de Abrantes não mudou.

Os jornalões paulistas vivem em êxtase diante da decisão de José Serra de concorrer à prefeitura de São Paulo.

Parece, até, que o nosso herói se tornou ainda mais “preparado”, o próprio diz representar uma visão distinta do Brasil e da política que convém ao País, em defesa da democracia e da fé republicana, ameaçadas pelo petismo no poder. Na corte tucana, não falta quem denuncie o projeto “chavista” posto em prática pelo partido de Lula e Dilma. Deste, Chávez é o profeta. Palmas febris dos jornalões.

Qualquer partido que atue sobre esta nossa medíocre bola de argila a girar em torno do Sol visa ao poder para manter-se nele quanto mais puder. Talvez Serra tenha esquecido que, ao eleger Fernando Henrique Cardoso, o tucanato urdia o plano de permanecer na cúspide da pirâmide, a contemplar a nação do alto, pelo menos por 20 anos. Temo, porém, que o candidato tenha esquecido coisas mais. Evitarei o pieguismo de evocar as crenças que o moviam na juventude. Refiro-me, simplesmente, ao senso do real.

Hóspede da minha cozinha, há dez anos Serra mostrou-se preparado a consumir risotto ai funghi da lavra do acima assinado, tivesse mais espaço, eu declinaria a receita. De todo modo, o convidado apreciou, enquanto afirmava que em matéria de política social, se eleito, seria muito mais ousado do que Lula. Illo tempore considerava-o um amigo. Tenho motivos para entender que não perdoou a opção de CartaCapital pela candidatura do ex-operário. Salvo raríssimas exceções, os jornalistas nativos e seus patrões estavam com Serra. Como neste exato instante.

Certos apoios custam caro. Não sei, porém, se a observação no caso faz sentido. Há tempo, Serra soube insinuar-se nas graças dos patrões, em primeiro lugar destes antes que dos jornalistas. Melhor ser amigo do rei. A esta altura, admito que uma afinação perfeita se instalou entre o político e quem agora o promove, em função, precisamente, de uma invejável harmonia de ideias e propósitos. Trata-se, tudo indica, de uma convergência natural, de um acerto espontâneo. Diria mesmo fatal porque inescapável.

Serra, não menos que o mundo mineral, está em condições de registrar o óbvio: a mídia nativa representa o reacionarismo mais retrógrado e preconceituoso. Não triunfam ali os mais genuínos valores democráticos e republicanos, Serra sabe disso. E então, o que o leva a se colocar à direita da direita? Pelos atalhos da vida, às vezes os homens enterram o seu passado, honroso ou não, em nome de interesses contingentes ou de impulsos d’alma, redentores ou interesseiros.

Certo é que essa mídia a favor da treva, com extrema coerência, é preciso reconhecer, silencia, por exemplo, a respeito das denúncias do livro A Privataria Tucana, na singular certeza de que não aconteceram os fatos por ela deixados de noticiar. Os fatos, ora os fatos… No libelo do repórter Amaury Jr. há provas de mazelas vergonhosas que incriminam Serra. Vale a pena ignorá-las, contudo, a bem do privilégio na terra dos herdeiros da casa-grande. E assim queira o deus dos prepotentes e dos hipócritas.

O candidato Serra acaba de anunciar que seu sonho de Presidência da República está adormecido até 2016. Ou seja, se for prefeito, cumprirá seu mandato por completo. Fernando Henrique achava o sonho aposentado de vez, mas, já que o homem resiste, mudou de ideia. Supõe, arrisco-me a crer, que vencedor em São Paulo, o velho companheiro de tucanagens ganhará cacife para voltar à carga ao sabor do intuito supremo. Veremos o que veremos. Resta a evidência: o PSDB assumiu o papel outrora arcado pela UDN velha de guerra e José Serra figura à perfeição como seu candidato ao que bem entender.


Em tempo: Saiu no ig:

Petista aproveita gafe de tucano, que se referiu ao Brasil como “Estados Unidos do Brasil”, e rebate críticas ao governo Dilma

O pré-candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad, aproveitou hoje a gafe cometida pelo adversário e pré-candidato do PSDB, José Serra, que referiu-se ao Brasil como ‘Estados Unidos do Brasil’ quando o correto é ‘República Federativa do Brasil’, para defender a presidenta Dilma Rousseff (PT) das críticas do tucano.

“Talvez estejamos falando dos Estados Unidos do Brasil e não da República Federativa do Brasil. É algum outro País na cabeça do candidato José Serra e não o Brasil”, ironizou Haddad.

(…)




O segredo do poder de José Serra

Maria Inês Nassif


José Serra chegou tarde na disputa pela legenda do PSDB à prefeitura paulistana: antes de declarar suas intenções, foram sete meses de disputa interna entre os quatro pré-candidatos tucanos (José Anibal, Bruno Covas, Ricardo Tripoli e Andrea Matarazzo), que percorreram os 48 diretórios zonais da capital e fizeram debates regulares com filiados do partido. Mesmo que vença a disputa com os candidatos que sobraram – Bruno Covas e Andrea Matarazzo abriram mão de suas candidaturas em favor de Serra –, o ex-prefeito terá de lidar com bases políticas que, pela tradição tucana pós-Covas, estavam alijadas até agora das decisões partidárias, e pela primeira vez na última década foram chamadas a debater e decidir uma candidatura.

Os relatos dos efeitos da disputa interna sobre uma base até então desmotivada são unânimes em apontar que as prévias foram um sopro de vida num partido altamente hierarquizado e sem vida interna fora dos seus quadros institucionais. Da participação da militância, tucanos levaram também a informação de que há um desconforto explícito com o distanciamento de Serra. O cacique tucano esteve no centro da política tucana paulista praticamente por toda a última década , mas trabalhou em isolamento completo em relação ao partido. À sua volta, formou-se um partido paralelo, o dos “serristas”, que sempre se sobrepôs e manobrou as decisões do PSDB.

O primeiro vice-presidente municipal, João Câmara, um dos que se revoltaram com as manobras feitas pelo grupo serrista na reunião da Executiva, segunda-feira, que conseguiram o adiamento da consulta, do dia 4 para o dia 25 de março, acha que Serra é a personificação do mal no partido: “O Serra historicamente é sinônimo de desagregação do PSDB nacional, estadual e municipal”, vocifera. Outro integrante do partido acha que, pior do que Serra, são os serristas. O método do grupo mantém o partido em crise permanente, para dentro, e para fora expressa “posições elitistas, antipáticas e arrogantes, às quais atribui a rejeição enorme atingida pelo tucano nas últimas pesquisas de intenção de voto.

Serra aceitou participar das prévias porque não existia mais caminho de volta. Em outros tempos e outras circunstâncias, teria conseguido manobrar internamente para que os quatro pré-candidatos renunciassem em seu favor. E, se as mesmas bases que no processo de escolha interna reclamam da marginalização de uma militância histórica, ligada à formação do partido, consagrarem o ex-prefeito como candidato, seguramente o PT terá uma enorme contribuição nessa decisão.

No imaginário tucano, a ação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa é uma estratégia de “aniquilamento” do PSDB nacional que, se abatido em seu último reduto, São Paulo, estaria condenado ao fogo do inferno. A ameaça de que o PT use uma eventual vitória na disputa pela prefeitura da capital paulista para destruir a hegemonia tucana no Estado torna Serra, o político com mais recall do partido, uma alternativa. Numa situação de ameaça extrema, a tendência do partido, provavelmente, será a de não correr o risco de lançar um nome novo na praça, mas apostar num candidato conhecido, e torcer para que os recursos de marketing político sejam eficientes para vencer a rejeição dos eleitores.

Ainda assim, o fato de o grupo de Serra ter passado como um trator sobre uma Executiva que praticamente já tinha acordado o adiamento das prévias marcadas para o dia 4 por uma semana, obrigando-a a engolir um adiamento de pouco mais de um mês (de 4 para 25) pode ser o sinal de que o ex-prefeito não está tão seguro de que possa nadar de braçada nas prévias, sem tempo suficiente para reverter simpatias já conquistadas pelos candidatos José Anibal e Ricardo Tripoli, mesmo contando com o apoio de Bruno Covas e Andrea Matarazzo, que se retiraram da disputa. E também que o grupo do ex-prefeito sabe que não conseguirá esvaziar o processo de escolha, o que o beneficiaria.

Segundo pesquisa feita internamente pelo partido, com uma amostra de 773 dos 19.500 filiados, 89% têm a intenção de votar. Nessas eleições, se vencer as prévias, Serra estará obrigado a sorrir e cumprimentar eleitores potenciais em dose dupla: primeiro, dentro do seu partido; depois, nas ruas da maior cidade da América Latina.

(*) Colunista política, editora da Carta Maior em São Paulo.




Sábado, 03 de Março de 2012

Serra estreia seu horário eleitoral

Por Saul Leblon

A estreia do horário eleitoral de Serra no telejornal do apresentador que se notabilizou por ofender garis foi um bate bola entre amigos. Pelota erguida, Serra disparou algo como: 'o problema principal do governo Dilma é que as obras não deslancham...'.

Naturalmente, seu interlocutor não cometeria a indelicadeza de recolocar a bola no campo municipal e quem sabe arguir o convidado sobre a grande obra de impermeabilização das margens do Tietê, por exemplo. Colosso do ambientalismo tucano cometido durante a sua passagem pelo governo do Estado, a obra deslanchou criticada por nove entre dez especialistas em drenagem e urbanismo. Perto disso, a infração de quem se considera um craque em Brasil mas troca o nome do país, é ato falho menor.

O amistoso feito de passes curtos e salamaleques franqueados às espinhas lubrificadas de anti-petismo, antecipa a disposição midiática de ocultar o que quer que seja da ruinosa herança de oito anos da dupla Kassab/Serra na capital, nem que chova canivete. Ou pedaços de viadutos, o que tem acontecido literalmente, com a regularidade alarmante dos eventos que anunciam uma dinâmica, não uma exceção. Quase simultaneamente à tertúlia desta semana na TV, despencava mais um pedaço de concreto de uma das 270 pontes e passarelas de uma capital literalmente caindo aos pedaços, por conta de obras e manutenção que 'não deslancham'. Mas a mídia não chia, nem associa o desgoverno à imagem 'operosa' com a qual seu candidato se vende com anuência obsequiosa dos 'meios'. Três exemplos:

I. SP: concreto de viaduto cai em cima de táxi e deixa 3 feridos(Folha/ 02-03-2012) : "A queda de um pedaço de concreto da estrutura do Viaduto Brigadeiro Luís Antônio, na região central de São Paulo, deixou três ocupantes de um táxi feridos levemente, por volta da 1h desta sexta-feira. Segundo a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), o táxi trafegava pela avenida 23 de Maio, no sentido aeroporto, quando foi atingido por um pedaço de concreto de aproximadamente dois metros..."

II. SP: parte de viaduto cai sobre pedestre (UOL/ 30-03-2011): "Um pedaço de concreto da estrutura do Viaduto Olavo Fontoura, na zona norte, despencou sobre um pedestre na tarde desta quarta-feira, 30, em São Paulo.De acordo com o Corpo de Bombeiros a vítima sofreu ferimentos leves, e foi encaminhada a um hospital próximo.

III, "SP: Cai pedaço da Ponte dos Remédios (Jornal da Tarde 23-11-2011):'Na madrugada de ontem, 30 metros de passeio e do gradil da Ponte dos Remédios despencaram sobre o Rio Tietê'(...)" *A passarela é uma das principais vias que ligam a capital à Osasco, na região metropolitana.

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