Caros Amigos, março 2012 p 33
MARCHA RUMO À PÁTRIA GRANDE
Salvador Cabral
A crise do Império Central fortalece a oportunidade de novos espaços de integração dos países latino-americanos.
A história da construção dos grandes poderes no mundo nos vem confirmando que somente são protagonistas, soberanos, donos absolutos de seus atos, com capacidade de decisão sobre sua própria história, os grandes espaços organizados. Esse é o momento em que a Geografia se transforma em História. Os grandes espaços com a organização do poder e economia articulada foram os protagonistas da história enquanto puderam manter todas essas condições juntas. Assim foi com Roma, com a Espanha, com a Inglaterra etc. E, ao contrário, estes mesmos espaços desarticulados e divididos ficaram à margem, na impossibilidade de tomar decisões. Em outras palavras, suportaram a História. É o caso da África, do Islã e da América Latina.
Neste último caso, nossa Pátria Grande muitas vezes tentou se unificar, mas foi impedida por forças internacionais mais poderosas que as nossas. Nascemos da luta pela Independência travada pelos unificadores, mas devido à habilidade britânica, à ambição cega da burguesia comercial portuária e à carência de um desenvolvimento próprio interno, com um centro de poder industrial aglutinador, nos transformamos em vinte republiquetas sem destino que se desconhecem e vivem desconfiadas entre si.
Seria longo relatar todas as tentativas em que nós latino-americanos quisemos levantar a cabeça para nos unificarmos, mas sempre as circunstâncias adversas foram mais fortes. De Morazán a Perón transcorreu mais de um século sem que pudéssemos lograr sequer pequenas vitórias.
Mas, a partir da década de 1990 do século 20, o mundo voltou a se reacomodar. Parece que adentramos uma época onde os mapas querem se mover e mudar suas dimensões. A repetição de grandes crises em distintos continentes, ano após ano, fizeram nascer uma consciência de autodefesa em zonas que haviam tentado alguma vez projetar uma unificação. O ABC de Saenz-Pefia e o ABC de Perón tomaram corpo no Mercosul. Em pouco tempo, este Mercosul multiplicou a si mesmo e se fortificou. Triplicaram os negócios e começou a nascer um poder interno próprio que numa página memorável jogou por terra a ALCA, que era uma nova tentativa de panamericanismo, para que a América Latina pagasse as festas e as dívidas dos EUA.
Em pouco tempo se formou a UNASUL. Os ventos da História começaram a soprar a favor da construção de nosso destino. E a UNASUL também se fortificou. Agora já temos o Banco do Sul.
OPORTUNIDADE
A América Latina está travando, sem canhões e sem exércitos, uma das maiores batalhas em que está em jogo o seu destino. Por ora, a questão é América do Sul. A sua ampliação virá por consequência.
O Mercosul levanta sua bandeira de proteção em conjunto, sinal de que quer brigar, defender o que conquistou, consolidar seus avanços, enfim, ser protagonista, "senhores de si mesmos".
Mas a batalha não será fácil e creio, com sinceridade, que esta é nossa última oportunidade.
A crise do Império Central é tão profunda e incontrolável que está do nosso lado. Já não têm tempo para pensar em nós, mas apenas para procurar uma saída para si mesmos. Agora se declararam uma potencia do Pacífico, dando as costas à Europa no meio de uma crise que nasceu nos EUA. Tudo faz pensar, até agora, que a questão será longa, e por isso temos que ganhar tempo colocando em prática tudo o que até agora vem sendo conversado:
A fábrica de aviões, em Córdoba, obra de parceria entre Brasil e Argentina;
A rodovia Caracas - São Paulo - Buenos Aires, que multiplicará por milhões os negócios;
Avançar no tema da moeda única, num momento de carência de fé no Dólar e no Euro;
A fábrica de submarinos atômicos, em Puerto Belgrano na Argentina em parceria com o Brasil;
A rodovia transoceânica, por onde for mais conveniente, já que existem ao menos sete projetos - incluindo as ferrovias - que almejam distintos objetivos.
É o momento para as grandes obras, já que não temos tempo para pequenas competições.
E algo tão importante quanto o que já foi dito: uma grande difusão - por parte dos Estados em jogo - da tomada de consciência da América Latina como um bloco cultural único e indivisível. Porque sem autoconsiência, tampouco haverá vitória possível. Todas as grandes culturas que se organizaram como Estado, ou Estados Continentes, ou Confederações de Estados com um Mercado Comum, contaram sempre com duas condições indispensáveis: criar um poder interno próprio, harmônico e compartilhado entre as partes; e ter consciência de pertencimento, de História e do inevitável que é construir um porvir comum. Então, sim, nossas conquistas darão razão de ser a antigos sacrificios. E esse é o caminho para sermos invencíveis.
Salvador Cabral é senador da República Argentina, designado para cumprir mandato no Parlamento do Mercosul. Publicou no Brasil o livro A Revolução Cultural do Mercosul.
Trad.: Micael Morassutti e Fernando Barros Lapoll
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