sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Mercados têm pior dia desde crise de 2008

Sisyphus
 
 
São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2011

Mercados têm pior dia desde crise de 2008, e cresce medo de recessão
 
DE SÃO PAULO

Os mercados tiveram ontem o dia mais nervoso desde a crise financeira de 2008 e elevaram o receio de que a economia mundial entre em novo período de recessão.
As Bolsas caíram na Ásia, na Europa e nas Américas - a de SP teve um dos piores desempenhos no mundo, perdendo 5,7%.
O dia começou com ação do Japão para desvalorizar o iene, para onde investidores preocupados vinham fugindo.
A decisão do Banco Central Europeu de comprar títulos de países em crise, deixando claro que a situação no continente ainda é grave, aumentou o pânico. Investidores se desfizeram de ações e buscaram proteção no Tesouro americano, apesar da crise dos EUA. O retorno sobre os papéis despencou.
Para tentar reanimar a economia, voltou a ser cogitada nova rodada de compra de títulos pelo governo americano.
Investidores fogem para papéis do Tesouro dos EUA

ÁLVARO FAGUNDES
DE NOVA YORK

A Bolsa de Nova York teve ontem uma queda como não era vista desde as semanas seguintes à quebra do Lehman Brothers, em 2008, com os investidores preocupados com os rumos da economia global e as incertezas sobre a crise da dívida na Europa.
O índice Dow Jones recuou 513 pontos, ou 4,3%, o pior resultado desde o fim de 2008, e já perdeu todos os ganhos acumulados neste ano. Na Ásia, as Bolsas de Tóquio e Hong Kong abriram hoje com queda superior a 4%.
Um sinal do temor dos investidores é que o rendimento dos títulos de dez anos do Tesouro continuou a cair ontem, de 2,64% para 2,47%, indicando a fuga dos investidores por segurança. No início de julho, eles pagavam rendimento de 3,22%.
Apesar da discussão sobre o calote da dívida americana, os títulos dos EUA continuam a ser os mais confiáveis, já que não há outro papel que tenha a mesma liquidez e outras grandes economias também enfrentam problemas.
Ao contrário dos últimos dias, em que foram divulgados dados desastrosos sobre a economia americana, ontem não saiu nenhum indicador, mas as tensões foram se acumulando e há preocupação quanto ao dado de desemprego, que sai hoje.
Para analistas, um dado negativo sobre trabalho deve desencadear nova onda de queda no mercado de ações.
Preocupações sobre a economia americana voltaram a crescer na semana passada, quando foi divulgado que o PIB do primeiro semestre teve um crescimento muito fraco, 0,9%, abaixo do necessário para acelerar a criação de empregos.
Nesta semana, indicadores da indústria e do consumo dos americanos mostraram os piores resultados em dois anos, e economistas como Martin Feldstein, de Harvard, disseram que é de 50% a chance de os EUA mergulharem em uma nova recessão.
A questão é o que o governo Barack Obama pode fazer para reverter esse processo.
O acordo fechado nesta semana para elevar o teto da dívida vai cortar gastos estatais e deve ter impacto negativo no PIB nos próximos anos.
Por isso, volta-se a falar em nova rodada de afrouxamento monetário pelo Fed (BC dos EUA), repetindo o que iniciou no fim do ano passado, com a compra de US$ 600 bilhões.

Ação do BC europeu ajuda a espalhar o pânico pelo mundo

DE NOVA YORK

O Banco Central Europeu (BCE) anunciou ontem a compra de títulos dos governos de Portugal e Irlanda pela primeira vez desde março, numa tentativa de aumentar seu valor de mercado.
O resgate das duas economias inquietou os investidores por ser um reconhecimento implícito de que a crise europeia está longe do fim.
Para piorar, o fato de Itália e Espanha, economias bem maiores e que também enfrentam dificuldades, terem ficado de fora da ação ajudou a enervar os mercados.
Em carta a líderes do continente, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, contribuiu para a tensão ao admitir que "está claro que não estamos mais administrando uma crise somente na periferia da zona do euro."
As Bolsas reagiram. A de Paris caiu 3,90%, enquanto a de Frankfurt registrou perdeu 3,40%. Em Londres, a queda foi de 3,43%.
Grande parte do dinheiro que saiu das ações acabou buscando títulos do Tesouro americano, derrubando seu rendimento.
Os custos de Espanha e Itália para pegar dinheiro emprestado no mercado continuaram a subir, enquanto o rendimento dos títulos alemães (vistos como os mais seguros da região europeia) também recuou.

OPINIÃO

Mercado joga com as brancas e ameaça dar o xeque-mate

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O frenético xadrez da economia mundial era assim assustadoramente descrito pelo sítio da Eurointelligence, centro de investigação da economia europeia:
"Do ponto de vista do risco-país [índice que o mercado usa para apontar o perigo de calote], Itália e Espanha estão agora na posição em que estavam Irlanda e Portugal quando tiveram que ser socorridos; a Bélgica está onde a Espanha costumava estar faz apenas um mês. E a França subiu para onde costumava estar a Bélgica".
Resumo: se a França, quarta maior economia do mundo, segunda da Europa, entrou no jogo, significa que ninguém está a salvo.
Prova-o o fato de que as Bolsas do mundo inteiro desabaram ontem de novo, inclusive a do Brasil, país em que o problema não é a falta de crescimento, mas o inverso, o risco de superaquecimento.
"O que estamos vendo é uma disseminada crise de confiança", confirma para o jornal britânico "Financial Times" Ed Yardeni, fundador de um grupo de pesquisa que leva seu sobrenome.
O que está no ar, como escreve a colunista do "Financial Times" Gillian Tett, é um certo ambiente Lehman Brothers, banco cuja quebra, três anos atrás, foi o detonante da Grande Recessão que se seguiu: "A maneira pela qual a história da eurozona está se desenvolvendo parece assustadoramente similar ao padrão por trás da turbulência financeira norte-americana do final de 2008", escreveu ela ontem.
Por fim, até o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, cuja missão é defender o rei nesse xadrez, admitiu que a crise da dívida já não se limita à periferia da zona do euro (aliás, só por licença poética pode-se colocar a Itália na periferia do que quer que seja, já que é membro pleno do G7).
E o pior ainda está por vir, ao menos em matéria de desemprego, dizem 47% dos europeus, maioria relativa dos consultados pelo Eurobarômetro nos 27 países da União Europeia.
Nos países já quebrados, o terror é ainda maior: 80% dos portugueses temem uma piora. Esse percentual é de 78% entre os gregos e 60% entre os irlandeses.
Como emprego está indissoluvelmente associado a crescimento e como a falta dele é o pretexto do dia para explicar a queda das Bolsas, fica a sensação de que o xeque-mate pode estar a apenas alguns lances mais.
São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2011

2008, a crise jamais acabou

VINICIUS TORRES FREIRE

OS COLAPSOS em vários mercados financeiros seriam um prenúncio do apocalipse maia de 2012? Da segunda vinda da Grande Recessão?
A resposta é assunto de profeta. O que deve de uma vez por todas ficar claro, porém, é que não se sai sem dor de catástrofe como a de 2008: a bandalha da finança desregulamentada com governos que o dinheiro grosso comprou ("capturou", como diz a economia política).
As euforias do início de 2010 e de 2011 eram apenas isso: festa de investidores que viam os preços dos ativos financeiros se valorizarem rapidamente, dada a oferta colossal de dinheiro barato pelos bancos centrais, em especial o dos EUA.
A economia real estava mesmo na lama: setor imobiliário em depressão, famílias na grande pindaíba (superendividadas), desemprego abissal, salários estagnados ou cadentes, bancos reticentes em emprestar, empresas cheias de caixa, mas reticentes em investir. O caldo engrossou de novo, agora, porque:
1) caiu a ficha de que os EUA não estão crescendo nada: indústria, serviços, consumo e renda estagnaram em julho. Pior, revisões de dados mostraram que a recessão fora mais profunda, e a recuperação, ainda mais pífia do que o sabido;
2) ficou ainda mais claro, depois do acordo de redução do deficit público nos EUA, que não virá estimulo adicional via gastos do governo. Na eurolândia, muito mais quebrada e "ortodoxa" do que os EUA, a hipótese de haver estímulo fiscal (gasto público) é ainda mais improvável. Logo, de onde virá o piparote para a retomada da demanda (consumo), do crescimento?;
3) o "pacote de socorro" para a Grécia, apesar da bajulação da mídia financeira mundial, era pouco e se acabou. O mercado continuou achando que a Grécia vai calotear;
4) mais grave, a perspectiva de crescimento pífio provocou ainda mais descrença na capacidade da Itália de pagar suas dívidas (se o país cresce menos e a poupança do governo não aumenta, aumenta também o peso relativo da dívida);
5) dada a percepção de que Grécia, Portugal e, talvez, Itália, irão para o vinagre, os donos do dinheiro passaram a cobrar retorno ("juros") ainda maiores para deter títulos da dívida desses países, o que pode apressar a quebra deles;
6) dado tal cenário, bancos europeus voltaram a temer o risco de quebra de seus pares: o empréstimo interbancário ficou mais difícil. Passou a faltar oxigênio na praça.
Isto posto, o Banco Central Europeu avisou que vai voltar a comprar títulos da dívida de Portugal e Grécia (indiretamente, os financia), mas não de Itália e Espanha (o que apavorou ainda mais os mercados).
O BCE avisou ainda que vai emprestar dinheiro para bancos com pouco oxigênio (isto é, reconheceu o início de pânico entre bancos).
Por fim, o "governo da Europa" reconheceu que é preciso mais dinheiro para cobrir rombos (na Itália e sabe-se lá onde mais): reconheceu que o caldo entornou.
O resto da história de ontem é "psicologia da manada". Houve fuga em massa para títulos do governo dos EUA e da Alemanha. As curvas de juros da dívida desses países estão ficando "achatadas", em tese prenúncio de recessão.
Mas pode não vir colapso imediato. O mais provável, por ora, é uma lenta saída do lamaçal de 2008. Coisa que pode levar 5, 10 anos.

São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2011

PREOCUPAÇÃO
CRISE É COMO 'PNEUMONIA', AFIRMA DILMA

Os temores de recessão mundial e a queda nas Bolsas fizeram a presidente Dilma Rousseff voltar a demonstrar sua preocupação com a crise. Ao falar da resposta que o Brasil adotará para proteger sua economia, Dilma afirmou que o país precisa saber reagir como "em uma pneumonia". "Na crise aguda você reage de uma forma. Na crise crônica, mudamos de reação", disse ela em reunião fechada com sindicalistas, segundo apurou a Folha.

Greece in Debt


CartaCapital, 04 de agosto de 2011

Grécia constrói fosso na fronteira com a Turquia

Gabriel Bonis
Em meio ao temor do avanço da extrema direita e do endurecimento das políticas imigratórias na Europa, a Grécia iniciou a construção de um fosso de 120 quilômetros de extensão, 30 metros de largura e sete de profundidade na fronteira com a Turquia, para evitar a entrada de imigrantes ilegais.
O projeto, que também visa a aumentar a proteção em relação ao país vizinho e de maioria islâmica, acontece mesmo com a debilidade da economia grega. O país teve um segundo pacote de ajuda financeira de 109 bilhões de euros aprovado em julho para controlar uma dívida pública com previsão de atingir 172% do PIB em 2012.
O isolamento da fronteira grega, segundo a socióloga Marijane Lisboa, do Instituto de Relações Internacionais da PUC-SP, repete empreendimentos custosos, ora gigantescos, que se pretendem a proteger a população dos próprios vizinhos. Dois exemplos citados por ela são as grades instaladas no porto espanhol do Marrocos e a cerca na praia de Tijuana, na fronteira com os EUA. “São medidas lamentáveis em um mundo no qual as mercadorias e o capital circulam livremente e as pessoas, não”, diz.
Os primeiros 14,5 quilômetros da obra, feitos na região do rio Evros, já estão finalizados e os trabalhos para os próximos trechos seguem. Em 2010, a área foi a porta de entrada para 90% dos imigrantes ilegais no Espaço de Schengen. Segundo o governo grego, que já havia ameaçado construir um muro para frear o trânsito ilegal de pessoas na região, cerca de 130 mil imigrantes sem documentos entraram na União Européia pela Grécia, destes 40 mil na zona de Evros.
Uma movimentação, que, para Lisboa, não é possível deter. “O fluxo vai ser desviado para rotas mais perigosas, resultando em mais mortes. Além disso, o tráfico humano ganha mais poder econômico, pois as travessias ficam mais difíceis e caras”.

Xenofobia
A instabilidade econômica na Europa, responsável pela derrocada das economias periféricas de Portugal, Espanha e Grécia, abre espaço para o discurso conservador e nacionalista no continente – que geralmente descanbam para a xenofobia.  Na França, por exemplo, Marine Le Pen, da Frente Nacional, constroi sua campanha presidencial atribuindo aos imigrantes as mazelas do país.
Enquanto isso, a Itália é forçada a receber milhares de pessoas fugindo das revoltas árabes no Norte da África, a maioria delas abrigadas na pequena ilha de Lampeduza. “A Europa está desrespeitando até mesmo as políticas de refugiados”, aponta Lisboa, que ainda critica a ação italiana no arquipélago. “Quais medidas são mais agressivas: deixar pessoas morrer em barcos como a Itália fez ou construir muros?”, questiona.
Nesse cenário, a União Européia começa a discutir a instalação de postos de controles internos de fronteiras no Espaço de Schengen, baseada principalmente nas pressões de França e Itália, que enfrentam dificuldades em lidar com os imigrantes ilegais. “A política de fechar as portas e não deixar entrar é ineficiente. Os países deveriam pensar em outras formas de conter o fluxo de pessoas indocumentadas, como estabelecer cotas ou um rodízio”, aponta a especialista.
Para ela, discursos anti-imigração funcionam apenas para alimentar os partidos de extrema direita “que usam essa situação como um bode expiatório para esconder seus verdadeiros problemas”.
“O setor da agricultura na Espanha, Suíça e Itália simplesmente não funcionaria sem essa mão-de-obra, assim como o setor hoteleiro. Os imigrantes trabalham muito e por pouco”, conclui.

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