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Consultor Jurídico, 05 de agosto de 2014
As motivações não tão secretas da aposentadoria de Joaquim Barbosa
Por Marcio Chaer
Em uma noite calorenta de Brasília em maio de 2005, um jornalista pôs-se a dar conselhos a Joaquim Barbosa, então ministro do Supremo Tribunal Federal. Nos seus dois primeiros anos na corte, Joca, como o chamam os mais próximos, mostrava-se perdido nas funções. Ele ouviu que precisava encontrar seu espaço no tribunal. Mostrar a que veio.
Por essa época, cada voto era um suplício. Até a leitura da decisão, preparada pela assessoria, a coisa ia bem. Mas quando chegava a hora dos costumeiros questionamentos dos demais ministros ao relator, complicava. Atônito, sem respostas, ele se punha a reler o voto — que não contemplava a informação solicitada. Uma nova pergunta se seguia de nova leitura do voto.
Até que um ou outro colega mais paciente, ou menos cruel, passou a vir em seu socorro. “Vossa Excelência, então, quanto à preliminar suscitada, acolhe os embargos, certo?” Ao que Joaquim murmurava algo em sentido positivo. Outro completava: “Quanto ao mérito, o relator considera prejudicado o pedido, é isso?”. Com uma variação ou outra, os votos iam sendo acochambrados até se dar formato a uma decisão inteligível ou minimamente satisfatória.
Naquela noite de maio, quando se sugeriu a Barbosa divulgar melhor sua produção técnica, outro ministro ouviu parte da conversa. Em outra roda, da qual participavam cinco colegas dele, o assunto virou piada. “Olha o que ouvi agora: sugeriram ao Joaquim mostrar sua contribuição técnica no Supremo”. E todos caíram na risada.
A pelo menos um amigo, Joaquim Barbosa confessou sua vontade de abandonar o tribunal. Mas foi aconselhado a desafiar e “peitar” a estrutura. No campo do Direito ele não tinha como se destacar, estava claro. Mas poderia puxar os colegas para outro ringue em que eles não tivessem como superá-lo.
No livro Como a picaretagem conquistou o mundo, o jornalista britânico Francis Wheen analisa a receita da construção de personagens que, com largas doses de demagogia e populismo chegaram a altos cargos, como a presidência dos Estados Unidos ou ao cargo de primeiro-ministro do Reino Unido. Em uma das resenhas dessa obra, o crítico Rafael Rodrigues cita o teatrólogo Nelson Rodrigues, que disse que esses personagens tomaram o lugar dos melhores a tal ponto que se criou “uma situação realmente trágica: ou o sujeito se submete ao idiota ou o idiota o extermina”.
É claro que Joaquim Barbosa não se enquadra no perfil. Mas o livro é pedagógico no sentido de evidenciar como a construção de um personagem, no mundo da política, do jornalismo, das artes ou das finanças, possibilita o sucesso sem que a celebridade artificial tenha realmente o estofo para pontificar no píncaro a que foi alçado.
Assim como nos primeiros anos em que ralhava com seus assessores por não preverem as perguntas que lhe seriam feitas em Plenário, o ministro manteve-se até o fim em estado de guerra com quase todos os colegas. Aperfeiçoou-se no uso da comunicação instantânea pelo laptop de tal forma que outros ministros resolveram não levar mais o equipamento para a bancada. Mas isso aliviou bastante o que considerava uma prática maldosa dos colegas: as tais perguntas embaraçosas.
Em sua passagem pelo STF, Joaquim Barbosa raramente recebeu advogados que lhe solicitavam a oportunidade de oferecer subsídios para suas decisões. Essa tarefa era penosa para ele da mesma forma que a interlocução com os ministros em Plenário. A sua explicação era que considerava esse tipo de “conluio” indecoroso. Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, o também ministro aposentado Cezar Peluzo, aponta outro motivo, mais prosaico, que cabia numa só palavra: insegurança.
Na mesma entrevista, Peluzo contrariou outra crença disseminada largamente por Barbosa: o de que suas ausências no plenário e sua impaciência com as sessões deviam-se a problemas de saúde.
O sucesso de Barbosa, como relator da Ação Penal 470, o chamado mensalão, lustrou a imagem externa do ministro. Mas junto à elite da comunidade jurídica foi motivo apenas de desconsolo. As poucas vozes que ousaram "chutar a santa" canonizada pela opinião pública, sedenta de vingança contra a comunidade política em geral e contra o PT em particular, enfrentaram o risco aventado por Nelson Rodrigues e as vaias da plateia.
Como presidente do Conselho Nacional da Justiça, originalmente apelidado de órgão de controle externo do Judiciário, Joaquim Barbosa viveu um paradoxo lógico entre o substantivo e o adjetivo. Durante toda sua gestão, foi o mais feroz crítico do sistema judicial e seus protagonistas. Mas não apresentou ou aprovou uma única proposta que corrigisse as distorções e deformações elencadas por ele mesmo. Na análise de pessoas que acompanham a carreira de Barbosa, o seu portfólio como procurador da República (em que passou dez de vinte anos em licença), como ministro e como presidente do STF e do CNJ têm igual relevância. A sua contribuição técnica, jurídica e institucional deixam a mesma marca nos três órgãos.
Por fim, depois de onze anos de embates e desinteligências, ao menos se sabe que Joaquim Barbosa e os ministros do Supremo, no plano institucional, concordaram em alguma coisa. Essa ideia se resume na sintética expressão que o ministro divulgou em seu perfil no Twitter, ao se retirar do ringue:
As motivaes...
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Tijolaço, 6 de agosto de 2014
O prato frio da vingança de Gilmar Mendes?
Por Fernando Brito
Se alguém não sabe quem é Marcio Chaer, editor do site Consultor
Jurídico, transcrevo abaixo a descrição que faz dele o jornalista Rubem
Valente, da Folha, autor do livro “Operação Banqueiro”:
Chaer tem ou teve como clientes de suas empresas alguns dos
principais escritórios de advocacia do país, muitos dos quais receberam
recursos da companhia telefônica Brasil Telecom na época em que ela era
comandada por pessoas indicadas pelo grupo Opportunity. Márcio Chaer é
amigo íntimo do ministro do Supremo Gilmar Mendes, devidamente referido
em meu livro.
Dito isso, ficamos livres para pensar que o artigo publicado por Marcio Chaer, ontem, insinuando de maneira nada indireta que o ex-Ministro Joaquim Barbosa é, em matéria de conhecimento jurídico, algo próximo do nada, possa ter uma espécie de identidade de avaliação de Gilmar Mendes, pelo intenso convívio de ambos, mesmo que não uma “coautoria espiritual”.
Diz de Joaquim o amigo de Gilmar:
(…)cada voto era um suplício. Até a leitura da decisão, preparada pela assessoria, a coisa ia bem. Mas quando chegava a hora dos costumeiros questionamentos dos demais ministros ao relator, complicava. Atônito, sem respostas, ele se punha a reler o voto — que não contemplava a informação solicitada. Uma nova pergunta se seguia de nova leitura do voto.
Até que um ou outro colega mais paciente, ou menos cruel, passou a vir em seu socorro. “Vossa Excelência, então, quanto à preliminar suscitada, acolhe os embargos, certo?” Ao que Joaquim murmurava algo em sentido positivo. Outro completava: “Quanto ao mérito, o relator considera prejudicado o pedido, é isso?”. Com uma variação ou outra, os votos iam sendo acochambrados até se dar formato a uma decisão inteligível ou minimamente satisfatória.
Chaer descreve que, numa roda de ministros, alguém comentou, jocosamente:
“Olha o que ouvi agora: sugeriram ao Joaquim mostrar sua contribuição técnica no Supremo”. E todos caíram na risada.”
Não tenho, é claro, elementos para julgar com tanta severidade as luzes jurídicas de Barbosa e muito menos duvido que Chaer, que frequenta aqueles tapetes há anos, possa de fato não estar distante do juízo que fazem dele os demais ministros.
Mas há, no texto, duas coisas gravíssimas.
A primeira é a afirmação de que a Ação Penal 470 foi o tablado em que Joaquim Barbosa fez sua exibição de poder ante seus próprios pares, criando um clima em que divergir dele seria ser conduzido ao “matadouro” diante da mídia e da opinião pública por ela insuflada.
“As poucas vozes que ousaram “chutar a santa” canonizada pela opinião pública, sedenta de vingança contra a comunidade política em geral e contra o PT em particular, enfrentaram o risco aventado por Nelson Rodrigues e as vaias da plateia.”
Boa razão para a frase do Ministro Luiz Roberto Barroso, logo em suas primeiras manifestações no STF:
“Não estou almejando ser manchete favorável. Sou um juiz constitucional, me pauto pelo que acho certo ou correto. O que vai sair no jornal no dia seguinte, não me preocupa”. “Eu cumpro o meu dever. Se a decisão for contra a opinião pública é porque este é o papel de uma Corte constitucional”
Mas, para os demais, uma vergonha em acompanhar situações que só recebiam a desabrida defesa de quem, por razões políticas, simpatizava com os atropelos de Joaquim Barbosa, como o próprio Ministro Gilmar Mendes e o “ministro” Merval Pereira.
O segundo fato grave está bem lá em cima, antes de iniciar-se o artigo: a data.
Dias após a aposentadoria de Joaquim Barbosa, torna-se meramente vingança covarde fazer aquilo que seria, antes, um ato de informar a população e a comunidade jurídica de algo da maior gravidade – um ministro ser incapaz tecnicamente na avaliação de seus próprios colegas e estar usando uma ação penal como instrumento de sua afirmação em um tribunal que o desprezava.
Assim é que Joaquim Barbosa tornou-se, ele próprio, alvo das vilanias que praticou e até de seus próprios arroubos, como aquele em que perguntou a Gilmar Mendes se estava falando “com os seus capangas lá do Mato Grosso”.
Não, não estava.
Até porque os capangas do Mato Grosso, mesmo pacientes em suas tocaias, usam outras armas e não têm tanta paciência para esperar.
Dito isso, ficamos livres para pensar que o artigo publicado por Marcio Chaer, ontem, insinuando de maneira nada indireta que o ex-Ministro Joaquim Barbosa é, em matéria de conhecimento jurídico, algo próximo do nada, possa ter uma espécie de identidade de avaliação de Gilmar Mendes, pelo intenso convívio de ambos, mesmo que não uma “coautoria espiritual”.
Diz de Joaquim o amigo de Gilmar:
(…)cada voto era um suplício. Até a leitura da decisão, preparada pela assessoria, a coisa ia bem. Mas quando chegava a hora dos costumeiros questionamentos dos demais ministros ao relator, complicava. Atônito, sem respostas, ele se punha a reler o voto — que não contemplava a informação solicitada. Uma nova pergunta se seguia de nova leitura do voto.
Até que um ou outro colega mais paciente, ou menos cruel, passou a vir em seu socorro. “Vossa Excelência, então, quanto à preliminar suscitada, acolhe os embargos, certo?” Ao que Joaquim murmurava algo em sentido positivo. Outro completava: “Quanto ao mérito, o relator considera prejudicado o pedido, é isso?”. Com uma variação ou outra, os votos iam sendo acochambrados até se dar formato a uma decisão inteligível ou minimamente satisfatória.
Chaer descreve que, numa roda de ministros, alguém comentou, jocosamente:
“Olha o que ouvi agora: sugeriram ao Joaquim mostrar sua contribuição técnica no Supremo”. E todos caíram na risada.”
Não tenho, é claro, elementos para julgar com tanta severidade as luzes jurídicas de Barbosa e muito menos duvido que Chaer, que frequenta aqueles tapetes há anos, possa de fato não estar distante do juízo que fazem dele os demais ministros.
Mas há, no texto, duas coisas gravíssimas.
A primeira é a afirmação de que a Ação Penal 470 foi o tablado em que Joaquim Barbosa fez sua exibição de poder ante seus próprios pares, criando um clima em que divergir dele seria ser conduzido ao “matadouro” diante da mídia e da opinião pública por ela insuflada.
“As poucas vozes que ousaram “chutar a santa” canonizada pela opinião pública, sedenta de vingança contra a comunidade política em geral e contra o PT em particular, enfrentaram o risco aventado por Nelson Rodrigues e as vaias da plateia.”
Boa razão para a frase do Ministro Luiz Roberto Barroso, logo em suas primeiras manifestações no STF:
“Não estou almejando ser manchete favorável. Sou um juiz constitucional, me pauto pelo que acho certo ou correto. O que vai sair no jornal no dia seguinte, não me preocupa”. “Eu cumpro o meu dever. Se a decisão for contra a opinião pública é porque este é o papel de uma Corte constitucional”
Mas, para os demais, uma vergonha em acompanhar situações que só recebiam a desabrida defesa de quem, por razões políticas, simpatizava com os atropelos de Joaquim Barbosa, como o próprio Ministro Gilmar Mendes e o “ministro” Merval Pereira.
O segundo fato grave está bem lá em cima, antes de iniciar-se o artigo: a data.
Dias após a aposentadoria de Joaquim Barbosa, torna-se meramente vingança covarde fazer aquilo que seria, antes, um ato de informar a população e a comunidade jurídica de algo da maior gravidade – um ministro ser incapaz tecnicamente na avaliação de seus próprios colegas e estar usando uma ação penal como instrumento de sua afirmação em um tribunal que o desprezava.
Assim é que Joaquim Barbosa tornou-se, ele próprio, alvo das vilanias que praticou e até de seus próprios arroubos, como aquele em que perguntou a Gilmar Mendes se estava falando “com os seus capangas lá do Mato Grosso”.
Não, não estava.
Até porque os capangas do Mato Grosso, mesmo pacientes em suas tocaias, usam outras armas e não têm tanta paciência para esperar.
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