terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Cala a boca já morreu, Cármen Lúcia!





Brasil 247, 31/01/17



Cala a boca já morreu, Cármen Lúcia!




Por Paulo Moreira Leite





Dezoito meses depois de usar uma expressão da infância de tantos brasileiros ("Cala a boca já morreu"), para justificar a liberação de obras biográficas sem prévia autorização dos envolvidos, Cármen Lúcia decidiu fazer segredo sobre as 77 delações premiadas da Odebrecht. É lamentável para o país e para a democracia.

Não só porque envolve o direito da população ser informada sobre o teor de documentos oficiais, que têm fé pública.

A experiência ensina que proibições jamais foram motivo para impedir que informações de dezenas de delações da Lava Jato viessem a público, através de vazamentos que, sem serem formalmente autorizados, jamais foram punidos com o rigor necessário para evitar novos deslizes. Em abril de  2016, no caso do grampo contra Dilma e Lula, o próprio juiz Sérgio Moro encarregou-se de divulgar um diálogo que fora gravado sem autorização legal, que deveria ter sido destruído antes de vir a público. 

 A prática brasileira e internacional permite compreender o seguinte. Se tivesse liberado o conjunto dos documentos, Carmen Lúcia teria assegurado aos 206 milhões de brasileiros o acesso a denúncias que envolvem a alta cúpula do Estado, com o selo de uma homologação da presidente da mais alta corte do país. Os fatos poderiam ser gravíssimos, como muitos imaginam, mas poderiam ser mastigados e digeridos num ambiente de transparência e conhecimento de causa.  Com a proibição, o próximo passo da crise pode ser decisivo mas torna-se um assunto para poucos, a ser resolvido em salas fechadas, na presença sabe-se lá de quem. Movimentos de ataque e contra-ataque, que podem se modificar de acordo com as investigações em curso, e resolver em prazo curto o futuro do governo Michel Temer, ou de alguns ministros, ou da campanha presidencial de 2018, ficarão entre amigos, que têm acesso aos segredos e poderão agir e reagir. Os demais serão mantidos na posição de marionetes - fazendo força para entender o que se passa.

Para o grande público, serão oferecidos de relatos parciais e depoimentos escolhidos a dedo, pelas partes interessadas, seja para atingir adversários, seja para proteger amigos. Em vez de permitir que a sociedade possa tomar conhecimento dos depoimentos, raciocinar e agir de acordo, exercitando a condição constitucional de homens e mulheres livres, coloca-se um país inteiro ao sabor das conveniências dos setores do judiciário e do Ministério Público que puderam ter conhecimento de denúncias. Em vez de liberdade, estamos falando de controle e de manipulação - situação estranha aos regimes democráticos e típica dos estados de exceção.
      
Sem jamais ter sido uma ministra de votos com grande repercussão, Carmen Lúcia foi improvisada como campeã da liberdade de expressão a partir de junho de 2015, graças aquele voto. Utilizando uma expressão conhecida do grande público, a frase foi republicada por manchetes e artigos favoráveis. Ela já era presidenta do STF em outubro de 2016, quando compareceu a uma cerimônia da Associação Nacional das Editoras de Revistas, em São Paulo. Não só repetiu a frase como citou Fernando Sabino para dizer: "Deixa o povo falar."

Procurando esclarecer seu ponto de vista, Carmen Lúcia acrescentou: "não há democracia sem uma imprensa livre. Não há democracia sem liberdade. Ninguém é livre sem acesso às informações". Para explicar a origem dos capítulos da Constituição que tratam destes assuntos, ela foi além. Reforçou a noção de que se tratavam de valores soberanos, que o Supremo tinha o dever de proteger "não como poder, mas como uma exigência constitucional para se garantir a liberdade de informar e do cidadão ser informado para exercer livremente a sua cidadania". Lembrando como as Constituições são feitas, Carmen Lúcia disse que na Carta de 1988 se definem objetivos que estão acima dos chefes de poder. "Os governantes não escolhem esses objetivos. Foi o deputado constituinte, eleito pela sociedade, que fez com que se estabelecessem esses objetivos, que são do Estado, não de governo."

Naquela época, a postura de Carmen Lúcia inspirou tanta empolgação que o jornalista Alberto Dines, veterano observador da imprensa brasileira chegou a falar de "tendências libertárias" no STF. Ontem, o melhor elogio partiu de Michel Temer. Para ele, a presidenta do Supremo "fez o que devia fazer e o fez corretamente."

Governante do país desde maio de 2016, Temer também foi Constituinte em 1986. Não recebeu votos suficientes em urna para conquistar uma cadeira de titular e terminou como suplente. Mas acabou assumindo uma vaga porque o titular foi para uma secretaria do governo de São Paulo.

Pelos argumentos que expôs nos pronunciamentos anteriores, ontem Carmen Lúcia agiu fora dos parâmetros que ela mesma definiu. Como ela disse, não cabe às autoridades escolherem os objetivos fixados na Constituição, mas apenas obedecer a vontade deixada pelo "deputado constituinte, eleito pela sociedade."






Jornalistas Livres, 30/01/17




Editorial

Contra os vazamentos seletivos, por uma inundação de informações!



Por Jornalistas Livres



A ministra Cármen Lúcia, presidenta do STF (Supremo Tribunal Federal), homologou hoje (30/01) pela manhã as delações de 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht. Isso quer dizer que, a partir de agora, as delações adquirem peso jurídico e poderão ser usadas pela Procuradoria-Geral da República para aprofundar as investigações. Os procuradores poderão, por exemplo, pedir abertura de inquérito ou mandado de busca e apreensão.

Por determinação da ministra Cármen Lúcia, porém, o sigilo das informações será mantido por enquanto pelo STF. Isso, apesar de haver, desde meados de janeiro a expectativa de que os documentos com as delações fossem tornados públicos pelo então ministro relator da Lava Jato, o finado Teori Zavascki.

Teori morreu no dia 19 de janeiro, em um acidente para lá de conveniente, quando ultimava os estudos para homologar as delações dos executivos da Odebrecht.

Reportagem do jornal ‘Valor Econômico’ de 17 de janeiro, dois dias antes da morte de Teori, afirmava que as delações deveriam “ser tornadas públicas já em fevereiro”.

Se vivêssemos em um Estado Democrático de Direito, essas delações seriam tratadas com o máximo cuidado, para que não se acusasse qualquer cidadão sem provas. Mas já se sabe que, neste preciso momento em que você, internauta, lê estas linhas, nas redações, os mesmos repórteres “de confiança do governo golpista”, os mesmos de sempre da mídia corporativa, já receberam os arquivos com as delações. E já preparam suas matérias com “vazamentos”.

Não queremos que essa mídia descomprometida com a Democracia e com a Liberdade, essa mídia misógina e antipovo, essa mídia vergonhosamente facciosa e partidarizada, escolha os “melhores trechos” para publicar.

Já que essa mídia golpista escolherá os “vazamentos” que publicará, dizemos bem alto: queremos ser inundados de informações. O povo brasileiro não pode e não deve deixar que a turma a serviço dos corruptos selecione o que devemos conhecer ou não.

Sabe-se que Temer foi citado 43 vezes em delações dos Executivos da Lava Jato. Queremos ler tudo! Queremos saber em que tramoias teria se metido Michel Temer, esse político medíocre, que nem conseguiu ser eleito presidente do centro acadêmico! Queremos conhecer todo o entulho de corrupção em que o traidor ancorou a nau sem rumo do golpismo brasileiro, tendo ele como capitão.
A ‘Folha de S.Paulo’ acaba de publicar reportagem dizendo do “alívio” do palácio do Planalto com a manutenção do sigilo sobre as delações.

Segundo o repórter Valdo Cruz, “a equipe presidencial receia que quando o conteúdo das delações se tornar público, haverá turbulências políticas.”

Temer, o PMDB e o PSDB não querem turbulências políticas porque isso pode atrapalhar seu projeto de aniquilação do país com uma política econômica desastrosa; porque pretendem aprovar a toque de caixa seu projeto de destruição da Previdência Social, que condena nossos idosos (mais os doentes e pessoas com deficiências) à terrível miséria exatamente quando mais frágeis. Porque querem aprovar a destruição dos direitos trabalhistas.

Para tudo isso, eles precisam da paz dos cemitérios.

Queremos saber tudo! Não confiamos na imprensa golpista. Que as delações sejam tornadas públicas de forma ampla e irrestrita. Que se faça a vontade de saber do povo brasileiro, que já não tolera mais mentiras, mais sujeiras e mais empulhações!

Nenhum comentário:

Postar um comentário