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CartaCapital, 17/05/17
CartaCapital, 17/05/17
Manipulações e expectativas
Por Paulo Kliass*
As forças políticas e os interesses econômicos que se articularam e conspiraram abertamente para o êxito do movimento que provocou o golpeachment estão em estado de alerta. Afinal, sonhavam com um futuro bem mais róseo e um pouco menos problemático do que a realidade que vivemos atualmente em nosso País.
As recomendações que sussurravam nos ouvidos dos liberais e dos conservadores ainda hesitantes em apoiar a solução ilegal e carente de base constitucional poderiam ser resumidas em um mantra sedutor: ‘Não se preocupe não. É fácil. Primeiro a gente tira a Dilma. Depois, tudo o mais se acerta”.
Na tentativa de conferir mais solidez e um pouco de aparência de seriedade ao movimento que jogou a institucionalidade democrática na lata do lixo, a agremiação partidária que deu a liga ao impedimento da presidenta eleita divulgou até um programa alternativo de governo. “Uma ponte para o futuro” converteu-se no documento para justificar as ações que visavam construir a manobra para que Temer se apoderasse do Palácio do Planalto.
O texto elaborado sob a responsabilidade do Presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Wellington Moreira Franco, representa a antítese de tudo aquilo que havia sido discutido durante a campanha eleitoral de outubro de 2014. Em resumo, o material elenca um conjunto de proposições de redução de direitos sociais e de liberalização da economia que viabilizariam a entrada no paraíso. E o vice-presidente em exercício parece ter aprendido direitinho o seu dever de casa. Passou a implementar tudo como sugerido ali ao longo das 19 páginas. Desde a reorientação da política externa até a destruição da previdência social, passando pela reforma trabalhista e por concessão de maiores benesses para o capital privado.
Temer: um ano de desastre social e econômico
As forças políticas e os interesses econômicos que se articularam e conspiraram abertamente para o êxito do movimento que provocou o golpeachment estão em estado de alerta. Afinal, sonhavam com um futuro bem mais róseo e um pouco menos problemático do que a realidade que vivemos atualmente em nosso País.
As recomendações que sussurravam nos ouvidos dos liberais e dos conservadores ainda hesitantes em apoiar a solução ilegal e carente de base constitucional poderiam ser resumidas em um mantra sedutor: ‘Não se preocupe não. É fácil. Primeiro a gente tira a Dilma. Depois, tudo o mais se acerta”.
Na tentativa de conferir mais solidez e um pouco de aparência de seriedade ao movimento que jogou a institucionalidade democrática na lata do lixo, a agremiação partidária que deu a liga ao impedimento da presidenta eleita divulgou até um programa alternativo de governo. “Uma ponte para o futuro” converteu-se no documento para justificar as ações que visavam construir a manobra para que Temer se apoderasse do Palácio do Planalto.
O texto elaborado sob a responsabilidade do Presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Wellington Moreira Franco, representa a antítese de tudo aquilo que havia sido discutido durante a campanha eleitoral de outubro de 2014. Em resumo, o material elenca um conjunto de proposições de redução de direitos sociais e de liberalização da economia que viabilizariam a entrada no paraíso. E o vice-presidente em exercício parece ter aprendido direitinho o seu dever de casa. Passou a implementar tudo como sugerido ali ao longo das 19 páginas. Desde a reorientação da política externa até a destruição da previdência social, passando pela reforma trabalhista e por concessão de maiores benesses para o capital privado.
Temer: um ano de desastre social e econômico
O problema é que passado mais de ano desde a usurpação do poder federal, a sociedade brasileira tem percebido que o mergulho na tragédia derivada da adoção do austericídio como programa básico de governo não proporcionou nenhuma melhoria. O futuro chegou e a ponte mais se parece com uma pinguela cujo eixo está voltado para o passado. A recessão econômica continuou firme e solta desde então, com as consequências trágicas das falências e do desemprego a níveis nunca antes atingidos.
Assim, concretizou-se a frustração de todos os que acreditavam na fábula da fadinha das expectativas. Com sua popularidade nos níveis mais rasos nas pesquisas de opinião, o governo começa a sentir também dificuldades em avançar a agenda do retrocesso no interior do Congresso Nacional. E assim tem início uma grande campanha de propaganda, operação articulada com os grandes meios de comunicação, para tentar reverter o quadro no sentimento da população. Isso vale tanto para vender a ideia de que o pior já passou ou de que o fundo do poço já foi atingido, quanto para responsabilizar os governos anteriores ao golpe por tal desastre.
A cada dia, a cada semana, os formadores de opinião vinculados ao financismo garimpam arduamente alguma notícia alvissareira para tentar comprovar que a bonança está logo ali na esquina. É claro que os novos ocupantes de cargos estratégicos na administração federal também oferecem sua generosa contribuição. Esse movimento ocorre de forma descarada na defesa da necessidade da reforma da previdência, com a manipulação de informações oficiais na justificativa do desmonte do Regime Geral da Previdência Social.
À espera do crescimento
Mas como os números que atestem o fim da recessão teimam em não comparecer, a última cartada foi a utilização de manobras estatísticas de baixo nível para obter alguma informação que corroborasse a versão da narrativa que o governo busca desesperadamente comprovar. E assim foi o que o IBGE mudou a metodologia na pesquisa de atividade do setor comércio e serviços para oferecer uma boia de salvação ao setor de comunicação do Planalto. Como esse indicador é usado na projeção do Banco Central para uma espécie de prévia do PIB, a intenção casuística é evidente. Mas o movimento foi amplamente denunciado e deve perder seu impacto como desejado no início.
O fato concreto é que a retomada de um ciclo de crescimento sustentado da economia depende basicamente de novos investimentos. E os grandes grupos empresariais não estão tomando decisões dessa natureza. A recessão está tão profunda que o nível de capacidade ociosa das empresas lhes permite assistir o quadro político e econômico sem precisar ampliar o parque produtivo. Por outro lado, a elevada rentabilidade proporcionada historicamente em nossas terras por retornos financeiros estratosféricos lhes assegura maiores ganhos operando nas finanças do que produzindo no setor real. Melhor aguardar do que se precipitar.
A manipulação fica evidente quando se verificam os resultados da pesquisa semanal realizada pelo Banco Central junto aos responsáveis pelas decisões do sistema financeiro - a Focus. Ali são levantadas as tais das “expectativas” do mercado. Trata-se de uma verdadeira lengalenga que ausculta apenas os integrantes do petit comité da nata do financismo. Operando na base do “de nós para nós mesmos”, a pesquisa pretende servir como bússola orientadora das ações da autoridade monetária. Um dos quesitos refere-se às perspectivas dos entrevistados quanto ao desempenho futuro da atividade econômica. Vejam abaixo a tendência de evolução das respostas a respeito do crescimento do PIB de 2017 segundo a data da pesquisa:
19/02/16 - 0,50%
18/03/16 - 0,44%
15/04/16 - 0,20%
24/06/16 - 1,00%
16/09/16 - 1,36%
09/12/16 - 0,70%
12/01/17 - 0,50%
12/05/17 - 0,50%
Desde o início do ano passado, o esmagamento midiático de Dilma e a campanha pró impeachment se combinavam com um quadro de desastre anunciado. Em abril, às vésperas da consumação do afastamento, o crescimento do PIB em 2017 não iria ser superior 0,2%. Com a chegada de Temer e a entrega do comando da economia nas mãos dos banqueiros Meirelles e Goldfajn, tudo mudou. Como que magicamente, os mesmos entrevistados pela pesquisa Focus mudaram de opinião e a economia passaria a bombar da noite para o dia. Em junho eles apostavam em um PIB crescendo a 1 % e em setembro chegaram a apostar em 1,36%. Porém, como não há mágica de desejo político que seja superior a qualquer base real da economia, os resultados da gestão Temer fizeram-nos cair na real. As projeções de crescimento em 2017 baixaram para 0,7% e agora estão em 0,5%. Ou seja, no mesmo patamar que apontavam lá atrás em fevereiro de 2016, ainda no início do segundo mandato de Dilma.
Investimentos em compasso de espera.
Um personagem que talvez exemplifique bem o sentimento que acomete os principais tomadores de decisão do mundo do capital é Armínio Fraga. Esse banqueiro, que já teve passagem no governo federal à época de FHC, reflete de forma sincera e articulada essa aparente contradição. Afinal, por que a economia não deslancha se a grande maioria dos principais responsáveis por parcela importante de nosso PIB apoiou a deposição do governo eleito? Em entrevista concedida essa semana, ele reconhece que
"Depois de uma recessão profunda seria de se esperar uma recuperação mais forte, mas isso não acontece quando se tem tanta incerteza".
E como que a reconhecer sua própria culpa na aposta equivocada e precipitada, passa a culpar o fantasma da volta de Lula para justificar a incapacidade de Temer em cumprir sua falsa promessa:
“O
problema é que o hoje está sendo influenciado por um amanhã nebuloso.
Deveria estar havendo boa recuperação, com apoio da política monetária,
que está dando sua contribuição. Mas dificilmente vai ser uma grande
festa da recuperação, até as incertezas começarem a desaparecer de forma
boa”
(...)
"Esse Lula hoje está reagindo como uma fera acuada. E aí vem o medo de ele voltar."A partir desse depoimento pode-se compreender algumas das razões que atuam para desestimular a retomada dos investimentos. Para além da obsessão visceral de Meirelles em impedir qualquer tipo de protagonismo na iniciativa do setor público nessa direção, Fraga assume que as incertezas permanecem no ar. Ou seja, não bastava tirar Dilma para que a fadinha das expectativas lançasse os superpoderes com sua varinha mágica. Agora, o próximo passo deve ser impedir Lula de sair candidato.
*Doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
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