Carta Maior, 17/05/2017
Lava a Jato e Mídia: o fermento do ódio na formação de valores antidemocráticos
Por Paulo Pimenta*
Apesar do jogo pesado de artimanhas jurídicas e
midiáticas que seguem um rito de disseminação da injúria, de ataque e
perseguição permanentes à presidenta Dilma e a Lula, o
plano de destruição do ex-presidente, por meio de uma condenação sem provas,
não teve o resultado esperado pelos operadores do golpe. O estratagema
criado para eliminar Lula, um adversário de esquerda superior na disputa
política com a direita no país, consolidando o golpe de 2016, não é o da contestação e sim da
desconstrução da pessoa, sua trajetória, história, família e honra. O
espaço que desvaloriza a argumentação tem como protagonistas indivíduos que
rejeitam a democracia e se valem do insulto para aprofundar a polarização
marcada pela intolerância.
A ruptura institucional no Brasil abriu uma trincheira de combate no campo político que é recheada de preconceito e ódio. O governo antidemocrático modifica a concepção política do Estado para governar sem obedecer ao programa de governo e recorre à força e à violência para conter a oposição às medidas neoliberais e a resistência às perseguições políticas. A política deixou de representar o espaço de construção coletiva que compreende a pluralidade de concepções e se transformou em negação das diferenças, que implica em cerceamento às liberdades e aos direitos.
O caráter fascista que emerge na sociedade brasileira é estimulado por discursos que fazem apologia à grilagem, ao genocídio, à tortura, à misoginia, à homofobia e outros que reforçam estigmas a fim de justificar e obter a cumplicidade da opinião pública para combater os adversários políticos que são tratados como inimigos a partir de uma narrativa que constrói a figura de grevistas como “vagabundos”, manifestantes como “terroristas”, líderes políticos como “ladrões” e toda ideologia contra o sistema como “esquerdopata”. Nessa empreitada, o governo ilegítimo sustenta a tese de que precisa “restaurar a ordem” no país, tendo como porta-vozes legisladores, juristas e comunicadores que fermentam o ódio a fim de legitimar o abuso de poder e o uso da força.
A lógica da guerra foi instalada e se direciona contra sindicalistas, povos indígenas, trabalhadores/as que lutam pela terra, negros/as, mulheres, partidos de esquerda e outros movimentos sociais e indivíduos que não se submetem à supressão dos direitos que provém da ameaça da violência. A grande arma de combate aos adversários políticos advém da concentração do controle da mídia no Brasil que reforça sistematicamente a fermentação de mais o ódio.
O monopólio de seis famílias que detém o poder da informação no país instalou um mal-estar com a perseguição declarada ao ex-presidente Lula e sua família, e isso alimenta uma explosiva divisão entre aqueles quem não se submetem à manipulação, à persuasão da criminalização midiática e se opõem à dominação e aqueles que defendem a ação coercitiva do Estado, o poder autoritário, a repressão, a censura, a perseguição e as prisões políticas, excluindo os princípios e os valores democráticos.
A mídia se encarrega, por exemplo, de cobrir de legalidade e criar justificativas para os atos ilegais do Poder Judiciário, alimentando o senso comum de que tudo é permitido nessa “cruzada” contra seus opositores. Essa perseguição e manipulação são facilmente perceptíveis quando os fatos em si - apresentação de provas - passam a ter um caráter secundário em sua cobertura, e a não-notícia “Lula atribui a Marisa interesse pelo tríplex (O Globo 10/06/2017) torna-se o objeto da cobertura jornalística, como estratégia de manter e intensificar o pré-julgamento e a condenação de Lula pelo aparato midiático.
Venício Lima quando analisa o tema da urgência da democratização dos meios de comunicação no Brasil diz que o que de fato é urgente é acabar com a corrupção da opinião pública e explica: “Se corrupção é a prevalência de interesses privados e ilegítimos sobre o interesse público, quando a mídia, seletivamente, apresenta e divulga interesses seus como se fosse o interesse público, ela desenvolve um processo crítico de corrupção da opinião pública”.
Os vazamentos seletivos, o emprego de recursos emocionais e simbólicos e de todos os meios incluindo o abuso de autoridade e a manutenção de prisões provisórias para a obtenção de delações foram estratégias utilizadas para atingir um alvo, a condenação do ex-presidente. Tudo isso impediu o diálogo e deu holofotes à “Lava a Jato”, mas também mostrou como essa operação se tornou um instrumento de combate permanente e de perseguição que fez crescer a disputa. A ferida do golpe de 2016 permanece aberta e a tentativa de impedimento da candidatura Lula em 2018 mostra que estamos diante de um quadro gravíssimo e que a luta é contra a morte da democracia no país.
O fermento do ódio criou uma simbologia em torno do tema da “corrupção” que atribui a responsabilidade à esquerda ao mesmo tempo em que essas investigações são manipuladas para resguardar os grandes esquemas fraudulentos que envolvem poderosos grupos políticos e empresariais. A estratégia de misturar os processos jurídicos com a política produziu as falsas verdades e gerou fanáticos que convertem o discurso de ódio em uma violência contra o Estado democrático de direito.
A opinião pública corrompida torna-se conivente com o abuso de poder, abandonando os valores constitucionais que constituem a essência da democracia. Nesse cenário, a greve geral que parou o país para protestar contra as reformas trabalhista e previdenciária foi rotulada como uma ameaça à ordem desconsiderando-se que a população não discutiu tais propostas e não elegeu legisladores com legitimidade para aprová-las.
A ruptura institucional no Brasil abriu uma trincheira de combate no campo político que é recheada de preconceito e ódio. O governo antidemocrático modifica a concepção política do Estado para governar sem obedecer ao programa de governo e recorre à força e à violência para conter a oposição às medidas neoliberais e a resistência às perseguições políticas. A política deixou de representar o espaço de construção coletiva que compreende a pluralidade de concepções e se transformou em negação das diferenças, que implica em cerceamento às liberdades e aos direitos.
O caráter fascista que emerge na sociedade brasileira é estimulado por discursos que fazem apologia à grilagem, ao genocídio, à tortura, à misoginia, à homofobia e outros que reforçam estigmas a fim de justificar e obter a cumplicidade da opinião pública para combater os adversários políticos que são tratados como inimigos a partir de uma narrativa que constrói a figura de grevistas como “vagabundos”, manifestantes como “terroristas”, líderes políticos como “ladrões” e toda ideologia contra o sistema como “esquerdopata”. Nessa empreitada, o governo ilegítimo sustenta a tese de que precisa “restaurar a ordem” no país, tendo como porta-vozes legisladores, juristas e comunicadores que fermentam o ódio a fim de legitimar o abuso de poder e o uso da força.
A lógica da guerra foi instalada e se direciona contra sindicalistas, povos indígenas, trabalhadores/as que lutam pela terra, negros/as, mulheres, partidos de esquerda e outros movimentos sociais e indivíduos que não se submetem à supressão dos direitos que provém da ameaça da violência. A grande arma de combate aos adversários políticos advém da concentração do controle da mídia no Brasil que reforça sistematicamente a fermentação de mais o ódio.
O monopólio de seis famílias que detém o poder da informação no país instalou um mal-estar com a perseguição declarada ao ex-presidente Lula e sua família, e isso alimenta uma explosiva divisão entre aqueles quem não se submetem à manipulação, à persuasão da criminalização midiática e se opõem à dominação e aqueles que defendem a ação coercitiva do Estado, o poder autoritário, a repressão, a censura, a perseguição e as prisões políticas, excluindo os princípios e os valores democráticos.
A mídia se encarrega, por exemplo, de cobrir de legalidade e criar justificativas para os atos ilegais do Poder Judiciário, alimentando o senso comum de que tudo é permitido nessa “cruzada” contra seus opositores. Essa perseguição e manipulação são facilmente perceptíveis quando os fatos em si - apresentação de provas - passam a ter um caráter secundário em sua cobertura, e a não-notícia “Lula atribui a Marisa interesse pelo tríplex (O Globo 10/06/2017) torna-se o objeto da cobertura jornalística, como estratégia de manter e intensificar o pré-julgamento e a condenação de Lula pelo aparato midiático.
Venício Lima quando analisa o tema da urgência da democratização dos meios de comunicação no Brasil diz que o que de fato é urgente é acabar com a corrupção da opinião pública e explica: “Se corrupção é a prevalência de interesses privados e ilegítimos sobre o interesse público, quando a mídia, seletivamente, apresenta e divulga interesses seus como se fosse o interesse público, ela desenvolve um processo crítico de corrupção da opinião pública”.
Os vazamentos seletivos, o emprego de recursos emocionais e simbólicos e de todos os meios incluindo o abuso de autoridade e a manutenção de prisões provisórias para a obtenção de delações foram estratégias utilizadas para atingir um alvo, a condenação do ex-presidente. Tudo isso impediu o diálogo e deu holofotes à “Lava a Jato”, mas também mostrou como essa operação se tornou um instrumento de combate permanente e de perseguição que fez crescer a disputa. A ferida do golpe de 2016 permanece aberta e a tentativa de impedimento da candidatura Lula em 2018 mostra que estamos diante de um quadro gravíssimo e que a luta é contra a morte da democracia no país.
O fermento do ódio criou uma simbologia em torno do tema da “corrupção” que atribui a responsabilidade à esquerda ao mesmo tempo em que essas investigações são manipuladas para resguardar os grandes esquemas fraudulentos que envolvem poderosos grupos políticos e empresariais. A estratégia de misturar os processos jurídicos com a política produziu as falsas verdades e gerou fanáticos que convertem o discurso de ódio em uma violência contra o Estado democrático de direito.
A opinião pública corrompida torna-se conivente com o abuso de poder, abandonando os valores constitucionais que constituem a essência da democracia. Nesse cenário, a greve geral que parou o país para protestar contra as reformas trabalhista e previdenciária foi rotulada como uma ameaça à ordem desconsiderando-se que a população não discutiu tais propostas e não elegeu legisladores com legitimidade para aprová-las.
Enfrentar
o ódio é uma tarefa fundamental. O recurso do ódio é
eficaz na formação antidemocrática que aponta alvos, alimenta calúnias e
autoriza operações de combate aos supostos inimigos, mas não contribui para a
resolução de nenhum dos problemas que afligem a sociedade brasileira.
Eliminar o ódio implica reconhecer que existem pessoas que embora não sejam orgânicas de um projeto fascista aderem a ele e tornam-se agentes de violências. E também implica desviar das armadilhas da fermentação do ódio e abrir espaços de diálogo capazes de desconstruir seus discursos e suas práticas e investir em novas formas de participação que permitam reconstituir a unidade política em torno de projetos que se opõem às desigualdades e às violências e mantém o ideal de construir um mundo melhor. O desafio é traduzir esse sentimento em uma mobilização que represente o oposto do poder autoritário.
Eliminar o ódio implica reconhecer que existem pessoas que embora não sejam orgânicas de um projeto fascista aderem a ele e tornam-se agentes de violências. E também implica desviar das armadilhas da fermentação do ódio e abrir espaços de diálogo capazes de desconstruir seus discursos e suas práticas e investir em novas formas de participação que permitam reconstituir a unidade política em torno de projetos que se opõem às desigualdades e às violências e mantém o ideal de construir um mundo melhor. O desafio é traduzir esse sentimento em uma mobilização que represente o oposto do poder autoritário.
*Jornalista e deputado federal pelo PT-RS.
Carta Maior, 17/05/2017
Censura editorial: não há outro nome para a omissão da Globo no 28 de abril
Por
Laurindo Lalo Leal Filho
A censura
praticada pela Rede Globo de Televisão à greve geral do dia 28 de abril já
tem um lugar garantido na história da comunicação brasileira.
Assim como ocorreu com o comício pelas eleições diretas para presidente da República realizado em janeiro de 1984, na praça da Sé, em São Paulo, transformado em festa de aniversário da cidade pela Globo ou com as distorções cometidas na edição do debate Lula-Collor, realizado às vésperas das eleições presidenciais de 1989.
Desta vez a linha editorial adotada foi a do silêncio total.
Um fato de abrangência nacional, com grande repercussão no exterior, foi simplesmente omitido pelo telejornal de maior audiência da emissora.
Não houve menção à greve sequer para alertar o telespectador da ausência de transporte público ou do fechamento das escolas no dia seguinte.
A situação torna-se mais grave sabendo-se da hegemonia da Globo no país que faz dela, na maioria das vezes, a única fonte de informação para a maior parte da população brasileira.
Dessa forma a omissão transforma-se em censura na medida em que sonega uma notícia que é, sob qualquer ponto de vista, importante para a sociedade.
A palavra censura está na maioria das vezes associada a ação do Estado ao coibir a circulação de informações, especialmente quando tomado por ditaduras.
No caso brasileiro salta logo à memória o período vivido após o golpe de 1964 com a implantação explicita da censura.
Mas não são só os Estados que têm o poder de censurar.
Em situações como a brasileira, a mídia hegemônica, liderada pela Globo, conquistou um poder que, em determinados momentos, se coloca acima dos poderes da República.
Com
o agravante de não sofrer qualquer controle externo.Assim como ocorreu com o comício pelas eleições diretas para presidente da República realizado em janeiro de 1984, na praça da Sé, em São Paulo, transformado em festa de aniversário da cidade pela Globo ou com as distorções cometidas na edição do debate Lula-Collor, realizado às vésperas das eleições presidenciais de 1989.
Desta vez a linha editorial adotada foi a do silêncio total.
Um fato de abrangência nacional, com grande repercussão no exterior, foi simplesmente omitido pelo telejornal de maior audiência da emissora.
Não houve menção à greve sequer para alertar o telespectador da ausência de transporte público ou do fechamento das escolas no dia seguinte.
A situação torna-se mais grave sabendo-se da hegemonia da Globo no país que faz dela, na maioria das vezes, a única fonte de informação para a maior parte da população brasileira.
Dessa forma a omissão transforma-se em censura na medida em que sonega uma notícia que é, sob qualquer ponto de vista, importante para a sociedade.
A palavra censura está na maioria das vezes associada a ação do Estado ao coibir a circulação de informações, especialmente quando tomado por ditaduras.
No caso brasileiro salta logo à memória o período vivido após o golpe de 1964 com a implantação explicita da censura.
Mas não são só os Estados que têm o poder de censurar.
Em situações como a brasileira, a mídia hegemônica, liderada pela Globo, conquistou um poder que, em determinados momentos, se coloca acima dos poderes da República.
Executivo e Legislativo mal ou bem sofrem um escrutínio a cada quatro anos, fato que não ocorre com os meios de comunicação, cujo controle familiar passa de geração a geração sem que deem satisfação à sociedade.
Já na metade do século passado o sociólogo alemão Karl Mannheim lembrava que “não devemos restringir o nosso conceito de poder ao poder político. Trataremos do poder econômico e administrativo, assim como do poder de persuasão que se manifesta através da religião, da educação e dos meios de comunicação de massa, tais como a imprensa, o cinema e a radiodifusão”.
Esse poder é mascarado por uma aura liberal que coloca os meios de comunicação como se fossem mediadores entre diferentes grupos sociais, pairando acima dos conflitos existentes entre eles.
Tentam esconder, na verdade, que tem lado, sendo no caso brasileiro o lado historicamente conservador, avesso às demandas populares.
A censura, portanto, ocorre em dois níveis.
No noticiário em si, escondendo aquilo que, embora importante para a sociedade, não atende aos interesses dos controladores dos meios.
E no seu papel social mais amplo, apresentando-se como isentos quando na verdade estão sempre defendendo um lado.
No Brasil não há reação a esse tipo de censura, muito menos prevenção para que ela não ocorra.
Em outras democracias legislações específicas e órgãos reguladores garantem a pluralidade de vozes circulando pela mídia, permitindo que a omissão de um veículo de comunicação sobre determinado fato seja corrigida pela divulgação por um meio concorrente.
Recentemente o governo do Equador, através da sua Superintendência de Informação e Comunicação, foi obrigado a abrir um processo contra os principais jornais e emissoras de televisão do pais pela censura por eles imposta a uma notícia divulgada pelo jornal argentino Página 12.
Ela informava que o candidato oposicionista à presidência da República, Guillermo Lasso, possuía empresas off shores e denunciava irregularidades financeiras por ele praticadas.
Notícia que não interessava a mídia comercial equatoriana alinhada com a oposição.
No Brasil, a censura da Rede Globo à greve geral infringiu os artigos 221 e 222 da Constituição Federal.
O primeiro por vedar “toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” e o segundo por determinar que as emissoras devem dar preferência, entre outras, a finalidades informativas.
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