sábado, 6 de maio de 2017

Costa Gavras e a resposta de Lula





O Cafezinho, 6 de maio de 2017



Costa Gavras e a resposta de Lula ao novo ataque dos Inquisidores



Por Miguel do Rosario


 
​(Yves Montand, protagonista, em cena do filme ‘A confissão, de Costa Gavras, de 1970) 


Reproduzo abaixo a resposta da defesa de Lula à nova armação dos conspiradores de Curitiba, que torram dinheiro público para posar de paladinos da justiça, mas que não fazem outra coisa senão subsidiar o golpe de Estado em curso.

Antes, porém, alguns comentários.

Ontem, por coincidência, assisti a um filme que me lembrou muito a Lava Jato.

O título é ‘A Confissão’, o primeiro filme de sucesso de Costa Gavras, segundo informa a capa do DVD (sim, aluguei o filme na última locadora do Rio, a Macedônia).

O filme se passa num país comunista do leste europeu, mais ou menos identificado com a Tchecoslováquia.

O personagem principal (em atuação brilhante de Yves Montand) é o vice-ministro de Segurança, um quadro importante do partido, que é preso e coagido, após meses de excruciante tortura psicológica, a “confessar” seus crimes e acusar seus colegas.

Com o filme, Costa Gavras, um homem de esquerda, denuncia os horrores dos porões stalinistas, que destruiu gerações inteiras de socialistas.

Os agentes de segurança, responsáveis por “arrancar” a todo custo confissões falsas dos presos, eram burocratas comunistas ignorantes, que agiam com autonomia em relação às próprias direções partidárias.

O próprio chefe de segurança do governo também será preso, torturado e executado. O mesmo acontecerá com o ministro de Segurança.

O personagem principal, enquanto é torturado, lembra que ele mesmo, em passado recente, havia participado de um outro teatro jurídico (embora ele não tivesse percebido, na época, que se tratava de um teatro), ocorrido em país vizinho, em que um quadro político também havia “confessado” seus crimes publicamente.

Os agentes de segurança me lembram muito os procuradores da Lava Jato. Há um ou dois dias, um articulista de um blog de direita de grande circulação, ao qual a Lava Jato subsidia com informações privilegiadas, escreveu que “A Lava Jato é maior que o STF”. A frase lembrou-me os diálogos do início do filme de Costa Gavras, quando um dos agentes de segurança diz ao pobre vice-ministro, que implorava, desesperadamente, que contatassem “alguém do partido” ou do “governo”, que eles – os meganhas – eram “maiores” que o partido.

Os liberais de hoje, que assistem a tudo em silêncio cúmplice, estão cometendo o mesmo erro de muitos dirigentes partidários do filme de Costa Gavras: o processo kafkiano de empoderamento de burocratas “autônomos” mergulhará o país em trevas que consumirão a todos.

O filme trabalha o tempo de maneira muito criativa. O cenário pula, de vez em quando, para a década seguinte, em 1968, quando o protagonista já está livre e conta a seus amigos sobre o que vivera.

Os próprios burocratas – conta o personagem – seriam mais tarde denunciados, presos, torturados, num ciclo de horror que caracteriza a degeneração política que representou a crise final do socialismo europeu.

Até mesmo o secretário-geral do partido é preso, torturado e executado. O país é dominado por burocratas sem expressão, como parece ser o caso do Brasil de hoje.

As “confissões” eram veiculadas, assim como essas de hoje da Lava Jato, por canais de rádio e tv, em países nos quais, assim como o Brasil, havia monopólio de um só canal.

A própria esposa do vice-ministro, uma comunista ortodoxa e fiel ao partido, ao ouvir a confissão de seu marido, pelo rádio, acredita nela. Anos depois, quando o marido é solto, ela acreditará em seu marido.

Os métodos usados para enganar os réus, a tortura psicológica, são formas avançadas de um problema antigo da justiça, que é quando ela usa todos os instrumentos de coação e violência para humilhar o indivíduo.

Não importa mais se o indivíduo é culpado ou não.

Quando eu analiso as delações da Lava Jato, assim como no filme de Costa Gavras, o que me interessa não é o que os réus tem a dizer.

O que realmente me intriga, o que instiga minha curiosidade, é destrinchar a engenhosidade com a qual as farsas jurídicas são montadas pelos aparelhos de segurança.

E o que me choca não é o conteúdo da fala, e sim a tortura, infligida mesmo que sobre um corrupto.

Afinal, não é apenas o réu que é torturado psicologicamente, mas – assim como no filme – uma nação inteira, que se vê refém do terrorismo político de um processo jurídico completamente manipulado.

Renato Duque foi condenado a passar o resto de sua vida atrás das grades, num país que tem os piores presídios do mundo. É óbvio que uma confissão, dada em tal situação, não expressa nada mais que o desespero de alguém, criminoso ou não, em busca de uma brecha de liberdade.

Se o próprio Estado o considera um criminoso, um corrupto, como pode dar valor às suas palavras?

Como pode o próprio Estado patrocinar um espetáculo desse tipo, inteiramente montado para subsidiar os grandes meios de comunicação com ataques políticos a um cidadão brasileiro?

Não tem sentido.

Ou melhor, tem sim: é puro jogo sujo.

Os procuradores da Lava Jato, mais o juiz, estão se igualando aos piores corruptos que prendem, e por razões espúrias: para se manter sob os holofotes e produzir o terrorismo político necessário à consolidação do golpe.

A cumplicidade da mídia é evidente. O consórcio criminoso entre a Lava Jato e a Globo está à vista de todos.

Este é o núcleo de poder hoje no país: um grupinho de meganhas, aterrorizando o país, associado a uma família de bilionários, que fez sua fortuna apoiando golpes, sonegando e acobertando crimes.

A Globo acobertava os crimes da ditadura militar e hoje acoberta os crimes da ditadura judicial.

O STF é paparicado apenas na medida em que obedece estritamente à Globo. Quando ousa fugir do script, é imediatamente massacrado, como vimos no dia seguinte à decisão da Segunda Turma de libertar José Dirceu. Lava Jato e Globo se unem para intimidar o STF.

O governo Temer, é preciso entender, apesar da quantidade enorme de ministros envolvidos em corrupção, inclusive investigados pela própria Lava Jato, é protegido pelo consórcio golpista.

Todos os delatores que tentaram externar denúncias que envolviam Michel Temer foram silenciados pela Lava Jato. As forças golpistas do judiciário, da mesma forma, vem trabalhando para que o processo de cassação no TSE, o plano B do golpe que se tornou agora apenas um constrangimento, poupe Michel Temer.

O objetivo do golpe é privatizar o Brasil. Pela primeira vez na história, o Exército norte-americano promoverá exercícios militares em nossa Amazônia. Há funcionários do governo Trump tomando conta da Embraer, da Odebrecht e da Petrobrás.

Estamos já, na prática, sob intervenção dos Estados Unidos, que controlam a nossa soberania mediante o governo mais corrupto que o Brasil já teve.

A violência no campo, contra sem-terra e indígenas, explodiu a níveis que não víamos há décadas.

Tudo isso acontece enquanto o ministro Luis Roberto Barroso viaja pelo Brasil e pelo mundo dando palestras sobre o papel “iluminista” do judiciário brasileiro, que estaria “refundando” o país…

A Lava Jato, que dá opinião sobre tudo, a ponto de Rodrigo Janot ir à Davos dizer que a operação é “pró-mercado”, jamais disse uma palavra sobre o desmonte do Estado promovido pelo governo Temer.

Ontem, a imprensa divulgou que o governo, para comprar o voto de deputados, está perdoando suas dívidas tributárias. O “mensalão”, uma farsa, quase derrubou um governo popular por causa da acusação de que se estava comprando voto de deputados por algumas dezenas de milhares de reais, por cabeça. A medida do governo Temer, por sua vez, corresponde a uma propina de dezenas de milhões de reais, para cada deputado ou empresa vinculada a esse deputado – e ninguém do MP ou da grande imprensa faz qualquer denúncia.

O desmonte das grandes estatais corresponde a valores de magnitude muito superior aos delirantes e exagerados números da Lava Jato, com suas “estimativas” estapafúrdias sobre o montante desviado ao longo de dez anos…

Com uma diferença, nos tempos de Lula/Dilma, batíamos recorde de investimentos públicos em infra-estrutura, o desemprego caía aos menores níveis da história, as dívidas públicas, líquida e bruta, caíam, e a arrecadação fiscal seguia em alta.

Hoje, o próprio governo informa que o investimento público caiu 61%. Pior: o governo não faz nenhuma autocrítica quanto a isso.

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