sábado, 15 de outubro de 2011

A farsa dantesca dos EUA contra o Iran


Jornal do Brasil, 15/11/2011

O pânico em Washington

 
Por Mauro Santayana

 
Ao morrer anos antes, Guimarães Rosa perdeu outro tema que a realidade dos sertões mineiros poderia ter oferecido à sua ficção: a da enlouquecida matança de inocentes por alguém acossado pelo medo de inimigos imaginários.

Durante alguns anos, um rico fazendeiro de Curvelo – cidade próxima a Cordisburgo, terra do escritor – manteve pequeno e eficiente grupo de pistoleiros, aos quais encarregava de identificar e matar suspeitos de tramar a sua morte. Os pistoleiros, que recebiam por empreitada, agiam com esperteza. Quaisquer estranhos que surgissem no município eram logo denunciados ao patrão, que, depois de  exame sumário da situação, ordenava o assassinato. Os crimes só foram descobertos muito tempo depois, quando, por acaso, descobriram uma cisterna abandonada no distrito de Angueretá, onde o fazendeiro tinha terras. Nela, exumaram-se ossos de trinta e seis vítimas. Os fatos foram conhecidos em 1975.

As investigações revelaram o horror: nenhuma das vítimas conhecia, sequer, o fazendeiro amedrontado. Eram caixeiros viajantes; turistas escoteiros, atraídos pelas grutas da região e pela represa de Três Marias, homens nascidos nas redondezas que, vivendo longe, visitavam seus parentes.

Os Estados Unidos, ao que parece, estão sob o meridiano fantástico e assustador de Angueretá. Eles, nesta quadra, se encontram em situação semelhante. Em seu editorial de ontem, o New York Times expõe as dúvidas sobre o suposto complô iraniano contra o embaixador da Arábia Saudita em Washington e outros alvos. As acusações são  bizarras e inconsistentes, diz o texto. E adverte o jornal que, desacreditados com tudo o que ocorreu com relação ao Iraque – quando os ianques mentiram do princípio ao fim – os altos funcionários do governo norte-americano deveriam ter provas irrefutáveis contra Teerã, antes de denunciar o plano. Como as coisas foram conduzidas – reitera o editorial – o governo está vendendo o que não tem, com impudência ridícula. Desde a guerra de anexação contra o México, no século 19,  os Estados Unidos têm mentido e criado incidentes falsos para justificar seus atos de agressão, como fizeram, mais recentemente,  no caso do golpe de 1964, no Brasil; no Chile de Allende; na Argentina; na Nicarágua; na Guatemala; em El Salvador; na República Dominicana; no Vietnã -  em todos os países do mundo que não têm armas nucleares, e onde têm interesses.

Outro fato que faz lembrar o mandante do sertão mineiro, foi a decisão de Obama de ordenar o  assassinato de um cidadão dos Estados Unidos no Iêmen, sem qualquer processo legal. O congressista republicano Ron Paul, declarou que há fundamento legal para um processo de impeachment contra o presidente. Do ponto de vista técnico, trata-se de um assassinato por encomenda. Quanto a seu antecessor, Bush, há um pedido da Anistia Internacional ao governo do Canadá, para que o prenda – quando de sua visita ao país no dia 20 -  e o submeta a julgamento por crimes contra a humanidade, por ter ordenado a tortura dos prisioneiros em Guantánamo e em outros lugares.

Convenhamos que não é fácil aceitar o declínio e o administrar com competência. Nisso, os ingleses,  experientes e  astutos, foram também  eficientes, com a invenção da Commonwealth of Nations, o que, pelo menos, deu um pouco mais de fôlego à sua influência política nos domínios mais próximos da cultura européia, como os da Austrália e do Canadá.

Nesse processo de desvario das elites norte-americanas, que já acometeu outros impérios, a lucidez só pode ser imposta pelos próprios nacionais, o que é difícil e demorado,  quando está em jogo a supremacia de seu país, mas pode ser inexorável. Tudo vai depender da persistência dos manifestantes e da capacidade que tenham de organizar e ampliar o movimento de resistência política.

É conhecida a tese de alguns historiadores, sobretudo de Toynbee, sobre o fim dos impérios: eles sempre desabam quando há a aliança entre o proletariado interno, o da metrópole,  com o proletariado externo, isto é, o das províncias subordinadas. Ao que parece, com as manifestações dos indignados, nos paises centrais e nas antigas colônias, o proletariado do mundo começa a fazer suas alianças, de forma bem diversa da que Marx e Engels pregavam em 1848 – mesmo porque os trabalhadores de nosso tempo são bem diferentes, com a veloz transformação do processo tecnológico de produção dos últimos 60 anos. A articulação desses movimentos poderá surpreender o mundo, se os donos do poder não conseguirem, como já o fizeram antes, apropriar-se da indignação, domá-la e submetê-la aos seus interesses.


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CartaCapital, 12 de outubro de 2011

Armação dos EUA ou loucura do Irã?

 Antonio Luiz M. C. Costa
Eric Holder, que anunciou o suposto envolvimento de dois cidadãos iranianos no plano de assassinato do embaixador saudita. Foto: AFP

Ontem, 11 de outubro, o governo de Barack Obama anunciou ruidosamente a desarticulação de uma suposta conspiração de uma facção do governo iraniano para assassinar o embaixador da Arábia Saudita nos EUA e cometer outros atentados contra embaixadas sauditas e israelenses. Em represália, anunciou novas sanções contra Teerã.
A Arábia Saudita se manifestou de imediato contra a “violação fragrante e desprezível da lei internacional” e o governo britânico de David Cameron para dizer que os indícios de envolvimento de “elementos do regime iraniano” eram “chocantes” e oferecer seu apoio aos EUA em relação a medidas punitivas. Os outros aliados dos EUA se mostraram mais cautelosos. A chanceler da União Europeia, Catherine Ashton, diz que as a acusações terão consequências graves “se forem confirmadas” e mídias da França e Alemanha falam de “suposto complô” e “acusação dos EUA”.
O governo iraniano está longe de ser monolítico – são notórios os desentendimentos entre o aiatolá Khamenei e o presidente Mahmoud Ahmadinejad, recentemente acusado de corrupção por vários parlamentares – e não se pode descartar, a priori, a possibilidade de algum componente fanatizado ter-se envolvido em planos insensatos. Mas há razões para duvidar.

A primeira, mais óbvia, é que já se viu EUA e Reino Unido acusarem mentirosamente e forjarem provas contra um governo estrangeiro, quando decidiram invadir o Iraque de Saddam Hussein. Desde então, mudaram os governos, mas as políticas de Estado continuam fundamentalmente as mesmas.
A segunda é que um complô do Irã para atacar os EUA ou a Arábia Saudita se encaixa mal na atual conjuntura internacional, ao passo que um complô anglo-americano contra o Irã combina perfeitamente com o cenário. Nos últimos meses, a Primavera Árabe tem permitido ao Irã romper seu isolamento na região, a começar pela normalização das relações com o Egito, que alarma estadunidenses, sauditas e israelenses. Teerã também continua a buscar a mediação dos BRICS e da Turquia para um acordo sobre seu programa nuclear, voltando a oferecer o fim do enriquecimento de urânio a 20% em troca de combustível. Parece óbvio que o regime não quer provocar um conflito imediato, ao passo que os EUA e seus aliados têm todo interesse em deter a regularização das relações iranianas e voltar a segregar o país.
A terceira é que a história contada pelo procurador-geral (com poderes de ministro da Justiça) dos EUA, o democrata Eric Holder, é, em si, um tanto bizarra. De maio a setembro, ao lado de Gholam Shakuri, integrante de uma unidade especial da Guarda Revolucionária do Irã, o iraniano-americano Manssor Arbabsiar, preso em 29 de setembro, teria feito contatos no México com um informante da DEA (departamento antidrogas dos EUA) que se fazia passar por representante de um cartel de narcotráfico não identificado (provavelmente os Zetas). Depois de discutirem a possibilidade de ataques com explosivos a embaixadas sauditas e israelenses não especificadas (fala-se em Washington e Buenos Aires), teriam fechado um acordo para assassinar o embaixador saudita nos EUA, Adel Jubeir, por 1,5 milhão de dólares, possivelmente num restaurante de Washington, mesmo que isso envolvesse a morte de inocentes. Arbabsiar foi detido ao desembarcar no México para pagar a primeira metade do acordo e teria confessado suas ligações com facções do governo de Teerã, enquanto Shakuri está no Irã.
Por que interessaria ao Irã, ou mesmo a uma facção do seu governo, eliminar um embaixador, ou cometer atentados contra embaixadas neste momento? Tais ações não são típicas de governos, mesmo mal intencionados, mas de organizações em busca de projeção, propaganda e conquista de militantes, como a Al-Qaeda. A tradicional pergunta “cui bono?” ou “cui prodest?” – “quem se beneficia?” –, pode não bastar como prova, mas aponta para outro lado.
Mesmo antes da Primavera Árabe, a Arábia Saudita e os emirados do Golfo pressionavam os EUA a atacarem Irã, visto como uma ameaça revolucionária a seus regimes obsoletos.  E é evidente que a nova conjuntura da região os deixou em pânico, pela influência dos aiatolás sobre a região e principalmente os xiitas de sua região oriental e dos países vizinhos. Teerã acusou os sauditas de genocídio na repressão às manifestações de descontentamento dos xiitas do vizinho Bahrein, que é também a principal base da Quinta Frota dos EUA. Por outro lado, na Síria o Irã dá apoio crítico ao regime Assad, enquanto o governo de Riad foi o primeiro a romper relações com Damasco e apoiar abertamente os dissidentes.
Também é evidente o interesse de Washington em criar um incidente, tanto por razões de política internacional – desincentivar negociações e aproximação de outros países com o Irã, dar o “toque de reunir” a seus aliados da Otan – quanto de política interna, uma vez que se aproxima o período eleitoral, Obama já não é favorito para a reeleição e está encurralado entre os ataques dos republicanos pela direita e as críticas do #Occupywallstreet, pela esquerda. Quando a economia é um desastre, nada como forjar um inimigo externo para conseguir o apoio automático da mídia e de parte dos eleitores. O patriotismo é o último recurso dos canalhas, como dizia Samuel Johnson.
Antonio Luiz M.C.Costa é editor de internacional de CartaCapital e também escreve sobre ciência e ficção científica.
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São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2011

ESPIONAGEM

Irã sentencia dois turistas americanos a oito anos de prisão

DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS - Dois americanos, presos desde 2009 em Teerã, foram sentenciados ontem a oito anos de prisão cada um pelos crimes de espionagem e entrada ilegal no país. As informações são de uma rede de TV estatal iraniana.
Não estava claro, ontem, se na pena de oito anos será contabilizado o tempo que eles passaram presos, à espera do julgamento.
Ambos negam as acusações e dizem que estavam apenas caminhando na região fronteiriça entre Iraque e Irã.
Uma americana que estava com eles foi solta em setembro de 2010 após pagar fiança e voltou aos Estados Unidos.
Acreditava-se, até ontem, que eles seriam inocentados. A sentença aumenta o atrito entre os governos do Irã e dos EUA -que haviam pedido a libertação dos dois.

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