Fim de uma era
Morte de Kadafi evita julgamento longo que poderia dividir a Líbia e constranger líderes ocidentais
Publicada em 20/10/2011 às 21h32m
O GloboCom agências internacionais
RIO - A morte de Muamar Kadafi, ainda que envolta em relatos imprecisos e imagens com cenas caóticas dos últimos momentos do cerco a Sirta, evitou um longo e complexo julgamento que poderia dividir a Líbia e constranger governos ocidentais e companhias de petróleo, dizem analistas.
Um militar de alto escalão do Conselho Nacional de Transição (CNT) disse que o ex-líder líbio morreu após um bombardeiro da Otan atingir o comboio no qual fugia de Sirta. Mas rumores dão conta de que o ditador teria sido executado depois de ter sido capturado com vida. De qualquer forma, as primeiras notícias da morte de Kadafi já foram suficiente para ajudar a baixar o preço do petróleo, que caiu cerca de 30% nesta quinta-feira.
Se ele estivesse vivo, possivelmente ocorreria um debate sobre onde ele seria julgado: ou na Líbia ou pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), que em maio expediu um mandato de prisão contra o ditador, seu filho Saif al-Islam, que também foi capturado e estaria gravemente ferido em um hospital de Zlitan e o ex-chefe da Inteligência da Líbia, Abdullah al-Sanoussi, também morto na operação desta quinta-feira.
Qualquer tribunal poderia dar a Kadafi uma nova oportunidade de constranger tanto os novos líderes da Líbia, quanto as potências internacionais, e lembrar de questões que todos preferem deixar esquecidas. Além disso, ele poderia relembrar laços com importantes companhias de petróleo que na última década assinaram contratos bilionários com o regime. Mas o pior mesmo seria, dizem analistas, se o ditador tivesse continuado escondido nos desertos do país, articulando novas milícias, minando a estabilidade da Líbia e de seus vizinhos e prejudicando a credibilidade da Otan e do CNT.
- (A morte de Kadafi) é de uma enorme importância simbólica - disse Alan Frase, analista de Oriente Médio para a consultoria de risco AKE. - Ajuda o CNT a seguir em frente. Se Kadafi foi mesmo morto, ao invés de capturado, isso também pode ser visto como uma forma de evitar um longo julgamento que poderia revelar secretos constrangedores.
Organizações de direitos humanos há muito afirmam a importância de o ditador líbio ser capturado e levado a julgamento, o que poderia oferecer ao novo governo da Líbia uma chance de mostrar suas intenções e comprometimentos contra os crimes cometidos contra civis por membros do regime.
Morte tem lados positivos e negativos para governo interino
Mas alguns críticos reclamam que muitos julgamentos de crimes de guerra, locais ou internacionais, demoram muito para analisar provas, se transformando, muitas vezes, em verdadeiros shows. Líderes como Saddam Hussein e Slobodan Milosevic, por exemplo, usaram suas audiências para negar qualquer crime e para ofender seus algozes. Além disso, o líder derrubado também pode usar a oportunidade de um tribunal de grande visibilidade para abrir feridas políticas e incitar novos problemas.
- A morte de Kadafi é um evento ambivalente para as novas autoridades líbias - disse Daniel Korski, membro do Conselho Europeu para Relações Exteriores e defensor da intervenção da Otan - Eles evitaram um drama judicial como foi com Milosevic, o que poderia ter incitado simpatizantes do ditador líbio, mas sua morte também tira do governo interino a chance de mostrar que são melhores que o ex-líder. A morte de Kadafi, em circunstâncias tão violentas, pode transformá-lo num mártir.
A imprensa internacional teria esmiuçado todos os detalhes sórdidos de como os governo ocidentais ajudaram Kadafi a construir seu império e construir a indústria de petróleo do país. Muitas grandes imprensa como a British Petroleum, a italiana ENI e a francesa Total tinham contratos com o ditador.
Este risco, é bem verdade, ainda não foi apagado completamente. Alguns filhos de Kadafi ainda estão soltos e podem, eles próprios, serem réus de julgamentos.
Se o CNT queria julgar Kadafi internamente, eles provavelmente enfrentaria problemas para erguer um sistema legal. A Líbia de Kadafi tinha muito pouca credibilidade em infraestrutura judicial, e muitas dúvidas sobre a legitimidade do processo poderiam surgir.
Desde a morte de Osama bin Laden, assassinado por forças especiais americanas, a morte de líderes controversos (no lugar de seus julgamento) se tornou uma opção também muito atraente.
- Dizer que é melhor para todo mundo que ele esteja morto é dizer que o processo legal tem algumas desvantagens e se render ao cinismo - disse Rosemary Hollis, chefe do programa de estudos de Oriente Médio da London's City University -
Com a morte de Kadafi, diz Rosemary, há um risco de que seus simpatizantes e outros radicais queiram se vingar. E o risco será ainda maior se for de fato comprovado que ele foi morto pela Otan ou ainda executado. Apesar de vários líderes internacionais terem dito que a morte do ditador representa o fim de um capítulo sangrento na História da Líbia, analistas são categóricos: a morte de Kadafi está longe de ser o fim dos problemas líbios.
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Comunidade internacional pede detalhes da morte de Gaddafi
22/10/2011 12:13, Por Redação, com BBD - de Brasília
Um legista deve realizar neste sábado a autópsia no corpo do coronel Muamar Gaddafi, em meio a dúvidas sobre as circunstâncias da morte do ex-líder líbio na ultima quinta-feira.
A família do coronel pediu que os corpos sejam liberados o mais rapidamente possível e, assim como a ONU, quer uma investigação completa sobre as circunstâncias da morte do ex-líder líbio.
O governo americano pediu que o Conselho Nacional de Transição (CNT) explique os acontecimentos da ultima quinta-feira de “forma aberta e transparente”, enquanto a Rússia disse que a forma como o ex-líder morreu “levanta uma série de questões”.
O CNT anunciou que realizará uma cerimônia para declarar a libertação formal da Líbia no próximo domingo.
Ao mesmo tempo, a Otan – que age na Líbia com anuência de um mandado da ONU – se prepara para concluir suas operações militares no país norte-africano.
O secretário-geral da aliança, Anders Fogh Rasmussen, disse que em princípio a ofensiva será mantida até 31 de outubro, e que a Otan vai garantir que “não haja ataques contra civis durante o período de transição”.
Vivo ou morto
Em Misrata, no norte da Líbia, centenas de pessoas fizeram fila para entrar em um contêiner refrigerado e ver os corpos de Gaddafi – que tem um ferimento a bala visível na cabeça – e de seu filho Mutassim, também morto na ultima quinta-feira.Autoridades do governo interino haviam dito que pretendiam realizar uma cerimônia fúnebre secreta, mas o funeral que, segundo a tradição islâmica, tem de ocorrer o mais rápido possível, foi adiado em meio a incertezas sobre o que fazer com o corpo e sobre onde enterrá-lo.
Um vídeo revelado na ultima sexta-feira indica que Gaddafi foi capturado vivo na véspera – nas imagens, ele aparece sendo conduzido por combatentes de oposição que, com armas apontadas para o coronel, discutiam se deviam matá-lo ou não.
Horas depois, ele foi declarado morto, por um ferimento a bala na cabeça. Não se sabe quem disparou o tiro.
Um importante integrante do CNT, Mohammed Sayeh, disse à BBC duvidar que Gaddafi tenha sido assassinado deliberadamente, mas disse: “Mesmo que ele tenha sido morto intencionalmente, eu acho que ele merecia isso”.
Questões similares envolvem a morte de Mutassim, filmado vivo pouco após sua captura. Ele também foi morto a tiros.
A BBC conversou com combatentes ligados ao CNT em Misrata, que dizem que sabiam há dias que Gaddafi se escondia em Sirte – cidade natal do coronel e onde ele foi detido.
O combatente Anwar Souwan disse que eram poucos os que tinham a informação do paradeiro do líder líbio e que o dado foi passado por um mercenário da Mauritânia que fora recrutado por tropas de Gaddafi.
- Se revelássemos o segredo (do paradeiro), qualquer coisa poderia ter acontecido. Gaddafi poderia ter tentado escapar disfarçado de mulher, ou poderia ter cometido suicídio- , diz Souwan.
Ação Militar
A ação da Otan (aliança militar ocidental) também teve papel importante no desenrolar dos fatos na última quinta-feira. Horas antes de Gaddafi ser capturado, jatos militares franceses haviam disparado mísseis contra um comboio de veículos que levava o coronel e aliados.Aparentemente, o coronel saiu praticamente ileso da ofensiva, e a Otan afirmou não saber que o ele estava no comboio. Mas Fateh Bashagha, membro do CNT que coordena o diálogo entre a Otan e os combatentes de Misrata, diz que foi o ataque da aliança que alertou as tropas anti-Gaddafi para o fato de que o coronel estava tentando escapar.
Até o momento, o CNT insiste em que a morte de Gaddafi ocorreu durante uma troca de tiros entre opositores e aliados do coronel. Mas, com as evidências até agora, observadores não descartam a possibilidade de que ele tenha sido sumariamente executado
Pistas sobre a morte de Gaddafi são escondidas do público
22/10/2011 16:26, Por Redação, com Reuters - da Líbia
Os soldados líbios que estão vigiando o corpo de Muammar Gaddafi numa câmara fria, estão deixando o púbico entrar para ver o líder deposto, pelo segundo dia seguido, no sábado, mas as feridas que podem dar a resposta de como ele morreu, estão cobertas.
O corpo de Gaddafi jazia em um colchão no chão da sala fria, como estava na ultima sexta-feira, quando centenas de pessoas fizeram fila para conferir pessoalmente, que o homem que governou a Líbia durante 42 anos, estava morto.
Mas, ao contrário da véspera, o corpo de Gaddafi estava coberto por um lençol, deixando apenas a cabeça exposta, escondendo as feridas no seu torso e as marcas de arranhões no peito, que podiam ser vistas antes.
E, principalmente, um repórter da Reuters que viu o corpo disse que a cabeça de Gaddafi havia sido virada para a esquerda. Isso significa que o buraco de bala que podia ser visto anteriormente, no lado esquerdo do seu rosto, perto da orelha, não podia mais ser visto.
Guardas que vigiavam o corpo de Gaddafi estavam distribuindo máscaras cirúrgicas verdes para as dezenas de pessoas que entravam para ver o corpo, por causa do cheiro de carne podre que havia na sala.
O buraco de bala na cabeça de Gaddafi e os outros ferimentos, poderiam ajudar a desvendar o enigma para saber se, como os novos governantes da Líbia disseram, ele foi baleado durante o tiroteio do confronto ou como dizem alguns relatos, se ele foi morto pelos combatentes que o capturaram.
Um comandante militar da cidade de Misrata, para onde as forças que capturaram Gaddafi, levaram seu corpo, disse que combatentes “muito empolgados” decidiram fazer justiça com as próprias mãos, quando ficaram frente a frente com o homem que eles tanto desprezavam.
- Queríamos mantê-lo vivo, as coisas fugiram ao nosso controle, por causa dos mais jovens,- disse ele, pedindo para permanecer anônimo.
Poucas pessoas na Líbia – onde milhares de pessoas, incluindo civis foram mortos pelas forças de Gaddafi durante a rebelião que durou sete meses – dizem que estão preocupadas pelo modo como ele morreu.
Mas, se ele foi realmente morto pelos seus captores, isso vai lançar dúvidas sobre as promessas dos novos líderes do país, de respeitar os direitos humanos e evitar represálias. Isso também deixará constrangidos os governantes do Ocidente, que deram apoio incondicional ao NTC.
A PEÇA QUE FALTA
Os minutos dramáticos que levaram à morte da Gaddafi foram caóticos, violentos e terríveis – como podem ser visto nas imagens granuladas, feitas por celular e vistas pelo mundo todo, do ex-líder confuso e ensanguentado, sendo arrastado por combatentes do NTC.
O que não foi mostrado nas imagens, e está faltando nos relatos sobre os acontecimentos, dados pelos combatentes presentes na hora, é como ele morreu e quem o matou. Gaddafi ainda estava vivo quando foi capturado, do lado de fora da sua cidade natal, Sirte, mas ele já estava sangrando no lateral do rosto e tinha uma ferida perto da sua orelha esquerda, pouco depois de ter sido capturado.
Combatentes do governo colocaram Gaddafi no capô de uma picape Toyota, com a intenção, segundo um deles, de atravessar a multidão de companheiros combatentes e levá-lo até uma ambulância estacionada a cerca de 500 metros de distância.
Gaddafi pode ser ouvido em um vídeo: “Deus proíbe isso” diversas vezes, enquanto a multidão dava tapas na sua cabeça. “Isso é por Misrata, seu cachorro,” disse um homem, batendo nele.
“Você sabe a diferença entre o certo e o errado?” pergunta Gaddafi. “Cale a boca, seu cachorro,” diz alguém, enquanto seguem batendo nele.
Misrata, um dos redutos da rebelião anti-Gaddafi sofreu com meses de cerco e bombardeios nas mãos das forças leais a Gaddafi.
Outro vídeo mostra Gaddafi sendo retirado de cima do capô e arrastado para um carro, e depois sendo puxado pelos cabelos. “Deixem-no vivo! Deixem-no vivo!” podemos ouvir alguém gritar.
Mas outro homem na multidão dá um grito histérico. Logo em seguida, Gaddafi não é mais visto e ouvem-se tiros. Um dos combatentes presentes, disse que Gaddafi estava mal, porém vivo, quando foi colocado na ambulância.
Entretanto, o motorista da ambulância, Ali Jaghdoun, disse que Gaddafi já estava morto, quando ele o pegou e levou o corpo para a cidade de Misrata. “Não tentei reanimá-lo, porque ele já estava morto,” disse Jagdoun.
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