quinta-feira, 3 de março de 2011

Causas que vale a pena jogar a vida por elas

 
Blog do Emir  
 
 

Perseguido, por boas razões


Há gente que me pergunta como eu me sinto sendo vítima da truculência da direita brasileira. Na realidade, pelo que me lembro, esta é a terceira vez.

A primeira foi durante a ditadura
. Buscado pela Oban (aquela para a qual a empresa dos Frias emprestou seus carros para disfarçar de jornalistas os agentes do terrorismo de Estado), casa invadida, mulher detida, biblioteca e álbum de todos destruído, foto nos jornais e nos cartazes da ditadura como buscado por terrorista, execrado pela imprensa. Eu estava na clandestinidade, fui condenado, à revelia, a 4 anos e meio de prisão, depois anistiado.

A segunda, no processo movido pelo Jorge Bornhausen, quando eu lhe respondi com artigo na Carta Maior àquela declaração de que ia “acabar com essa raça por 20 anos”. Ele me moveu processo por injúria, calúnia e difamação, teve o apoio, uma vez mais, do lado da empresa dos Frias, execrado pela imprensa. Foi desatado um amplíssimo movimento de solidariedade, com abaixo assinado encabeçado pelo Chico Buarque, pelo Veríssimo, pelo Antônio Candido, pelo Eduardo Galeano, que recolheu mais de 20 mil assinaturas.
Como espécie de revanchismo por terem perdido as eleições de 2006 – que não estava nas contas deles, nem na dos Frias -, o processo caiu na mãos de um juiz de Santa Catarina, que me condenou a um ano de prisão e perda do meu cargo de professor da Uerj. Como eu era réu primário, porque tinha sido anistiado da condenação anterior, não iria à prisão, mas teria que realizar trabalhos sociais em comunidades. O absurdo não era apenas que eu é que era condenado e não eleo crime de discriminação é imprescritível, pela Constituição – como não havia o direito de me tirar o cargo de professor de universidade pública, conquistado por concurso. O recurso a meu favor foi aprovado por unanimidade e aí terminou aquele processo.
Agora há esta nova ofensiva da direita
, de novo achando que podem me constranger, me calar, me isolar. De novo truculenta, de novo submetido à execração pela, agora, senil e velha mídia, mas a mesma da época da ditadura e do processo do Bornhausen. De novo a empresa dos Frias envolvida, mediante uma armadilha de usar em on o que era uma conversa em off, coisa típica desse jornalismo decadente e imoral. Saio também ileso, moral e politicamente, honrado com todos os apoios que recebo, assim como pela lista – esta sim, execrável, dos que atacam, do outro lado.
A sensação, nas três circunstâncias, é a de que me tornaram vítima “por boas razões”, como dizia o Brecht, porque estou do lado certo, no bom combate, que o que está em jogo não sou eu individualmente, mas causas justas que é preciso defender e a que tantos dedicam também suas vidas na defesa delas. Que a solidariedade imensa e emocionante que recebi nas três ocasiões se dirige às causas às quais dedico o melhor da minha energia e não a mim como pessoa.
Portanto, me sinto bem nessas circunstâncias em que a direita me toma como vítima privilegiada, como que honrado por esse privilégio de ser considerado alguém que os incomoda, que afeta os seus interesses e os seus valores conservadores. De todas elas saí mais forte, com mais apoio, com mais amigos e companheiros, mais convencido de que essas são causas justas – tanto assim, que a direita as combate sempre, com todas suas armas, desde as metralhadoras e os carros da Oban-Folha, até o monopólio, enfraquecido e senil, da imprensa -, que vale a pena jogar a vida por elas.
 
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Comunicado - Sobre a Casa de Rui Barbosa


Consultado sobre a possibilidade de assumir a direção da Fundação Casa de Rui Barbosa, elaborei proposta, expressa no texto “O trabalho intelectual no Brasil de hoje”. No documento proponho que, além das suas funções tradicionais, a Casa passasse a ser um espaço de debate pluralista sobre temas do Brasil contemporâneo, um déficit claro no plano intelectual atual.
Como se poderia esperar, setores que detiveram durante muito tempo o monopólio na formação da opinião pública reagiram com a brutalidade típica da direita brasileira. Paralelamente, o MINC tem assumido posições das quais discordo frontalmente, tornando impossível para mim trabalhar no Ministério, neste contexto.
Dificuldades adicionais, multiplicadas pelos setores da mídia conservadora, se acrescentaram, para tornar inviável que esse projeto pudesse se desenvolver na Casa de Rui Barbosa. Assim, o projeto será desenvolvido em outro espaço público, com todas as atividades enunciadas e com todo o empenho que sempre demonstrei no fortalecimento do pensamento crítico e na oposição ao pensamento único, assumindo com coragem e determinação os desafios que nos deixa o Brasil do Lula e que abre com esperança o Governo da Presidente Dilma.
Rio de Janeiro, 2 de março de 2011
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
 
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Pensamento crítico contra pensamento único


O maior debate de ideias do nosso tempo é aquele que opõe o pensamento crítico ao pensamento único. A hegemonia neoliberal impôs o pensamento único e o Consenso de Washington como formas dominantes de enfocar a realidade e orientar as formas de vida das pessoas. Apologia do mercado, desqualificação dos Estados, taxação das políticas sociais como “populismo”, tentativas de desmoralização de tudo o que diferisse do capitalismo e do liberalismo, criminalização dos movimentos sociais e das suas lutas – entre outras fórmulas, foram disseminados pela mídia, pelas grandes editoras, ocupando espaços conquistados pelas grandes empresas monopolísticas.

Governos como os de Collor, Itamar, FHC, foram expressões do pensamento único e do Consenso de Washington
. Consideravam que só havia uma politica possível, aquela centrada nos ajustes fiscais e na estabilização monetária como eixo central dos governos. Governaram com programas similares aos de Menem, de Fujimori, de Carlos Andrés Perez, de Salinas de Gortari, segundo as fórmulas do FMI, da OMC e do Banco Mundial.

A imprensa e as editoras difundiram esse discurso como o único possível, produzindo nova geração de best-sellers e de personagens da imprensa escrita, radial e televisiva, que se valiam do monopólio das empresas que os empregavam para repetir, mecanicamente, sem nenhuma criatividade, os mesmos jargões do pensamento único.
Os jornais foram perdendo interesse, todos se parecendo entre si, como se fossem escritos pela mesma pessoa, sem inventividade e defasados da realidade concreta. Os noticiários da TV foram sendo povoados por personagens grotescos, que banalizavam qualquer analise, vulgarizando os temas, sem qualquer informação ou analise concreta Tudo isso foi desmoralizando a imprensa e fazendo com que os best-sellers esgotassem sua vigência conforme as crises seguintes fossem tirando-os de moda.
Enquanto foi aparecendo a imprensa alternativa, hoje centrada na internet, que os derrota cotidianamente, de forma democrática, pluralista, inovadora, com ironia e criatividade.
A década que termina foi aquela que foi enterrando o pensamento único, esses personagens folclóricos na mídia e as forças politicas que os representam. A América Latina, principal vitima do neoliberalismo, foi quem mais fortemente reagiu, derrotando a imprensa monopolista e seus esquemas de pensamento.
Quando praticamente toda a mídia atacou a Lula ao longo dos 8 anos do seu mandato, mas Lula terminou seu mandato com 87% de apoio e só 4% de rejeição – o que foi conquistado da opinião publica por essa mídia -, estava dada a derrota do pensamento único, do Consenso de Washington e dos seus porta-vozes. O mesmo aconteceu em muitos outros países da América Latina.

O debate atual sobre um simples projeto de promoção de debates de interesse geral para o Brasil de hoje em um centro de caráter publico gerou uma resistência feroz da parte dos porta-vozes do pensamento único, que acreditam que ainda gozam do monopólio de formação da opinião pública. Será que não se dão conta que suas ideias foram derrotadas nas últimas três eleições presidenciais? Que esses órgãos da mídia, que apoiaram a ditadura, foram perdendo leitores, credibilidade, viabilidade, foram sendo abandonados pelos jovens, pelos que preferem o pensamento critico ao pensamento único?

É uma triste – e muito dura para eles – decadência, irreversível. Os brasileiros demonstram, no apoio que deram e dão ao Lula, atacado por eles todos os dias, como se autonomizaram desses meios que tentavam fazê-los pensar todos iguais, pela cartilha dos organismos internacionais.

Jornalistas mais jovens foram ocupando lugares nessa imprensa e envelhecem rapidamente, não conseguem ter sensibilidade popular para sentir como os governos Lula e Dilma triunfam porque se opuseram a seus clichês, porque derrotaram e derrotam cotidianamente suas opiniões. Os mesmos órgãos que repetem esses clichês ficam implorando para que escrevamos para eles. Eu lhes respondo que um texto dos “blogueiros sujos” – como o seu candidato nos chamava – tem milhares de vezes mais leitores do que um texto na sua mídia, que vende cada vez menos, cada vez é menos lida, cada vez mais é reduzida à intranscendência.

Hoje os grandes pensadores brasileiros são os que exercem ativamente o pensamento crítico contra o pensamento único. Pensadores como Marilena Chaui, Maria Conceição Tavares, José Luiz Fiori, Maria Rita Kehl, Wanderley Guilherme dos Santos, Leonardo Boff, Marcio Pochmann, Tania Bacelar
– para mencionar apenas alguns – desenvolvendo suas formas distintas de pensamento em uma lógica oposta aos dogmas do pensamento único, que continua a orientar a velha mídia. Por isso são cada vez menos lidos, não são mais levados em conta, constituem a ultima geração de jornalistas desse tipo, de uma mídia monopolista que perdeu importância e viabilidade. Sobram para eles personagens grotescos, muitos deles ex-esquerdistas, que se penitenciam a vida inteira por ter sido de esquerda e repetem os mesmos clichês de todos, para poderem ter algum espaço nos jornais, revistas e programas de televisão.

O Brasil mudou e derrotou tudo isso que representa o Brasil do passado, aquele que fez do nosso país o mais desigual da América Latina e um dos mais desiguais do mundo. Aqueles que reclamam dos espaços de pensamento alternativo – na internet, nos centros de debate, nas publicações novas – são os mesmos que reclamam que os aeroportos se parecem a rodoviárias, os que reagem brutalmente para tentar impedir que a massa da população brasileira tenha acesso a bens fundamentais, até há pouco reservado a eles. São os que perderam e seguem perdendo as eleições, porque estão sem sintonia com o novo país. Usam ainda o monopólio privado da mídia para tentar sobreviver um pouco mais.

Todas as agressões que me reservam, eu as recebo como condecorações ao pensamento crítico. Não tive medo da ditadura, de processos que tentaram me silenciar, resisti, como tanto outros, a toda essa engrenagem e saímos vitoriosos, com a vitória do Lula e da Dilma. Grave seria se me exaltassem. Eu esperava isso, porque conheço a direita brasileiro e seu ranço elitista. Porém o Brasil para todos os condena a falar para si mesmos, enquanto um novo Brasil surge, apesar de tudo isso e contra o pensamento único e o Consenso de Washington.

Os projetos propostos não serão brecados por essa barreira de intolerância e de neo-bushismo, dos saudosos de outras épocas em que dominavam a esfera pública. Esses projetos serão realizados - em um ou outro espaço público, disso não tenham dúvidas - e esperam contar com o apoio de todos os que preferem o pensamento crítico ao pensamento único. Eles passarão, nós passarinhos.

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