Carta Maior, 23/05/2016
Brazilianista alerta embaixador dos EUA na OEA: "estão correndo o risco de repetir o trágico erro feito em Abril de 1964"
Por Renan Quinalha*
Um dos maiores brasilianistas da atualidade, o professor James N. Green da Brown University (EUA), enviou uma carta aberta ao Embaixador Michael Fitzpatrick, representante dos EUA na Organização dos Estados Americanos (OEA), contestando as declarações deste no sentido de que o processo de impeachment no Brasil seria legítimo por estar conforme os procedimentos constitucionais e as regras democráticas.
Green começa a carta afirmando: “Fiquei extremamente desapontado ao ler que você afirmou que, inequivocamente, o processo de impeachment atualmente em curso no Brasil é democrático e legítimo. Mesmo considerando os perigos existentes na comparação histórica de eventos ocorridos em diferentes períodos, digo que o governo dos EUA está correndo o risco de repetir o trágico erro feito em Abril de 1964, quando o Presidente Lyndon B. Johnson reconheceu a ditadura militar que havia tomado o poder e que terminou governando o país por 21 anos”.
Após examinar detidamente como o golpe de 1964 “respeitou” alguns procedimentos formais e legais para manter sua aparência de legitimidade, James Green analisa diversos aspectos do atual processo do impeachment que, guardadas as devidas proporções, em muito se aproximam do golpe que deu início à ditadura militar.
E conclui assim sua carta: “Em 1964, o governo dos EUA estava no lado errado da história. Ele nunca pediu desculpas para o povo brasileiro por ter apoiado uma ditadura militar. Agora, cinco décadas depois, eu receio que, mais uma vez, ele esteja endossando um processo ilegítimo. Aqueles que não aprendem com a história são levados a repeti-la”.
A íntegra da carta segue abaixo, traduzida em português, e na sua versão original, em inglês.
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19 de maio de 2016
Carta Aberta ao Embaixador Michael Fitzpatrick
Representante dos EUA na Organização dos Estados Americanos (OEA)
Caro Embaixador Fitzpatrick,
Fiquei extremamente desapontado ao ler que você afirmou que, inequivocamente, o processo de impeachment atualmente em curso no Brasil é democrático e legítimo. Mesmo considerando os perigos existentes na comparação histórica de eventos ocorridos em diferentes períodos, digo que o governo dos EUA está correndo o risco de repetir o trágico erro feito em Abril de 1964, quando o Presidente Lyndon B. Johnson reconheceu a ditadura militar que havia tomado o poder e que terminou governando o país por 21 anos.
Você declarou o seguinte: “Há um claro respeito pelas instituições democráticas e uma clara separação de poderes. No Brasil, é claramente a lei que prevalece, emergindo com soluções pacíficas para as disputas”. Você também afirmou: “Nós não acreditamos que isso seja um exemplo de um “golpe brando” ou, para esse efeito, um golpe de qualquer tipo. O que aconteceu em Brasil cumpriu rigorosamente o procedimento legal constitucional e respeitou totalmente as regras democráticas”.
Esses são precisamente os argumentos que o Embaixador Lincoln Gordon usou 52 anos atrás, quando ele insistiu que a administração Johnson imediatamente endossou a tomada do poder pelos militares, que foi legitimada pela aplicação formal da Constituição e pela votação majoritária do Congresso.
Tenho certeza de que você esteja familiarizado com a história recente do Brasil. Mesmo assim, vale certamente a pena uma revisão, dada a situação atual. Peço desculpas se minhas observações são extensas. Eu sou um historiador e, honestamente, acredito que o entendimento do passado é importante para compreender o presente. E, como o compositor brasileiro Tom Jobim uma vez gracejou, “o Brasil não é para principiantes”.
Em 1960, Jânio Quadros, um candidato de centro-direita, foi eleito presidente. João Goulart, um político de centro-esquerda, tornou-se vice-presidente, porque se votava separadamente para presidente e vice-presidente. Sete meses depois, Quadros repentinamente renunciou do cargo. Setores militares tentaram, sem sucesso, impedir Goulart de assumir a presidência.
A direita, infeliz com o fato de que Goulart assumiu o cargo, organizou uma ampla coalização para retirá-lo do poder. Ela incluiu a Igreja Católica, empresários, grande mídia e grandes setores das classes médias. Esses eventos ocorreram em um contexto de uma crise econômica, inflação e movimentos de base de trabalhadores, camponeses e marinheiros clamando por maior inclusão econômica e social.
Como já foi largamente documentado e revelado pelos documentos liberados do Departamento de Estados dos EUA, o Embaixador Lincoln Gordon e o seu adido militar Vernon Walters ativamente apoiaram a conspiração para depor Goulart. Eles usaram os argumentos da Guerra Fria, segundo os quais Goulart estava sendo manipulado pelo Partido Comunista Brasileiro, que ele era corrupto e que ele queria assumir um poder ilimitado. Eles garantiram aos generais brasileiros que, caso eles forçassem a saída de Goulart do cargo, o governo norte-americano daria apoio ao novo governo que assumisse. A administração de Johnson chegou a organizar a Operação Brother Sam, que mandou porta-aviões, armas, suprimentos, para apoiar as tropas rebeldes caso uma guerra civil eclodisse.
No dia 31 de março, tropas marcharam no Rio de Janeiro para depor Goulart. No dia seguinte, o presidente voou do Rio de Janeiro para Brasília para mobilizar apoio político contra essa tomada ilegal do poder. Ele queria evitar o derramamento de sangue, então ele não convocou seus apoiadores a resistir ao golpe de Estado.
Assim que o avião decolou, o Presidente do Senado e o Presidente da Corte Suprema, argumentando que eles estavam seguindo os procedimentos constitucionais, empossaram Ranieri Mazzilli, Presidente da Câmara dos Deputados, como Presidente em exercício. De acordo com a Constituição, o Congresso tinha trinta dias para escolher um novo presidente. Hoje, todo mundo, exceto os que defendem a ditadura militar, chamam esses eventos de golpe de Estado, o golpe de 1964.
Em vários telegramas com a Casa Branca, o Embaixador Gordon argumentou que o que se passou no Brasil cumpria perfeitamente com os procedimentos legais constitucionais e respeitava totalmente as regras democráticas. Ele trabalhou duro para convencer o Presidente Johnson a reconhecer o novo governo, o que foi feito no dia 2 de abril, legitimando o golpe e colocando o selo de aprovação do governo dos EUA nessa mudança ilegal de poder que foi implementada de acordo com “os procedimentos legais constitucionais”.
No dia 11 de abril, os 295 membros do Congresso elegeram o General Castelo Branco como Presidente do Brasil. Isso completou a transição “democrática” de um governo legalmente eleito para uma ditadura militar ilegítima.
Imediatamente depois de reconhecer o governo de Mazzilli, no dia 3 de abril, o Presidente Johnson chamou os líderes do Congresso para a Casa Branca para convencê-los de que o governo dos EUA estava apoiando a democracia no Brasil. O senador democrata Wayne Morse, de Oregon, deixou o encontro e declarou para a imprensa: “os acontecimentos no Brasil não resultaram da ação de uma junta militar ou de um golpe. Ao invés disso, a deposição da presidência do Brasil resultou de um desenvolvimento no qual o Congresso do Brasil, agindo sob a Constituição, foi a força condutora e foi reforçado por um grupo militar que garantiu a preservação do sistema constitucional brasileiro”.
Em comentários para seus colegas senadores mais tarde naquele mesmo ano, Morse reiterou suas conclusões:“Nesta noite, nenhum senador pode citar o Brasil como um exemplo de ditadura militar, porque ele não é. O autogoverno por parte do povo brasileiro continua prosseguindo. Se alguém pensa que não, deixe-o olhar ao que está acontecendo no Brasil com o respeito ao intercâmbio de pontos de vista no Parlamento, na imprensa e em muitas fontes e forças da opinião pública”.
Um ano depois, em outubro de 1965, quando o governo militar aboliu as eleições presidenciais, Morse chegou a uma conclusão diferente. Percebendo que as armadilhas do regime democrático eram só para manter as aparências, ele afirmou: “novidades da captura do poder ditatorial pela junta militar brasileira assinala uma reversão para a liberdade na América Latina. O que é ainda pior é a continuidade do apoio financeiro americano a esse regime (…) As semânticas de Washington e da trama brasileira, buscando acalmar os receios pelas instituições democráticas naquela grande nação, não vão enganar qualquer um, mas aqueles que querem ser enganados”.
Muitos que lutaram contra o regime militar e muitos outros que lembram ou que estudaram sobre o regime autoritário têm sustentado que a manobra política em curso para expulsar o governo eleito democraticamente da Presidenta Dilma Rousseff é um outro golpe de Estado.
Você afirmou, vigorosamente, que “há um claro respeito pelas instituições democráticas e uma clara separação de poderes” no Brasil hoje. Mas será mesmo isso? Estaria você, como o Senador Wayne Morse em 1964, talvez sendo enganado pelas aparências de procedimentos democráticos e separação de poderes no processo de impeachment porque não há tanques nas ruas e nem generais no comando do governo?
Como pode ter havido procedimento democrático na Câmara dos Deputados quando Eduardo Cunha, que controlava totalmente essa instituição, foi afastado do seu cargo um semana após a votação de admissão do processo do impeachment? Um pedido para seu afastamento dessa posição havia sido feito em dezembro do ano passado por desvio de finalidade e abuso de poder, mas o membro da Suprema Corte sentou sobre esse pedido até que Cunha tivesse garantido que a oposição teria os dois terços necessários para aprovar o seguimento do processo do impeachment da Presidenta Dilma. Quantos congressistas Cunha e seus aliados compraram ou ganharam com suas promessas de um novo governo? Como um processo conduzido por uma pessoa que é processada por lavagem de dinheiro e por recebimento de suborno pode ser legítimo?
Como pode haver separação de poderes quando integrantes da Suprema Corte fazem afirmações públicas sobre casos que estão sob sua alçada, revelando suas opiniões políticas na mídia, pré-julgando casos e, com isso, influenciando o debate público e os atores políticos? Além disso, a Suprema Corte tem sido excessivamente arbitrária em decidir quais casos analisar, levando quase seis meses para julgar o afastamento de Eduardo Cunha e proferindo uma decisão veloz contra a indicação de Lula para um cargo no governo Dilma. Esses casos são exemplos, dentre tantos outros, das maneiras perversas como o Judiciário se enredou com a política, ao invés de permanecer separado dela.
Como você pode dizer que houve procedimentos democráticos quando agentes da polícia e do sistema de justiça vazam seletivamente informações da Operação Lava Jato para criar um clima hostil ao governo e aos seus aliados? Por que era um desvio de finalidade a Presidenta Dilma nomear o ex-Presidente Lula como seu ministro da Casa Civil sob alegação de que ele estaria supostamente esquivando-se das investigações, quando o Presidente interino Michel Temer indicou sete pessoas sob investigação para ministérios? Não estaria ele abusando do seu poder em um esforço para proteger seus aliados?
Por que a Presidenta Rousseff está sendo acusada de violação à Lei de Responsabilidade Fiscal pela prática de pedaladas, sendo que o Presidente interino Michel Temer fez exatamente a mesma coisa enquanto substituía a presidenta em viagens desta? E os antecessores, presidentes Lula e Cardoso, que também praticaram atos semelhantes, para não falar de pelo menos 16 governadores, incluindo Aécio Neves, que também fizeram as pedaladas?
Você também falhou em assinalar no seu discurso outra deficiência na situação política atual do Brasil, ou seja, a liberdade de imprensa (e das mídias de massa em geral) apenas para os que são proprietários delas. Hoje, as forças conservadoras que controlam os maiores jornais, revistas e canais de televisão sistematicamente apresentam visões parciais dos acontecimentos apenas para influenciar a opinião pública. É como se a Fox New pudesse controlar todos os canais da grande mídia dos EUA. Felizmente, as mídias sociais estão servindo como uma fonte alternativa de informação, mas elas não têm o mesmo peso da mídia hegemônica.
A primeira semana do novo governo revelou uma agenda radicalmente nova, mas verdadeiramente antiga, para o Brasil, que pretende retroceder todos os avanços sociais que tiveram lugar nos últimos 30 anos desde o fim da ditadura. Aqueles que se sentiram ultrajados pelo fato de Michel Temer não ter indicado nenhum mulher ou pessoa negra para posições ministeriais não estão clamando por demagogia. Esse ato não é trapalhada de relações públicas.
Isso simboliza a intenção desse governo. Temer culpou seus aliados por não indicarem nomes de mulheres e negros, em um esforço para se eximir da responsabilidade. Ao menos seus comentários falam alto sobre a natureza dos seus aliados que o levaram ao poder e sobre a natureza desse novo governo “democrático”. Na primeira semana de sua gestão, ele já anunciou que vai reduzir direitos sociais, com cortes no sistema de seguridade social, educação e moradia, que afetam largamente os setores mais pobres da sociedade brasileira.
Em 1964, o governo dos EUA estava no lado errado da história. Ele nunca pediu desculpas para o povo brasileiro por ter apoiado uma ditadura militar. Agora, cinco décadas depois, eu receio que, mais uma vez, ele esteja endossando um processo ilegítimo. Aqueles que não aprendem com a história são levados a repeti-la.
Respeitosamente,
James N. Green
Carlos Manuel de Céspedes Chair in Latin American History, Brown University
Director of the Brown-Brazil Initiative
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May 19, 2016
An Open Letter to Ambassador Michael Fitzpatrick
U.S. Representative at the Organization of American States
Dear Ambassador Fitzpatrick:
I was extremely disappointed to read today that you have unequivocally argued that impeachment process currently taking place in Brazil is democratic and legitimate. While acknowledging the dangers of comparing historical events from different time periods, the U.S. government is running the risk of repeating a tragic mistake it make in April 1964 when President Lyndon B. Johnson recognized the military dictatorship that had taken power, which ended up ruling the country for twenty-one years.
You have declared that: “There is a clear respect for democratic institutions and a clear separation of powers. In Brazil it is clearly the law that prevails, coming up with peaceable solutions to disputes.” You have also stated: “We don’t believe that this is an example of a ‘soft coup’ or, for that matter, a coup of any sort. What happened in Brazil complied perfectly with legal constitutional procedure and totally respected democratic norms.”
These are precisely the arguments that U.S. Ambassador Lincoln Gordon used fifty-two years ago when he insisted that the Johnson administration immediately endorse the seizure of power by the military, which was legitimized by the formal application of the Constitution and a majority vote in Congress.
I am sure that you are familiar with the recent history of Brazil; nevertheless, it is certainly worth reviewing, given the current situation. I apologize if my remarks are extensive. I am an historian, and I honestly believe that understanding the past is important for comprehending the present. And, as Brazilian composer Tom Jobim once quipped, “Brazil is not for beginners.”
In 1960, Jânio Quadros, a Center-Right candidate, was elected president. João Goulart, a Center-Left politician, became vice president on a split ticket. Seven months later, Quadros suddenly resigned from office. Sectors of the military unsuccessfully tried to block Goulart from assuming the presidency.
The Right, unhappy with the fact that Goulart had taken office, organized a broad coalition to overthrow him. It included the Catholic Church, entrepreneurs, the major media, and large sectors of the middle classes. These events took place within the context of an economic crisis, inflation, and grassroots movements of workers, peasants, and sailors clamoring for greater economic and social inclusion.
As has been widely documented and revealed in declassified U.S. State Department documents, U.S. Ambassador Lincoln Gordon and his military attaché Vernon Walters actively supported the conspiracy to overthrow Goulart. They used Cold War arguments that Goulart was being manipulated by the Brazilian Communist Party, that he was corrupt, and that he wanted to assume unlimited power. They assured Brazilian generals that if they forced Goulart out of office, the U.S. government would back the regime that replaced it. The Johnson administration even organized Operation Brother Sam, which sent aircraft carriers, arms, and supplies to back rebel troops should a civil war breakout.
On March 31, troops marched on Rio de Janeiro to overthrow Goulart. The next day, the president flew from Rio de Janeiro to Brasília to mobilize political support against this illegal seizure of power. Realizing that he would be unsuccessful, he took his family to his ranch in southern Brazil. He wanted to avoid bloodshed, so he did not call on his supporters to resist the coup d’état. As soon as his airplane took off, the President of the Senate declared that he had abandoned his office. The President of the Senate and the President of the Supreme Court, arguing that they were following constitutional procedures, swore in Ranieri Mazzilli, President of the Chamber of Deputies, as Acting President. According to the Constitution, Congress had thirty days to choose a new president. Today everyone, except defenders of the military dictatorship, call these events a golpe de estado, the coup d’état of 1964.
In numerous cables to the White House, Ambassador Gordon argued that what happened in Brazil complied perfectly with legal constitutional procedure and totally respected democratic norms. He lobbied hard for President Johnson to recognize the new government, which he did on April 2, legitimizing the golpe and placing the U.S. government’s seal of approval on this illegal change of power that was implemented with “legal constitutional procedures.”
On April 11, the 295 members of Congress elected General Castelo Branco as President of Brazil. This completed the “democratic” transition from a legally elected government to an illegitimate military dictatorship.
Immediately after recognizing the government of Mazzilli, on April 3, President Johnson called leaders of Congress to the White House to convince them that the U.S. government was supporting democracy in Brazil. Democratic Senator Wayne Morse of Oregon left the meeting and declared to the press: “The developments in Brazil did not result from action by a military junta or from a coup by a military junta. Instead, the overthrow of the presidency of Brazil resulted from developments in which the Congress of Brazil, acting under the Constitution of Brazil, was the guiding force, and was reinforced by a military group which backed up the preservation of the Brazilian constitutional system.”
In comments to his fellow Senators later that year, Morse reiterated his conclusions: “Tonight no Senator can cite Brazil as an example of a military dictatorship, because it is not. Self-government on the part of the Brazilian people continues to proceed. If anyone thinks not, let them look at what is happening in Brazil with respect to an exchange of points of view in Parliament, in the press, and in many sources and forces of public opinion.”
A year later, in October 1965, when the military government abolished direct presidential elections, Morse came to a different conclusion. Realizing that the regime’s democratic trappings were for appearances’ sake only, he stated: “News of the seizure of dictatorial power by the Brazilian military junta marks a disastrous reversal for liberty in Latin America. What is even worse is the continuation of American financial backing of such a regime. . . . The semantics from Washington and from the Brazilian cabal, seeking to allay fears for democratic institutions in that great nation, will not fool any but those who want to be fooled.”
Many who fought against the military regime and many others who remember or have studied about its authoritarian rule have argued that the current political maneuvers to oust the democratically elected government of President Dilma Rousseff is another coup d’état. You have forcefully argued that “there is a clear respect for democratic institutions and a clear separation of powers” in Brazil today. But is that the case? Are you, like Senator Wayne Morse in 1964, perhaps being fooled by appearances of constitutional procedures and separation of powers in the impeachment process when there are no tanks in the streets and no generals heading the government?
How can there have been a democratic procedure in the Chamber of Deputies, when Eduardo Cunha, the president of that body, who entirely controlled that house, was removed from his office a week after the vote to recommend to the Senate impeachment proceedings? An appeal had been made to remove him from that position last December for abuse of power, but a member of the Supreme Court sat on the request until it was clear that Cunha had ensured that the opposition had the necessary two-third vote to favor the impeachment of President Rousseff. How many Congresspersons did Cunha and his allies buy or win over with promises to be in the new government? How can a process overseen by a person who had been indicted for money laundering and taking bribes be legitimate?
How is there a separation of powers when members of the Supreme Court make public statements about cases that are under consideration, reveal their political opinions in the media, pre-judge cases that have not yet been tried, and with this influence the public debate and political actors? Moreover, the Supreme Court has been excessively arbitrary in deciding which cases to review, taking six months to issue an injunction against Eduardo Cunha and then making a speeding decision against the appointment of Lula to a post in Rousseff’s government. These cases are examples, among many, of a perverse ways in which the judiciary has become enmeshed in politics, rather than remaining separate from it.
How can you say that there have been democratic procedures when agents of the police and justice systems selectively leaked information from the Lava Jato (Car Wash) corruption investigations to create a climate hostile to the government and its allies? Why was it an alleged charge of a misuse of a function for President Rousseff to appoint ex-President Lula as her Chief of Staff because she was supposedly shielding him from corruption investigations, when Interim President Michel Temer has appointed seven people under investigation for corruption to ministerial positions? Isn’t he abusing his power in an effort to protect his allies?
Why is President Rousseff being charged with violating the Law of Fiscal Responsibility for pedaladas, when Interim President Michel Temer did the exactly the same thing when he was acting President during times that Rousseff was out of the country? And what about her predecessors, Presidents Lula and Cardoso, who engaged in similar budgetary actions, to say nothing of at least sixteen Brazilian governors, including Aécio Neves, President Rousseff’s rival in the 2014 election.
While you did not mention it in your declarations, you also failed to point out another shortcoming in the current political situation in Brazil, namely, a situation in which there is freedom of the press (and the mass media in general) only for those who own it. Today conservative forces, which control the major newspapers, magazines, and television stations, systematically present partial reporting on events in order to influence public opinion. It is as if Fox News were to control all of the major media outlets in the United States. Fortunately, social media has served as an alternative source of information, but it doesn’t have the weight of the mainstream media.
The first week of the new government has revealed a radical new, but actually old, agenda for Brazil that intends to rollback all of the progressive social changes that have taken place over the last thirty years since the end of military rule. Those who were outraged by the fact that Michel Temer did not appoint a single woman or a person of African-descent to ministerial positions were not clamoring for tokenism. That act was not a public relations blunder. It symbolized the intent of a government. Temer blamed his allies for not provided names of women and Afro-Brazilians, in an effort to free himself of responsibility for the appointments. Yet his comments speak loudly about the nature of his allies that brought him to power and the nature of the new “democratic” government. In the first week of his governance, he has already announced that he is going to reduce social rights in the countryside and introduce cutbacks in the social security system, education, and housing, all of which will largely affect the poorest sectors of Brazilian society.
In 1964, the U.S. government was on the wrong side of history. It never apologized to the Brazilian people for supporting a military dictatorship. Now, five decades later, I fear that it is once again endorsing an illegitimate process. Those who don’t learn from history are forced to repeat it.
Respectfully,
James N. Green
Carlos Manuel de Céspedes Chair in Latin American History, Brown University
Director of the Brown-Brazil Initiative
*Renan Quinalha é advogado, doutorando em Relações Internacionais pela USP e Visiting Research Fellow na Brown University, EUA.
A verdadeira causa
Do Facebook de Luis Carlos Bresser Pereira*
Diante do afastamento do Senador Romero Jucá, que caiu em uma armadilha preparada pelo senhor Sérgio Machado (é difícil encontrar alguém pior neste Brasil), o PT passou a afirmar que paralisar a Operação Lava Jato foi a "verdadeira" causa do impeachment. Não, não foi. Foi uma das causas; é claro que o PMDB e os demais partidos querem paralisá-la, e não se conformavam com a "inação" do PT, mas a principal causa está hoje nos jornais.
A meta fundamental dos impichadores é reduzir os direitos sociais dos trabalhadores, e o governo informa que, para isto apresentará quatro reformas constitucionais: desvinculação das despesas com educação e saúde da receita e teto para elas; autorização para que os acordos sindicais prevaleçam sobre a legislação trabalhista; desvinculação de benefícios sociais do salário mínimo; e definição da idade mínima para a previdência.
O objetivo é beneficiar os capitalistas rentistas e financistas - os grandes vitoriosos do momento - para que paguem menos impostos. É reduzir os salários diretos e indiretos.
A justificativa é uma "crise fiscal estrutural". É a tese que a Constituição de 1988 não cabe no PIB. Ora, isto é falso. Entre 1999 e 2012 as metas fiscais foram atingidas. Agora estamos em uma crise fiscal que, de fato, exige ajuste. Mas exige medidas pontuais.
Quanto às reformas constitucionais, é realmente necessário fazer alguma coisa, mas não da forma violenta que está sendo proposta. Uma desvinculação de 20% é razoável, e realmente é necessário estabelecer uma idade mínima de 65 anos, mas com um amplo prazo de carência, porque não há problema fiscal agudo na previdência hoje. A desvinculação dos benefícios sociais do salário mínimo não é necessária, mas sua manutenção significa que o salário mínimo não deverá aumentar mais, em termos reais, do que a produtividade. Prevalecer acordos sobre a legislação trabalhista é péssimo para a grande maioria dos trabalhadores, que não têm sindicatos fortes a defendê-los.
A economia brasileira está semiestagnada desde 1990 - ano da abertura comercial - porque a partir de então a doença holandesa deixou de ser neutralizada e as empresas brasileiras passaram a ter uma desvantagem competitiva muito grande. Porque a taxa de juros é muito alta desde a abertura financeira de 1992. Porque essa taxa de juros muito alta implica um custo fiscal de juros para o Estado absurdo - em torno de 6% do PIB, no último ano, 8,7% do PIB. E porque a poupança pública é muito pequena, insuficiente para financiar os necessários investimentos públicos.
Diante do afastamento do Senador Romero Jucá, que caiu em uma armadilha preparada pelo senhor Sérgio Machado (é difícil encontrar alguém pior neste Brasil), o PT passou a afirmar que paralisar a Operação Lava Jato foi a "verdadeira" causa do impeachment. Não, não foi. Foi uma das causas; é claro que o PMDB e os demais partidos querem paralisá-la, e não se conformavam com a "inação" do PT, mas a principal causa está hoje nos jornais.
A meta fundamental dos impichadores é reduzir os direitos sociais dos trabalhadores, e o governo informa que, para isto apresentará quatro reformas constitucionais: desvinculação das despesas com educação e saúde da receita e teto para elas; autorização para que os acordos sindicais prevaleçam sobre a legislação trabalhista; desvinculação de benefícios sociais do salário mínimo; e definição da idade mínima para a previdência.
O objetivo é beneficiar os capitalistas rentistas e financistas - os grandes vitoriosos do momento - para que paguem menos impostos. É reduzir os salários diretos e indiretos.
A justificativa é uma "crise fiscal estrutural". É a tese que a Constituição de 1988 não cabe no PIB. Ora, isto é falso. Entre 1999 e 2012 as metas fiscais foram atingidas. Agora estamos em uma crise fiscal que, de fato, exige ajuste. Mas exige medidas pontuais.
Quanto às reformas constitucionais, é realmente necessário fazer alguma coisa, mas não da forma violenta que está sendo proposta. Uma desvinculação de 20% é razoável, e realmente é necessário estabelecer uma idade mínima de 65 anos, mas com um amplo prazo de carência, porque não há problema fiscal agudo na previdência hoje. A desvinculação dos benefícios sociais do salário mínimo não é necessária, mas sua manutenção significa que o salário mínimo não deverá aumentar mais, em termos reais, do que a produtividade. Prevalecer acordos sobre a legislação trabalhista é péssimo para a grande maioria dos trabalhadores, que não têm sindicatos fortes a defendê-los.
A economia brasileira está semiestagnada desde 1990 - ano da abertura comercial - porque a partir de então a doença holandesa deixou de ser neutralizada e as empresas brasileiras passaram a ter uma desvantagem competitiva muito grande. Porque a taxa de juros é muito alta desde a abertura financeira de 1992. Porque essa taxa de juros muito alta implica um custo fiscal de juros para o Estado absurdo - em torno de 6% do PIB, no último ano, 8,7% do PIB. E porque a poupança pública é muito pequena, insuficiente para financiar os necessários investimentos públicos.
*Economista e ex-ministro da Fazenda
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