http://www1.folha.uol.com.br/
Folha.com, 16/03/17
Um país em que o presidente é produtor oficial de notícias falsas
Por Janio de Freitas
Os alemães estão preocupados com o número e os efeitos crescentes de notícias falsas. Seu governo discute, já como anteprojeto, uma legislação duríssima contra empresas que viabilizam redes na internet, quando não eliminem com presteza as notícias falsas e a disseminação do ódio.
No Brasil, providência semelhante seria contraditória, sendo o país, por exemplo, em que um ex e badalado presidente da República e um ministro do Supremo Tribunal Federal propõem que o caixa 2 em política –o dinheiro tomado e destinado em segredo– não mais seja considerado como corrupção.
Ou, mais simplesmente: o país em que o presidente é produtor oficial e contumaz de notícias falsas. Com uso não só da internet, mas de todo o sistema de comunicação informativa do país.
O que Fernando Henrique e Gilmar Mendes pretendem aceitável é a maior causa da grande mentira eleitoral, o mito das eleições livres e limpas no Brasil. Lembre-se, a propósito, que as contas da campanha presidencial de Fernando Henrique foram recusadas pela Justiça Eleitoral, com um grande rombo apesar da contabilidade conveniente. Como diz Carlos Ayres Britto, com brilhante passagem pelo Supremo, o caixa 2 "é eticamente espúrio e juridicamente delituoso".
Michel Temer repete, com a esperança de que o país o ouça, serem as críticas ao projeto de "reforma" da Previdência movidas apenas por interesses. Nega perdas: "Cerca de 63% dos trabalhadores terão apo
À parte a dupla indecência que está na proporção dos recebedores de salário mínimo e no valor dele, já desmoralizantes da Previdência e da "reforma", o projeto do governo fere sobretudo os mais carentes. Os de salário mínimo integram a grande multidão que começa a trabalhar mais cedo, na puberdade ainda. Exigir-lhes mais cinco ou dez anos de trabalho, para chegar à nova idade mínima de aposentadoria, é um ônus desumano. E negá-lo é mentir ao país.
O "ministério de técnicos", a "recuperação da moralidade pública", a "retomada do crescimento ainda neste ano" (de 2016!), e tantas balelas mais, formam uma estrada imoral de mão única. Na qual foi erguido há pouco um monumento à indignidade. Recusar-se a reconhecer uma autoria legítima é uma usurpação, seja ou não em proveito próprio. No caso, era.
Michel Temer saiu-se com a bobagem de que "a paternidade da transposição do São Francisco é do povo brasileiro". Sua forma de negar a autoria de Lula, em áspera batalha técnica e de comunicação, e a difícil continuidade assegurada por Dilma. Citou valores errados, sempre em seu favor. E inventou a entrega de 130 mil cisternas.
Por isso a recente seca, brutal, não provocou o abalo e os demais efeitos das secas equivalentes. Observação de valor especial nestes tempos: tamanha obra sem que houvesse sequer vestígio de escândalo, na atividade que mais produziu corrupção e escarcéus na história do Nordeste.
Tereza Campello, a cujo silêncio realizador a imprensa/TV respondeu com silêncio incompetente, foi uma ministra extraordinária.
Quanto a Michel Temer, entende-se por que lhe pareceu normal nomear Alexandre de Moraes, coautor de um livro que assina sozinho, para o Supremo. A veracidade não é o que lhe importa. Como caráter não se vende em supermercado, Michel Temer não recebe informações a respeito.
Carta Maior, 14/03/17
O preço do golpe
Por Eric Nepomuceno, para o Página/12
Dias atrás, Michel Temer, que ocupa a presidência de Brasil desde o golpe institucional do ano passado, afirmou que a economia começava a mostrar resultados excelentes.
Bom, em se tratando de um cavalheiro que, ao discursar no Dia Internacional da Mulher, disse que o papel delas era essencial para saber dos aumentos de preços nos supermercados, se pode esperar qualquer coisa. Inclusive semelhante disparate.
A verdade verdadeira é bem diferente: a pior recessão da história do país é o preço a se pagar pelo golpe institucional que se iniciou em 2015 e que levou à destituição de Dilma Rousseff, processo que se desenrolou entre abril e agosto do ano passado, sacramentado pela legislatura de mais baixo nível das últimas muitíssimas décadas, com parte substancial de deputados e senadores diretamente comprados – não há outra palavra – para assegurar o golpe, sempre sob o olhar bovino do Supremo Tribuna Federal.
Ler os diários econômicos por estes dias é como entrar na literatura de horror, recheada de mentiras e fracassos. E o noticiário político se parece cada vez mais às páginas policiais, onde se destacam cada vez mais os principais integrantes do governo ilegítimo – e também os secundários.
Entretanto, o pior é saber que ainda falta muito para que se alcancem os verdadeiros objetivos do golpe: destroçar as leis trabalhistas, liquidar conquistas de décadas na seguridade social, abrir as portas e janelas do país ao entreguismo mais mesquinho, ou seja, as tão mencionadas “reformas” anunciadas e prometidas por Temer e seu pessoal.
Jamais, nem mesmo nos tempos de Fernando Henrique Cardoso (menos ainda em seu segundo mandato, entre 1999 e 2002), o neoliberalismo atuou no meu país com semelhante fúria. Existem dados alarmantes que provêm de entidades que podem ser classificadas de qualquer coisa exceto de simpatia ou proximidade com a esquerda em geral, ou com Lula e o PT em particular.
O Banco Mundial, por exemplo. Em um informe sobre o ano de 2015, quando o governo de Dilma Rousseff esteve literalmente paralisado pela Câmara de Deputados – quando esta era presidida por Eduardo Cunha, ferramenta principal dos golpistas – a pobreza aumentou no Brasil, de 7,4% a 8,7% da população.
Dias atrás, Michel Temer, que ocupa a presidência de Brasil desde o golpe institucional do ano passado, afirmou que a economia começava a mostrar resultados excelentes.
Bom, em se tratando de um cavalheiro que, ao discursar no Dia Internacional da Mulher, disse que o papel delas era essencial para saber dos aumentos de preços nos supermercados, se pode esperar qualquer coisa. Inclusive semelhante disparate.
A verdade verdadeira é bem diferente: a pior recessão da história do país é o preço a se pagar pelo golpe institucional que se iniciou em 2015 e que levou à destituição de Dilma Rousseff, processo que se desenrolou entre abril e agosto do ano passado, sacramentado pela legislatura de mais baixo nível das últimas muitíssimas décadas, com parte substancial de deputados e senadores diretamente comprados – não há outra palavra – para assegurar o golpe, sempre sob o olhar bovino do Supremo Tribuna Federal.
Ler os diários econômicos por estes dias é como entrar na literatura de horror, recheada de mentiras e fracassos. E o noticiário político se parece cada vez mais às páginas policiais, onde se destacam cada vez mais os principais integrantes do governo ilegítimo – e também os secundários.
Entretanto, o pior é saber que ainda falta muito para que se alcancem os verdadeiros objetivos do golpe: destroçar as leis trabalhistas, liquidar conquistas de décadas na seguridade social, abrir as portas e janelas do país ao entreguismo mais mesquinho, ou seja, as tão mencionadas “reformas” anunciadas e prometidas por Temer e seu pessoal.
Jamais, nem mesmo nos tempos de Fernando Henrique Cardoso (menos ainda em seu segundo mandato, entre 1999 e 2002), o neoliberalismo atuou no meu país com semelhante fúria. Existem dados alarmantes que provêm de entidades que podem ser classificadas de qualquer coisa exceto de simpatia ou proximidade com a esquerda em geral, ou com Lula e o PT em particular.
O Banco Mundial, por exemplo. Em um informe sobre o ano de 2015, quando o governo de Dilma Rousseff esteve literalmente paralisado pela Câmara de Deputados – quando esta era presidida por Eduardo Cunha, ferramenta principal dos golpistas – a pobreza aumentou no Brasil, de 7,4% a 8,7% da população.
Foi a primeira vez em dez anos que o número de brasileiros pobres cresceu. Pois em 2016, as projeções indicavam que esse porcentual se aproximaria perigosamente dos 10%. Um de cada dez brasileiros será pobre. Se Lula conseguiu tirar o Brasil do mapa mundial da fome, Temer e seus colaboradores fazem o contrário, aumentam o número de pobres existentes no país.
Outra instituição tão respeitada pelos neoliberais e os golpistas irresponsáveis é o Fundo Monetário Internacional – o famoso FMI –, que fez graves alertas sobre os riscos de que se chegasse aonde chegamos: há um ano, uma análise da instituição dizia que “os principais riscos para a economia do Brasil” estavam num “cenário político turbulento”.
Mais turbulento que o que existe agora é impossível, ou quase. E digo “quase” porque é impossível prever o que virá no futuro imediato. O que vai acontecer na semana que vem, por exemplo, ou na seguinte. Foram muitos e seguidos os avisos do FMI alertando que as ações para destituir a presidenta Dilma Rousseff e afastar o PT do poder afetariam duramente a economia do país. Ninguém os escutou, nem o empresariado, menos ainda o mercado financeiro, e tampouco as grandes centrais patronais.
Quando o FMI – o FMI! – diz e repete que a negativa de suas excelências – tanto as da Câmara quanto as do Senado – em aprovar as medidas de ajuste fiscal impulsadas pela então mandatária poderia levar o país à quebra, os que passaram a vida ajoelhados diante desse altar preferiram, de repente, das as costas. No Congresso, falou mais alto, muito mais alto, a voz do mercado, que intercambia votos por interesses, por postos e por verbas – e, muitas vezes, votos por dinheiro sujo.
E o que diz agora o FMI? Que a perspectiva é a de que a economia brasileira continuará paralisada, ou quase. Ou seja, que o desemprego continuará destroçando vidas, que a pobreza seguirá crescendo, que o país seguirá se destruindo lentamente.
Este é o retrato de um país em descomposição ética, política, moral e, claro, econômica. Este é o preço, terrível preço, tenebroso preço, da traição levada a cabo por um bando de ressentidos, liderados pelo frustrado Aécio Neves e por Fernando Henrique Cardoso, que nunca aceitaram as quatro derrotas consecutivas sofridas nas urnas eleitorais.
Este é o preço do cinismo, da ambição e da covardia da quadrilha que gravita ao redor de um homenzinho cuja estatura moral, ética e intelectual pode ser coberta por uma folha seca nas veredas do mundo.
De um homenzinho que seguiria sendo a insignificância conspiradora e corrupta de sempre se não tivesse sido alçado às inalcançáveis alturas da poltrona presidencial, usurpada por seus chefes e entregue a ele por pura conveniência. Ao fim e ao cabo, para tal missão não lhe falta talento. Temer sempre foi um conspirador desleal. É a figura perfeita para a missão que lhe foi conferida.
Tradução: Victor Farinelli
Nenhum comentário:
Postar um comentário