Arquidiocese de BH, 22/03/17
Bispos da Província Eclesiástica de Belo Horizonte divulgam manifesto
NÃO É ESTA A REFORMA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL QUE O BRASIL PRECISA
Se a vossa justiça não for maior que a dos escribas e dos fariseus,
não entrareis no Reino dos Céus (Mt 5,20).
1. Conscientes
de sua responsabilidade na vida pública, os cristãos devem estar
presentes na formação dos consensos necessários e na oposição contra as
injustiças. A Igreja não substitui e nem se identifica com políticos ou
interesses partidários. Contudo, não pode se eximir da sua vocação de
ser incansável advogada da justiça e dos pobres (Documento de Aparecida
p.278). Em razão disso, nós, bispos da Igreja Católica, na província de
Belo Horizonte, somos instados a promover a reflexão sobre a reforma da
Previdência (PEC 287/2016), que tramita no Congresso Nacional.
2. Visando
promover o bem-estar da população brasileira, a Constituição Federal de
1988 estabeleceu a Seguridade Social, destinada a garantir saúde,
previdência e assistência social. Para sua realização, essas políticas
públicas compartilham diversas fontes de financiamento, denominadas
“contribuições sociais”.
3. Várias
reformas são indispensáveis à democracia brasileira. O aprimoramento
das políticas é bem-vindo, desde que aperfeiçoe as instituições
democráticas. Nenhuma reforma, contudo, pode operar em sentido
contrário, trazendo o risco de aumentar as desigualdades que
historicamente já caracterizam a sociedade brasileira.
4. Num
momento de intensa crise de representatividade e de legitimidade das
instituições, pela ausência de autoridade moral que agrava a falta de
credibilidade dos legisladores e governantes, é contraditório e perigoso
impor mudanças constitucionais, quanto mais no que tange aos direitos
sociais. A reforma da Previdência, tal como proposta, terá impactos para
todos os cidadãos brasileiros: tanto para os que vivem neste tempo
presente, quanto para as gerações futuras. É indispensável que a
sociedade seja ouvida e que se criem mecanismos de participação dos
cidadãos nesse processo de reforma previdenciária.
5. Também
é preciso assegurar a transparência das informações veiculadas. É
indispensável que se apresentem com clareza todas as fontes de
financiamento e o verdadeiro destino dos recursos da Previdência e, de
forma mais ampla, da Seguridade Social.
6. A
Previdência é uma das políticas sociais de maior abrangência exercidas
pelo Estado. É arriscado analisá-la apenas sob a ótica de receitas e
despesas, esquecendo-se de seu papel essencial na redistribuição de
renda. A Previdência Social representa, para os cidadãos empobrecidos, a
única diferença entre o desamparo e uma velhice minimamente segura.
Além disso, num País de tão intensas desigualdades regionais, há muitos
municípios cuja economia local depende dos recursos dos aposentados.
7. É
inaceitável uma reforma que se assenta na redução dos direitos dos mais
pobres, assim como é inadmissível estabelecer benefícios abaixo do
salário mínimo, com valores insuficientes para garantir as condições
básicas de sobrevivência, enquanto certos grupos continuam sendo
privilegiados.
8. Há
uma profunda contradição em um modelo que pretende reduzir os
benefícios pagos ao cidadão sem que antes sejam cobrados os débitos dos
sonegadores e reavaliadas as isenções, para que estas apenas se
justifiquem pelo serviço que prestam aos pobres. Do mesmo modo, é
necessário um reordenamento nas finanças e no orçamento públicos, com
vistas a impedir que recursos da Seguridade Social sejam utilizados para
outros fins.
9. Não
é possível deixar desprotegidos aqueles que, por uma questão de justiça
social, mais necessitam do amparo do poder público. Nesse campo, é
condenável a extinção da diferença entre mulheres e homens em seu
acesso, por direito, à Previdência. Sobrecarregam-se as mulheres nas
atividades domésticas e nos cuidados familiares, além da disparidade
salarial que as atinge com maior força.
10. Com
efeito, não há justiça em tratar de forma igual situações que são
eminentemente desiguais. Nesse sentido, é inaceitável o estabelecimento
de uma idade mínima universal. A idade de 65 anos para se aposentar e o
tempo de 49 anos de contribuição para se obter o benefício integral são
injustos para os trabalhadores, especialmente os do meio rural e aqueles
submetidos a condições penosas e extenuantes. Uma idade mínima elevada
sacrifica os pobres, que começam a trabalhar mais cedo e têm uma
expectativa de vida menor.
11. Nenhuma
reforma da Previdência pode se eximir da responsabilidade de garantir
um envelhecimento seguro e amparado. Como afirma o Papa Francisco: a
economia que promove a exclusão e a desigualdade social é comprometida
com a morte: “Essa economia mata!” (Evangelho da Alegria 53). Em
discurso sobre a previdência social (Praça São Pedro, 07/11/15) o Para
Francisco afirmou “nunca falte o seguro para a velhice, a doença, os
acidentes de trabalho; não falte o direito à pensão, e sublinho, o
direito, porque trata-se de direito [...]. É preciso fazê-lo não como
obra de solidariedade, mas como dever de justiça e subsidiariedade”.
12. Diante
disso, nós, bispos da Arquidiocese de Belo Horizonte e de sua Província
Eclesiástica, sabedores de que “qualquer comunidade de Igreja, que
pretende subsistir tranquila [...] sem cooperar de forma eficaz para que
os pobres vivam com dignidade e haja inclusão de todos, correrá o
risco de sua dissolução [...]” (Evangelho da Alegria 205), conclamamos
os católicos, todos os cidadãos, mulheres e homens, a se empenharem na
luta por uma previdência social que cumpra sua função de proteção social
para os mais empobrecidos, conforme assegurado na Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988.
Belo Horizonte, 20 de março de 2017.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte
Dom João Justino de Medeiros Silva
Arcebispo Coadjutor eleito de Montes Claros,
transferido de Bispo Auxiliar de Belo Horizonte
Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães
Bispo Auxiliar de Belo Horizonte
Dom Edson José Oriolo dos Santos
Bispo Auxiliar de Belo Horizonte
Dom Otacílio Ferreira de Lacerda
Bispo Auxiliar de Belo Horizonte
Mons. Geovane Luís da Silva
Bispo Auxiliar eleito de Belo Horizonte
Mons. Vicente de Paula Ferreira
Bispo Auxiliar eleito de Belo Horizonte
Dom Guilherme Porto
Bispo Diocesano de Sete Lagoas
Dom José Aristeu Vieira
Bispo Diocesano de Luz
Dom José Carlos de Souza Campos
Bispo Diocesano de Divinópolis
Dom Miguel Ângelo Freitas Ribeiro
Bispo Diocesano de Oliveira
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