Blog da Cidadania, 23/03/17
Como se deu minha prisão. E o interrogatório
Por Eduardo Guimarães
O juiz Sergio Moro, nesta quinta-feira 23, recuou de sua decisão para reconhecer que sou jornalista e, como consequência, mandar excluir as provas obtidas mediante violação do sigilo de fonte.
Todavia, em sua decisão, ele faz afirmações sobre como se deu meu depoimento as quais não correspondem aos fatos e devem ser esclarecidas.
Às 6 horas do dia 21 de março deste ano, eu e minha esposa dormíamos quando escutamos um barulho semelhante a arrombamento da porta da frente do nosso apartamento.
Achei que era algum vizinho começando alguma obra antes da hora e, como fora dormir poucas horas antes, virei-me para o lado e voltei a dormir. Segundos depois, ouço minha esposa dizer, desesperada, que tinham vindo me prender.
Minha filha Victoria, 18 anos, 26 quilos, portadora de paralisia cerebral, que dormia no quarto ao lado, assustou-se com os golpes desferidos pelos policiais na porta e começou a reclamar, como faz quando está nervosa.
Levanto-me assustado, corro para a sala e encontro minha mulher à porta, entreaberta. Termino de abrir a porta, vejo quatro policiais federais. E o porteiro do prédio com expressão assustada no rosto.
Enquanto isso, Victoria assistia a tudo com olhos arregalados.
Os policiais comunicaram que tinham uma ordem de busca e apreensão e começaram a vasculhar o apartamento. Obrigaram o porteiro a entrar no meu quarto de dormir, que começaram a vasculhar, abrindo gavetas, portas de armário e qualquer outro lugar possível.
Acharam meu computador (notebook), exigiram a senha para ligá-lo e, assim, poderem mudar essa senha para terem acesso quando quisessem. Pedi para copiar alguns dados pessoais, mas não me foi permitido. Pediram para desbloquear meu celular com a mesma finalidade.
Após a busca, nada tendo sido encontrado, os policiais anunciaram minha condução coercitiva.
Tentei ligar para meu advogado, doutor Fernando Hideo, mas não consegui. Passava um pouco das 6 horas. Minha esposa pediu para esperarem que eu conseguisse falar com o advogado, mas não permitiram. Exigiram que eu me vestisse e os acompanhasse.
Eu e minha esposa entramos no quarto de Victoria, onde respeitaram mais, para nos abraçarmos. Ela chorava, minha filha fazia seus sons característicos, pois não fala.
Imaginei se voltaria a vê-las.
Tentei, porém, aparentar calma. Até então, achava que estava sendo conduzido por conta da denúncia de ameaça contra Moro, feita por ele.
No meio do caminho, fui informado pelos policiais de que estava sendo detido por conta do post que publiquei em 26 de fevereiro do ano passado divulgando a quebra de sigilo de Lula.
Como não estava ainda raciocinando direito, pois fora dormir tarde e depois fui acordado daquele jeito poucas horas depois, comecei a debater a operação Lava Jato com os policiais. Enquanto eu dizia que era uma operação de caráter partidário contra o PT, eles defendiam as investigações com as argumentações que todos conhecem.
Chegamos à sala do delegado que me interrogou. Eu já não tinha mais telefone, já não tinha mais como me comunicar. O delegado iniciou o interrogatório sem a presença de qualquer advogado.
O delegado me comunicou que já sabia quem fora a minha fonte, mostrou-me o nome da fonte, contou-me que ela obtivera a informação que me passara de uma “auditora da Receita” (fonte da minha fonte), mas não quis me dizer a profissão da pessoa que entrou em contato comigo.
Mostrou-me a foto da “auditora da Receita” que vazou a informação. Perguntou se eu a conhecia e me disse que estava tentando determinar se nós três agíamos juntos.
Fiquei surpreso, pois a fonte, o tal jornalista, dissera-me que obtivera as informações com a imprensa. Disse-me que toda a imprensa de São Paulo já tinha aquelas informações que me estava passando. Então, descubro que uma servidora da Receita subtraiu de lá as informações ilegalmente.
O delegado deixou claro que eu era suspeito de ser “cúmplice” daquelas pessoas. Eu disse que isso não era verdade e me perguntei, em voz alta, por que o tal jornalista me dera informação inverídica.
O delegado respondeu minha pergunta retórica. Disse que, provavelmente, fora para me “induzir” a divulgar os dados sem medo de estar cometendo um crime. Repito: o delegado me disse que minha fonte me enganou.
Enquanto isso, minha esposa tentava falar com o doutor Fernando, mas não conseguia. Então, NO DESESPERO, recorreu a uma parente que é advogada da área de Direito da Família e não tem maiores conhecimentos sobre a área criminal.
A nossa familiar chegou à sede da PF em São Paulo, à sala em que eu era interrogado, lá pela metade do depoimento. Porém, não teve condição técnica de me passar qualquer orientação enquanto eu respondia. Apenas assistiu à oitiva.
O meu interrogador deu a entender que eu teria que provar não ser cúmplice do tal jornalista e da auditora da Receita Federal, ambos de Curitiba. Nesse momento, decidi dizer ao delegado que tinha o telefone no qual recebera as mensagens e que elas poderiam demonstrar que eu não conhecia o jornalista curitibano dos quais eles tinham todos os dados, pois, nas mensagens, ele se apresentava a mim e eu fazia perguntas a ele sobre sua identidade.
Contudo, cerca de dois meses após a condução coercitiva de Lula, o aparelho travou.
No segundo semestre de 2016, o celular de minha esposa se quebrou e ela precisava de um novo. Achando que não iria precisar mais do celular no qual estava registrada a conversa com o jornalista de Curitiba, minha fonte, levei o aparelho à assistência técnica. Lá, fui informado de que, para consertá-lo, teriam que apagar todos os dados.
Concordei e o celular teve sua memória “formatada” e me foi devolvido absolutamente “em branco”.
De volta ao interrogatório a que fui submetido no último dia 21. Colocado diante da hipótese de ser preso se não provasse que não tinha relações com o jornalista de Curitiba que me passou as informações sobre Lula, disse a ele que tinha provas, sim, de que não conhecia a pessoa, pois ele me dissera que “já sabia tudo”.
Eis a informação que o juiz Sergio Moro divulgou nesta data e que não corresponde aos fatos, apesar de que não se sabe como ele foi informado da forma como transcorreu meu interrogatório. Ele diz que não fui pressionado, eu digo o contrário.
Só o que posso afirmar é que não havia fonte a preservar porque as autoridades me disseram mais sobre elas do que eu sabia. Antes de começar a depor, fui informado de que meus interrogadores sabiam quem era a fonte.
Ora, vamos repassar os fatos.
Fui ouvido sem um advogado com condições de me orientar sobre o que eu precisava ou não responder. Tudo isso após o trauma pelo qual eu, minha esposa e minha filha doente passamos ao raiar do dia.
Avisei ao delegado que me interrogou que a familiar de minha esposa não tinha conhecimentos da área criminal e que estava lá mais para eu não ficar sozinho em um depoimento, mas ela nem sequer se manifestou durante a oitiva.
Como se diz, ela “pegou o bonde andando”, ou seja, apesar de ser uma excelente advogada em sua área, nem conhecia o caso a fundo e nunca atuou na área criminal.
Fui informado de que, se não provasse que não tinha relações com as pessoas de Curitiba que conseguiram os dados que recebi, eu seria considerado parte de um grupo, ou uma quadrilha.
Meu advogado que atua nessa área, doutor Fernando Hideo Lacerda, chegou bem depois do fim do depoimento, no exato momento em que eu iria firmá-lo. Doutor Fernando descobriu vários pontos que haviam sido inseridos indevidamente no depoimento e pediu retificação, após eu informar que não havia dito certas coisas que lá constavam.
O delegado aceitou os pedidos de retificação e reconheceu que eram justificados. Se meu advogado não tivesse chegado a tempo, meus direitos civis teriam sido violados de forma ainda mais séria.
Sobre eu ter avisado o instituto Lula, o juiz Sergio Moro dá a impressão de que a Lava Jato apurou alguma coisa. Não é o que ocorreu.
Eis os fatos.
Em 23 de fevereiro de 2016 recebi as informações do jornalista de Curitiba. Recebi uma relação de mais de 40 nomes de pessoas e empresas que seriam ligadas ao ex-presidente Lula. Precisava saber se não era alguma armação – eu corria o risco de divulgar mentiras sobre o ex-presidente.
Procurei o assessor de imprensa do instituto Lula para saber se o ex-presidente conhecia aqueles nomes. Nada disse a ele sobre condução coercitiva. O assessor de imprensa do ex-presidente pediu prazo para verificar as informações antes que eu as divulgasse.
Concordei, ressaltando que não poderia demorar muito para divulgar as informações.
Em resumo: se eu não tivesse publicado a matéria de 26 de fevereiro de 2016, na qual EU disse que informei o Instituto Lula os 40 nomes de empresas e pessoas, Sergio Moro e a Lava Jato nunca saberiam que o ex-presidente foi informado de alguma coisa.
Aliás, vale dizer que o Instituto Lula só foi informado dos nomes que teriam sigilos quebrados. Mais nada. E com a finalidade de ser perguntado sobre se, de fato, aquelas pessoas e empresas tinham alguma ligação consigo ou com pessoas próximas a si, de modo que eu não divulgasse mentiras.
O juiz Sergio Moro parece muito preocupado em negar arbitrariedades, mas não se cansa de cometê-las. A nota que soltou demonstra intenção clara de me acusar de ter revelado informações que não me foram pedidas. Ou seja: ele procura me atingir moralmente.
Bem, eu digo o que realmente aconteceu: ele quebrou meu sigilo de forma irremediável ao determinar a quebra de sigilo de meu extrato telefônico.
O magistrado determinou que a operadora de celular informasse o meu extrato telefônico, com o objetivo claro de identificar a fonte que teria me passado a informação divulgada no blog.
Portanto, a decisão não corresponde à realidade ao afirmar que eu teria revelado “de pronto, ao ser indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria a sua fonte de informação”.
Basta perceber que o próprio juiz Sérgio Moro agora reconhece a ilegalidade das medidas tomadas visando à obtenção prévia da fonte de informação, para concluir que houve nítida coação ilegal no meu depoimento.
Está devidamente comprovado que, na ocasião do depoimento, as autoridades já tinham conhecimento da sua fonte de informação, obtido mediante o emprego de meios que o próprio magistrado agora assume serem ilegais.
O juiz Sergio Moro se converteu em meu inimigo. Está me processando depois de ter sido por mim representado no CNJ e depois de ter representado criminalmente contra mim em razão de uma publicação em rede social, em que se considera vítima de ameaça praticada por mim.
Não é mais juiz, é parte de um litígio. Não posso ser julgado por um inimigo. Isso é uma aberração, isso é coisa de ditaduras.
Você gostaria de ser julgado por um desafeto? Isso é Justiça?!!
E mais: quero lembrar a todos os brasileiros que, até o momento, ninguém nem mesmo ousou afirmar que informei alguma coisa ao ex-presidente Lula com a finalidade de obter qualquer lucro.
Não fui acusado de me corromper, de corromper alguém, de ter feito qualquer coisa para obter benefícios. Agi de acordo com a minha consciência sem visar lucro pessoal. Tenho a consciência tranquila.
Considero uma honra lutar contra todo esse arbítrio. Estou lutando em defesa da democracia brasileira, ameaçada por processos Kafkianos como esse do qual sou vítima simplesmente por fazer jornalismo, ainda que o juiz me negue a condição de jornalista.
Por fim, o mais irônico em toda essa história é que aqueles que me acusam de vazamento, eles mesmos vazaram meu processo, então sigiloso, para um site que se dedica a atacar o PT, Lula, a esquerda. Todo santo dia. E que é ligado ao PSDB e ao governo Temer.
O mundo precisa saber do que está acontecendo no Brasil e, enquanto eu tiver vida e voz (liberdade), vou me dedicar a denunciar a ditadura que se abateu sobre o nosso país. Para que minhas três netas – e outros netos que virão – não vivam em uma ditadura.
DCM, 23/03/17
O recuo de Moro no caso Eduardo Guimarães é o epílogo de seu reinado
Por Kiko Nogueira
E então Moro recuou.
http://jornalggn.com.br/blog/s ergio-saraiva/doi-codi-2017-a- policia-politica-da-lava-jato- por-sergio-saraiva
E então Moro recuou.
Em despacho desta quinta, o juiz avisa que decidiu não mais investigar Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania.
Eduardo havia sido conduzido coercitivamente para depor na sede da Polícia Federal na Lapa, em São Paulo, sob a alegação de que divulgou informações sobre uma operação envolvendo Lula.
Segundo o blogueiro, os agentes da Lava Jato já sabiam a fonte da informação. De acordo com a Constituição, jornalistas não são obrigados a revelá-la.
Moro tentou uma pegadinha: Eduardo não faz
jornalismo, mas “propaganda política” (Estadão e Globo, vamos combinar,
fazem empadas, paçocas e escondidinhos).
Não colou. A ação arbitrária foi
criticada unanimemente — à esquerda, à direita e ao centro. Nem
Reinaldo Azevedo aprovou o que fizeram com o que chamaria, em outras
circunstâncias, de “petralha”.
A ONG Repórteres Sem Fronteiras, sediada em Paris, emitiu nota de repúdio. Ficaram
a seu lado apenas os extremistas de sempre, que recebem milagrosamente
vazamentos selecionados, e sicofantas de Temer como a inacreditável
Eliane Cantanhêde.
Ao cometer essa insânia, nas
palavras de Juca Kfouri, num misto de desespero, vingança e arrogância,
perdeu o apoio da mídia, com quem sempre contou e que o alçou à condição
de super herói.
“Considerando o valor da imprensa livre em uma
democracia e não sendo a intenção deste julgador ou das demais
autoridades envolvidas na investigação colocar em risco essa liberdade e
o sigilo de fonte, é o caso de rever o posicionamento anterior e melhor
delimitar o objeto do processo”, escreveu.
“Deve ser excluído do processo e
do resultado das quebras de sigilo de dados, sigilo telemático e de
busca e apreensão, isso em endereços eletrônicos e nos endereços de
Carlos Eduardo Cairo Guimarães, qualquer elemento probatório relativo à
identificação da fonte da informação”.
Traduzindo: foi mals, aê.
Moro se tornou um empecilho, como antes dele Joaquim Barbosa. Como dizem os teletubbies, é hora de dar tchau.
Nei latorraca, o delegado Duran em 'Ópera do malandro'
http://jornalggn.com.br/blog/s
Jornal GGN, 25/03/17
DOI-CODI 2017: A polícia política da Lava Jato
Por Sergio Saraiva
“Se pensas que burlas as normas penais, insuflas, agitas e
gritas demais, a lei logo vai te abraçar, infrator com seus braços de
estivador”.
A reportagem do caderno Poder da Folha de S. Paulo de 24 de março de 2017 descreve o método de perseguição ao blogueiro Eduardo Guimarães e às suas fontes jornalísticas. Traz também dados do inquérito da Polícia Federal que levou à detenção de Eduardo, acusado por ter antecipado – em um furo de reportagem – a condução coercitiva do presidente Lula.
“Se tu falas muitas palavras sutis E gostas de senhas, sussurros, ardis, a lei tem ouvidos pra te delatar nas pedras do teu próprio lar”.
Interessante é percebermos que a Policia Federal parece, nesse caso, atuar como polícia política. Não parece que o vazamento em si seja mais do que um mote para o constrangimento de adversários do “regime imaginário de poder” que a Lava-Jato passou a representar.
O que há de mais representativo dessa posição ideológica assumida pela Polícia Federal de Lava-Jato são os termos utilizados no inquérito.
A auditora da receita que teria vazado os dados para Eduardo Guimarães foi rastreada pelas páginas da internet que seguia. As páginas eram de esquerda e isso a tornou suspeita. Seguia publicações do jornalista Fernando Morais.
Voltaram a vasculhar as lixeiras do pessoal de esquerda. Agora, as lixeiras das caixas de e-mails.
“Se trazes no bolso a contravenção, muambas, baganas e nem um tostão, a lei te vigia, bandido infeliz, com seus olhos de raio-X”.
Agora vejamos como a PF classifica tais publicações: “desrespeitosas” e “ofensivas” para com a Lava-Jato.
Não, as publicações não eram críticas a Lava-Jato, eram ofensivas. A Lava-Jato, no entender desses policiais, não é uma investigação, é uma entidade em si mesma que pode ser desrespeitada e ofendida. Algo como a “pátria” na época da ditadura.
Para criminalizar tal atitude, ressaltam que seguir tais publicações demonstra “alguma espécie de simpatia ou alinhamento à posição ideológica do ex-presidente do Brasil”. Referem-se a Lula – por óbvio fonte de inspiração ideológica deletéria à moral e à segurança nacional.
Pelas últimas pesquisas de intenção de voto, mais de 40% dos eleitores brasileiros tem simpatia ou alinhamento ao ex-presidente do Brasil. Como se posicionaria a polícia de Lava-Jato em relação a isso?
Simples, o Brasil é o Brasil e Lava Jato é Lava Jato – são países diferentes, inimigos em alguns aspectos. Tal e qual demonstrar simpatia por Fidel Castro era crime na ditadura.
Quanto à pessoa que serviu de ponte entre a auditora da receita e Eduardo Guimarães – seria um “radical político”.
Mas afinal o que é um “radical político”? Algo próximo de um “radical islâmico” ou a um “terrorista”?
Não sei, mas a Polícia Federal de Lava-Jato o julga como alguém muito perigoso.
“Se vives nas sombras, frequentas porões, se tramas assaltos ou revoluções, a lei te procura amanhã de manhã com seu faro de dobermann”.
O que se passa pela cabeça de um policial que redige um inquérito usando tais expressões?
Vive em que tempo de que país? No tempo das liberdades civis garantidas, no Brasil, pela Constituição de 1988?
“Art 5º – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
Não, vive em outro país – no país da Lava-Jato.
Nesse país, uma investigação policial não pode ser ofendida, quem demonstrar simpatias por Lula é suspeito e quem se posicionar formalmente em relação a isso é radical político.
E, então, em nome da pátria Lava-Jato, a detenção de Eduardo Guimarães passa a ser coerente.
“E se definitivamente a sociedade só te tem desprezo e horror e mesmo nas galeras és nocivo, és um estorvo, és um tumor, a lei fecha o livro, te pregam na cruz, depois chamam os urubus”.
PS1: os versos entremeados ao texto são da canção 'Hino de Duran', de Chico Buarque de Holanda. São de 1979 – em plena ditadura, e se parecem aplicáveis ao momento atual do Brasil, não é por coincidência.
PS2: Oficina de Concertos Gerais e Poesia - mais um porão infecto dentro dos subterrâneos da liberdade.
A reportagem do caderno Poder da Folha de S. Paulo de 24 de março de 2017 descreve o método de perseguição ao blogueiro Eduardo Guimarães e às suas fontes jornalísticas. Traz também dados do inquérito da Polícia Federal que levou à detenção de Eduardo, acusado por ter antecipado – em um furo de reportagem – a condução coercitiva do presidente Lula.
“Se tu falas muitas palavras sutis E gostas de senhas, sussurros, ardis, a lei tem ouvidos pra te delatar nas pedras do teu próprio lar”.
Interessante é percebermos que a Policia Federal parece, nesse caso, atuar como polícia política. Não parece que o vazamento em si seja mais do que um mote para o constrangimento de adversários do “regime imaginário de poder” que a Lava-Jato passou a representar.
O que há de mais representativo dessa posição ideológica assumida pela Polícia Federal de Lava-Jato são os termos utilizados no inquérito.
A auditora da receita que teria vazado os dados para Eduardo Guimarães foi rastreada pelas páginas da internet que seguia. As páginas eram de esquerda e isso a tornou suspeita. Seguia publicações do jornalista Fernando Morais.
Voltaram a vasculhar as lixeiras do pessoal de esquerda. Agora, as lixeiras das caixas de e-mails.
“Se trazes no bolso a contravenção, muambas, baganas e nem um tostão, a lei te vigia, bandido infeliz, com seus olhos de raio-X”.
Agora vejamos como a PF classifica tais publicações: “desrespeitosas” e “ofensivas” para com a Lava-Jato.
Não, as publicações não eram críticas a Lava-Jato, eram ofensivas. A Lava-Jato, no entender desses policiais, não é uma investigação, é uma entidade em si mesma que pode ser desrespeitada e ofendida. Algo como a “pátria” na época da ditadura.
Para criminalizar tal atitude, ressaltam que seguir tais publicações demonstra “alguma espécie de simpatia ou alinhamento à posição ideológica do ex-presidente do Brasil”. Referem-se a Lula – por óbvio fonte de inspiração ideológica deletéria à moral e à segurança nacional.
Pelas últimas pesquisas de intenção de voto, mais de 40% dos eleitores brasileiros tem simpatia ou alinhamento ao ex-presidente do Brasil. Como se posicionaria a polícia de Lava-Jato em relação a isso?
Simples, o Brasil é o Brasil e Lava Jato é Lava Jato – são países diferentes, inimigos em alguns aspectos. Tal e qual demonstrar simpatia por Fidel Castro era crime na ditadura.
Quanto à pessoa que serviu de ponte entre a auditora da receita e Eduardo Guimarães – seria um “radical político”.
Mas afinal o que é um “radical político”? Algo próximo de um “radical islâmico” ou a um “terrorista”?
Não sei, mas a Polícia Federal de Lava-Jato o julga como alguém muito perigoso.
“Se vives nas sombras, frequentas porões, se tramas assaltos ou revoluções, a lei te procura amanhã de manhã com seu faro de dobermann”.
O que se passa pela cabeça de um policial que redige um inquérito usando tais expressões?
Vive em que tempo de que país? No tempo das liberdades civis garantidas, no Brasil, pela Constituição de 1988?
“Art 5º – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
Não, vive em outro país – no país da Lava-Jato.
Nesse país, uma investigação policial não pode ser ofendida, quem demonstrar simpatias por Lula é suspeito e quem se posicionar formalmente em relação a isso é radical político.
E, então, em nome da pátria Lava-Jato, a detenção de Eduardo Guimarães passa a ser coerente.
“E se definitivamente a sociedade só te tem desprezo e horror e mesmo nas galeras és nocivo, és um estorvo, és um tumor, a lei fecha o livro, te pregam na cruz, depois chamam os urubus”.
PS1: os versos entremeados ao texto são da canção 'Hino de Duran', de Chico Buarque de Holanda. São de 1979 – em plena ditadura, e se parecem aplicáveis ao momento atual do Brasil, não é por coincidência.
PS2: Oficina de Concertos Gerais e Poesia - mais um porão infecto dentro dos subterrâneos da liberdade.
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