10/09/2012
O DEVER DA CONTRIÇÃO
Por Mauro Santayana
Houvesse sido o seu
governo o mais limpo e mais honrado de toda a nossa história republicana e,
naturalmente, o Sr. Fernando Henrique Cardoso manteria silêncio sobre os seus
sucessores. Não lhe caberia censura-los, nem elogia-los, deixando o juízo à
transparência dos fatos.
Quando alguém despreza
a inteligência alheia, e é o que faz o ex-presidente, infirma a própria
inteligência. Em nenhum governo houve tão rápido enriquecimento de agentes
públicos, quanto no seu. Tudo se fez de forma asséptica, com cuidadoso
planejamento legal, para que os brilhantes rapazes da equipe econômica saíssem
por uma porta – a das instituições públicas – e entrassem pela outra – a do
sistema financeiro e das empresas privatizadas, ganhando milhões neste
movimento. É provável que, em nenhum dos casos, houvesse infração às leis,
ajustadas previamente ao programa, a partir do governo Collor. Pode ter sido
“legal”, mas contrariou todas as regras morais e feriu profundamente o
mandamento ético.
É claro que sempre há
descuidos, como houve o do “adjutório” ao banqueiro Cacciola. Cacciola, que pôde
fugir para a Itália, foi laçado pelas circunstâncias e acabou indo para a
prisão. Os outros implicados, diretores do Banco Central, apesar de condenados,
respondem em liberdade.
O dinheiro desapareceu no vórtice da crise.
Nenhum chefe de
Estado, antes dele – e, até agora - nem depois dele, violou a Constituição a fim
de reeleger-se, mediante o suborno de parlamentares com favorecimentos e, de
acordo com as denúncias conhecidas, dinheiro vivo. A emenda da reeleição já se
encontra na História como um dos momentos mais constrangedores da vida
republicana.
Em entrevista a um
portal da internet, há alguns meses, Fernando Henrique se referiu ao Ministro
Gilmar Mendes – que ele nomeou – como “corajoso”. Não lhe pode ser negada a
mesma coragem. A coragem, por exemplo, de se referir aos fatos lamentáveis da
Ação 470, em julgamento pelo STF, como se referiu, esquecendo-se de que homens
de seu partido se encontram sob suspeita de atos semelhantes. O publicitário
Marcos Valério, é o que se sabe, sempre agiu com neutralidade partidária. Em
lugar do ataque a Lula, seria melhor a Fernando Henrique um ato de
contrição.
No julgamento dos
pósteros, Lula, com todos os seus acertos, erros e defeitos, será lembrado como
o sertanejo que entrou para a História, arrombando-a com o próprio peito, como
fazem os pobres. E Fernando Henrique será lembrado como o “intelectual”
arrogante, que chamou o seu próprio povo de caipira, e os aposentados de
vagabundos. Ele, sim, é até hoje fascinado com os estrangeiros, embasbacado com
Paris e Boston, frustrado por não ter nascido no Marais do século 18, nem na
Nova Inglaterra de Franklin e Jefferson.
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