TODOS OS POVOS SÃO IGUAIS PERANTE A ONU, MAS ALGUNS SÃO MAIS IGUAIS QUE OS OUTROS
FORÇAS ESTRANGEIRAS VÃO ATACAR A LÍBIA
Conselho de Segurança da ONU aprova zona de exclusão aérea contra Kadafi e autoriza o uso 'de todas as medidas para proteger civis'. Brasil, Alemanha, China, Índia e Rússia se abstiveram. Enquanto isso, no Bahrein, sob ocupação de tropas da Arábia Saudita, forças de repressão mobilizam tanques e helicópteros contra milhares de pessoas que tomaram as ruas há vários dias pedindo o fim da monarquia e liberdades democráticas. Mais seis civis foram mortos nas últimas horas. Governado por uma autocracia sunita, o Bahrein, distante 25 quilômetros da Arábia Saudita, é uma espécie de guarita de segurança dos poços de petróleo do Golfo e serve como estacionamento para a V Frota norte-americana. Seus bancos compõem um braço do imenso paraíso fiscal regional, reunindo depósitos da ordem de US$ 200 bilhões. Essa coalizão de interesses decretou a lei marcial contra o movimento de oposição xiita, etnia que compõe a maioria esmagadora da população. A ONU não autorizou uma zona de exclusão aérea contra o Bahrein, tampouco considerou pertinente o uso de 'todas as medidas' para proteger seus civis.
Oposição do Bahrein denuncia ocupação por tropas sauditas
Esquerda.net
As autoridades do Bahrein, que enfrentam a mais grave contestação no país desde a década de 1990, acolheram segunda-feira a chegada de uma unidade de mil soldados sauditas, pedida para “ajudar a manter a ordem e segurança” no país, depois de manifestantes da oposição terem entrando em confrontos com a polícia no domingo e bloqueado várias estradas.
A entrada dos soldados sauditas em território do Bahrein – numa missão do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG, bloco regional que integra a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait, Qatar e Omã, além do Bahrein) – foi confirmada pelo antigo ministro da Informação do país, e atual conselheiro do rei Hamad bin Issa al-Khalifa, Nabeel al-Hamer, através de uma mensagem no serviço de microblogging Twitter.
Pelo menos 150 veículos militares blindados de transporte de tropas e 50 outros veículos, incluindo ambulâncias, tanques de água, caminhões e jipes foram avistados por residentes locais passando a fronteira da Arábia Saudita para o Bahrein, em direcção a Riffa, região maioritariamente sunita.
Os principais grupos da oposição, incluindo o maior partido xiita, o Wefaq, avaliaram esta intervenção de forças do CCG no país como uma “declaração de guerra e uma ocupação”.
O movimento de oposição ao rei Hamad bin Issa al-Khalifa do Bahrein respondeu ao decreto de recolher obrigatório com a convocação de um novo protesto em Manama, depois de os manifestantes terem sido expulsos, ao nascer do dia, da Praça da Pérola que ocupavam há já várias semanas, exigindo reformas políticas no país. Na praça permaneciam acampados cerca de 500 opositores ao regime.
Chamando a uma manifestação massiva, o grupo de Juventude 14 de Fevereiro – que tem liderado a contestação na Praça da Pérola – convocou este novo protesto para a Rua Budaya, região norte da capital repleta de vilas e subúrbios de maioria populacional xiita que conduz à localidade de Budaya, berço da elite governadora sunita do país.
Nos confrontos da manhã desta quarta-feira, pelo menos três manifestantes morreram e dezenas ficaram feridos, afirmou fonte da oposição citada pelas agências noticiosas. O Ministério do Interior, por seu lado, anunciou a morte de dois policiais.
No seguimento destes confrontos, as autoridades do Bahrein decretaram recolher obrigatório entre às 16h e às 4h (1h em Lisboa) na Praça da Pérola e no centro financeiro de Manama.
No Bahrein, a situação é de tensão explícita. O rei Hamad Ben Issa Al-Khalifa proclamou o estado de emergência por três meses, um dia após a chegada de tropas do Golfo para ajudar a travar a contestação xiita num país governado por sunitas.
A entrada dos soldados sauditas em território do Bahrein – numa missão do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG, bloco regional que integra a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait, Qatar e Omã, além do Bahrein) – foi confirmada pelo antigo ministro da Informação do país, e atual conselheiro do rei Hamad bin Issa al-Khalifa, Nabeel al-Hamer, através de uma mensagem no serviço de microblogging Twitter.
Pelo menos 150 veículos militares blindados de transporte de tropas e 50 outros veículos, incluindo ambulâncias, tanques de água, caminhões e jipes foram avistados por residentes locais passando a fronteira da Arábia Saudita para o Bahrein, em direcção a Riffa, região maioritariamente sunita.
Os principais grupos da oposição, incluindo o maior partido xiita, o Wefaq, avaliaram esta intervenção de forças do CCG no país como uma “declaração de guerra e uma ocupação”.
O movimento de oposição ao rei Hamad bin Issa al-Khalifa do Bahrein respondeu ao decreto de recolher obrigatório com a convocação de um novo protesto em Manama, depois de os manifestantes terem sido expulsos, ao nascer do dia, da Praça da Pérola que ocupavam há já várias semanas, exigindo reformas políticas no país. Na praça permaneciam acampados cerca de 500 opositores ao regime.
Chamando a uma manifestação massiva, o grupo de Juventude 14 de Fevereiro – que tem liderado a contestação na Praça da Pérola – convocou este novo protesto para a Rua Budaya, região norte da capital repleta de vilas e subúrbios de maioria populacional xiita que conduz à localidade de Budaya, berço da elite governadora sunita do país.
Nos confrontos da manhã desta quarta-feira, pelo menos três manifestantes morreram e dezenas ficaram feridos, afirmou fonte da oposição citada pelas agências noticiosas. O Ministério do Interior, por seu lado, anunciou a morte de dois policiais.
No seguimento destes confrontos, as autoridades do Bahrein decretaram recolher obrigatório entre às 16h e às 4h (1h em Lisboa) na Praça da Pérola e no centro financeiro de Manama.
No Bahrein, a situação é de tensão explícita. O rei Hamad Ben Issa Al-Khalifa proclamou o estado de emergência por três meses, um dia após a chegada de tropas do Golfo para ajudar a travar a contestação xiita num país governado por sunitas.
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Kadafi voltou a ser inimigo do Ocidente
Eduardo Febbro - De Paris, para o Página/12
Muammar Kadafi foi retirado definitivamente do altar ao qual havia sido conduzido pela gula ocidental, pelos petronegócios e pela desfaçatez do sistema financeiro internacional. O tirano, que durante quase duas décadas foi considerado o “inimigo número um” do Ocidente para logo converter-se no vistoso aliado de seus inimigos de agora, voltou ao seu estatuto originário. A resolução adotada pelo Conselho de Segurança da ONU não deixa nenhum espaço para a ambiguidade: o dispositivo militar já está preparado e só faltava a famosa “base jurídica” reclamada pela OTAN. Paris e Londres levaram até um final tardio sua ideia de instaurar uma zona de exclusão aérea para neutralizar a força aérea de Kadafi.
As provocações mútuas tornaram inevitável a participação árabe-ocidental em uma nova cruzada militar contra um país árabe. A Líbia se soma assim ao Iraque e ao Afeganistão à lista de países que passarão uma temporada sob as bombas de uma coalizão onde o poderio militar do Ocidente marcará as orientações. Era necessário o voto a favor de 9 dos 15 membros do Conselho de Segurança e também que nenhum dos integrantes permanentes do Conselho vetasse a resolução. China e Rússia se abstiveram e com isso abriram passagem ao operativo militar.
A comunidade internacional, fragmentada, salvará no fio da navalha a já asfixiada oposição líbia. Cercada em seu feudo de Benghazi pelas forças leais ao regime, a participação direta do Ocidente era a única cartada que podia salvar a oposição do despenhadeiro. “Preparem-se, esta noite chegamos”, disse Kadafi aos habitantes de Benghazi. Talvez, as primeiras a chegar sejam as bombas ocidentais apoiadas por alguns países árabes como Emirados Árabes Unidos, Qatar e Egito. Washington conseguiu seu propósito de transferir a responsabilidade da ação principal aos países vizinhos, ou seja, os europeus com costas mediterrâneas e os árabes. França e Inglaterra, promotores da resolução, assumirão a maior parte da responsabilidade do Ocidente, apesar de os Estados Unidos serem a força dominante na OTAN.
Não é certo que a guerra total seja a aposta definitiva. O Guia Supremo da desgastada revolução libia soube dar marcha ré diante do abismo. A partir de 2003, Kadafi demonstrou seu sentido de realismo quando, impressionado pela invasão do Iraque e a captura de Saddam Hussein, retrocedeu em seu principal projeto, a acumulação de armas de destruição massiva, e reconheceu a responsabilidade em dois atentados: contra o avião da PanAm que explodiu sobre a localidade de Lockerbie (1988, 270 mortos) e contra o avião francês da companhia UTA (1989, 170 mortos). Esse foi o início do idílio público entre o coronel e seus juízes de anos anteriores. Investimentos e visitas de Kadafi às grandes capitais do mundo e viagens dos democratas a Trípoli consagraram o retorno do coronel ao “eixo do bem”. Ou seja, os negócios ficaram seguros ainda que as mãos que firmavam os contratos estivessem manchadas de sangue.
Pode ser que faça o mesmo agora. A resolução da ONU é ampla e explícita. A OTAN e a Liga Árabe apoiaram a instauração de uma zona de exclusão e isso os converte em aliados diretos da intervenção. Pressionado internamente pelos rebeldes, monitorado pelo céu e cercado pelo mar, Kadafi tem as horas contadas. Kadafi ofereceu a repressão selvagem a seu povo e uma fonte de água benta para que o Ocidente lave a sua má consciência.
Não cabe a mais remota dúvida de que as armas já estão preparadas. Na noite de quinta, tanto o primeiro ministro francês, François Fillon, como o chefe da diplomacia, Alain Juppé, adiantaram que a força seria empregada quando a resolução fosse aprovada. Alain Juppé precisou inclusive o modo da operação: “Está excluído que se faça algo em terra. Está claro. A alternativa é a utilização da força aérea”. Talvez Kadafi tenha calculado mal a convicção de seus sócios do Oeste. Pensou que suas divisões profundas e suas debilidades morais e energéticas permitissem que ele sufocasse a revolta com um custo mínimo. O Ocidente também se equivocou com ele e com as reais capacidades da oposição. As demoras e o duplo erro resultaram em centenas e centenas de mortos, destruição e êxodo de centenas de milhares de pessoas para as fronteiras.
As provocações mútuas tornaram inevitável a participação árabe-ocidental em uma nova cruzada militar contra um país árabe. A Líbia se soma assim ao Iraque e ao Afeganistão à lista de países que passarão uma temporada sob as bombas de uma coalizão onde o poderio militar do Ocidente marcará as orientações. Era necessário o voto a favor de 9 dos 15 membros do Conselho de Segurança e também que nenhum dos integrantes permanentes do Conselho vetasse a resolução. China e Rússia se abstiveram e com isso abriram passagem ao operativo militar.
A comunidade internacional, fragmentada, salvará no fio da navalha a já asfixiada oposição líbia. Cercada em seu feudo de Benghazi pelas forças leais ao regime, a participação direta do Ocidente era a única cartada que podia salvar a oposição do despenhadeiro. “Preparem-se, esta noite chegamos”, disse Kadafi aos habitantes de Benghazi. Talvez, as primeiras a chegar sejam as bombas ocidentais apoiadas por alguns países árabes como Emirados Árabes Unidos, Qatar e Egito. Washington conseguiu seu propósito de transferir a responsabilidade da ação principal aos países vizinhos, ou seja, os europeus com costas mediterrâneas e os árabes. França e Inglaterra, promotores da resolução, assumirão a maior parte da responsabilidade do Ocidente, apesar de os Estados Unidos serem a força dominante na OTAN.
Não é certo que a guerra total seja a aposta definitiva. O Guia Supremo da desgastada revolução libia soube dar marcha ré diante do abismo. A partir de 2003, Kadafi demonstrou seu sentido de realismo quando, impressionado pela invasão do Iraque e a captura de Saddam Hussein, retrocedeu em seu principal projeto, a acumulação de armas de destruição massiva, e reconheceu a responsabilidade em dois atentados: contra o avião da PanAm que explodiu sobre a localidade de Lockerbie (1988, 270 mortos) e contra o avião francês da companhia UTA (1989, 170 mortos). Esse foi o início do idílio público entre o coronel e seus juízes de anos anteriores. Investimentos e visitas de Kadafi às grandes capitais do mundo e viagens dos democratas a Trípoli consagraram o retorno do coronel ao “eixo do bem”. Ou seja, os negócios ficaram seguros ainda que as mãos que firmavam os contratos estivessem manchadas de sangue.
Pode ser que faça o mesmo agora. A resolução da ONU é ampla e explícita. A OTAN e a Liga Árabe apoiaram a instauração de uma zona de exclusão e isso os converte em aliados diretos da intervenção. Pressionado internamente pelos rebeldes, monitorado pelo céu e cercado pelo mar, Kadafi tem as horas contadas. Kadafi ofereceu a repressão selvagem a seu povo e uma fonte de água benta para que o Ocidente lave a sua má consciência.
Não cabe a mais remota dúvida de que as armas já estão preparadas. Na noite de quinta, tanto o primeiro ministro francês, François Fillon, como o chefe da diplomacia, Alain Juppé, adiantaram que a força seria empregada quando a resolução fosse aprovada. Alain Juppé precisou inclusive o modo da operação: “Está excluído que se faça algo em terra. Está claro. A alternativa é a utilização da força aérea”. Talvez Kadafi tenha calculado mal a convicção de seus sócios do Oeste. Pensou que suas divisões profundas e suas debilidades morais e energéticas permitissem que ele sufocasse a revolta com um custo mínimo. O Ocidente também se equivocou com ele e com as reais capacidades da oposição. As demoras e o duplo erro resultaram em centenas e centenas de mortos, destruição e êxodo de centenas de milhares de pessoas para as fronteiras.
O movimento democrático líbio terminou condicionado à pior opção para triunfar: derrubar Kadafi com o respaldo de forças estrangeiras. Os movimentos de uns e outros condenaram a contrarrevolução líbia a uma assistência estrangeira. Kadafi não deixaria o poder sem matar e sem zombar da OTAN e da ONU. O Ocidente, por sua vez, não podia deixá-lo ganhar sem cair no ridículo. Kadafi foi um sócio perfeito, na paz e na guerra. Sua previsível derrota se forjou segundo suas condições. Matou seu povo sem concessões e provocou o Ocidente para que viessem buscá-lo. A história volta a se repetir com uma pontualidade sangrenta, como no Panamá, Iraque e Afeganistão: outra vez é preciso armar uma coalizão e lançar bombas para extirpar um mal que foi se arraigando com a cumplicidade e até a ajuda direta daqueles que hoje se mobilizam para derrotá-lo. Noriega foi um aliado das superpotências, do mesmo modo que Saddam Hussein no Iraque e os talibãs no Afeganistão. Tirá-los do poder custou milhares de vidas humanas inocentes. Kadafi e seus sócios tardios fizeram cair sobre o povo líbio o mesmo e repetitivo destino.
Tradução: Katarina Peixoto
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