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JusBrasil, 03/03/2015
HSBC, sistema bancário e a cleptocracia mundial
Por Luiz Flávio Gomes*
No livro A Suíça lava mais branco, publicado há 25 anos, Jean Ziegler já dizia que “A Suíça é o principal local de lavagem de dinheiro do nosso planeta, o local de reciclagem dos lucros da morte [das ditaduras e do narcotráfico]” (veja Estadão1/3/15: B9). Somente no HSBC, nos anos 2006/2007, mais de 100 mil contas estavam lavando mais de US$ 100 bilhões (desse total US$ 7 bilhões pertencem a mais de 6 mil brasileiros, cujos nomes, apenas parcialmente, foram até aqui revelados). Reis, atletas, pilotos, narcotraficantes, ditadores, corruptos, empresários de vários setores etc.: a quase totalidade dessa clientela “seleta”, cujo patrimônio lícito e ilícito passa por vários processos de mimetização, faz parte da cleptocracia mundial (Estados “governados” por ladrões e aproveitadores, a começar, evidentemente, pelo Brasil).
Grande parte do que somos vem do berço. Que pena que no berço dos brasileiros (e dos latino-americanos em geral) nunca tenha sido disseminada (de maneira absoluta) a repugnância ou a ojeriza à corrupção, à lavagem de dinheiro, à sonegação, à injustiça, ao analfabetismo, à miséria e à violência. Enquanto alguns poucos sugam o esquálido Brasil (sobretudo em razão da falta de um capitalismo realmente competitivo), nossa segurança pública (com destaque para Brasil, Honduras, El Salvador, Venezuela, Colômbia e México) mergulha a cada dia num abismo profundo de desespero e indignação, que está exterminando a vida de milhares e tornando milhões de outras absolutamente insuportáveis.
A América Latina, depois de ter sido sanguinariamente espoliada pelos povos ibero-americanos, que foram seguidos pelas lideranças nacionais sucessoras, se tornou a região mais violenta do globo terrestre (28,5 assassinatos para cada 100 mil pessoas – OMS-ONU; a segunda colocada, região africana, tem 10,9 óbitos para 100 mil). Das 50 cidades do mundo com mais homicídios, 43 estão na América Latina (4 nos EUA e 3 na África), sendo 19 no Brasil (veja Consejo Ciudadano para la Seguridad Pública y la Justicia Penal, México). Em 2013 eram 16. A esse descalabro não se chega da noite para o dia. Só uma cleptocracia (Estado governado por ladrões, adeptos do patrimonialismo, clientelismo e da corrupção), profundamente enraizada na sociedade, seria capaz de destroçar avassaladoramente todo um continente de mais de 400 milhões de pessoas.
O sucesso das cleptocracias espalhadas pelo mundo todo não seria tão estrondoso se elas não contassem com um sistema bancário mundial que oferece lavagem e sigilo. O HSBC, diz Jean Ziegler (Estadão citado), “é apenas a ponta do iceberg de um sistema inteiro de fraude; aqui [na Suíça], a matéria-prima se chama dinheiro estrangeiro”. Em 1990, quando lançou seu livro, Jean era parlamentar. Em menos de um ano sua obra foi alvo de nove processos e até hoje ele paga uma multa de US$ 6 milhões por ter publicado o livro. Mundo de ponta-cabeça. O vício virou virtude. A desgraça é que os mandões endinheirados mandam na política e, frequentemente, também na Justiça. O autor perdeu sua imunidade parlamentar [desde 1939 isso não ocorria], foi atacado pela imprensa, perdeu sua casa e até hoje vive ameaçado de morte. Conta atualmente com 80 anos de idade. A Associação dos Bancos disse na época que não protegia criminosos. A cada revelação dos seus correntistas não se vê outra coisa senão narcotraficantes, corruptos, sonegadores, ditadores etc.
Histórias como a do HSBC se tornaram na Suíça banalidades, disse Jean Ziegler, que agregou: “Existe uma corrupção institucional na Suíça; quem regula os bancos é uma entidade paga por eles mesmos; Berna sempre soube que o dinheiro lavado na Suíça inclui lucros das drogas colombianas, da máfia, do terrorismo; Rousseau dizia que ‘os ricos andam com a lei sempre dentro de seus bolsos’; os parlamentares não ganham salários, sim, apenas ajuda de custo; ocorre que eles passaram a fazer parte dos conselhos das empresas; o Parlamento foi colonizado por multinacionais e bancos; no Parlamento quem sempre tem a maioria são os bancos [eles compram os políticos]; no Parlamento só se aprova o que os Bancos querem; hoje, 27% da riqueza global está na Suíça; o dinheiro vem do crime, dos fraudadores e do sangue; os EUA estão punindo vários bancos pelas suas práticas; a mentira que contam é de que o sigilo bancário está acabando; isso só vai valer em 2018 e se for aprovado por referendo; até hoje a conta que recebe o dinheiro da renda do livro está bloqueada”.
Como se vê, não é apenas o Brasil que está no atoleiro da corrupção e da cleptocracia. O fenômeno é mundial (com 50 graduações distintas, conforme cada País). Tal como Étienne de la Boétie (Discursos da servidão voluntária, escrito no começo do século XVI), os “anormais irresignados” (nessa lista eu me incluo) apenas gostariam de entender “como tantos humanos, tantos burgos [cidadãos], tantas cidades e tantas nações suportam um só tirano [o sistema político-econômico-financeiro extrativista, que nunca levou o capitalismo a sério em termos de competitividade], que não tem mais poder que o que lhe dão, que só pode prejudicá-los enquanto quiserem suportá-lo, e que só pode fazer-lhes mal se eles preferirem tolerá-lo a contradizê-lo”. Como?
*Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).
Estadão.com, 01/03/2015
Jamil Chade
“A Suíça é o principal local de lavagem de dinheiro do nosso planeta, o local de reciclagem dos lucros da morte.” O alerta bem que poderia ter sido feito pelas fontes que revelaram os segredos das 100 mil contas do banco HSBC na Suíça, o que criou um terremoto mundial. Mas, na verdade, a frase já foi dita há 25 anos na primeira página de um livro que já revelava tudo o que se vê agora.
Em A Suíça Lava Mais Branco, o suíço Jean Ziegler escancarava um cenário muito diferente da imagem que o país tentava transmitir ao mundo. Hoje, diante das provas do que ele mesmo já dizia, seu sentimento é de que o “tempo lhe garantiu justiça”. Mas, ele mesmo avisa: o HSBC é apenas a ponta do iceberg de um sistema inteiro de fraude. Provocador, Ziegler questiona como um país sem recursos naturais como a Suíça se transformou em um dos mais ricos do mundo. “Aqui, a matéria-prima se chama dinheiro estrangeiro”, disse.
Em 1990, quando o livro saiu, Ziegler era membro do Parlamento Suíço. Em menos de um ano, seu livro foi alvo de nove processos legais e até hoje ele paga a multa de US$ 6 milhões que recebeu. Ziegler, hoje com 80 anos, foi acusado como “traidor” pelos demais políticos, sua imunidade parlamentar foi retirada, perdeu sua casa, foi atacado pela imprensa e diz ter sido até ameaçado de morte. A poderosa Associação dos Bancos Suíços rejeitou as acusações na época e garantiu que o sigilo bancário “não protegia criminosos”. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Um quarto de século depois que o sr. denunciou como os bancos suíços operavam, o HSBC está hoje no centro das atenções mundiais. Isso o surpreende?
Não. A história que estamos escutando é, no fundo, a normalidade helvética mais banal. Essa é apenas a normalidade banal e cotidiana da Suíça e a ponta do iceberg. E o pior é que vai continuar.
Como assim?
Existe uma corrupção institucional na Suíça. Na maioria dos países, o órgão que regula os bancos é uma entidade estatal. Na Suíça, trata-se de uma empresa semi-privada e que é paga pelos bancos. Uma agência que regula bancos bancada pelos bancos. Há ainda um segundo aspecto. A lista de pessoas com contas no HSBC já era de conhecimento das autoridades suíças desde 2012, quando a relação de contas circulou entre os governos. Berna sabia que o dinheiro vinha das drogas colombianas, da máfia, do terrorismo e da lavagem de dinheiro. Mas até hoje nenhum processo foi aberto.
Como um país que se apresenta como uma democracia perfeita vive uma situação dessas com seus bancos?
Já em 1990 eu citei uma frase de Jean-Jacques Rousseau no meu livro: os ricos andam com a lei sempre dentro de seus bolsos. Mas a realidade é que existe uma explicação mais complexa. A Suíça é uma democracia onde não existe a ideia da incompatibilidade de funções no Parlamento. Ou seja, um deputado não ganha um salário para ser deputado. Apenas uma ajuda de custo e precisa manter seu emprego. E quem são os deputados suíços? Pequenos comerciantes, agricultores, profissionais liberais e até donas de casa. De repente, essas pessoas passaram a ser convidadas a fazer parte do conselho de empresas. Isso fez com que o Parlamento fosse colonizado por multinacionais e bancos. No Parlamento, quem sempre tem maioria são os bancos.
E como isso dificulta qualquer tipo de ação de regulação?
No caso dos bancos, isso significa que as reformas do sistema financeiro praticamente não existem como iniciativas internas da Suíça. Dou um exemplo. Na crise financeira, o governo resgatou o UBS com US$ 61 bilhões. Agora, a ideia era de que o banco fosse reformado. Mas nada disso ocorreu. No Parlamento, foi impossível aprovar qualquer coisa que não seja antes aprovada pelos bancos.
De onde vem esse poder dos bancos na Suíça?
A raiz disso é ainda o papel que tivemos na Segunda Guerra e a cumplicidade com o regime de Hitler. Desde então, temos as maiores fortunas do mundo. Hoje, 27% da riqueza global está na Suíça. Mas como é que podemos estar entre os dez maiores PIBs do mundo em termos per capita e viver num país sem recursos naturais? Aqui, a matéria-prima se chama dinheiro estrangeiro, que vem de fraudadores internacionais, dinheiro do crime ou dinheiro do sangue, que é como eu chamo o dinheiro das ditaduras.
Mas os bancos tiveram de mudar recentemente, com novos controles.
O único golpe, ironicamente, veio dos EUA, que os ameaçou. Os bancos foram alertados que ou pagavam multas e mudavam suas práticas ou simplesmente Wall Street se fecharia a eles, o que significaria sua falência.
Diante da pressão americana, o segredo bancário vai sobreviver?
Essa é talvez a maior mentira de todas, a de que o segredo bancário está acabando. A Suíça foi obrigada a assinar um acordo internacional pelo qual está de acordo em trocar informações sobre correntistas a partir de 2018. Mas partidos já iniciaram uma campanha para realizar um referendo contra o acordo e não há qualquer garantia de que essa troca de informação vá ocorrer. Pior que isso, mesmo que a troca de informações ocorra, não será nada fácil saber quem está por trás de uma offshore com contas em Genebra e sede no Panamá.
Como se sentem as autoridades suíças hoje, diante da pressão mundial?
Os suíços estão sofrendo muito. Para os calvinistas, ser criticado em público é um grande trauma. A reputação é tudo e se cultivou por décadas que eles faziam tudo sempre bem. De repente, agora se sabe que não e, por isso, eles sofrem psicologicamente.
Qual foi a reação local quando o seu livro saiu?
Bom, fui alvo de nove processos e de uma campanha da imprensa contra a minha pessoa. Pela primeira vez desde 1939, o Parlamento retirou a imunidade de um deputado.
O sr. foi ameaçado?
Sim. Mas não saberia dizer por quem. Meu filho era pequeno e tínhamos de caminhar com escolta até a escola. Meu carro foi sabotado na estrada entre Lyon e Genebra. Sofri outros dois ataques. Perdi uma casa e, até hoje, a conta que recebe o dinheiro da renda do livro está bloqueada.
Entrevista.
Jean Ziegler, autor do livro ‘A Suíça lava mais branco
Jamil Chade
“A Suíça é o principal local de lavagem de dinheiro do nosso planeta, o local de reciclagem dos lucros da morte.” O alerta bem que poderia ter sido feito pelas fontes que revelaram os segredos das 100 mil contas do banco HSBC na Suíça, o que criou um terremoto mundial. Mas, na verdade, a frase já foi dita há 25 anos na primeira página de um livro que já revelava tudo o que se vê agora.
Em A Suíça Lava Mais Branco, o suíço Jean Ziegler escancarava um cenário muito diferente da imagem que o país tentava transmitir ao mundo. Hoje, diante das provas do que ele mesmo já dizia, seu sentimento é de que o “tempo lhe garantiu justiça”. Mas, ele mesmo avisa: o HSBC é apenas a ponta do iceberg de um sistema inteiro de fraude. Provocador, Ziegler questiona como um país sem recursos naturais como a Suíça se transformou em um dos mais ricos do mundo. “Aqui, a matéria-prima se chama dinheiro estrangeiro”, disse.
Em 1990, quando o livro saiu, Ziegler era membro do Parlamento Suíço. Em menos de um ano, seu livro foi alvo de nove processos legais e até hoje ele paga a multa de US$ 6 milhões que recebeu. Ziegler, hoje com 80 anos, foi acusado como “traidor” pelos demais políticos, sua imunidade parlamentar foi retirada, perdeu sua casa, foi atacado pela imprensa e diz ter sido até ameaçado de morte. A poderosa Associação dos Bancos Suíços rejeitou as acusações na época e garantiu que o sigilo bancário “não protegia criminosos”. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Um quarto de século depois que o sr. denunciou como os bancos suíços operavam, o HSBC está hoje no centro das atenções mundiais. Isso o surpreende?
Não. A história que estamos escutando é, no fundo, a normalidade helvética mais banal. Essa é apenas a normalidade banal e cotidiana da Suíça e a ponta do iceberg. E o pior é que vai continuar.
Como assim?
Existe uma corrupção institucional na Suíça. Na maioria dos países, o órgão que regula os bancos é uma entidade estatal. Na Suíça, trata-se de uma empresa semi-privada e que é paga pelos bancos. Uma agência que regula bancos bancada pelos bancos. Há ainda um segundo aspecto. A lista de pessoas com contas no HSBC já era de conhecimento das autoridades suíças desde 2012, quando a relação de contas circulou entre os governos. Berna sabia que o dinheiro vinha das drogas colombianas, da máfia, do terrorismo e da lavagem de dinheiro. Mas até hoje nenhum processo foi aberto.
Como um país que se apresenta como uma democracia perfeita vive uma situação dessas com seus bancos?
Já em 1990 eu citei uma frase de Jean-Jacques Rousseau no meu livro: os ricos andam com a lei sempre dentro de seus bolsos. Mas a realidade é que existe uma explicação mais complexa. A Suíça é uma democracia onde não existe a ideia da incompatibilidade de funções no Parlamento. Ou seja, um deputado não ganha um salário para ser deputado. Apenas uma ajuda de custo e precisa manter seu emprego. E quem são os deputados suíços? Pequenos comerciantes, agricultores, profissionais liberais e até donas de casa. De repente, essas pessoas passaram a ser convidadas a fazer parte do conselho de empresas. Isso fez com que o Parlamento fosse colonizado por multinacionais e bancos. No Parlamento, quem sempre tem maioria são os bancos.
E como isso dificulta qualquer tipo de ação de regulação?
No caso dos bancos, isso significa que as reformas do sistema financeiro praticamente não existem como iniciativas internas da Suíça. Dou um exemplo. Na crise financeira, o governo resgatou o UBS com US$ 61 bilhões. Agora, a ideia era de que o banco fosse reformado. Mas nada disso ocorreu. No Parlamento, foi impossível aprovar qualquer coisa que não seja antes aprovada pelos bancos.
De onde vem esse poder dos bancos na Suíça?
A raiz disso é ainda o papel que tivemos na Segunda Guerra e a cumplicidade com o regime de Hitler. Desde então, temos as maiores fortunas do mundo. Hoje, 27% da riqueza global está na Suíça. Mas como é que podemos estar entre os dez maiores PIBs do mundo em termos per capita e viver num país sem recursos naturais? Aqui, a matéria-prima se chama dinheiro estrangeiro, que vem de fraudadores internacionais, dinheiro do crime ou dinheiro do sangue, que é como eu chamo o dinheiro das ditaduras.
Mas os bancos tiveram de mudar recentemente, com novos controles.
O único golpe, ironicamente, veio dos EUA, que os ameaçou. Os bancos foram alertados que ou pagavam multas e mudavam suas práticas ou simplesmente Wall Street se fecharia a eles, o que significaria sua falência.
Diante da pressão americana, o segredo bancário vai sobreviver?
Essa é talvez a maior mentira de todas, a de que o segredo bancário está acabando. A Suíça foi obrigada a assinar um acordo internacional pelo qual está de acordo em trocar informações sobre correntistas a partir de 2018. Mas partidos já iniciaram uma campanha para realizar um referendo contra o acordo e não há qualquer garantia de que essa troca de informação vá ocorrer. Pior que isso, mesmo que a troca de informações ocorra, não será nada fácil saber quem está por trás de uma offshore com contas em Genebra e sede no Panamá.
Como se sentem as autoridades suíças hoje, diante da pressão mundial?
Os suíços estão sofrendo muito. Para os calvinistas, ser criticado em público é um grande trauma. A reputação é tudo e se cultivou por décadas que eles faziam tudo sempre bem. De repente, agora se sabe que não e, por isso, eles sofrem psicologicamente.
Qual foi a reação local quando o seu livro saiu?
Bom, fui alvo de nove processos e de uma campanha da imprensa contra a minha pessoa. Pela primeira vez desde 1939, o Parlamento retirou a imunidade de um deputado.
O sr. foi ameaçado?
Sim. Mas não saberia dizer por quem. Meu filho era pequeno e tínhamos de caminhar com escolta até a escola. Meu carro foi sabotado na estrada entre Lyon e Genebra. Sofri outros dois ataques. Perdi uma casa e, até hoje, a conta que recebe o dinheiro da renda do livro está bloqueada.
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Folha.com, 04/03/2015
Recorrer à Suíça sobre HSBC é erro, diz grupo
Marcelo Soares, de São Paulo
Solicitar à Suíça os dados dos correntistas do caso HSBC é um erro, diz a coordenadora do projeto SwissLeaks, que reúne repórteres de 45 países para investigar contas mantidas no HSBC de Genebra.
O governo suíço, a quem o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) anunciou que fará pedidos formais de colaboração na investigação do caso, simplesmente não possui os dados desejados.
"Seria estranho pedir os dados do HSBC ao governo suíço, que processa Hervé Falciani, o técnico de informática que roubou os dados do HSBC", afirma Marina Walker, vice-diretora do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), que coordena o projeto SwissLeaks.
O projeto revelou como políticos, criminosos e empresários usam o HSBC na Suíça para ocultar recursos dos fiscos de seus países e deu origem a averiguações internacionais sobre as práticas do banco.
Fazer o pedido de cooperação à Suíça adia, na prática, o momento em que o governo poderá investigar detalhadamente os dados, já que a Suíça não os possui. O país processou Falciani, mas é incerto se e quando obterá os dados. O caminho mais garantido caso realmente se queira investigar com rapidez tais contas, segundo Walker, é procurar a França, que obteve os dados em 2010.
"O governo francês já compartilhou dados do HSBC com governos do mundo inteiro que os requisitaram", diz a jornalista. Até agora, US$ 1,36 bilhão em impostos sonegados foi repatriado pelos países que procuraram a cooperação francesa nos últimos cinco anos. A própria França recuperou US$ 286 milhões. A Bélgica, US$ 490 milhões.
Procurado pela Folha para esclarecer a estratégia de solicitar os dados à Suíça, o Ministério da Justiça não havia se pronunciado até a conclusão desta edição.
Cada país trabalha à sua maneira com os dados obtidos. No Reino Unido, por exemplo, o governo ofereceu desconto de até 90% no imposto devido pelos cidadãos pegos mantendo contas secretas. A Argentina solicitou os dados à França e os recebeu em setembro de 2014.
Há 8.667 brasileiros que possuíam contas no HSBC de Genebra, de acordo com os dados roubados por Falciani em 2008. O país é o quarto na concentração de clientes e nono na de recursos - US$ 7 bilhões estavam investidos lá.
O único jornalista brasileiro com acesso aos dados do SwissLeaks é Fernando Rodrigues, ex-colunista da Folha, que hoje mantém um blog no UOL. Ele participa do projeto desde seu início, em 2014.
Até agora, os esforços do governo brasileiro para investigar as contas foram pouco frutíferos. Autoridades brasileiras conhecem o caso desde o fim de 2014, quando Rodrigues apresentou ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) uma lista com 340 nomes de brasileiros que possuíam contas no HSBC de Genebra, para checar se havia indícios de crime.
O Coaf é o órgão da Fazenda responsável por investigar lavagem de dinheiro e elisão de impostos. Os dados da consulta foram usados em relatório enviado pelo Coaf à Receita, vazado para a "Época" e a "IstoÉ Dinheiro".
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