domingo, 16 de novembro de 2014

Mino Carta: A paz esteja convosco








Carta Capital, 16/11/2014
 


Editorial

A paz esteja convosco


 
Por Mino Carta
 



Pergunto aos meus inquietos botões que acham de Henrique Meirelles. Resposta imediata: “Meirelles é codinome de Fraga, Arminio Fraga. Inquietos e irônicos. Difícil, isto é certo, perceber uma diferença substancial entre o pensamento de um e de outro. De sorte que, se Henrique Meirelles for o próximo ministro da Fazenda, não deixará de se portar exatamente como faria Arminio Fraga, o qual, pasmem, ocuparia a mesma pasta se Aécio vencesse as eleições.
Deixo ao meu companheiro de aventura Luiz Gonzaga Belluzzo a tarefa de traçar na página ao lado o perfil do presidente do Banco Central no primeiro e no segundo mandato de Lula. Reservo-me analisar a possível convocação de Meirelles de um ponto de vista estritamente político. Seria ele a maçã da discórdia subitamente atirada no cesto governista em plena gestação do novo gabinete?
Informações respeitáveis contam sem meios-tons que Meirelles ainda é figura grata a Lula. Ao incluí-lo no seu governo, o vencedor de 2002 pretendeu dar um recado apaziguador ao mercado financeiro. Ocorre que Dilma Rousseff não tem pela figura a mesma simpatia que lhe reserva o ex-presidente. Daí um certo desencontro, de efeitos por ora imprevisíveis. CartaCapital sempre entendeu que a parceria entre Dilma e Lula seria a melhor garantia de êxito para o futuro governo e, há duas semanas, escrevi a respeito neste mesmo espaço.
Inegáveis as falhas do primeiro mandato da presidenta, a começar pela ausência de diálogo fluente com políticos e empresários. Desta situação resultaram o isolamento de Dilma, a rebeldia de congressistas mesmo da base majoritária e o abandono da indústria ao seu destino. Fato este mais de uma vez apontado e lamentado por CartaCapital.
Não é hora de divergências, e sim de corrigir os erros. Qualquer tipo de confronto a solapar a desejável parceria oferece munição de graça ao espírito golpista da casa-grande, sempre e sempre à espreita do momento oportuno e, de mais a mais, tão transparente nas suas intenções. Até o mundo mineral se dá conta de que a ideia do impeachment não foi aposentada, e mesmo de iniciativas ainda mais violentas. Seriam prontamente invocadas no instante azado, diante da “ameaça bolivariana”.
A aliança Dilma-Lula é indispensável a bem do País, na rota de metas igualmente indispensáveis. Recuperação da indústria combalida. Desenvolvimento, inclusive para a continuidade das bem-sucedidas políticas de inclusão social. Reforma capaz de encolher a arena eleitoral, ao eliminar inúteis comparsas e assegurar governabilidade ao poder contingente. Acreditamos que Lula haverá de ser decisivo em muitas fases de um programa destinado a alcançar essas metas, bem como na busca da renovação do PT e no resgate de ideias e comportamentos perdidos.
Há aspectos do momento que não teriam de ser discutidos, sequer aventados. Precisamos de um New Deal e Meirelles não passa da caricatura da caricatura e da caricatura, como diria Gertrude Stein, de John Maynard Keynes. Aliás, não sejamos ridículos ao arriscar uma comparação. Penoso é reconhecer que às vezes falta faz o próprio senso comum. Preservado, levaria à compreensão da encruzilhada histórica que o País vive e da necessidade da perfeita afinação entre os vencedores da recentíssima eleição.
Se, como diz o professor Delfim Netto, para o Brasil nada resta senão crescer ou crescer, o que menos interessa é agradar ao deus mercado, o qual, em lugar da genuflexão, merece repulsa. Nada contraria tanto a ideia do desenvolvimento quanto o culto desta falsa divindade, cujos seguidores foram tão arrogantes e daninhos ao longo da campanha eleitoral. Nada, no Brasil, se opõe tanto ao progresso da maioria do que a religião neoliberal, responsável pela crise mundial, a provocar o fenômeno do rentismo, em proveito de poucos e em detrimento dos demais.

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