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Carta Maior, 16/07/2014
Filiações: quem é Brics e quem é Wall Street?
Por Saul Leblon
Por Saul Leblon
Aécio Neves resolveu mostrar a família no site de campanha.
Aquela coisa de ‘elevar’ o leitor ao nível do tanquinho de areia do ensino infantil. Aécio é filho de; pai de; tio de; neto de ... (a foto de Tancredo na parede só falta sorrir, como nos desenhos animados).
A vida é bela; a família mais bela de todas garante que o candidato tucano é um cara bacana...
A ideia, dizem os assessores, é combater o estereotipo do playboy desregrado, que pelo visto calou fundo nas pesquisas.
Aécio deveria mostrar outras filiações, as históricas, aquelas que decorrem de opções feitas na vida pública, não as herdadas na corrente sanguínea.
As eleições brasileiras de outubro –é forçoso reiterar, como tem feito Carta Maior- não podem ser desperdiçadas em um fabulação publicitária feita de personagens simpáticos e imagens cativantes.
As eleições de outubro dialogam com um poder nada simpático.
Apesar da presença invisível nos palanques, como tem sido dito neste espaço, ele detém a singular capacidade de asfixiar o debate nacional, ademais de condicionar a agenda dos partidos e governantes, antes e à revelia do escrutínio das urnas.
A fonte desse poder invisível remete à hegemonia das finanças globalizadas em nosso tempo.
Sua supremacia reduz de forma importante o repertório das iniciativas políticas nacionais.
Não é uma jabuticaba brasileira.
O que vale para o Brasil não é diferente do que ocorre na Argentina, mas também na França, ou na Nigéria.
O ingrediente decisivo da luta pelo desenvolvimento, a soberania reordenada pelo voto democrático, e o poder indutor do Estado, operam hoje por instrumentos sob forte turbulência e restrição.
Não há novidade nisso, claro.
Nas transições de ciclo de desenvolvimento, porém, quando decisões estratégicas devem ser tomadas para desobstruir o passo seguinte da história, tais restrições assumem contornos de uma asfixia quase imobilizante.
É o caso da encruzilhada brasileira atual.
Mudanças de fundo são requeridas para inaugurar um ciclo de investimentos.
Sem avanços na infraestrutura e na produtividade, estreita-se a margem de manobra para consolidar um novo estirão na redistribuição da renda, na redução da desigualdade e na universalização de serviços de qualidade.
As opções são duas.
Entregar a rapadura de vez aos mercados, deixar que eles resolvam os impasses na base do arrocho; ou tentar erguer linhas de passagem de um novo ciclo convergente da riqueza.
A segunda escolha requer a força e o consentimento de uma ordenação pactuada da sociedade e da economia.
Estamos, portanto, diante de uma encruzilhada da democracia.
A ruptura dessa asfixia no ambiente global acaba de registrar um capítulo importante nesta 3ª feira ( 15-07) .
Um novo banco de desenvolvimento e um fundo de reservas alternativos ao Banco Mundial e ao FMI foram criados na reunião de Cúpula dos líderes dos Brics, realizada em Fortaleza, no Ceará.
A mídia conservadora fez pouco diante desse ensaio de Bretton Woods cearense e preferiu afogar a atenção dos seus leitores naquilo que é secundário.
A saber: o valor dos fundos iniciais e a ocupação de cargos no novo banco, em que o Brasil terá a estratégica diretoria encarregada de planos de investimento e expansão.
A Índia inaugurará a presidência rotativa e a China sediará a instituição em Xangai.
O desdém em relação aos valores iniciais envolvidos (US$ 100 bi de fundo de reservas e um funding de US$ 50 bilhões, no caso do banco de desenvolvimento) precifica a ignorância ou a má fé, ou as duas coisas juntas, na abordagem obtusa da emissão conservadora.
O que está em jogo no xadrez do século XXI é a construção de novas estruturas de poder global que rompam com os frangalhos resultantes do colapso de Bretton Woods.
Hoje, o FMI e o Banco Mundial restam como um zumbi da arquitetura disciplinadora do capitalismo imaginada para a ordem internacional em 1944.
Inteiramente prestativos aos desígnios dos mercados desregulados –que nasceram para disciplinar—funcionam, a exemplo das agencias de risco, como alavancas pró-cíclicas do vale tudo especulativo.
Na fase de valorização irracional dos ativos e de fastígio do crédito, certificam a higidez das estripulias de Wall Street -como nas vésperas do colapso de 2008; em seguida, acentuam a espiral contracionista, chancelando políticas de arrocho quando as bolhas especulativas explodem.
A reunião dos Brics no Brasil moveu as placas tectônicas dessa ruína cristalizada no xadrez mundial.
Os valores envolvidos ganham dimensões superlativas quando associados à contrapartida política do que está em jogo.
Objetivamente, e de forma consistente, a decisão dos Brics afronta a subordinação passiva das nações à desordem neoliberal.
Países que reúnem um PIB da ordem de US$ 16 trilhões, superior ao da Zona do Euro, e uma população conjunta de 3 bilhões de pessoas, informaram ao mundo que vão construir instituições que colidem com a lógica de Wall Street e de seus braços institucionais.
Convenhamos, não é uma notícia agradável para quem defende que o Brasil, por exemplo, dissolva a sua soberania, seu poder de consumo, o pré-sal e a sua industrialização –para citar alguns de uma longa série de itens- no detergente global dos mercados desregulados.
Carta Maior considera que a iniciativa histórica dos Brics amplia o espaço político para um debate qualificado de sua contrapartida no plano regional e nacional.
Não por acaso os líderes dos Brics se reuniram com os da Unasul, em Brasília, nesta 4ª feira.
A filiação que importa saber e que Aécio não registrou em sua fábula familiar, portanto, é quem é Brics, quem é Unasul e quem é Wall Street na política nacional?
Claramente, a disputa presidencial de outubro opõe dois projetos de futuro que guardam correspondência com a clivagem evidenciada nas decisões da cúpula reunida em Fortaleza.
Traduzir esse debate em textos que abordem a dimensão internacional e nacional da nova ordem em construção é o objetivo do seminário virtual, ‘O Poder da Internacional Financeira’, que Carta Maior está promovendo em sua página (leia os textos já publicados de Márcio Pochmann e Tarso Genro).
Para ele estão sendo convidados intelectuais de todo o Brasil e do exterior (leia também ‘O candidato oculto’).
Aquela coisa de ‘elevar’ o leitor ao nível do tanquinho de areia do ensino infantil. Aécio é filho de; pai de; tio de; neto de ... (a foto de Tancredo na parede só falta sorrir, como nos desenhos animados).
A vida é bela; a família mais bela de todas garante que o candidato tucano é um cara bacana...
A ideia, dizem os assessores, é combater o estereotipo do playboy desregrado, que pelo visto calou fundo nas pesquisas.
Aécio deveria mostrar outras filiações, as históricas, aquelas que decorrem de opções feitas na vida pública, não as herdadas na corrente sanguínea.
As eleições brasileiras de outubro –é forçoso reiterar, como tem feito Carta Maior- não podem ser desperdiçadas em um fabulação publicitária feita de personagens simpáticos e imagens cativantes.
As eleições de outubro dialogam com um poder nada simpático.
Apesar da presença invisível nos palanques, como tem sido dito neste espaço, ele detém a singular capacidade de asfixiar o debate nacional, ademais de condicionar a agenda dos partidos e governantes, antes e à revelia do escrutínio das urnas.
A fonte desse poder invisível remete à hegemonia das finanças globalizadas em nosso tempo.
Sua supremacia reduz de forma importante o repertório das iniciativas políticas nacionais.
Não é uma jabuticaba brasileira.
O que vale para o Brasil não é diferente do que ocorre na Argentina, mas também na França, ou na Nigéria.
O ingrediente decisivo da luta pelo desenvolvimento, a soberania reordenada pelo voto democrático, e o poder indutor do Estado, operam hoje por instrumentos sob forte turbulência e restrição.
Não há novidade nisso, claro.
Nas transições de ciclo de desenvolvimento, porém, quando decisões estratégicas devem ser tomadas para desobstruir o passo seguinte da história, tais restrições assumem contornos de uma asfixia quase imobilizante.
É o caso da encruzilhada brasileira atual.
Mudanças de fundo são requeridas para inaugurar um ciclo de investimentos.
Sem avanços na infraestrutura e na produtividade, estreita-se a margem de manobra para consolidar um novo estirão na redistribuição da renda, na redução da desigualdade e na universalização de serviços de qualidade.
As opções são duas.
Entregar a rapadura de vez aos mercados, deixar que eles resolvam os impasses na base do arrocho; ou tentar erguer linhas de passagem de um novo ciclo convergente da riqueza.
A segunda escolha requer a força e o consentimento de uma ordenação pactuada da sociedade e da economia.
Estamos, portanto, diante de uma encruzilhada da democracia.
A ruptura dessa asfixia no ambiente global acaba de registrar um capítulo importante nesta 3ª feira ( 15-07) .
Um novo banco de desenvolvimento e um fundo de reservas alternativos ao Banco Mundial e ao FMI foram criados na reunião de Cúpula dos líderes dos Brics, realizada em Fortaleza, no Ceará.
A mídia conservadora fez pouco diante desse ensaio de Bretton Woods cearense e preferiu afogar a atenção dos seus leitores naquilo que é secundário.
A saber: o valor dos fundos iniciais e a ocupação de cargos no novo banco, em que o Brasil terá a estratégica diretoria encarregada de planos de investimento e expansão.
A Índia inaugurará a presidência rotativa e a China sediará a instituição em Xangai.
O desdém em relação aos valores iniciais envolvidos (US$ 100 bi de fundo de reservas e um funding de US$ 50 bilhões, no caso do banco de desenvolvimento) precifica a ignorância ou a má fé, ou as duas coisas juntas, na abordagem obtusa da emissão conservadora.
O que está em jogo no xadrez do século XXI é a construção de novas estruturas de poder global que rompam com os frangalhos resultantes do colapso de Bretton Woods.
Hoje, o FMI e o Banco Mundial restam como um zumbi da arquitetura disciplinadora do capitalismo imaginada para a ordem internacional em 1944.
Inteiramente prestativos aos desígnios dos mercados desregulados –que nasceram para disciplinar—funcionam, a exemplo das agencias de risco, como alavancas pró-cíclicas do vale tudo especulativo.
Na fase de valorização irracional dos ativos e de fastígio do crédito, certificam a higidez das estripulias de Wall Street -como nas vésperas do colapso de 2008; em seguida, acentuam a espiral contracionista, chancelando políticas de arrocho quando as bolhas especulativas explodem.
A reunião dos Brics no Brasil moveu as placas tectônicas dessa ruína cristalizada no xadrez mundial.
Os valores envolvidos ganham dimensões superlativas quando associados à contrapartida política do que está em jogo.
Objetivamente, e de forma consistente, a decisão dos Brics afronta a subordinação passiva das nações à desordem neoliberal.
Países que reúnem um PIB da ordem de US$ 16 trilhões, superior ao da Zona do Euro, e uma população conjunta de 3 bilhões de pessoas, informaram ao mundo que vão construir instituições que colidem com a lógica de Wall Street e de seus braços institucionais.
Convenhamos, não é uma notícia agradável para quem defende que o Brasil, por exemplo, dissolva a sua soberania, seu poder de consumo, o pré-sal e a sua industrialização –para citar alguns de uma longa série de itens- no detergente global dos mercados desregulados.
Carta Maior considera que a iniciativa histórica dos Brics amplia o espaço político para um debate qualificado de sua contrapartida no plano regional e nacional.
Não por acaso os líderes dos Brics se reuniram com os da Unasul, em Brasília, nesta 4ª feira.
A filiação que importa saber e que Aécio não registrou em sua fábula familiar, portanto, é quem é Brics, quem é Unasul e quem é Wall Street na política nacional?
Claramente, a disputa presidencial de outubro opõe dois projetos de futuro que guardam correspondência com a clivagem evidenciada nas decisões da cúpula reunida em Fortaleza.
Traduzir esse debate em textos que abordem a dimensão internacional e nacional da nova ordem em construção é o objetivo do seminário virtual, ‘O Poder da Internacional Financeira’, que Carta Maior está promovendo em sua página (leia os textos já publicados de Márcio Pochmann e Tarso Genro).
Para ele estão sendo convidados intelectuais de todo o Brasil e do exterior (leia também ‘O candidato oculto’).
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